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Começam a chegar a Portugal alguns dos representantes do Movimento Emigrantes Lesados (MEL), numa rotina que se repetiu durante décadas e marcava o início de férias. Desta vez, “não há férias para ninguém”, garante Amélia Reis, emigrante em França há mais de 40 anos, país onde estará a maioria dos sete mil emigrantes que adquiriram soluções de poupança propostas pelo Banco Espírito Santo (BES). “Há meses que não dormimos, os problemas de saúde agravam-se e estes dias em Portugal vão ser de luta”, resume.
Na sexta-feira, Amélia Reis e Manuel Sousa foram chamados a uma reunião em Paris com “administradores do Novo Banco que se deslocaram de Portugal para explicar a proposta”. Ofendidos por terem sido “tratados como crianças”, na definição de Manuel Sousa, garantem que “os emigrantes franceses não vão assinar a proposta do Novo Banco (NB)”. E se pelo menos 50% não assinarem, não podem ser liquidados os veículos financeiros onde estão “presos” os quase 800 milhões de euros dos emigrantes.
Em causa está parte da proposta que transforma cerca de 60% do investimento inicial em obrigações seniores não subordinadas do NB com maturidade em 2049 e 2050. As propostas escritas que o NB, finalmente, enviou aos emigrantes detalham que aqueles instrumentos financeiros “serão avaliados considerando o presumível valor de realização difundido através de meios de informação especializados”. Para os emigrantes, isto significa que “valem zero e ninguém as quer. Querem transformar 60% do nosso dinheiro em lixo”, acusa Ana Maria Fernandes.
Os restantes 30% – o NB não assume mais do que 90% das poupanças aplicadas – serão recuperados durante seis anos. “Mas, como não nos pagam os juros que estavam contratualizados, mais os que decorreram entretanto, e para esse dinheiro ser resgatado ainda vamos ter de pagar imposto, na melhor das hipóteses recuperamos apenas 74% dessa fatia (de 30%) do capital inicial”, aponta Luís Marques, porta-voz do MEL em Portugal. Para um Poupança Plus 6 em que tenham sido aplicados 100 mil euros, por exemplo, o emigrante apenas teria como certa a recuperação de cerca de 22 mil euros em 2021. E nem o caso de quem tinha o Top Renda, alegadamente com 120% de valorização, salva o capital inicial. “Se é assim, como é que recebi a mesma proposta dos outros?”, questiona Valentim Santos.
Não é aceitável. Se temos economias é porque trabalhámos. É dinheiro limpo, pagámos impostos e não estou a pedir aos portugueses que o paguem. Se o NB não tem dinheiro, podem pagar em bens. Eu aceito”, declarou José Campos, visivelmente transtornado. “Estão todos nervosos e o MEL não se responsabiliza por ações que não sejam sensatas e razoáveis. Somos pessoas de bem e queremos resolver isto a bem”, alerta Luís Marques. “Uns dizem que se matam se não recuperarem o dinheiro, outros dizem que não têm nada a perder – são velhos, já não vão gozar o dinheiro – e admitem vir a Portugal “fazer uma asneira”. Queremos que tenham calma, mas há situações mesmo muito complicadas que só pioram quando parece que não há justiça em Portugal”, remata Ana Maria Fernandes.
O que o BES oferecia
Os produtos de poupança oferecidos aos emigrantes, descritos como “depósitos a prazo” pelos gestores de conta, subscritos à confiança por telefone e/ou sem ficha normalizada (“Estava sempre esgotada”, refere Célia Santos), ofereciam juros entre 2% e 4,5%. “Não era nada de extraordinário, por isso permiti que me transformassem o PPR nisso”, diz Ana Maria Fernandes.
Proposta do Novo Banco
Transformar 60% do capital inicial em obrigações do Novo Banco, sem rentabilidade assegurada e maturidade dentro de 35 anos, podendo algum diferencial ser aplicado a prazo por dois anos e os restantes 30% são depositados a prazo até 2020.
O que podem aceitar
Os emigrantes admitem aceitar uma solução idêntica à que foi oferecida aos residentes que detinham produtos idênticos do BES: as obrigações foram vendidas e aplicadas num depósito a prazo a 3 anos e 75% do diferencial entre o valor da venda e o capital mais juros que o cliente tinha a haver foram aplicados num depósito a prazo a 10 anos.