Arquivo para Dezembro, 2017

Salgado acusa Banco de Portugal de usar “delação premiada”

Domingo, Dezembro 24th, 2017

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Sábado

O ex-presidente do BES e o ex-administrador Amílcar Pires consideram que o Banco de Portugal usou ilegalmente a “delação premiada”

O ex-presidente do BES, Ricardo Salgado, e o ex-administrador Amílcar Pires consideram que o Banco de Portugal usou ilegalmente a “delação premiada” no processo em que foram condenados por comercialização da dívida da ESI junto de clientes do banco.

Na fase final do processo de impugnação das coimas de quatro milhões de euros aplicada a Ricardo Salgado e de 600.000 euros a Amílcar Pires — valores que as defesas consideraram não terem comparação com qualquer moldura de processos crime -, os arguidos reafirmaram que a condenação de que foram alvo por parte do Banco de Portugal (BdP) é nula, por vícios processuais, e que os administradores que “tinham conhecimento de toda a dívida” ou foram absolvidos ou foram alvo de contraordenações mínimas. Exemplificaram com o caso de José Maria Ricciardi (60.000 euros, suspensa em três quartos por cinco anos), que optou por pagar e desistiu do recurso.

Com sentença marcada para 30 de Abril de 2018, o julgamento, que se iniciou a 06 de Março último no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, aprecia os pedidos de impugnação apresentados por Ricardo Salgado e Amílcar Pires no âmbito de um processo que começou por ter 18 arguidos (15 singulares e três colectivos), 13 dos quais alvo de coimas.

Ricardo Salgado foi condenado ao pagamento de quatro milhões de euros e ficou impedido de exercer cargos no sector por 10 anos como resultado da aplicação de cinco coimas por não implementação de sistemas de informação e comunicação adequados, por não implementação de um sistema de gestão de riscos sólido, eficaz e consistente, no que concerne à actividade de colocação de produtos emitidos por terceiros, por actos dolosos de gestão ruinosa, praticados em detrimento dos depositantes, investidores e demais credores, por prestação de falsas informações ao BdP, por violação das regras sobre conflitos de interesses.

A defesa de Ricardo Salgado — conduzida por Francisco Proença de Carvalho e Adriano Squilacce — retomou, nas alegações finais feitas no final desta semana, muita da argumentação já constante do recurso, pondo em causa a actuação do BdP, em particular do governador Carlos Costa, que “três dias depois da abertura do processo já tinha decidido”, e a “estratégia” de atingir Ricardo Salgado, o “endeusado”, e Amílcar Pires, apontado como seu “braço direito”.

Para a defesa de Salgado, o facto de o BdP ter, no processo, “transformado arguidos em testemunhas” assumiu uma forma de “delação premiada”, sem regras e “utilizada para responsabilizar” quem o supervisor “já tinha condenado”.

Frisando que não está a ser julgada “uma multa de trânsito, mas o processo de uma vida”, os mandatários afirmaram que a “acusação genérica”, sem precisão de tempo e lugar, num “processo gigante” (67 volumes e 640 anexos à data da decisão) obrigou a um esforço “surrealista” num prazo de tempo para o exercício do direito de defesa que noutros processos foi já motivo de sentença de anulação.

Invocaram ainda o pedido da procuradora do Ministério Público (MP), Edite Palma, para que o tribunal desconsidere o testemunho de José Castella (cujas declarações no TCRS foram extraídas para averiguação da atuação dos instrutores do processo que o inquiriram na fase administrativa), a que acrescentaram o pedido de igual tratamento para o depoimento de Francisco Machado da Cruz, a que chamaram a “testemunha rainha” do BdP.

A defesa de Salgado frisou que o ‘commissaire aux comptes’ era muito mais do que um simples contabilista e realçou o facto de se ter “descoberto” neste processo a forma como Machado da Cruz foi contactado (através de relações familiares de um dos instrutores do BdP), considerando estar-se perante “mais uma transformação de arguidos em testemunhas”.

O facto de a procuradora ter proposto ao Tribunal a “reorganização dos factos” constantes da acusação levou Raul Soares da Veiga, advogado de defesa de Amílcar Pires, e os mandatários de Salgado a reafirmarem a existência de vícios processuais que deverão levar a juíza Anabela Campos a declarar nula a decisão do BdP.

Amílcar Morais Pires foi alvo de duas contraordenações por não implementação de sistemas de informação e comunicação adequados e não implementação de um sistema de gestão de riscos sólido, eficaz e consistente, no que concerne à atividade de colocação de produtos emitidos por terceiros.

Para Soares da Veiga, o pedido de aligeiramento da coima aplicada a Morais Pires feita pelo MP (de redução para 300.000 euros, suspensos em três quartos, e revogação da sanção acessória de inibição do exercício de cargos por três anos), por entender que o seu comportamento se deveu a negligência e não dolo, não deve colher por “insuficiência de matéria provada”.

EY substitui PwC na auditoria ao Novo Banco

Domingo, Dezembro 24th, 2017

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Negócios

Com um novo accionista, o auditor do Novo Banco mudou. A PwC sai do cargo, dando lugar à EY, que acumula aquela função com a de revisora oficial de contas da Caixa Geral de Depósitos e com o Fundo de Resolução.

A EY, antiga Ernst & Young, vai ser a nova auditora do Novo Banco. A decisão foi tomada esta quinta-feira, 21 de Dezembro, na mesma assembleia-geral que deu forma à injecção de 250 milhões de euros, pela Lone Star, na instituição financeira.

 

“Foi ainda deliberado nomear para o cargo de revisor oficial de contas com mandato a iniciar em 2018 a sociedade Ernst & Young Audit & Associados – SROC, S.A representada por António Filipe Dias da Fonseca Brás e como Suplente, João Carlos Miguel Alves”, indica o comunicado enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).

A EY será a responsável por olhar para as contas da instituição liderada por António Ramalho (na foto) a partir do próximo ano, o primeiro exercício completo em que o seu accionista maioritário, com 75%, é a americana Lone Star.

O Fundo de Resolução detém 25% do banco sendo que também esta entidade, que funciona junto do Banco de Portugal, tem a EY como auditora.

A EY fica, assim, com dois grandes bancos em carteira: o Novo Banco junta-se à Caixa Geral de Depósitos.

Já a PwC, embora perdendo o herdeiro do BES, ganhou este ano a conta do BPI e tem ainda o Santander Totta.

Ainda na banca, o BCP tem a Deloitte como sua auditora, cargo que era até ao ano passado ocupado pela KPMG. Esta última é a responsável por rever as contas do Montepio.

Venda do Novo Banco: Herdeiro do BES ainda tem riscos para o Estado

Domingo, Dezembro 24th, 2017

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Negócios

A venda do Novo Banco à Lone Star foi o negócio do ano de 2017.

Mais de três anos depois da sua criação, após um concurso falhado e seguindo-se a vários pedidos de nacionalização, o Novo Banco foi alienado. Não na sua totalidade; apenas 75% do seu capital passou para as mãos americanas do fundo de “private equity” Lone Star. O Fundo de Resolução, que é financiado através de contribuições dos bancos a operar em Portugal, manteve 25% da instituição financeira na sua posse. Não houve lugar a pagamento, apenas foi assegurada a capitalização do banco. Entraram, no imediato, 750 milhões de euros através da Nani, que deu os 75% à Lone Star. E quase a fechar o ano a nova injecção garantiu mais 250 milhões de euros ao banco, conforme estava previsto.

Com a venda, deixou de haver um banco de transição. Para o governador do Banco de Portugal, a alienação de 75% do Novo Banco permitiu cumprir “integralmente as finalidades que presidiram à resolução do Banco Espírito Santo”, determinada a 3 de Agosto de 2014, com a injecção de 3,9 mil milhões de euros estatais no Fundo de Resolução, que terão de ser devolvidos até 2046. A alienação foi a colocação de um ponto final num processo que tornou Carlos Costa um alvo de críticas no Parlamento.

Só que o dossiê não ficou fechado. Na venda, que foi coordenada por Sérgio Monteiro, o Fundo de Resolução assumiu a partilha de riscos em torno do Novo Banco. É o chamado mecanismo de capitalização contingente, que cobre um conjunto específico de activos que a Lone Star considerou tóxicos e que em determinadas condições, nomeadamente prejudicando os rácios de capital do banco, poderá obrigar a uma capitalização pelas instituições.

O Governo assegurou o mecanismo devido à “preservação da estabilidade financeira”, referindo que “os seus compromissos” são “eventuais”. A injecção poderá obrigar à entrada de até 3,9 mil milhões de euros vindos do Fundo de Resolução. Ainda que permitindo a venda, o BCP foi para tribunal para impedir que o mecanismo de capitalização contingente venha a ser executado.

A partilha de riscos não é, no entanto, a única forma possível de mobilização de montantes que pertencem ao Fundo de Resolução relativamente ao banco presidido por António Ramalho. Há centenas de processos judiciais em torno da intervenção administrativa ao BES, nomeadamente contra a resolução ou contra a comercialização de produtos vendidos pelo antigo BES. Um dos processos mais relevantes, pela dimensão, é de grandes gestoras de fundos internacionais, como a Pimco e a BlackRock, que, para além de terem tentado travar a alienação, têm feito um esforço de boicote de idas aos mercados de outros bancos portugueses, como a CGD e o BCP.

A vida do Novo Banco continua. Com o Estado por perto.

Lesados do BES recebem em Abril após empréstimo de 145 milhões do Estado

Sexta-feira, Dezembro 22nd, 2017

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Negócios

O Tesouro português vai emprestar directamente ao fundo de recuperação de créditos 145 milhões de euros para o papel comercial da ESI e Rioforte. A garantia estatal de até 301 milhões de euros não vai ser usada.

 

Salvar os bancos já custou 14,6 mil milhões aos contribuintes

Sexta-feira, Dezembro 22nd, 2017

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Diário de Notícias

Entre 2008 e 2016, as ajudas à banca, descontando os ganhos que o Estado obteve, custaram o equivalente a 8% do PIB, quase seis vezes o valor do défice deste ano. BPN pesa mais 455 milhões de euros em 2016

Os encargos dos contribuintes com o salvamento e a ajuda aos bancos ascendem já a 14,6 mil milhões de euros, no período que vai de 2008 a 2016, e a fatura não está fechada. A maior ameaça continuam a ser os escombros do BPN, que deve muito dinheiro à CGD. Os números são do Tribunal de Contas (TdC) e vêm no Parecer sobre a Conta Geral do Estado referente ao ano passado, publicado nesta semana.

Só em juros – porque o Estado, sem verbas suficientes, teve de pedir dinheiro emprestado aos mercados para apoiar a banca – terão sido desembolsados 1,8 mil milhões de euros.

O Estado ganhou algum dinheiro com as ajudas prestadas (juros e dividendos), mas não o suficiente. Em termos brutos, nos nove anos em análise, gastou 20,8 mil milhões de euros (11% do produto interno bruto, PIB) em despesas de capital e correntes. Conseguiu recuperar 6,2 mil milhões de euros (3% do PIB). Em nove anos, as únicas duas operações que deram dinheiro até agora foram as ajudas ao BCP (receita líquida de 211,4 milhões de euros) e ao BPI (167,5 milhões).

Assim, o custo líquido imputado aos contribuintes é muito elevado e ascende aos tais 14,6 mil milhões de euros (8% do PIB). É o equivalente a quase seis vezes o valor do défice estimado para este ano.

Na atualização da análise aos apoios públicos ao setor financeiro, o Tribunal de Contas refere que “o esforço financeiro resultante das intervenções públicas, destinadas a apoiar o sistema financeiro nacional no seguimento da crise financeira internacional iniciada em 2007, constituiu um encargo elevado para o erário público num contexto de finanças públicas deficitárias”. “O peso dos encargos diretos variou de ano para ano entre um mínimo de 0,1% das necessidades de financiamento da Conta Geral do Estado em 2011 e um máximo de 6,3% em 2012”, acrescenta.

Em 2016, o valor e o esforço foram os mais baixos desde 2011, mas 2016 foi uma exceção: não foi preciso apoiar qualquer banco em apuros. O mesmo não foi verdade nos anos anteriores. Depois do BPN e do BPP, o BES faliu em 2014 e o Banif em 2015. Em 2017, foi a vez de a CGD receber uma enorme injeção de capital, mas como foi financiada com dívida, o défice deverá ficar a salvo. O primeiro-ministro, António Costa, anunciou nesta semana que o défice público deste ano deve ficar abaixo da meta de 1,4%.

Mas o mesmo não aconteceu com o BPN, que é, e continuará a ser, a maior dor de cabeça dos contribuintes, perfilando-se como a herança financeira mais pesada da crise financeira, pior até do que o BES, por causa do volume generoso de garantias estatais dadas aos negócios do banco (muitos deles ruinosos) na sequência da sua nacionalização, em 2008 (pelo governo PS de José Sócrates e Fernando Teixeira dos Santos, o ministro das Finanças na altura).

Pelas contas do TdC, o BPN, que era um banco de pequena dimensão mas muito próximo do círculo do poder e de altas individualidades do PSD, já custou 3,7 mil milhões de euros aos contribuintes nos nove anos analisados. Em 2016, caiu mais uma fatura de 455 milhões de euros.

Todos os anos o Estado empresta dinheiro aos fundos que gerem os ativos do antigo BPN (as sociedades par – Parvalorem, Parparticipadas e Parups). Como estes veículos geram receitas magras, o custo líquido das operações cai diretamente no défice. Se o Estado não emprestasse dinheiro às par, a CGD, que é o maior credor, teria problemas sérios. Em 2016, o Estado financiou as par com mais 442 milhões. Os veículos financeiros só amortizaram 7,5 milhões, diz o TdC.

E este ano não foi exceção. O Orçamento do Estado deste ano previa injetar mais 561,2 milhões de euros. Só na execução orçamental de dezembro (a divulgar em janeiro) é que se vai saber quanto dinheiro seguiu efetivamente para o ex-BPN. E só em junho de 2018 é que se saberá o custo líquido da operação, com a Conta Geral do Estado relativa a 2017.

Além do BPN, o Estado gasta dinheiro com outros bancos falidos. No Orçamento para 2018, a dotação para os veículos BPN vale 641 milhões; quatro veículos do Banif levam 372 milhões e o antigo BES absorve mais 3,6 milhões. No total, são mais de mil milhões de euros.

Cheque de 250 milhões do Lone Star já chegou ao Novo Banco

Sexta-feira, Dezembro 22nd, 2017

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Eco

Depois dos 750 milhões injetados no Novo Banco, o Lone Star realiza a segunda parte do aumento de capital no valor de 250 milhões. O banco de António Ramalho mudou de auditora para a EY.

Não era obrigatório, mas o Lone Star comprometeu-se em passar o último cheque para concluir a compra do Novo Banco ainda este ano. E cumpriu. A Nani Holdings, a sociedade que vai assumir a posição do fundo norte-americano no banco liderado por António Ramalho, recebeu esta quinta-feira a segunda tranche de 250 milhões de euros, a tempo do Natal, anunciou a CMVM. Por outro lado, o banco mudou de auditores da PwC para EY.

O cheque do Lone Star “chega até ao Natal”, já tinha garantido ao ECO fonte oficial do fundo norte-americano. O dinheiro chegou praticamente uma semana antes do “fim do prazo”, já que o que estava acordado era a entrada do dinheiro no banco até ao final deste ano, e não no prazo de três anos como na versão inicial.

Esta tranche junta-se ao primeiro cheque de 750 milhões de euros que chegou ao banco que resultou da falência do Banco Espírito Santo em outubro, altura em que foi celebrada a venda da instituição de transição. Isto em troca de uma participação de 75% do fundo no banco, com os restantes 25% a ficarem nas mãos do Fundo de Resolução.

“[O cheque do Lone Star] chega até ao Natal.”

Fonte oficial do Lone Star

Esta injeção de mil milhões de euros foi uma das condições para que o Novo Banco fosse vendido ao Lone Star, para além de uma troca de dívida por depósitos que permitiu ao banco uma poupança de 500 milhões de euros para reforçar os rácios de capital.

Na assinatura do contrato de venda do Novo Banco, o senior managing directordo Lone Star afirmou que “através desta operação de venda e do processo de recapitalização (…) a posição de capital do Novo Banco melhorou significativamente. Hoje, o Novo Banco é uma instituição sólida e bem capitalizada”.

Garantir a solidez do Novo Banco

Inicialmente, tinha ficado definido que o montante de 250 milhões chegaria num prazo de três anos. Mas esta injeção acabou por chegar ao banco liderado por António Ramalho ainda este ano. Porquê? Para que a instituição financeira apresente rácios de capital sólidos.

Através desta operação de venda e do processo de recapitalização (…) a posição de capital do Novo Banco melhorou significativamente. Hoje, o Novo Banco é uma instituição sólida e bem capitalizada.

Donald Quintin

Senior managing director do Lone Star

Só com este montante de mil milhões de euros, a que se somam os 500 milhões da troca de dívida, é que o banco liderado conseguiu apresentar uma solidez acima do exigido. Apesar de o banco não revelar qual é o impacto desta injeção, é suficiente para o Banco de Portugal considerar que os níveis são adequados.

Novo Banco vai avançar ainda com outra operação para reforçar os rácios. Mas desta vez não conta com o Lone Star, terá de conseguir atrair investidores no mercado. Obanco liderado por António Ramalho vai emitir dívida subordinada. Pretende obter um montante mínimo de 400 milhões de euros.

Serão emitidos títulos que, não contando para o rácio de capital core da instituição, contam para o rácio de capital total do Novo Banco. Se não houver procura para estes títulos, ou a taxa de juro exigida for extremamente elevada, o Fundo de Resolução toma firme a emissão com o dinheiro que está destinado ao mecanismo de capitalização contingente (num total de 3,89 mil milhões de euros).

 

Fundos “lesados” do BES mandam carta a lembrar que há “compromisso” por cumprir pelo BdP

Quinta-feira, Dezembro 21st, 2017

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Negócios

Este mês, cumprem-se dois anos da decisão do Banco de Portugal que empurrou dívida do Novo Banco nas mãos de grandes fundos para o BES “mau”. Desde aí, tem havido luta judicial e mediática. Depois da missiva a Centeno, há agora uma nova carta para Carlos Costa.

As grandes gestoras de fundos de investimento globais que foram prejudicadas pela transferência de dívida do Novo Banco para o BES “mau” enviaram uma carta ao Banco de Portugal a relembrar um alegado “compromisso”: o de retomar o diálogo para chegar a um consenso. O que, dizem, ainda não aconteceu.

 

Na missiva, enviada esta segunda-feira 18 de Dezembro, o grupo composto pela BlackRock, Pimco, Attestor Capital e CQS, que se auto-intitula Novo Note Group, relembra o processo de recompra de dívida do Novo Banco (designado, na sigla inglesa, de LME), que serviu para capitalizar a instituição financeira e no qual alguns dos visados, como a Pimco, participaram.

 

“Embora tenhamos analisado o LME segundo as suas condições, o compromisso do Banco de Portugal em continuar as discussões permitiu-nos confiar no processo. Apesar do compromisso assumido pelo Banco de Portugal, e apesar da participação do grupo no LME, as discussões que visavam resolver as questões advindas da decisão do Banco de Portugal [de 29 de Dezembro de 2015] não foram retomadas e não há progresso para a sua resolução”, aponta a carta enviada às redacções.

A decisão de 29 de Dezembro de 2015, tomada portanto há praticamente dois anos, prendeu-se com a retransmissão de cinco séries de dívida sénior do Novo Banco, avaliadas em cerca de 2 mil milhões de euros, para o BES “mau”. Desde aí, os fundos lesados têm tentado reverter a decisão, inclusive recorrendo aos tribunais, e também tendo enviado uma mensagem a Mário Centeno, quando o ministro das Finanças foi eleito para o Eurogrupo.

Na carta, os visados pedem um novo encontro “com todas as autoridades competentes” para levar em frente “os compromissos assumidos”. O Ministério das Finanças, que assumiu ter tido reuniões com os investidores institucionais afectados, já afirmou que a solução para o problema está nas mãos do supervisor da banca.

Maiores custos para os bancos

Na carta enviada ao governador do Banco de Portugal, e onde se congratulam com o facto de o vice-governador Luís Máximo dos Santos estar a liderar o dossiê, os grandes fundos elencam aquelas que dizem ser as consequências da transferência de dívida determinada pela entidade presidida por Carlos Costa.

“A decisão continua a minar a credibilidade do sector financeiro português como destino do investimento externo. Na verdade, os bancos portugueses pagam juros significativamente mais elevados do que os seus pares”, assinala a missiva enviada por fundos que, antes das emissões de dívida protagonizadas este ano pela CGD e pelo BCP, enviaram notas a anunciar que não iriam participar naquelas operações.

Até haver uma solução, argumentam estes fundos, os bancos portugueses “vão continuar a enfrentar os custos desta decisão sem precedentes na forma de maiores custos de capital e de carência de investidores institucionais credíveis e de longo prazo na sua estrutura de capital”. À BlackRock, que assina a carta, é imputável uma participação accionista de 2,63% no BCP.

Tribunal obriga Banco de Portugal a divulgar contrato de venda do Novo Banco

Quinta-feira, Dezembro 21st, 2017

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Negócios

O Banco de Portugal está obrigado a divulgar o contrato de venda do Novo Banco a fundos internacionais que investiram em obrigações do BES, ainda que podendo proteger partes que considere confidenciais, segundo decisão do tribunal administrativo de Lisboa.

O pedido de acesso ao contrato de venda do Novo Banco ao fundo norte-americano Lone Star foi feito por 19 fundos de investimento internacionais que investiram em obrigações subordinadas do Banco Espírito Santo (BES), que aquando da sua resolução ficaram no ‘banco mau’ BES, com penalização dos investimentos.

Na sentença a que a Lusa teve acesso, de 13 de Dezembro, o tribunal administrativo de Lisboa “intima” o Banco de Portugal e o Fundo de Resolução bancário a “no prazo de 10 dias” darem aos fundos a “cópia do contrato de compra e venda” no Novo Banco, ainda que “expurgado da informação relativa à matéria confidencial”.

Contudo, decide também o tribunal, que a entidade liderada por Carlos Costa tem de justificar a eventual ocultação no contrato de determinadas matérias que considera confidenciais.

Estes fundos de investimento já tinham pedido, em Setembro, acesso ao contrato ao Banco de Portugal e ao Fundo de Resolução, mas como não lhes foi dado avançaram com uma acção judicial a “requerer a intimação de prestação de informação e consulta de processos”.

Contactados já pela Justiça, o Fundo de Resolução e o Banco de Portugal consideraram, de acordo com a sentença, que o contrato é confidencial, uma vez que contém “informação de natureza altamente sensível e sigilosa”, quer sobre a “vida interna do comprador e do próprio Novo Banco”, quer sobre o “segredo de negócio”.

O tribunal diz que não conhece o contrato, mas admite que poderá haver matéria que envolvam “segredo comercial e/ou sobre a vida interna do Novo Banco e/ ou do comprador”, decidindo assim pela sua divulgação retirando os “elementos confidenciais”.

Contudo, exige a Justiça, que o Banco de Portugal e o Fundo de Resolução fundamentem a ocultação de determinadas partes, “explicitando os concretos motivos para entender que os documentos revelariam dados confidenciais”.

Estes 19 fundos de investimentos já têm outro processo na Justiça em que pedem a impugnação da medida de resolução aplicada ao Banco Espírito Santo (BES) e a criação do banco de transição Novo Banco, pelo que o tribunal considera que, nesse âmbito, poderá ser importante terem conhecimento dos contornos da venda já que tal “pode ter consequências na respectiva esfera jurídica e, nesse sentido, os seus interesses”.

Estes fundos reclamam 700 milhões de euros em investimentos.

A Lusa contactou o advogado que representa estes fundos de investimento internacionais, Nuno Silva Vieira, que não quis prestar declarações relativamente ao processo. Contudo, considerou que este tipo de sentenças representa “um grande avanço na democratização do sistema financeiro português” por permitir acesso a informação fundamental para a defesa dos investidores.

A maioria do capital do Novo Banco foi vendida ao fundo norte-americano Lone Star este ano.

O contrato de promessa de compra e venda foi assinado em final de Março, tendo o negócio sido efectivado em 18 de Outubro.

O fundo norte-americano Lone Star não pagou qualquer preço, tendo acordado injectar 1.000 milhões de euros.

Em troca, ficou com 75% do capital social do Novo Banco, continuando os restantes 25% com o fundo de resolução bancário, entidade gerida pelo Banco de Portugal e antes da venda o único accionista.

MP acusa funcionário do Banco de Portugal do crime de abuso de informação

Segunda-feira, Dezembro 18th, 2017

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Correio da Manhã

Em causa está num caso ligado à venda de ações do BES.

O Ministério Público acusou um funcionário do Banco de Portugal pelo crime de abuso de informação, num caso ligado à venda de ações do BES e ao conhecimento antecipado do plano de contingência para o banco, divulgou esta sexta-feira o MP. Segundo a Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa (PGDL), ficou suficientemente indiciado que, depois de, em julho de 2014, aquele funcionário do Banco de Portugal ter adquirido ações do BES, tomou conhecimento, na tarde de 31 de julho 2014, de que iria fazer parte da equipa que iria preparar um plano de contingência para esse banco. “Munido de tal informação, que conjugou com as demais informações públicas, concluiu que as ações do BES iriam sofrer forte desvalorização, pelo que procedeu, na manhã do dia 01 de agosto de 2014, à venda de todas as ações dessa instituição bancária de que era detentor. Tal conduta permitiu-lhe evitar sofrer menos-valias correspondentes à totalidade do dinheiro que despendera para adquirir as referidas ações”, diz a acusação. Neste processo de abuso de informação previsto no Código de Valores Mobiliários, o Ministério Público (MP) requereu a aplicação da pena acessória de publicação da sentença condenatória. O arguido encontra-se sujeito à medida de coação de Termo de Identidade e Residência (TIR). O inquérito foi dirigido pelo Departamento de Investigação e Ação (DIAP) de Lisboa, com a coadjuvação da Polícia Judiciária (PJ).

O interrogatório a Salgado: o ex-DDT que pediu um “copinho de água” para lidar com o “choque” das acusações

Segunda-feira, Dezembro 18th, 2017

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O interrogatório a Salgado: o ex-DDT que pediu um “copinho de água” para lidar com o “choque” das acusações

 

 

O dia 18 de janeiro de 2017 ficará registado na história de Ricardo Salgado como o dia em que foi formalmente constituído arguido por alegadamente ter corrompido um primeiro-ministro e dois ex-líderes da Portugal Telecom (PT) — indiciação que foi mais tarde confirmada pelo Ministério Público no despacho de acusação da Operação Marquês.

Como diria o historiador José Hermano Saraiva, “foi aqui” — ou melhor, foi ali –, naquela pequena sala do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), em Lisboa, que Ricardo Salgado tomou consciência de que já não era o DDT — Dono Disto Tudo. Ao ouvir a longa indiciação que o procurador Rosário Teixeira demorou 30 minutos a ler, a sua habitual postura glaciar pouco se alterou mas a forma contida, ritmada e fria das primeiras declarações do líder informal da família Espírito Santo contrastam claramente com o seu estado de espírito.

“Não se surpreendam de eu ter ficado praticamente em estado de choque porque se não tivesse alguma preparação física provavelmente tinha caído para o lado com estas acusações (…) O que eu ia pedir era um copinho de água porque, de facto, este… este choque que sofri o merece”, começou por dizer perante os procuradores Rosário Teixeira e Inês Bonina e os inspetores tributários Paulo Silva e Ana Barroso.

O céu tinha acabado de cair em cima da cabeça de um dos homens mais poderosos do Portugal dos últimos 30 anos.

[Ouça no vídeo a reconstituição de 8 momentos-chave do interrogatório a Ricardo Salgado, em mais um episódio da mini-série Sim, Sr. Procurador]

A defesa da honra

Entre suspeitas de corrupção de titular de cargo político (José Sócrates), corrupção ativa de dois gestores da PT (Henrique Granadeiro e Zeinal Bava), branqueamento de capitais, fraude fiscal qualificada e abuso de confiança — alegados ilícitos estes a que foi acrescentado o alegado crime de falsificação de documento no despacho de acusação da Operação Marquês –, Salgado diz ter ficado “profundamente chocado, profundissimamente chocado com tudo isto”. Mas não ficou calado: “Nunca vi tanta mentira junta e peço desculpa por o estar a afirmar”.

Seguindo um padrão de discurso público e privado que segue desde a derrocada do grupo que liderou informalmente durante mais de 20 anos, Salgado começou por negar qualquer irregularidade e refutou as acusações — particularmente no que diz respeito às suspeitas de corrupção e aos alegados benefícios nos negócios relacionados com a PT.

Ricardo Salgado: Posso ter cometido erros de julgamento mas não erros de princípios (…). Não são verdadeiras as afirmações de qualquer tipo de relação, de influência, no primeiro-ministro da altura, o eng. José Sócrates, em relação a qualquer operação que fosse. Nunca falei com o José Sócrates sobre a história da PT sequer. E muito menos procurar entregar valores a um primeiro-ministro [José Sócrates], portanto subornos, direta ou indiretamente, por qualquer outra forma. Também gostava de referir que ilícitos praticados em relação a administradores da PT, por mim ou pelo grupo, não foram cometidos. (…)

O primeiro negócio da PT que está sob escrutínio na Operação Marquês é a Oferta Pública de Aquisição (OPA) da Sonae que Belmiro e Paulo Azevedo anunciaram ao mercado em fevereiro de 2006 — que foi derrotada em Assembleia Geral da PT cerca de um ano depois. Salgado é suspeito de alegadamente ter corrompido José Sócrates para o então primeiro-ministro influenciar a Caixa Geral de Depósitos (onde estava Armando Vara como administrador) a alinhar contra a OPA da família Azevedo (mantendo a influência do BES na PT) e de ter igualmente e alegadamente corrompido Henrique Granadeiro (então líder da PT) e Zeinal Bava (então vice-presidente da PT) para convencer a gestão da operadora a delinear e a aplicar uma estratégia anti-OPA.

Ricardo Salgado ao lado de Henrique Granadeiro e Zeinal Bava em 2012 (Jorge Amaral / Global Imagens )

Ricardo Salgado: Sr. procurador posso-lhe dizer que este aspeto da OPA da PT é o aspeto mais fácil para mim de explicar. Que não era necessária nenhuma intervenção política. (…) Se quisermos fazer um esforço de memória é muito fácil relembrar as informações que saíram na época logo que foi anunciada a OPA, salvo erro no início de fevereiro de 2006, em que imediatamente saíram duas afirmações que explicam muita coisa. A primeira é que a OPA não passa. Isso era opinião dos media especialistas na área económica (…). E a segunda vem exatamente do Paulo Azevedo, que vem referir com toda a transparência que a participação da PT no Brasil não é estratégica e, portanto, diz de caras que a operação do Brasil é para ser vendida porque — isto agora já é um julgamento meu — isso permitiria ajudar a financiar a aquisição da PT, uma vez que tinham um comprador garantido que era a Telefónica (…).

Homem no poder há muito tempo, Ricardo Salgado lidou com todos os primeiros-ministros eleitos desde que tomou posse no início dos anos 90 como líder executivo do BES. Tem, por isso mesmo, muitas histórias para contar – como faz questão de recordar ao longo das mais de duas horas de interrogatório. António Guterres, primeiro-ministro entre 1995 e 2001, é protagonista de um episódio marcante para a história da PT.

Homem no poder há muito tempo, Ricardo Salgado lidou com todos os primeiros-ministros eleitos desde que tomou posse no início dos anos 90 como líder executivo do BES. Tem, por isso mesmo, muitas histórias para contar — como faz questão de recordar ao longo das mais de duas horas de interrogatório. António Guterres, primeiro-ministro entre 1995 e 2001, é protagonista de um episódio marcante para a história da PT: a ida para o Brasil e a vitória na privatização da Telesp Celular. Mais tarde, a PT uniu-se à Telefónica (que tinha ganho a privatização da rede fixa de São Paulo) e criam uma joint venture que veio dar origem à operadora Vivo.

Mas o procurador Rosário Teixeira não perde o foco desta parte do interrogatório: a OPA da Sonae.

Ricardo Salgado: Gostava também de recordar que foi o BES que financiou a PT para a aquisição da licença da Vivo [no final dos anos 90]. A Telefónica tinha comprado a rede fixa de São Paulo, a rede celular da Vivo [Telesp Celular] foi vendida no Rio de Janeiro. E é muito fácil de verificarem esse aspeto porque (…) julgo que era o eng. Guterres que era primeiro-ministro. Telefona e diz-me [Guterres]: “Ricardo, o valor da licença está a subir exponencialmente e não sabemos se podemos ir a certos valores”. E eu apoiei-o naquilo que fosse a decisão que ele tomasse, que a administração da PT que estava no Rio de Janeiro tomasse. “O BES fará tudo para poder estar ao vosso lado na aquisição da Vivo [Telesp Celular]”. (…)

Procurador Rosário Teixeira: A administração da PT contra a OPA [da Sonae] não foi uma coisa que o sr. dr. [Ricardo Salgado] tivesse, digamos assim, também apoiado de alguma forma?

Ricardo Salgado: (…) hoje em dia não sei se consigo convencer as pessoas da bondade do meu comportamento… (…) Eu tinha tido a oportunidade de vender o controlo do BES quando o Santander comprou o grupo do António Champalimaud (…) e eu disse que não. Não podíamos vender o controlo de uma instituição a outro banco espanhol, principalmente. O nosso princípio era de defesa dos centros de decisão em Portugal e não era com objetivos maquiavélicos de retirar daí benefícios significativos. E, portanto, com certeza que estava contra a OPA [da Sonae à PT] e estava contra a OPA porquê? Por uma razão muito simples. É que nós sabíamos que a Telefónica ia comprar a Vivo. (…) Nunca falei com o José Sócrates a pedir o que quer que fosse. Aliás, eu julgo que houve no início, até nas notícias de 2006, José Sócrates fez uma dissertação pública de satisfação que a OPA [da Sonae] mostrava confiança na economia do país.

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A relação com Hélder Bataglia

De acordo com a tese da acusação, o processo da alegada corrupção de Sócrates por parte de Salgado tem um homem-chave: chama-se Hélder Bataglia e, de acordo com o testemunho do próprio nos autos da Operação Marquês, terá sido este alto quadro do GES e ex-presidente da Escom a receber dinheiro do Banco Espírito Santo Angola e da Espírito Santo Enterprises, o famoso ‘saco azul’ do GES, e a transmiti-lo a Carlos Santos Silva.

O Ministério Público entende que Bataglia terá recebido do GES cerca de 22 milhões de euros com esse objetivo, mas Bataglia apenas reconheceu no seu interrogatório no DCIAP, realizado poucos dias antes de Salgado ser chamado a prestar declarações, que transferiu cerca de 12 milhões de euros para Santos Silva alegadamente a pedido expresso de Salgado.

A alegada necessidade de Ricardo Salgado corromper José Sócrates é explicada pelo MP através de dois temas — ambos relacionados com a PT:

  • Convencer Sócrates a apoiar a oposição do BES à OPA lançada pela Sonae em fevereiro de 2006, de forma a manter a influência do BES na operadora;
  • Promover a utilização das 500 golden-shares da PT que o Estado detinha, de forma a condicionar a venda da participação que a PT tinha na Vivo ao reinvestimento de boa parte dos 7,5 mil milhões de euros pagos pelos espanhóis da Telefónica na aquisição de uma nova participação numa operadora brasileira: a Oi/Telemar.

Procurador Rosário Teixeira: Vamos então, e já que era seu desejo, reconstruir esse relacionamento com o sr. Hélder Bataglia. Tinha prometido ou não ao sr. Hélder Bataglia qualquer tipo de pagamento, qualquer tipo de compensação pelo trabalho, pelo sucesso da Escom?

Ricardo Salgado: (…) o Hélder Bataglia foi contratado pelo meu primo António Espírito Santo. (…) E para fazer a longa história curta eu vou-lhe dizer que houve dois grandes culpados da catástrofe do Grupo Espírito Santo em Angola: um foi o sr. Álvaro Sobrinho e outro foi o sr. Hélder Bataglia. Mas, no início, o Hélder Bataglia era um homem genial. O desenvolvimento da atividade da Escom vem em velocidade acelerada e ele começa, muito cedo, a desenvolver relações internacionais com a bandeira Espírito Santo (…). Vai para a China, vai para a Rússia, vai para aqui, vai para acolá. E é de tal maneira bem-sucedido que, no final dos anos 90, eu não lhe sei precisar a data exata, os chineses já estavam a fazer acordos com Angola no sentido de comprar petróleo e financiar o Estado angolano. O prestígio do Hélder Bataglia em Angola subiu vertiginosamente. Ele era praticamente one man show. Trouxe os chineses para Angola. Há relatórios, até relatórios secretos, sobre isso se depois tiverem interesse. Que afirmam isso. Poderemos facultar-lhe.

Ricardo Salgado: “Devo dizer-lhe que encontrei o Manuel Vicente [ex-vice-presidente de Angola e ex-presidente da Sonangol] em Portugal uma ou duas vezes a quem eu me queixei (…). E ele por duas vezes garantiu-me: ‘Vocês vão ter concessões de petróleo em Angola. Não tenha dúvida alguma’.”

Salgado manteve ao longo de todo o interrogatório a sua justificação para as transferências realizadas pelo BESA e pela ES Enterprises para as contas bancárias suíças de duas sociedades offshore de Hélder Bataglia: tratava-se de uma remuneração por um acordo (apelidado de acordo-chapéu pelo próprio Salgado) que o GES tinha assinado com Bataglia para remunerá-lo pela obtenção da licença bancária que permitiu ao GES abrir o BESA em Angola e por alegadas licenças de exploração de petróleo em Angola que seriam emitidas em nome do GES.

Procurador Rosário Teixeira: O acordo-chapéu com Hélder Bataglia foi mesmo feito nesta data de 2005?

Ricardo Salgado: Foi, foi. (…) Com as boas relações que estava com o governo de Angola, o Hélder Bataglia diz-nos que vai obter licenças para blocos de petróleo. E então aparecem seis blocos, salvo erro, dois onshore em Angola e quatro offshore. Não sei agora os nomes nem as características. Aquilo que eu vim a reconhecer depois é que nós só tivemos uma participação num bloco de petróleo com um grupo angolano. Foi a única coisa que eu depois acabei por detetar. Mas nós tivemos que pagar ao Hélder Bataglia montantes consideráveis para efeitos dessas concessões.

Contudo, o próprio Salgado admite que Bataglia não conseguiu as licenças de petróleo que tinha prometido e para as quais teria alegadamente recebido cerca de 6 milhões de euros do BESA.

Ricardo Salgado: Devo dizer-lhe que encontrei o Manuel Vicente [ex-vice-presidente de Angola e ex-presidente da Sonangol] em Portugal uma ou duas vezes a quem eu me queixei (…) e disse-lhe: “Tudo aquilo que nós já fizemos por Angola e eu tenho agora esta informação, esta possibilidade dos blocos de petróleo dita pelo Hélder Bataglia…”. E ele por duas vezes garantiu-me: “Vocês vão ter concessões de petróleo em Angola. Não tenha dúvida alguma”. O Manuel Vicente verbalmente. Julgo até que uma vez foi num jantar oficial oferecido não sei se foi ao [José] Eduardo dos Santos, mas ele estava lá nesse jantar oficial. Não sei qual era o primeiro-ministro, o Presidente [Cavaco Silva] que estava a receber as entidades.

Procurador Rosário Teixeira: Tinha então duas pessoas bem posicionadas, o dr. Hélder Bataglia e o Manuel Vicente, que estava na Sonagol na altura, a garantir que o grupo iria ser beneficiário de licenças de exploração?

Ricardo Salgado: Em função disso são montadas algumas dessas operações. (…) Os pagamentos ao Hélder Bataglia eram feitos com esta finalidade. A obtenção de direitos de concessão, poços de petróleo, etc. Agora, de repente, e eu devo-lhe dizer que descobri isso fundamentalmente depois do colapso, por trás das nossas costas estava a passar um filme de terror em que os recursos eram desviados para outras finalidades. Que eu nunca na minha vida pensei que isso pudesse acontecer. (…)

Procurador Rosário Teixeira: Então porque é que pagaram sem verificar se isso tinha ido avante ou não?

Ricardo Salgado: Porque é que pagámos? A sua questão é perfeitamente correta. É porque nós estávamos convencidos de que as coisas estavam a acontecer. (…)

Procurador Rosário Teixeira: O acordo é feito pela tal Espírito Santo Enterprises, que o sr. dr., não sei se admitirá ou não, mas que em princípio só libertaria fundos com a sua intervenção…

Ricardo Salgado: Não era só com a minha. Também havia outros membros do Conselho Superior [do GES] que davam ordens para a Enterprises. Mas pronto. (…) O senhor que controlava os pagamentos [Jean Luc Schneider], certamente deve ter perguntado se podia pagar (…).

Inspetor Paulo Silva: E foi perguntar a quem?

Ricardo Salgado: Deve ter perguntado a mim! Pode ter perguntado perfeitamente a mim! (…) Eu não tinha tempo para tratar administrativamente desse assunto. Há falhas, há. Não tenho dúvida. Agora, pode ter a certeza que esses recursos para nós deviam ter sido investidos em Angola (…) e não sub-repticiamente passar-nos por trás das costas e estarem a ser passados não sabemos a quem.

Hélder Bataglia, ex-presidente da Escom, denunciou Ricardo Salgado no interrogatório a que foi sujeito no DCIAP. MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

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Os alegados pagamentos a José Sócrates

A primeira tranche que Hélder Bataglia recebeu do GES corresponde a 7 milhões de euros que tiveram origem no BESA e acabaram numa conta da Suíça aberta em nome da Markell, sociedade offshore de Bataglia. Com esses fundos na mão, o então líder da Escom terá transferido cerca de 6 milhões de euros para a conta da Gunter Finance de José Paulo Pinto de Sousa — primo de José Sócrates e o seu alegado primeiro testa-de-ferro. Bataglia diz que este montante corresponde ao preço de compra dos terrenos das salinas de Benguela que pertenciam à família Pinto de Sousa. Mas esta justificação foi claramente desmentida por Pedro Ferreira Neto, alto quadro do GES e então chief financial officer da Escom, nos autos da Operação Marquês.

Ricardo Salgado: (…) Quando me falam agora de acusações ou de suposições que eu mandei pagar através do Hélder Bataglia ó… ó… A quem é que é? Ao José [Paulo] Pinto de Sousa [primo de José Sócrates]! O Hélder Bataglia falou-me uma vez neste José Pinto de Sousa que tinha… que tinha se… porque havia lá terrenos do… da… destes familiares do Sócrates e que tinham umas salinas… foi a única coisa que eu soube.

Procurador Rosário Teixeira: É capaz de nos dizer em que circunstâncias é que ocorreu essa… essa conversa?

(…)

Ricardo Salgado: Comigo? Não! Eu vim a saber mais tarde que as salinas acabaram no BESA. Mas só soube mais tarde. Só soube depois da nossa intervenção lá no BESA. Em 2013. Exatamente.(…) Foi uma conversa de ocasião, uma coisa qualquer que me disse: “Ah! Eu tenho aqui o Pinto de Sousa…”, que era primo do Sócrates. Eu não sabia que o Hélder Bataglia tinha relações familiares tão estreitas com o José Sócrates, não fazia a mais pequena ideia. Acho que tinha uma filha que era de uma prima dele [Filomena Pinto de Sousa]. (…) Em outubro de 2013 quando eu fui lá [a Angola], depois de ter detetado o buracão que havia no banco [Espírito Santo Angola] provocado pelo Álvaro Sobrinho, hoje não tenho dúvida de acrescentar o nome do Hélder Bataglia. Peço desculpa, aquilo que lhes vou dizer é uma frase inglesa, os ingleses são muito cínicos, mas que é esta:”birds of the same feather they fly together — pássaros com as mesmas penas voam juntos”. Não tenho dúvida nenhuma que fomos completamente enganados em relação às duas coisas. Ao banco [BESA] e à Escom. E que o Hélder Bataglia foi um elemento determinante nisso.

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As críticas a Carlos Costa

Hélder Bataglia e Álvaro Sobrinho são dois protagonistas do caso BES/GES que merecem acusações de Ricardo Salgado. Salgado aponta o dedo a muitas outras pessoas, desde o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, que recusou autorizar a Caixa Geral de Depósitos a conceder um empréstimo de emergência ao GES, até Carlos Costa, governador do Banco de Portugal que o afastou da liderança do BES e abriu cinco processos de contra-ordenação ao próprio Salgado e aos restantes administradores do BES. Aliás, Salgado fez mesmo questão de mostrar o que pensa de Carlos Costa num aparte do interrogatório que decorreu no DCIAP — tudo a propósito do pagamento da dívida de Angola a empresas portuguesas que decorreu no início da década sob patrocínio do Governo de Durão Barroso.

Procurador Rosário Teixeira: E neste processo de negociação [para o pagamento da dívida de Angola a Portugal e restantes credores internacionais], o Sr. Hélder Bataglia tem alguma intervenção?

Ricardo Salgado: Zero. Nada. Não tem nada. Isto foi tudo feito em Lisboa. Estavam vários responsáveis angolanos à volta da mesa, que agora não me lembro do nome mas posso facultar-lhe alguns nomes, e estavam entre outras pessoas como representantes dos bancos, a ironia da história, entre outros um tal dr. Carlos Costa da área internacional do BCP. Infelizmente para o nosso país. Peço desculpa pelo aparte.

Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, afastou Ricardo Salgado da liderança do BES e ordenou a abertura de cinco processos de contra-ordenação à sua administração

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“Conhece Carlos Santos Silva?”

O momento-chave do interrogatório de Ricardo Salgado surge quando o procurador Rosário Teixeira confronta o ex-líder informal do GES com as declarações de Hélder Bataglia — que, dias antes, tinha responsabilizado Ricardo Salgado naquela mesma sala por lhe ter pedido para usar as suas contas.

Procurador Rosário Teixeira: Diga-me uma coisa: conhece o sr. eng. Carlos Santos Silva?

Ricardo Salgado: Nunca o vi! Nunca o vi. Era uma… é uma situação para mim de uma enorme perplexidade. Por aquilo que eu percebi, os recursos foram parar a um tal Carlos Santos Silva. Eu vou-lhe dizer o que é que eu conheço do grupo Lena. (…)

Procurador Rosário Teixeira: (…) Mas já me está a associar o Carlos Santos Silva ao grupo Lena.

Ricardo Salgado: Ó sr. procurador, eu não me recordo de ter falado ao Carlos Santos Silva.

Procurador Rosário Teixeira: Em primeiro lugar, era seu cliente com alguns recursos, que até recebia os dinheiros numas contas do BESI que não são para toda a gente e que trouxe dinheiro lá de fora.

Ricardo Salgado: Para mim foi uma enorme surpresa que ele tivesse feito o RERT [ Regime Excepcional de Regularização Tributária] no BES. Eu não sabia! (…) Eu falo no Lena porquê. Porque eu vejo-o associado ao Lena e nas fotografias aparece sempre os senhores [irmãos] Barroca com o Carlos Santos Silva ao lado e o eng. José Sócrates. Uma das minhas funções é estar todos os 15 dias no terreno em Portugal a visitar as direções regionais dos centros de empresas e, portanto, nessas reuniões nós acabávamos por receber os clientes ao fim do dia. E eu parece-me que o Lena é ali da região de Leiria, não é?

Procurador Rosário Teixeira: Certo.

Ricardo Salgado: Pronto. E portanto eu posso ter recebido — e nós normalmente quando recebíamos pessoas não eram 100 ou 200, chegavam a ser 400 e 500 pessoas para cocktail e jantar, jantar em pé. Posso ter cumprimentado o Sr. Carlos Santos Silva, mas não sei! Não… Nunca eu, em plena consciência… nunca o vi. (…) Agora, nunca me passou pela cabeça que isto pudesse acontecer. Esta conjugação de relações entre o eng. Sócrates, o Lena e o Carlos Santos Silva. Não fazia ideia.

Procurador Rosário Teixeira: E muito menos tem conhecimento que tenha pedido a alguém para fazer transferências para este sr. Carlos Santos Silva?

Ricardo Salgado: Claro que não! Isso é tudo iniciativas do sr. Bataglia, que quando tinha um programa para desenvolver em Angola, para o qual estava a ser pago (…) fazia circular os recursos por trás das nossas costas desta forma. Foi uma total surpresa. (…)

Procurador Rosário Teixeira: Mas algumas dessas mesmas interpretações destes factos não saem da nossa lavra, saem de pessoas que o afirmaram e que dizem que foi o senhor que pediu precisamente para haver contas que serviam de passagem para dinheiros que vieram da [Espírito Santo] Enterprises.

Ricardo Salgado: Nunca fiz isso na minha vida.

Procurador Rosário Teixeira: Nunca pediu a ninguém: “Olhe, deixe lá passar esse dinheiro e depois transfere para a conta tal”?

Ricardo Salgado: Não, não.

Procurador Rosário Teixeira: Portanto, aquilo que aqui está em causa são duas versões sobre a existência destes pagamentos porque o sr. está-nos a dizer que deu estes dinheiros todos ao sr. Hélder Bataglia — que só nestes anos 2008, 2009 somam aqui assim os tais 22 milhões de euros — e que são pura e simplesmente para ele desenvolver negócios e para remunerações dele pelo sucesso que pudesse ter, incluindo a tal licença bancária do BESA que terá sido paga algum tempo depois. Isso é verdade da sua parte que a licença já foi paga nos anos depois. Outra coisa é dizer que parte deste dinheiro foi entregue por si ao sr. Hélder Bataglia mas para depois o reencaminhar para umas contas que o sr. Carlos Santos Silva deveria indicar.

Ricardo Salgado: Nunca ouvi falar no Carlos Santos Silva antes. Nunca ouvi falar. O Hélder Bataglia nunca me falou no Carlos Santos Silva. Nunca me falou de nada. Ele fazia o que queria (…)

Procurador Rosário Teixeira: “Pediu a alguém para fazer transferências para este sr. Carlos Santos Silva?”
Ricardo Salgado: “Claro que não! Isso é tudo iniciativas do sr. Bataglia, que, quando tinha um programa para desenvolver em Angola, (…) fazia circular os recursos por trás das nossas costas desta forma. Foi uma total surpresa.”

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As relações com José Dirceu

João Abrantes Serra, sócio de Fernando Lima (grão-mestre do Grande Oriente Lusitano) no escritório de advogados Lima, Serra e Fernandes & Associados, foi constituído arguido na Operação Marquês mas acabou por não ser acusado de nenhum ilícito criminal. Em causa estava o alegado pagamento de cerca de 944 mil euros a José Dirceu, o ex-braço direito do Presidente brasileiro Lula da Silva. A equipa do procurador Rosário Teixeira suspeitava que o escritório Lima, Serra e Fernandes & Associados, que foi contratado por Henrique Granadeiro para assessorar a PT no Brasil a propósito de uma possível fusão com a operadora Telemar, teria sido usado para fazer chegar aquele montante a José Dirceu, de forma a que este intercedesse junto das autoridades brasileiras para alegadamente favorecer a PT.

Ricardo Salgado foi confrontado com estas suspeitas, o que levou o ex-líder do BES a falar de um personagem que ficou famoso na década passada no Brasil e em Portugal: Marcos Valério, um antigo publicitário que está na origem do caso Mensalão — um processo judicial de alegada corrupção de um número muito significativo de congressistas do Partido dos Trabalhadores (PT) e que levou mesmo à primeira condenação a prisão efetiva de José Dirceu. Ricardo Salgado (BES), António Mexia (presidente da EDP) e Miguel Horta e Costa (ex-presidente da PT) chegaram a ser ouvidos como testemunhas em Portugal num inquérito criminal a propósito de acusações de Valério (conhecido como “o careca” por ser calvo) de alegado financiamento pratidário ilícito por parte daquelas empresas portuguesas ao PT. O inquérito foi arquivado.

Procurador Rosário Teixeira: Conheceu José Dirceu e em que circunstâncias?

Ricardo Salgado: O José Dirceu foi o braço direito do Lula na primeira fase do presidente brasileiro.

Procurador Rosário Teixeira: Chegou a conhecê-lo lá [no Brasil] ou cá [em Portugal]?

Ricardo Salgado: Conheci-o cá e vou-lhe já dizer: o sr. procurador deve-se recordar do período em que houve o célebre careca [Marcos Valério] que era o ‘homem da mala’ que veio a Lisboa e que foi à PT, foi ao BES e que depois foi à EDP. E então andava a procurar levantar dinheiro. E eu disse-lhe que nós não tínhamos hipótese nenhuma e que não fazia sentido estarmos a contribuir para o Partido dos Trabalhadores. Ele aparecia então como responsável por uma empresa de comunicação no estado de Minas Gerais. Veio-se a verificar que é do pior que há, lá dentro daquele grupo. E aconselhei-o a falar com o meu primo Ricardo Espírito Santo no Brasil, o que ele fez. Entretanto, acontece a queda do Dirceu, começam as investigações e há um mandado para fazer um inquérito em Portugal no qual eu fui responder. Eu, o António Mexia e o Miguel Horta e Costa, que estava na PT na altura. Para saber se tínhamos dado dinheiro para o tal sujeito, o careca. Daí que poderia ser para o Dirceu. E nós dissemos que não tínhamos feito absolutamente pagamento nenhum, que não havia absolutamente nada e que não havia relação nenhuma com o José Dirceu. E encontro o José Dirceu numa cerimónia, ali na Expo, e o José Dirceu veio-me agradecer o depoimento que eu tinha feito. Eu nem sequer o vi lá no julgamento. E foi assim que eu o conheci.

José Dirceu, ex-ministro e ex-braço-direito de Lula da Silva, foi condenado a pena de prisão efetiva no caso do Mensalão e na Operação Lava Jato (HEDESON ALVES/EPA)

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E as relações com José Sócrates

O interrogatório terminou, como não podia deixar de ser, com a relação entre Ricardo Salgado e José Sócrates. O ex-líder do BES negou qualquer proximidade ao ex-líder do PS.

Inspetor Paulo Silva: A sua relação com o sr. José Sócrates. Conhecia-o antes das funções dele como primeiro-ministro?

Ricardo Salgado: Não. Julgo que terei eventualmente tido um encontro quando ele foi do Ambiente uma vez, por causa de uma situação na Beira Baixa, onde nós tínhamos lá propriedades. Mas fora isso as minhas relações com o eng. José Sócrates foram sempre institucionais. (…) Nada de intimidades. Aliás, nunca tive relações íntimas com nenhum primeiro-ministro ou Presidente [da República]. No outro dia, dei o meu testemunho em relação ao dr. Mário Soares, foi uma coisa de facto muito especial. Foi o dr. Mário Soares que me chamou para nós [família Espírito Santo] voltarmos para Portugal, infelizmente. E nós aceitamos. (…) O dr. Mário Soares ficou chocadíssimo com tudo aquilo que aconteceu [a detenção de Salgado no âmbito da processo Universo Espírito Santo]. Mas foi um amigo fantástico e visitava-me quando estava detido em casa — ele e a senhora, a Maria Jesus Barroso — e jantavam connosco. Quando eu deixei de estar detido, passei a ir visitá-los a casa deles. Foi um homem notável no nosso país.

Inspetor Paulo Silva: E com o eng. José Sócrates então?

Ricardo Salgado: Com o eng. José Sócrates nunca tive relações de intimidade, quaisquer que fossem. Nunca falei com ele sobre esta história.

Inspetor Paulo Silva: Já agora, qual foi a última vez que esteve com ele [José Sócrates]? (…) nunca foi à sua residência em Cascais?

Ricardo Salgado: Não me recordo.

Advogado Adriano Squilacce: O sr. inspetor está a perguntar isto porque saíram umas notícias que o Sócrates esteve a jantar em sua casa.

Ricardo Salgado: Não me lembro. Pode ter ido quando ele escreveu um livro, quando regressou de Paris ou qualquer coisa assim. Escreveu um livro e foi lá a casa entregar-me o livro. Julgo que foi isso.

Advogado Adriano Squilacce: Tanto quanto é público, aliás foi o Correio da Manhã que referiu, que teria ocorrido um jantar em março, abril de 2014.

Ricardo Salgado: Não me recordo do jantar. Recordo-me do tal livro que eu nunca li. Nunca tive intimidade nenhuma com o eng. José Sócrates. (…)

A falta de intimidade não livrou Ricardo Salgado de, na perspetiva da equipa do procurador Rosário Teixeira, ser o principal protagonista da Operação Marquês. No centro do alegado esquema de corrupção que é denunciado no despacho de acusação do Ministério Público está o alegado favorecimento do Grupo Espírito Santo — o que significa Ricardo Salgado, o ex-Dono Disto Tudo.

Luís Rosa é autor do livro “A Conspiração dos Poderosos — Os Segredos do Saco Azul do Grupo Espírito Santo” (Esfera dos Livros) lançado em novembro de 2017.