O procurador Rosário Teixeira demorou mais de 30 minutos a ler as razões porque Ricardo Salgado estava a ser ouvido como arguido na Operação Marquês. No final, o ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES) só conseguia falar em “choque”. Pediu desculpa ao magistrado pela afronta e disse nunca ter visto “tanta mentira junta”.
Rosário Teixeira perguntou-lhe se não queria tempo para conferenciar com os seus advogados numa outra sala do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), e Salgado, abatido, pediu apenas “um copinho de água”, alegando que quem sofria um choque daqueles o merecia. Ainda bem que tinha “alguma preparação física”, desabafaria mais à frente. Caso contrário, teria “caído para o lado” com as acusações que lhe faziam.
Seguir-se-iam quase quatro horas de um interrogatório tenso, de que a VISÃO teve conhecimento e revela em exclusivo, e em que o ex-líder do BES foi “apertado” pelos investigadores para explicar transferências bancárias de mais de €90 milhões feitas pelo Grupo Espírito Santo (GES). Para responsáveis políticos, em Portugal e no Brasil, administradores da PT e até para o próprio Ricardo Salgado, entre 2006 e 2014.
Foi uma das revelações mais surpreendentes do interrogatório.
O Ministério Público (MP) descobrira que tinham sido “desviados” da Espírito Santo Enterprises (o alegado saco azul do GES) €7,75 milhões para uma conta da Savoices, offshore que era, nada mais, nada menos, de Ricardo Salgado. A equipa liderada por Rosário Teixeira acreditava que o então presidente do BES o teria feito deliberadamente, para também “tirar proveitos” dos negócios da PT e ocultar esses valores das suas declarações de rendimentos. As suspeitas eram gravíssimas: Salgado não só era apontado como o corruptor de José Sócrates e de administradores da PT, como era suspeito de ter prejudicado as contas do grupo que liderara durante mais de duas décadas, ao desviar o dinheiro para contas suas e para pagar subornos. O Grupo Espírito Santo ruiu, a PT também.
Chamado a explicar-se, o antigo banqueiro disse ter recorrido àquela empresa do grupo, em 2010 e em 2011, para ter financiamento e assim entrar em aumentos de capital do banco. Só não devolveu todo o dinheiro porque teria sido desse bolo que pagara a caução de €3 milhões que “o sr.
procurador tinha feito questão” de lhe estabelecer, no processo Monte Branco. E não tinha mais “recursos”, como Rosário Teixeira bem saberia: “Congelou-me as contas na Suíça!”, queixou-se.
Para explicar as razões que motivariam Salgado a corromper políticos e gestores em negócios da PT, o procurador começou por recuar até 2006, altura em que a Sonaecom, de Belmiro de Azevedo, lançou uma oferta pública de aquisição (OPA) sobre a PT.
À época, diz o MP, Ricardo Salgado teria um controlo real sobre a operadora telefónica: porque o BES tinha uma participação direta de 8,3% na PT e porque era próximo de membros da comissão executiva da empresa.
O estatuto permitia-lhe dar início a um plano para a OPA ser chumbada.
Perder a PT significaria perder dividendos e capacidade de influência, em Portugal e no Brasil. Por essa razão, diz a investigação, Salgado terá procurado apoio político para bloquear uma eventual decisão favorável à OPA, acordando com José Sócrates “o pagamento de uma quantia”, que deveria chegar à posse do então primeiro-ministro “de forma oculta”, com recurso a intermediários, contratos forjados e contas de passagem.
Nesta primeira fase, Ricardo Salgado terá “simulado” financiamentos à Escom empresa do Grupo Espírito Santo e do luso-angolano Hélder Bataglia para fazer o dinheiro chegar, de forma encapotada, a José Sócrates. Bataglia, acionista da Escom, e Pedro Neto, administrador da empresa, terão visto passar pelas suas contas €7,5 milhões, entre abril e maio de 2006. Desses, €6 milhões foram transferidos para uma conta na UBS de José Paulo Pinto de Sousa, primo de José Sócrates residente em Angola, e já referenciado no processo Freeport. Uma parte terá sido enviada em numerário para Portugal, através de um circuito paralelo; e outra parte terá, mais tarde, sido transferida para as contas suíças do empresário e então administrador do grupo Lena, Carlos Santos Silva, suspeito de ser o testa de ferro de Sócrates.
O suposto plano de Ricardo Salgado para não perder o controlo da PT não terminaria aí. Em 2007, o então líder do BES terá acordado com Sócrates e com administradores da operadora telefónica “novos pagamentos” para levar avante a estratégia de reestruturação da PT e de investimentos no Brasil. Fundos de €7 milhões foram transferidos da Espírito Santo Enterprises (E.S. Enterprises) para Bataglia em julho de 2007, justificados por um contrato que o MP diz ter sido forjado entre a Markwell, offshore do luso-angolano, e a Pinsong, uma subsidiária da E.S. Enterprises.
Dos €7 milhões, €3 milhões chegariam a Santos Silva.
No mesmo mês, aquela empresa do GES passou também a ser o veículo para distribuir dinheiro aos administradores da PT. O primeiro contemplado foi Henrique Granadeiro, então chairman da empresa, que terá recebido €6,5 milhões numa conta do banco Pictet, na Suíça. Em dezembro, também Bava receberia, numa conta em Singapura, os seus primeiros €6,7 milhões com origem no GES. Esse pagamento nunca foi tornado público: o antigo gestor da PT assumira ter recebido €18,5 milhões do GES em 2011, mas ocultara esta transferência de 2007. No total, terá recebido mais de €25 milhões.
€48 MILHÕES PARA ADMINISTRADORES DA PT
Durante o interrogatório, Salgado justificou as transferências de 2011 para Zeinal Bava com o que chamou de “garantia fiduciária”. Disse que deu adiantamentos ao então presidente–executivo da PT para garantir que a sua equipa de gestores brilhantes, com Bava “montado em cima do cavalo”, não abandonava a corrida antes de pôr em ordem a brasileira Oi. E a transferência feita em 2007 para Bava? Salgado não sabia explicar.
Entre 2010 e 2012, contas no banco Pictet voltaram a ser alimentadas, desta vez com €5,5 milhões e cerca de 15 milhões de francos suíços (à data o equivalente a cerca de €12 milhões).
Salgado associou essas transferências a Granadeiro, constituído arguido a 24 de fevereiro, dia em que Zeinal Bava também foi ouvido e constituído arguido. São suspeitos de corrupção passiva, fraude fiscal e branqueamento de capitais na Operação Marquês.
Sobre estes movimentos bancários para o ex-chairman da PT, Salgado já tinha explicações. Ou parte delas.
Primeiro, que o dinheiro serviria para pagar favores antigos do gestor, do tempo em que a família do banqueiro decidira investir em negócios ruinosos de cerâmicas. Depois, que seria para pagar a aquisição de parte de uma quinta de Granadeiro, reconhecido por Salgado como “um dos maiores sábios” da área agrícola e produtor de “uns vinhos fantásticos”. Qual quinta? Não sabia. Que participação? Não se lembrava. E o contrato? Não chegou a ser redigido, disse Salgado, garantindo porém que de certeza teria sido feita uma avaliação. No total, os administradores da PT terão recebido mais de €48 milhões, mais do dobro dos €22 milhões que terão chegado a Sócrates pelas suas alegadas interferências políticas nos negócios da operadora telefónica.
No ano de 2010, novas propostas alargaram os horizontes da PT.
A operadora portuguesa e a espanhola Telefónica tinham participações na brasileira Vivo. Em junho de 2010, a Telefónica formalizou uma proposta para adquirir a participação da PT.
À primeira vista, o negócio era bom para a empresa portuguesa, que encaixava o dinheiro da venda da Vivo e ganhava fundos para entrar no capital da Oi, outra operadora de telecomunicações brasileira.
Salgado não estava convencido.
Nesse momento, segundo o MP, o antigo banqueiro terá montado uma estratégia “para convencer o poder político a usar a goldenshare” detida pelo Estado na PT. A assembleia geral da PT concordou na venda da participação da Vivo à Telefónica. E no mesmo dia Sócrates usou as “ações douradas” para bloquear o processo.
A estratégia permitiu que a Vivo subisse a oferta de €7,15 mil milhões para €7,5 mil milhões, um valor que se considerava impensável. Na mesma data, a PT fez um acordo prévio para aquisição de capital da Oi.
Uns meses depois, em novembro, os administradores da PT foram compensados pela estratégia de expansão para o Brasil com novas transferências da E.S. Enterprises. Nas mesmas datas, Salgado recebeu dinheiro daquela empresa na sua Savoices e €4 milhões foram transferidos para Álvaro Sobrinho, então presidente do BES Angola.
O MP também descobriu movimentos em sentido inverso: entradas de verbas na E.S. Enterprises vindas da Socidesa, uma sociedade offshore com ligações à família de Sobrinho e que terá beneficiado dos créditos sem garantias dados pelo banco angolano. Salgado não soube explicar nenhuma das operações, mas lembrou não ser a única pessoa do grupo a poder movimentar as contas da empresa.
“NUNCA FUI ÍNTIMO DE SÓCRATES”
Ricardo Salgado acabaria por não se ficar só pelo “copinho de água”. Depois de uma paragem, regressou à sala do DCIAP e quis fazer uma declaração sobre o seu caráter: teria cometido erros de julgamento mas não “erros de princípio”. Nunca tinha falado “com o engenheiro José Sócrates” sobre a história da PT. E muito menos tinha entregado subornos a um ex-primeiro-ministro. E as coincidências das datas das transferências do Grupo Espírito Santo com as datas de decisões importantes para a PT? Salgado reconhecia a coincidência e respondia com humor: “Já ouvi falar várias vezes do diabo. Isto foi o diabo.” Com José Sócrates diz ter mantido apenas “relações institucionais”. “Nada de intimidades.” Aliás, nunca tivera relações íntimas com nenhum primeiro-ministro. Nunca usara contas de passagem. E tinha ficado “perplexo” por o dinheiro ter ido parar a Santos Silva, que jurou nunca ter visto. De resto, tinha estado duas vezes contra Sócrates publicamente: quando disse que a Vivo não devia ser vendida e quando, em 2011, foi à TVI defender a intervenção da troika. Desde então, acreditava que o ex-primeiro-ministro estaria “um bocado torcido” consigo. Depois disso, Sócrates não teria ido jantar à sua casa em Cascais?, perguntaram-lhe. Salgado tinha a vaga ideia de ter recebido uma visita de Sócrates no seu regresso de Paris, a pretexto da entrega do seu livro, que o banqueiro disse nunca ter lido. Nesse contexto, admitia lapsos de memória, mas não sobre passagens de dinheiro.
Isso, disse, só podia ter sido feito por uma pessoa: “Hélder Bataglia.”
DOIS PÁSSAROS, AS MESMAS PENAS
Desde o início da conversa que Ricardo Salgado pedia paciência e tentava interromper a ordem das perguntas para falar sobre as suas relações com Hélder Bataglia. Naquele dia, 18 de janeiro, Salgado já sabia que estava ali por causa do depoimento demolidor daquele que foi o homem do GES em África. Cerca de duas semanas antes, Bataglia tinha ido a Lisboa incriminar Salgado, dizendo que o então presidente do BES lhe pedira para ser intermediário do dinheiro para Santos Silva.
Salgado estava inquieto por ripostar.
E na onda acabou também por arrastar o ex-presidente do BES Angola (BESA), dizendo que, “ao buracão” de Sobrinho (havia 5 mil milhões de dólares de créditos irregulares no BESA), hoje já não tinha receio de juntar o nome de Bataglia. Salgado citou até o que dizia ser um provérbio inglês: “Pássaros com as mesmas penas voam juntos.” Contou que seria uma cunhada de Sobrinho a aprovar os créditos no BESA e que o angolano, escolhido para o cargo pelos seus dotes matemáticos, teria usado a matemática “só para benefício próprio”.
O ex-presidente do BES ia lançado e não poupou nas palavras. Quando ouviu que Bataglia tinha dito que vendera a sua posição no BESA a Sobrinho por 60 milhões de dólares, questionou de onde viria esse dinheiro, afirmando ter “quase a certeza” de que saíra dos cofres do banco em Angola. Nessa altura, insistiu, Sobri nho já se teria “servido muito bem” e já se falava que sairia de Angola com o dinheiro “em malas”. Salgado estranhava que tivesse comprado uma torre na Escom (o mais emblemático prédio de Luanda) por 400 milhões de dólares, financiado pelo BESA, e posteriormente vendido a torre por 800 milhões a outra entidade, também financiada por aquele banco. Para Salgado, era um escândalo como em Angola ainda ninguém lhe tinha tocado.
Para o ex-presidente do BES, isso só se explicava de uma maneira: com a existência de mais pessoas a lucrarem com o prejuízo do banco.
Embalado, Salgado chegou mesmo a levar para a história nomes de generais.
Disse ter ficado surpreendido ao saber que a equipa liderada por Rui Guerra que substituiu Álvaro Sobrinho no comando do BESA tinha chegado a Angola com “passaportes militares” e sido reencaminhada para o general Leopoldino Nascimento (“Dino”). “O Kopelipa era mais regrado”, terá então comentado Salgado.
O ex-líder do BES recordou como Bataglia tinha entrado no grupo nos anos 90; e como o BES tinha ajudado Angola ao liderar um sindicato bancário, que deu um empréstimo para o país conseguir pagar uma parte da sua dívida. Aqui, Salgado brincou. Disse que se as pessoas agora não gostavam de ouvir falar de offshores deviam saber que o Estado português tinha montado uma nesse negócio, para onde iriam os fundos para pagar a Portugal com “garantias de barris de petróleo”. Ironia maior ainda, lembrava Salgado, é que na mesa dessas reuniões estivesse sentado Carlos Costa, então na área internacional do BCP, e hoje governador do Banco de Portugal.
Depois da expansão dos negócios da Escom, o BES consegue a licença para abrir o primeiro banco de direito angolano e o BESA começa a crescer brutalmente. Cresce tudo de forma tão “inusitada” que Bataglia salta dali para o Congo Brazzaville. Para Salgado, esta terá sido mais uma forma de “passar dinheiros de Angola para fora”.
A primeira vez que se sentira traído por Bataglia aconteceu quando “um chinês esquisitíssimo” chamado Sam Pa, trazido na mão pelo luso-angolano, quis fazer negócios com o GES e lhes “passou a perna”. Certo é que, por mais desavenças que tivesse com Bataglia, e por mais que o chateasse que o fundador da Escom estivesse a toda a hora a pedir “success fees”, Salgado até assinou um contrato de prestação de serviços em 2005, prometendo remunerá-lo em negócios do petróleo aos diamantes, como diz ter feito.
O MP não acredita na veracidade deste contrato. Dos €29 milhões que o GES terá dado a Bataglia, o luso-angolano só terá ficado com €7 milhões.
A BONDADE NOS NEGÓCIOS DA PT
Salgado arrancou sorrisos na sala ao dizer que todas as decisões que tomou enquanto acionista da PT tinham sido em defesa da empresa e não com “objetivos maquiavélicos”. E lamentou o facto de hoje já não conseguir convencer as pessoas da sua “bondade”.
Contou que soube pelo bilionário mexicano Carlos Slim que a Telefónica iria comprar a Vivo. Slim estaria interessado porque era concorrente da Telefónica no Brasil. E Salgado não via razões para apoiar a OPA, nem para favorecer os espanhóis na venda da participação na Vivo, numa altura em que todos tinham interesse em estar no Brasil.
Também desmentiu ter forçado Nuno Vasconcellos, então presidente da Ongoing, a entrar no capital da PT.
Vasconcellos era “Rocha dos Santos” pelo lado materno e, por aí, tinha capitais.
O erro, diz, foi que Vasconcellos “exagerou” ao convencer-se de que a Ongoing iria ser “uma grande empresa de multimédia”.
Sobre os alegados lucros obtidos com a separação entre a PT e a PT Multimédia, em 2007, Salgado teimou em desmenti-los, puxando dos galões por ter sido durante 12 anos membro do Nyse Euronext, em Nova Iorque: “Ó sr. procurador, se alguém sabe alguma coisa de mercados sou eu!” O ex-presidente do BES foi então levado a explicar as alterações no conselho de administração da PT, com a saída de Miguel Horta e Costa e a entrada de Henrique Granadeiro.
É que César Alierta, presidente da Telefónica, teria convidado Horta e Costa para o conselho de administração da operadora espanhola. Além disso, recordou Salgado, a imagem do gestor estava denegrida na empresa.
Porque, além de Horta e Costa “se vestir muito bem” e ter “gravatas muito bonitas”, seria conhecido pelas viagens ao Brasil, “despesas sumptuárias” em festas e por ir a Paris apanhar um avião para São Paulo só para ir recostado “em cadeiras-cama”. Granadeiro, por seu turno, seria “extremamente controlado” nas despesas.
MILHÕES PARA HOMEM DE LULA
No interrogatório, que estava a ser gravado, o MP destacou Salgado como o grande impulsionador de outro plano para favorecer as parcerias da PT no Brasil. Salgado terá convencido a administração da PT a fazer pagamentos de 500 mil euros a José Dirceu, então braço-direito do presidente Lula da Silva, através de “pretensos contratos” de prestação de serviços com a sociedade de advogados de Abrantes Serra, já constituído arguido na Operação Marquês. Terá ainda desembolsado mais de €1,2 milhões (sem IVA) para Dirceu, através da Espírito Santo Financial, outra empresa do GES. Para o efeito, terão sido encenados outros contratos de prestação de serviços com aquele escritório, que justificavam uma avença de 30 mil euros por mês.
Esses pagamentos, que se estenderam durante três anos, terão acabado numa conta que seria usada exclusivamente para pagar despesas, designadamente viagens, do ex-ministro Dirceu, condenado em 2016, no Brasil, a uma pena de 23 anos de prisão no processo Lava-Jato.
Salgado insistiu que o dinheiro não era para Dirceu, mas para pagar ao escritório de advogados que tinha correspondentes no Brasil, para o ajudarem num processo judicial antigo relacionado com a invasão de uma propriedade da família. Mas Rosário Teixeira não descolava dos factos: Dirceu reunira-se em Portugal com Granadeiro e os pagamentos entregues a Abrantes Serra tinham acabado numa conta bancária onde, durante muitos anos, não tinha caído um cêntimo além dos do GES. Rosário Teixeira terá então desabafado em voz alta: “Outra vez essas coincidências…”
Para quem foi o dinheiro
O Grupo Espírito Santo terá distribuído mais de €90 milhões, de forma encapotada, por responsáveis políticos, administradores da PT e banqueiros, incluindo o próprio Ricardo Salgado
Os pagamentos para a PT
Em 2007 saíram cerca de €13,2 milhões da Espírito Santo Enterprises, do GES, para contas de Zeinal Bava e Henrique Granadeiro.
A 9 de julho saem €6 milhões para Granadeiro e a 7 de dezembro mais 468 mil euros. Nesse mesmo dia de dezembro, Bava recebe €6,7 milhões. De 2010 a 2012, decorre uma nova ronda de pagamentos.
São feitas cinco transferências para contas no banco Picté, na Suíça, que Salgado associa a Granadeiro no interrogatório. Em janeiro de 2011, uma conta em Singapura de uma offshore de Bava recebe €8,5 milhões. Outros €10 milhões chegam em setembro desse ano.
No total, os administradores da PT terão lucrado mais de 48 milhões de euros.
Os pagamentos para Sócrates
Segundo o Ministério Público, Salgado terá dado as primeiras ordens de transferências para o então primeiro-ministro em abril de 2006. Os fundos vêm do BES Angola e da Sucursal Financeira Exterior do BES, através de supostos financiamentos à Escom, a empresa do Grupo Espírito Santo em que Hélder Bataglia detinha 33%. Seguem para uma conta do BESA no Santander. Passam por Hélder Bataglia e Pedro Neto, administrador da Escom. Vão para uma conta de José Paulo Pinto de Sousa, primo de Sócrates.
Uma parte chega a Portugal em numerário, através de um circuito paralelo. Outra segue para as contas suíças de Santos Silva, mas só em 2008. Em julho de 2007, seguem mais €7 milhões para Bataglia, mas desta vez com origem no alegado saco azul do GES (a Espírito Santo Enterprises): só €3 milhões chegam a Santos Silva. Em 2008 e 2009, a ronda de pagamentos para Sócrates completa-se com a chegada à Suíça de €12 milhões, através de duas offshores de Bataglia, a Monkway e a Markwell. O primeiro circuito financeiro não incluiria Carlos Santos Silva. Na verdade, o empresário só foi chamado ao plano de ocultação de fundos em 2008. Até então, segundo Rosário Teixeira, o alegado testa de ferro seria José Paulo Pinto de Sousa, primo de José Sócrates residente em Angola, conhecido como “O Gordo”. O problema começou quando José Paulo passou a ser visado em investigações judiciais, como o processo Freeport, que rebentara nas vésperas das eleições legislativas e continuaria a perseguir Sócrates depois de ser eleito. Era preciso desviar os fundos para alguém mais discreto, que escapasse aos olhos da justiça.
Terão então escolhido Santos Silva.
Os pagamentos para Ricardo Salgado
Depois de concluída a venda da participação na Vivo por mais €350 milhões (devido ao uso das “ações douradas” pelo Estado), e da entrada da PT no capital da operadora Oi, o alegado saco azul do GES transferiu a 8 e a 18 de novembro de 2010 mais €7,5 milhões para a Green Emerald, offshore de Bataglia.
Só que desta vez o destinatário final não seria José Sócrates. A 9 de novembro são feitas duas transferências para a sociedade Savoices, de Ricardo Salgado, no total de €2,75 milhões. A 21 de outubro de 2011, outros €4 milhões seguem diretamente da Espírito Santo Enterprises para a Savoices, que acumula assim €6,75 milhões.
Em 2011, a Green Emerald volta a distribuir verbas que tinham ficado guardadas desde a transferência do GES, ainda em 2010: a 3 de janeiro saem €4 milhões com destino à Grunberg, de Álvaro Sobrinho, então presidente do BESA.