Prorrogação do prazo, a contar a partir de hoje, é justificada com a necessidade de “realização de audições em falta, bem como a apreciação e discussão do respetivo relatório final”.
A prorrogação por 60 dias do prazo de funcionamento da comissão de inquérito ao Novo Banco foi hoje aprovada pelo parlamento, para permitir a realização de audições em falta e a apreciação e discussão do respetivo relatório final.
Este prolongamento do período de funcionamento já tinha tido luz verde em reunião, na quinta-feira, da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução, tendo hoje sido aprovado por unanimidade pelo plenário da Assembleia da República.
De acordo com o projeto de resolução do presidente da Assembleia da República aprovado, a prorrogação do prazo, a contar a partir de hoje, será por 60 dias, “de modo a permitir a realização de audições em falta, bem como a apreciação e discussão do respetivo relatório final”.
A comissão de inquérito ao Novo Banco tomou posse em 15 de dezembro de 2020, tendo então Ferro Rodrigues considerado que “são altas” as expectativas quanto ao trabalho desta nova comissão já que a crise resultante da derrocada do Banco Espírito Santo teve “consequências devastadoras para o país”.
A comissão é presidida pelo deputado do PSD Fernando Negrão e resultou das propostas aprovadas de BE, PS e Iniciativa Liberal para a sua constituição.
Depois de sucessivas suspensões de prazo devido à pandemia de covid-19, as audições desta comissão de inquérito começaram em 10 de março com o antigo presidente do Conselho de Auditoria do Banco de Portugal (BdP) João Costa Pinto.
Na comissão, o PS tem sete efetivos, o PSD quatro e o BE dois, enquanto PCP, CDS-PP, PAN e Iniciativa Liberal estão representados, cada um, por um deputado efetivo, num total de 17.
“A decisão de autorizar uma injeção do Fundo de Resolução no Novo Banco responsabiliza diretamente o PS que só a faz com o apoio tácito do PSD. Consideramos grave e ilegítima”, disse Catarina Martins.
A coordenadora do BE considerou este sábado que a decisão de autorizar uma injeção do Fundo de Resolução no Novo Banco, que é “grave e ilegítima”, “responsabiliza diretamente o PS”, que só tomou “com o apoio tácito do PSD”.
Na conferência de imprensa após a Mesa Nacional do BE, órgão máximo entre convenções, a líder do BE recentemente reconduzida, Catarina Martins, teceu críticas ao PS e também ao PSD devido à injeção no Novo Banco, na semana em que o Conselho de Ministros aprovou o diploma que permite que o Fundo de Resolução se financie junto da banca para concretizar essa transferência para o banco.
“A decisão de autorizar uma injeção do Fundo de Resolução no Novo Banco é uma decisão que responsabiliza diretamente o PS, que só a faz com o apoio tácito do PSD. Consideramos grave e ilegítima esta injeção. Ela não deve acontecer”, criticou.
Na perspetiva de Catarina Martins, “uma injeção do Fundo de Resolução no Novo Banco é supérflua” uma vez que o banco “já cumpre rácios de capital”, sendo “feita à conta dos contribuintes como o Tribunal de Contas já explicitou”. “E é uma injeção ilegítima uma vez que não está prevista no Orçamento do Estado”, referiu.
Questionada sobre a abstenção do PSD no projeto de resolução do BE, que acabou chumbado na sexta-feira no parlamento e que recomendava que fosse submetida à Assembleia da República, para discussão e votação, qualquer decisão de injeção de capital no Novo Banco, Catarina Martins recordou as palavras do líder do PSD, Rui Rio.
“Como é que Rui Rio, num dia, diz que não é possível haver nenhuma injeção [no Novo Banco] sem um orçamento retificativo e depois a sua bancada vota para dar conforto ao Governo, quando o Governo quer fazer uma injeção sem esse orçamento retificativo. É uma posição insustentável”, criticou.
Para a líder do BE, o silêncio da direção social-democrata — no parlamento quem justificou este voto pelo PSD foi o deputado Alberto Fonseca — “só é explicado de uma forma”. “O PSD não consegue explicar a sua posição porque a sua posição é inexplicável”, sintetizou.
O Conselho de Ministros aprovou na quinta-feira o diploma que altera o quadro de financiamento do Fundo de Resolução, permitindo que este se financie junto da banca para concretizar a transferência para o Novo Banco.
“Como o Governo sempre afirmou este ano, o Fundo de Resolução não ia obter qualquer empréstimo junto do Estado, mas iria financiar-se junto do setor financeiro”, precisou o ministro de Estado e das Finanças, João Leão, no final da reunião do Conselho de Ministros.
Os advogados alegam o facto de Ana Gomes ser tia da juíza Mariana Machado e de ambas terem feito referências na comunicação social sobre o risco da prescrição de processos.
Adefesa de Ricardo Salgado suscitou, junto do Tribunal da Relação, um incidente de recusa da juíza titular do processo que juntou os recursos às coimas aplicadas nos casos BESA e Eurofin e quer ouvir Ana Gomes como testemunha.
No documento entregue no passado dia 18 e consultado pela Lusa no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, os mandatários do ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES) requerem ao Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) que seja realizada uma audiência de julgamento, na qual querem ouvir, como testemunha, a antiga diplomata e ex-eurodeputada Ana Gomes.
Na fundamentação do pedido, os advogados alegam o facto de Ana Gomes ser tia da juíza Mariana Machado e de ambas terem feito referências na comunicação social sobre o risco da prescrição de processos que envolvem Ricardo Salgado, e consideram que a ex-eurodeputada, pelas declarações que tem proferido, já julgou e condenou este “na praça pública”.
Na sessão realizada no TCRS no passado dia 21, para agendamento das sessões do julgamento, a juíza Mariana Machado afirmou que se pronunciará sobre o incidente de recusa quando for notificada pelo TRL, sublinhando que os autos têm natureza urgente, por risco de prescrição parcial, pelo que o julgamento irá iniciar-se.
No pedido feito junto do TRL, a defesa de Ricardo Salgado, liderada pelo advogado Adriano Squilacce, pede que seja deferido o incidente de recusa e declarada a nulidade de todos os atos praticados nos autos.
Mariana Machado afirmou, na sessão de dia 21, que, caso o incidente de recusa venha a ser considerado procedente, apenas produzirá efeitos quanto a Ricardo Salgado, pois não foi subscrito pelos restantes arguidos recorrentes.
No incidente de recusa apresentado junto do TRL, a defesa de Salgado juntou 40 documentos (artigos e notícias com declarações de Ana Gomes), a que adicionou, três dias depois, vários ‘tweets’ publicados pela antiga diplomata no passado dia 20, um dos quais em comentário à notícia do Expresso que dava conta do processo que está na Relação de Lisboa e que corre risco de prescrever (a 27 de junho próximo).
Para os advogados, a juíza “não oferece garantias de imparcialidade e isenção”, embora afirmem não querer pôr em causa “a dignidade pessoal e profissional e nem sequer a imparcialidade na sua vertente subjetiva”.
A outra questão que levantam, que no seu entender coloca também em causa a “imparcialidade objetiva”, foi a decisão de apensação do processo Eurofin ao do BESA, quando Mariana Machado negou a pretensão de Ricardo Salgado de junção deste ao da KPMG.
Contudo, tanto Mariana Machado como a juíza que inicialmente recebeu o processo Eurofin, Vanda Miguel, frisaram que os processos BESA e Eurofin envolvem a mesma entidade (BES) e a sua atividade bancária no período que terminou em 03 de agosto de 2014 (data da resolução do banco), ao contrário do que sucedia com a KPMG. Sendo o do BESA o mais antigo, foi a juíza titular deste a assumir o “megaprocesso”.
No processo da KPMG, que tem alegações marcadas para o próximo dia 01 de junho, está em causa uma coima de 1,0 milhão de euros aplicada à auditora das contas consolidadas do BES pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).
No processo BESA/Eurofin, estão em causa coimas num total de 17,3 milhões de euros aplicadas pelo Banco de Portugal (BdP).
No primeiro caso foram condenados Ricardo Salgado e o ex-administrador financeiro do BES, Morais Pires, por infrações como a não implementação de procedimentos que reforçassem ou garantissem o acompanhamento das operações realizadas com o BES Angola, não implementação de processos de análise ao risco de crédito relativamente ao crédito contratado com aquela instituição, “não obstante a extremamente elevada materialidade dos montantes em causa e os potenciais impactos associados ao seu incumprimento”.
A terceira coima que lhes foi aplicada neste processo deveu-se ao “incumprimento dos deveres de comunicação obrigatória” ao BdP dos problemas associados às carteiras de crédito e de imobiliário do BESA, a mesma pela qual foi condenado Rui Silveira, que detinha o pelouro de auditoria e inspeção, enquanto Gherardo Petracchini foi condenado pela não implementação de sistemas de controlo interno e ausência de identificação das deficiências de controlo interno pela Espírito Santo Financial Group (ESFG), de que era administrador.
No processo Eurofin, o BdP aplicou ao ex-presidente do Banco Espírito Santo sete contraordenações, imputando a Ricardo Salgado a prática de atos dolosos de gestão ruinosa praticados em detrimento de depositantes, investidores e demais credores, desobediência ilegitima à determinação do BdP que impôs a alimentação da conta ‘escrow’ com recursos alheios ao ESFG.
Foi ainda condenado por desobediência ilegítima às determinações do BdP que impuseram a obrigação de eliminar a exposição não garantida do ESFG à Espírito Santo International (ESI/ESR) e que proibiram o aumento de exposição direta e não coberta do BES à ESI (cartas de conforto) e a comercialização, de forma direta ou indireta, de dívida de entidades do ramo não financeiro do GES junto de clientes de retalho.
As outras contraordenações dizem respeito à desobediência à proibição de concessão de financiamentos ou refinanciamentos, diretos ou indiretos, às entidades financeiras do GES que não integravam o Grupo BES e à violação das regras sobre conflitos de interesses.
Amílcar Morais Pires foi condenado por quatro infrações e José Manuel Espírito Santo Silva por três, tendo o mandatário deste, Rui Patrício, interposto três recursos para apresentação junto do Tribunal da Relação de Lisboa relativos à conexão dos dois processos.
Os recursos, entrados em janeiro, fevereiro e abril no TCRS não foram admitidos pela juíza Mariana Machado, o que levou Rui Patrício a reclamar da sua retenção para a Relação.
Rui Patrício alega que José Espírito Santo Silva não é arguido no processo do BESA, não fazendo sentido ser “arrastado” para a discussão de factos nos quais não intervém, e que a apensação cria um “megaprocesso” que vai atrasar a decisão e violar o direito a um processo “justo e equitativo”.
O julgamento deveria ter-se iniciado esta sexta-feira, mas o início foi reagendado para o próximo dia 2 de junho, por indisponibilidade de Fernando Infante, do Departamento de Supervisão Prudencial do Banco de Portugal (BdP), e por o Ministério Público não prescindir da audição desta testemunha em primeiro lugar.
Apenas Rui Silveira e Amílcar Morais Pires haviam manifestado, nos autos, intenção de prestar declarações, após a produção de prova, tendo Ricardo Salgado manifestado o mesmo interesse no passado dia 21.
Paulo Vasconcelos, que liderou a GNB Vida (cuja venda causou perdas de 287 milhões ao Fundo de Resolução), diz que o BES tinha o valor da seguradora “empolado” nas suas contas.
O Banco Espírito Santo (BES) tinha nas suas contas um valor “empolado” para a BES Vida até 2014, seguradora que depois da resolução do banco se passou a chamar GNB Vida e que acabou por ser vendida a uma fração desse valor, impondo perdas de 268 milhões compensadas pelo Fundo de Resolução. Quem o diz é Paulo Vasconcelos, que a convite de Eduardo Stock da Cunha liderou a seguradora GNB Vida até à sua venda – o responsável lembra que quem fazia a avaliação da BES Vida para o BES era o banco de investimento do grupo, ou seja, essa avaliação “vale o que vale“.
A reflexão foi feita durante a audição de Paulo Vasconcelos na comissão parlamentar de inquérito às perdas do Novo Banco. Esta é uma seguradora que acabou por ser vendida por 123 milhões de euros mais uma componente variável que pode ir até 125 milhões de euros adicionais (mas também pode vir a ser zero, dependendo do volume de vendas de produtos de seguro, como o responsável também admitiu nesta sessão parlamentar).
Nesta sessão foi também revelado, pelo deputado do PSD Hugo Carneiro, que o comprador fez uma reclamação e pediu 14,3 milhões de volta ao Novo Banco por considerar que houve “informações erradas” dadas no momento da venda. Segundo o deputado, terá pedido ao Fundo de Resolução para ressarcir os compradores pelo valor em causa, que assim subtraiu aos 123 milhões já pagos.
A esse respeito, Paulo Vasconcelos comentou que folgava “em saber que só ajustaram 14 milhões” porque estavam em causa até 28 milhões em ativos por impostos diferidos (DTA, na sigla anglosaxónica por que estes ativos são mais conhecidos) que geraram um diferendo que o gestor considerava “injusto”. Sendo esse ressarcimento já posterior à saída de Vasconcelos, que abandonou a empresa no momento da venda, o gestor garantiu, porém, que nunca houve “intenção” de prestar informações erradas ao comprador.
O dividendo de 600 milhões pago ao BES de Ricardo Salgado, em 2013
Seja como for, o valor final da venda contrasta com mais de 600 milhões de euros a que a seguradora estava avaliada nas contas do BES, valor que se manteve inalterado com a resolução. E só no momento da venda se gerou a imparidade que teve de ser compensada pelo Fundo de Resolução, organismo público que é alimentado por contribuições dos bancos mas tem vivido nos últimos anos sobretudo com empréstimos anuais dos contribuintes, a longo prazo.
Para Paulo Vasconcelos, essa discrepância tem de ser vista à luz de vários fatores de mercado, como a evolução das taxas de juro, mas também um fator crucial que é o pagamento de dividendos à casa-mãe. E, aí, recordou que em 2013 a se seguradora desfez de uma grande quantidade de títulos de dívida pública (recorde-se que foi a era do regresso aos mercados, em que a dívida pública portuguesa passou a gozar de melhor perceção de risco). Eram títulos que rendiam 6% ou mesmo 7% anualmente, à seguradora.
Essa venda foi como uma “antecipação” de resultados dos anos seguintes, porque os títulos, uma vez vendidos, deixavam de dar rentabilidade à companhia nos anos seguintes. E o que se fez com essa mais-valia que terá ascendido a 600 milhões de euros, em 2013? Pagou-se um dividendo à casa-mãe, ao BES, recordou Paulo Vasconcelos, sustentando que há que olhar para a evolução do valor da companhia à luz desse facto.
A partir daí, vieram os prejuízos: a companhia passou a ter uma carteira de investimentos com rentabilidades cada vez menores, de 1% ou pouco mais (também uma fase em que as taxas de juro caíram muito, o que se mantém) e a ter de continuar a entregar aos clientes rentabilidades médias de 5% ou 6%. Esse fator contribuiu para que a empresa perdesse cada vez mais valor, à medida que o tempo passava – sendo que se trata de uma seguradora sem autonomia, que apenas vivia da distribuição de produtos através do canal bancário (BES e, depois, Novo Banco).
Por outro lado, explicou o responsável, “o valor que vinha do passado estava sobrevalorizado porque estava indexado a um volume de vendas que nunca se veio a concretizar” – caberia ao banco cumprir esses ambiciosos objetivos nomeadamente quando vendesse seguros associados aos créditos à habitação que concedesse aos clientes.
Paulo Vasconcelos, que falou por videoconferência a partir de Lima, Peru, acrescentou que estes fatores ajudam a explicar porque é que a empresa foi vendida a um preço tão abaixo daquele a que estava registado. Mas não foi o único: “Se a venda foi ou não mal feita, não sei dizer”, porque “era administrador, esse era um tema dos acionistas”.
Mas comentou: “Quando pomos um ativo à venda, quando temos uma data-limite para a venda e temos um mercado restrito isso coloca quem está a vender numa posição de desvantagem”, sobretudo quando se está a vender uma “companhia que trabalha em exclusivo para um canal bancário” e que, por essa razão, “nunca devia ser posta no mercado” porque “a companhia para o comprador vale sempre menos do que valia para o banco”.
A única alternativa seria não vender. Não havendo alternativa à venda, tinha de se vender àquele preço”, notou.
A seguradora esteve em 2018 para ser vendida a um magnata norte-americano, Greg Lindberg, por 190 milhões. Mas esse comprador acabou por ter problemas com a Justiça dos EUA, envolvendo suspeitas de corrupção, o que suspendeu o processo de venda que estava em curso.
Todos estes fatores empurravam o valor da empresa para baixo. Havia um comprador, depois desapareceu, os que sobram tentam sempre comprar mais barato. Quando há uma obrigação de fazer uma venda torna-se mais difícil. Cada candidato que sai, cada notícia que surge, vai-se desvalorizando o ativo”, afirmou.
Mas a venda acabaria por avançar, sendo o comprador o fundo Apax Partners. A venda terá, segundo o jornal Público, gerado uma queixa apresentada à ESMA (Autoridade Europeia de Mercados e Títulos) que lançava suspeitas pelo facto de ter sido inscrito no relatório do primeiro semestre de 2019 do Novo Banco um valor de 391,2 milhões de euros, um cálculo já ajustado às reavaliações do ativo que, na altura, cumpria os rácios de capital e de solidez.
Desmentindo a notícia do Público, o Novo Banco garantiu que “o preço final da transação foi o melhor e resultou de um processo organizado de venda, competitivo e transparente, com o acordo do Fundo de Resolução, em que o comprador obteve idoneidade por parte da ASF”.
Valor indicado para injeção no Novo Banco é 429 milhões de euros, ainda está a ser verificado. Governo muda contrato para permitir ao Fundo de Resolução financiar-se na banca, mas não muda Orçamento.
O valor indicado para a injeção ao Novo Banco em 2021 é de 429 milhões de euros, um valor que é abaixo do solicitado pela instituição e que foi de 598 milhões de euros, indicou esta quinta-feira o ministro das Finanças.
João Leão acrescentou contudo que ainda se está na fase de validação pelo Fundo de Resolução. Falta apurar qual o valor final “em virtude de esclarecimentos adicionais que foram solicitados”. O ministro falava no briefing do Conselho de Ministros que aprovou uma alteração ao acordo quadro assinado entre o Estado e o Fundo de Resolução de forma a permitir que a injeção seja financiada através de um empréstimo da banca e não do Estado como estava contratualizado. Este ano “não vai haver empréstimos do Estado”, ao contrário do que sucedeu nos três anos anteriores.
A alteração aprovada vai no sentido de permitir ao Fundo de Resolução financiar-se junto da banca para cumprir os seus compromissos resultantes do mecanismo de capital contingente. De acordo com esclarecimentos prestados pelo ministro das Finanças esta é a única alteração no quadro legal necessária para efetuar a operação e que mexe apenas nas fontes de financiamento do apoio público ao Novo Banco.
João Leão assegura que não será necessária qualquer alteração à lei do Orçamento do Estado, apesar de uma coligação negativa ter apagado deste documento a despesa prevista do Fundo de Resolução para com o Novo Banco. “Não há nenhuma norma que impossibilite a transferência. O que se trata é de permitir que o Fundo peça um empréstimo à banca. Nesse sentido, não há qualquer alteração à lei do Orçamento”.
O ministro salienta ainda que o impacto orçamental do Novo Banco este ano será menor do que o previsto inicialmente no Orçamento do Estado, onde estavam referidos 476 milhões de euros. O valor tinha aliás sido revisto em baixa para 430 milhões de euros no Programa de Estabilidade entregue em abril. O montante final ainda não está totalmente fechado, nem se conhece o valor do empréstimo a contrair junto dos bancos, que deverá ser inferior à dimensão da injeção no Novo Banco já que o Fundo de Resolução conta com a receita das contribuições sobre a banca.
Apesar do financiamento ser assegurado pela banca privada (a Caixa também deverá estar incluída), a operação continuará a ter impacto no défice e na dívida pública por uma “questão estatística”, referiu João Leão. O Fundo está classificado no perímetro das contas do Estado. E nessa medida, tal como já tinha referido o presidente da entidade, Luís Máximo dos Santos, precisa sempre da autorização do Ministério das Finanças para fazer a despesa, mesmo que lhe saísse o Euromilhões.
No entanto, e na leitura de João Leão, não precisa da autorização do Parlamento que chumbou esta transferência do Fundo de Resolução eliminando a linha das despesas previstas nos documentos que acompanhavam o Orçamento do Estado. Na altura, o Governo falou em “bomba atómica”, mas tem vindo a desvalorizar este percalço, defendendo que não impede a operação.
Esta quinta-feira, João Leão recordou que o Governo sempre disse que ia cumprir os contratos e os compromissos assumidos com o Banco Central Europeu e com a Comissão Europeia que são contrapartes no contrato de venda do Novo Banco assinado em 2017. É ao abrigo deste contrato que o Fundo de Resolução é chamado a realizar capital todos os anos para cobrir as perdas nos ativos de risco quando estas põe em causa os rácios financeiros do banco. É o mecanismo de capital contingente.
Regulador do mercado suspendeu a cobrança da coima para “mitigar qualquer eventual impacto” no ressarcimento dos clientes do BES.
A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) aplicou uma multa de um milhão de euros ao Banco Espírito Santo (BES) por violação dos deveres dos intermediários financeiros. A coima respeita a três infrações cometidas pelo banco entretanto resolvido, sendo que por isso mesmo fica suspensa a cobrança dos valores para “mitigar qualquer eventual impacto” no ressarcimento dos clientes da instituição.
Em causa está “um processo por violação dos deveres dos intermediários financeiros em que estão em causa três infrações” cometidas pelo BES na qualidade de intermediário financeiro, explica o regulador do mercado de capitais português.
Estas são as três infrações identificadas:
Uma infração relativa à prestação do serviço de gestão de carteiras por conta de outrem, em que o arguido, na execução dos contratos, não realizou todos os atos tendentes à valorização das carteiras, adquiriu, para as carteiras sob sua gestão, instrumentos financeiros que não eram compatíveis com o perfil de investimento contratualizado com os respetivos clientes, e não conservou os registos respeitantes às decisões de negociar de modo a permitir o armazenamento de forma acessível para futura referência pela CMVM e a reconstituição de cada uma das fases essenciais do tratamento de todas as operações;
Uma infração relativa à oferta junto dos clientes de um produto denominado “Séries Comerciais”, no âmbito da qual o arguido prestou aos seus clientes informação que não era completa, verdadeira, clara, não permitindo uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada;
E uma infração relativa à violação do dever de respeitar as regras sobre conflito de interesses.
Enquanto a primeira e a segundas infrações constituem “contraordenação grave”, a terceira, relativa ao dever de respeitar as regras sobre conflito de interesses é uma “contraordenação muito grave“. Todas são puníveis com coimas entre os 25.000 euros e os 5.000.000 de euros, mas a coima aplicada pela autoridade liderada por Gabriela Figueiredo Dias foi inferior.
“[Coima fica suspensa de] forma a mitigar qualquer eventual impacto da aplicação da coima sobre o ressarcimento dos créditos dos clientes.”
“No total foi aplicada ao arguido uma coima única de um milhão de euros“, refere a CMVM na publicitação de decisões relativas a processos de contraordenação. Mas a coima fica “suspensa pelo prazo de dois anos”.
“Atentas as circunstâncias do caso concreto, nomeadamente o facto de o BES ter sido objeto de uma medida de resolução deliberada pelo Banco de Portugal em agosto de 2014, encontrando-se em processo de liquidação, e de forma a mitigar qualquer eventual impacto da aplicação da coima sobre o ressarcimento dos créditos dos clientes“, fica suspensa a cobrança, diz a CMVM.
Banco quase sem dinheiro para pagar aos lesados
A coima, que fica suspensa por dois anos, é aplicada a um banco que se encontra em liquidação, apresentando contas cada vez mais negativas. Depois de ter reforçado as provisões para responsabilidades com os credores que foram afetados com a medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal em 2014, apresentou em 2020 prejuízos de 547,5 milhões de euros.
O BES fechou 2020 com um passivo de 7,08 mil milhões de euros. Do lado do ativo, contabilizado em 177 milhões, o banco tem cerca de 96,5 milhões em aplicações noutras instituições de crédito, cerca de 50 milhões em obrigações do Tesouro e 20,6 milhões de créditos sobre entidades do Grupo Espírito Santo.
Contas feitas, o banco dispõe apenas de 2,5 euros de ativos por cada 100 euros de responsabilidades, o que limita bastante as hipóteses de recuperação de dinheiro por parte dos credores por via da liquidação da instituição que está a ser conduzida pela equipa de César Brito.
Apenas os credores comuns poderão ter melhores perspetivas de recuperação dos seus investimentos, tendo em conta que já houve uma auditoria da Deloitte a estimar um nível de recuperação de 31,7% para estes créditos comuns e de 0% para os créditos subordinados num cenário de liquidação (a lei determina que os credores têm direito uma compensação caso sejam mais prejudicados numa resolução do que numa liquidação de um banco).
“No final do dia propusemos a venda desses créditos, e é essa operação que está para apreciação do Fundo de Resolução”, disse esta terça-feira o ex-diretor de recuperação de crédito da instituição.
O Novo Banco está à espera de uma decisão do Fundo de Resolução (FdR) quanto à venda da dívida do antigo grupo Lena, atualmente denominado Nov, de acordo com o ex-diretor de recuperação de crédito Daniel Santos.
“No final do dia propusemos a venda desses créditos, e é essa operação que está para apreciação do Fundo de Resolução“, disse esta terça-feira Daniel Santos aos deputados.
O antigo diretor de recuperação de crédito do Novo Banco foi ouvido esta terça-feira na Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução.
“Foi a própria equipa de gestão a propor comprar os créditos, com o apoios de outros bancos que iam tentar conseguir obter crédito para injetar nas empresas e tentar viabilizar esses grupos económicos”, disse ainda Daniel Santos no parlamento.
De acordo com o diretor de recuperação de crédito do Novo Banco até março deste ano, “um dos bancos acabou por vender esses créditos, de acordo com a proposta apresentada”.
“A Caixa [Geral de Depósitos] até agora, que eu saiba, não aprovou, mas também não sei que decisão é que tomou”, acrescentou ainda.
Daniel Santos revelou que uma estimativa da consultora PwC para a recuperação judicial da dívida do grupo Lena, que estimou em cerca de 210 milhões de euros, ascendia a cerca de dois ou três milhões de euros.
“Ia ser miserável face ao valor de crédito que está em causa”, disse Daniel Santos, pelo que o Novo Banco, “sabendo que é um caso difícil e um caso que precisa de muita explicação, decidiu avançar com uma proposta de venda de créditos, porque o valor que está a ser proposto é, ainda assim, superior”.
Segundo Daniel Santos, foi essa a proposta apresentada ao Fundo de Resolução, num modelo “idêntico ao que outro banco já fez” e “sabendo-se que o estado da empresa se degrada dia-a-dia se não forem tomadas medidas”.
Uma das diretoras de conformidade (`compliance`) do Novo Banco e BES, Paula Gramaça, disse hoje no parlamento que havia dificuldades de comunicação do banco português com o BES Angola, apesar de não haver recusa taxativa de partilha de informação.
“Os nossos colegas de Angola não estavam muito recetivos. Nunca dizendo que não, nunca diziam que não estavam disponíveis a implementar ou para dar informação, mas de facto havia sempre alguma coisa que impedia que a informação chegasse”, disse hoje Paula Gramaça no parlamento.
A responsável, que faz ainda parte do departamento de conformidade do Novo Banco, foi hoje ouvida na Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução.
“Isto acabava por não só ser nessa área de controlo interno, que é, no fundo, como é que o banco implementava as suas obrigações de conhecimento dos clientes, de análise das transações”, disse ainda aos deputados Paula Gramaça.
A antiga responsável do BES referiu ainda que “só mais tarde”, quando Rui Guerra entrou na administração do BESA, é que “há uma abertura”.
“O dr. Rui Guerra contratou um `compliance officer`, portanto, uma pessoa para as funções de `compliance` do BESA, que veio a Portugal”, tendo aí existido “uma tentativa de apreender” como eram os procedimentos na casa-mãe, que deveriam ser replicados em Angola.
A primeira de três audições agendadas para hoje contou apenas com perguntas dos deputados Duarte Alves (PCP), Eduardo Barroco de Melo (PS) e Mónica Quintela (PSD).
Questionada pela deputada social-democrata sobre quem, em Portugal, “é que sabia o que se estava a passar em Angola”, Paula Gramaça disse recordar-se que, “em termos da instituição”, O BESA reportava ao antigo presidente do BES Ricardo Salgado.
“Não quer dizer que tenha sido, durante este período sempre, porque houve uma altura em que o dr. Morais Pires ficou com o pelouro da área internacional”, referiu.
A exposição do BES ao BESA entre 2008 e 2014 passou de 1.700 para 3.300 milhões de euros, sendo correspondente a 47% dos fundos próprios do BES à data da resolução.
A exposição do BES ao BESA esteve coberta, até pouco depois da resolução do BES, por uma garantia soberana de Angola, assinada pelo Presidente da República de então, José Eduardo dos Santos, e cuja validade foi reiterada pelo ministro das Finanças, Armando Manuel, tendo depois sido revogada.
Autor de relatório sobre actuação do supervisor no caso BES questiona porque não foi possível para o Novo Banco a opção de um plano de recuperação, “em vez de venda ou liquidação”. E dá a CGD como exemplo.
João Costa Pinto, ex-vice-governador do Banco de Portugal, que presidiu à comissão independente que produziu um relatório sobre a actuação do supervisor no caso BES, por encomenda do anterior governador Carlos Costa, afirma que, ao longo destes últimos anos, a gestão do Novo Banco tem demonstrado “uma enorme tenacidade a procurar as condições que permitem uma activação rápida do mecanismo de capital contingente”, que procura utilizar “no valor máximo possível”, daí ser normal que o Lone Star a queira premiar, decisão que considera insensata.
Costa Pinto, que já foi ouvido pelos deputados na Comissão Parlamentar de Inquérito ao Novo Banco, considera que Carlos Costa tem “um entendimento muito peculiar das funções de um governador de um banco central, de que é possível, sejam quais forem as razões, poder não dizer aquilo que corresponde estritamente à verdade”.
Que avaliação faz dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) ao Novo Banco, que arrancou com a sua audição sobre o relatório da comissão independente que lhe foi encomendado em 2015, pelo anterior governador, Carlos Costa, para avaliar o papel do Banco de Portugal (BdP) no BES?
Como cidadão, respeito o trabalho da CPI e até admiro os esforços dos deputados para romperem o denso nevoeiro em que estão mergulhados. Temo, no entanto, que as armas de que dispõem não sejam suficientes para esclarecer muitas das questões que a comissão se propunha esclarecer. E o problema é que o resultado da CPI é muito importante e, na minha opinião, vai ter um impacto forte sobre o prestígio tanto da função parlamentar como do próprio parlamento.
As audições têm ajudado a esclarecer o que se passa no Novo Banco? Quais eram as suas expectativas?
As minhas expectativas, por razões diferentes, são baixas, mas no essencial as audições corresponderam ao que eu estava à espera. E contribuíram para o tal nevoeiro denso em que a CPI está mergulhada.
De tudo o que ouviu nas inquirições conseguiu distinguir entre o que são manobras de narrativa e a realidade?
É como lhe digo: a CPI está mergulhada num nevoeiro densíssimo de informação e de contra-informação, sem ter os instrumentos, em particular de natureza técnica, que a apoiem para tirar conclusões.
Alguma audição o surpreendeu?
Evidentemente, algumas das intervenções surpreenderam mais do que outras.
Tais como?
Surpreendeu-me a do anterior governador Carlos Costa, por exemplo, mas também a do presidente do Tribunal de Contas (TdC), que foi falar da auditoria ao financiamento público do Novo Banco – mas esta surpreendeu-me pela positiva.
A auditoria do TdC surpreendeu-o por dar um retrato explosivo do Novo Banco, em termos de indícios de conflitos de interesses, de falta de reporte por parte da gestão e de empenho das autoridades em proteger os interesses dos contribuintes?
É verdade. Mas considero que o TdC está a ser arrastado para um terreno minado. O TdC é uma das nossas mais importantes instituições e terá sido chamado para esclarecer várias questões, entre as quais duas, que considero mais importantes: a forma como tem sido gerida a carteira de crédito coberta pela garantia do Estado; a existência, ou não, de conflitos de interesses, em particular, com os últimos beneficiários dos fundos que têm adquirido esses activos e que têm sido beneficiados com mais-valias importantes. Não foi surpresa para mim que sobre estas questões centrais o TdC não pudesse avançar muito.
Porquê?
Porque a forma como a gestão do Novo Banco tem actuado sobre estes créditos não permite avanços nessa direcção. E pergunta bem: porquê? É que, havendo um conjunto de activos bons, ou maus ou assim-assim, cobertos por uma garantia que pode levar à mobilização directa ou indirecta de recursos públicos, o que seria natural é que essa carteira fosse isolada e tratada por si só. E, havendo que a alienar, então que fosse alienada de forma autónoma. Porque só assim é possível, quando há dúvidas, avaliar a metodologia e as decisões tomadas pela gestão. Ora, o caminho da gestão do Novo Banco não foi esse.
Seguiu outra direcção para fugir ao escrutínio?
Isso é o que eu gostaria de ver esclarecido. E, portanto, não admira que não seja possível avaliar, tecnicamente, e com um mínimo de objectividade, se os activos foram ou estão a ser vendidos por valor inferior ao de mercado, por quanto e a quem. E isto prende-se com o tema dos conflitos de interesses, pois essas carteiras foram alienadas a fundos internacionais protegidos por uma legislação que impede que sejam identificados os seus verdadeiros beneficiários finais. Não me surpreendi que o TdC não pudesse avançar.
Por exemplo, a Deloitte [na auditoria ao Novo Banco] não conseguiu chegar ao nome dos últimos beneficiários dos fundos que compraram os activos ao Novo Banco. Mas o Fundo de Resolução (FdR) e António Ramalho dizem que sabem quem são (caso da Gama Life, vendida a Apax)…
O que me surpreende, na medida em que os gestores dos fundos de investimento não são os seus verdadeiros beneficiários. E, portanto, não entendo que afirmem que os conhecem. E, sendo assim, uma eventual existência de conflitos de interesses não pode ser comprovada.
Para se chegar ao nome do último beneficiário, o Ministério Público teria de ser envolvido?
Mesmo assim, tenho dúvidas porque os fundos estão sediados fora de país, regem-se por enquadramentos jurídicos ou regulamentares que não são os nossos, e se a lei não os obrigar a identificar os investidores, não o fazem, não divulgando os nomes dos beneficiários finais. No entanto, o TdC levantou uma dúvida que deve ser esclarecida: de que a mobilização de fundos junto do FdR foi feita por uma metodologia que não garante que estes correspondam necessariamente às perdas que decorrem do passado e das carteiras envolvidas, mas que podem decorrer de custos da gestão corrente, de actos tomados pela gestão.
Entre aumentos de capital e empréstimos, o Estado meteu no banco estatal CGD 6,5 mil milhões (dos quais 4,9 mil milhões em 2016). Mas a CGD já dá lucro e distribuiu dividendos ao Estado. Já o Novo Banco, que desde 2014 recebeu cerca de oito mil milhões, continua a revelar prejuízos e a pedir dinheiro ao Fundo de Resolução…
Essa questão é crucial. É que a valorização da CGD vem a beneficiar o accionista que é o Estado. Já no caso do Novo Banco, a valorização do banco com as entradas de capital do FdR vai beneficiar em 75% o accionista exterior (Lone Star).
Ainda assim, António Costa, Carlos Costa, Mário Centeno e Máximo dos Santos defendem a venda ao Lone Star como a melhor opção…
Quando se afirma que o desfecho do Novo Banco só podia ser ou a venda ou a liquidação, ignora-se deliberadamente, ou não, o que está a acontecer na CGD. Porque é que no Novo Banco não foi escolhido um caminho que permitisse uma recuperação como a que está a ser conseguida na CGD, ou seja, colocar uma gestão competente no Novo Banco que o gerisse em representação do Estado, o estabilizasse e posteriormente vir a beneficiar do seu reequilíbrio?
Defendia a nacionalização?
Não, mas um caminho idêntico ao adoptado em bancos como o Lloyds [Bank]. E há mais uma consequência: todos nós, economistas ou não, nos queixámos de que o país não tem capital e tomamos sistematicamente decisões que levam a uma drenagem de capital para o exterior.
A gestão do Novo Banco está a falhar?
Eu não digo que a actual gestão do Novo Banco não é competente, o que digo é que toda a actuação da gestão beneficiou objectivamente o accionista maioritário.
O CEO foi nomeado pelo Lone Star e é ao Lone Star que reporta…
O que nos tem sido dito sistematicamente é que a Comissão Europeia (CE) impediu ou dificultou a nomeação de administradores que representassem o accionista minoritário, o FdR [que tem 25% do Novo Banco]. Eu não aceito este argumento, porque me recuso a acreditar que uma adequada negociação não fosse capaz de fazer ver à CE a necessidade de defesa dos interesses dos contribuintes portugueses. E até acho que o FdR tem feito o que pode, tendo em conta o contrato de venda. E vou explicar porquê. O acompanhamento efectivo da gestão dos créditos garantidos só é possível fazer com alguma eficácia participando na gestão e na administração. Fora disso, são sempre apreciações a posteriori meramente formais. E Máximo dos Santos até fala em que o FdR rejeitou situações. E eu acredito. São as que são tão evidentes, mesmo para uma apreciação a posteriori, que o FdR não podia deixar de actuar.
António Ramalho já veio avisar: se a injecção do FdR no Novo Banco, este ano, for inferior aos 598 milhões pedidos, em 2022 irá pedir mais 100 milhões…
Isso é de uma tal insensibilidade que, lamento dizê-lo, raia a arrogância. Porque quando estamos a discutir estes problemas, quando o FdR e o Governo vêm dizer que não serão entregues mais do que cerca de 450 milhões, o que a gestão do NB diz à opinião pública é simples: “Está bem, se não pagam agora, pagam depois.” Isto é inconcebível!
Na CPI, o CEO do Novo Banco considerou a discussão em torno dos prémios atribuídos à gestão uma batalha mediática perdida. Não uma falha ética, mas um erro mediático…
É chocante. É a total falta de sensibilidade para o que está em causa. Mas eu compreendo que na actual fase seja a parte mediática que a todos preocupa. Eu avalio a questão dos prémios em duas vertentes: na óptica dos accionistas, é perfeitamente normal que este queira atribuir prémios aos gestores.
Porque já lhe deram muito dinheiro a ganhar?
Ninguém tem dúvidas de que a gestão do Novo Banco é uma gestão experiente e até competente na defesa dos interesses do seu maior accionista. Ninguém pode negar isto. E, ao longo destes últimos anos, a gestão do Novo Banco nomeada pelo Lone Star tem demonstrado uma enorme tenacidade a procurar as condições que permitem uma activação rápida do mecanismo de capital contingente, que procura utilizar no valor máximo possível.
Ainda que seja em prejuízo do accionista minoritário?
É o que se constata. É evidente que isto resulta da perversidade do mecanismo constituído. Esta é uma perspectiva. Mas há outra, que é a perspectiva do cidadão. E aí eu tenho uma grande dificuldade em entender a falta de sensibilidade que revela num contexto como este, que se atribuam prémios.
O que acha de o facto de o CEO do Novo Banco anunciar que quer comprar bancos – falou mesmo no Eurobic? E isto, apesar do Novo Banco ser alimentado por verbas dos contribuintes e dos bancos concorrentes…
Tenho dificuldade em entender, mas, dentro da linha de total insensibilidade, a lógica é a mesma. Há linhas que não deviam ser cruzadas.
Ouviu as declarações de Carlos Costa, na CPI, sobre a auditoria independente à actuação do BdP no BES?
Sim, ouvi. Essa é uma questão muito importante para mim. Tenho que começar por manifestar a minha perplexidade. Eu aceitei muito contrariado, e por insistência do ex-governador, o convite que ele me fez para presidir a uma comissão independente à actuação do BdP no BES. Na altura, aceitei porque me convenci de que havia uma intenção e uma vontade genuínas de que se procedesse a uma avaliação independente. Hoje, infelizmente, estou convencido de que o ex-governador se surpreendeu por a comissão ter levado a sério o mandato que ele próprio estabeleceu.
Porque é que diz isso?
Repare: eu próprio entreguei o relatório ao ex-governador em nome da comissão independente. Na altura disse-lhe que a comissão ficava a aguardar que fosse chamada para dar explicações sobre o trabalho e que estava disponível e interessada em fazê-lo. Passado algum tempo, por insistência minha junto do dr. Carlos Costa, tive oportunidade de fazer um brevíssimo resumo das conclusões do relatório ao conselho de administração do BdP. E fiquei surpreendido por verificar que os administradores me estavam a escutar sem ter lido o relatório. Depois da apresentação, informei-os de que a comissão estava disponível para voltar a reunir-se ou com o conselho ou com quem este entendesse. A resposta foi um aferrolhamento do relatório por parte do ex-governador.
O ex-governador acusa-o de não ter mostrado disponibilidade para conversar com ele sobre o documento...
Vamos fazer um parêntese. Estamos a falar de um relatório que continua submetido a uma classificação de confidencialidade e, em rigor, eu não posso falar sem violar a lei. Mas, o ano passado, o PÚBLICO já tinha revelado o seu conteúdo [a 2 de Outubro], e recentemente um órgão de comunicação social tem vindo a publicá-lo aos bocados. Eu considero que o relatório deveria ser desclassificado e deveria ser tornado público para que as pessoas saibam do que estamos a falar.
Carlos Costa alega que a comissão independente não tentou ouvir as direcções do BdP para procurar o contraditório, para “procurar a reflexão interna” e que a encomenda do relatório tinha “implícito” o contraditório…
Se o relatório fosse tornado público, as pessoas perceberiam que aquilo que o ex-governador foi dizer na CPI, de que a comissão independente não falou com as direcções, não é verdade. O relatório começa precisamente por explicar a metodologia e as pessoas que ouviu e porquê. Mas não quero especular sobre as razões do ex-governador para ter feito esta declaração.
O ex-governador, tal como outros membros directivos do BdP, disseram na CPI que não podiam ter intervindo mais cedo no BES, apesar dos indícios de problemas graves…
O que posso dizer é que o relatório indica os instrumentos e os dispositivos legais aplicáveis que poderiam na altura ter sido utilizados pelo BdP para uma intervenção atempada sobre a gestão do BES e que o BdP optou por não utilizar. Mas não posso ir mais longe do que isto, porque o relatório está sob confidencialidade.
Quando esteve na CPI, afirmou que uma actuação “mais enérgica” do BdP no BES teria evitado perdas?
O que eu quis dizer é que, de acordo com as conclusões da comissão independente, o BdP poderia ter actuado mais cedo utilizando os instrumentos que tinha ao seu dispor, o que teria evitado uma deterioriação da situação do BES.
Faltou, e falta, poder de persuasão ao BdP?
O poder de persuasão já implica um julgamento com alguma subjectividade e não foi este o caminho seguido pela comissão independente, que procurou antes identificar se havia instrumentos ao dispor do BdP para ter actuado mais cedo. E havia.
Na CPI, o anterior governador lamentou que o relatório da comissão independente não se tenha debruçado sobre outras matérias relevantes. O que é que falhou?
Quando o dr. Carlos Costa diz que falta um capítulo no relatório, é outra declaração muito importante pelo significado que lhe deu. Eu presumo que se refira a um capítulo laudatório de toda a evolução organizativa que a área prudencial teve. A verdade é que isso vem referido no relatório. E, por isso, nem essa observação eu compreendo. Fiquei com a ideia de que o ex-governador gostaria de ter tido uma intervenção sobre a própria concepção e conclusões do relatório. Não sei se é assim ou não, mas a verdade é que, posteriormente, teve um comportamento de muito difícil compreensão.
Havia a expectativa, no BdP, de que a comissão independente seguisse a linha de auditoras externas que submetem as suas conclusões aos clientes antes de as publicarem?
Isso eu não sei, mas o problema não é só do BdP. Na Europa continental, enraizou-se nos bancos centrais uma cultura que convive mal com o escrutínio externo e, quando se verificam tentativas para o fazer, reagem com o argumento de que está em causa a autonomia dos bancos centrais. É uma cultura que contribui para uma falta de transparência perante a opinião pública e os cidadãos. E só me lembro da expressão britânica accountability, prestar contas e assumir responsabilidades, necessária sobretudo se falamos de países com regimes democráticos. Ora, aceitei liderar a comissão independente porque achei que havia da parte do anterior governador uma intenção genuína de proceder a uma avaliação independente da actuação do BdP.
Uma das expressões de Carlos Costa na CPI foi: “[em 2017] Eu vou vender um cabaz de fruta que parcialmente está apodrecida. Eu não posso contar com a benevolência ou generosidade do comprador para que me pague toda a fruta como sendo de qualidade.” Mas antes da venda ao Lone Star – em 2014, 2015, 2016 –, o BdP validou as contas do Novo Banco, auditadas pela PwC, como estando equilibradas e sem necessidades de provisionamento…
[Silêncio] Tenho alguma dificuldade em estar a referir-me concretamente ao que o dr. Carlos Costa disse ou não disse. Mas essa afirmação tem implicações de enorme complexidade.
Ao ser confrontado pelos deputados, Carlos Costa disse isto: “Queria que eu, em 2014, tivesse anunciado que tinha criado uma coisa da qual deviam fugir?”
[Silêncio] Sinceramente, preferia não elaborar mais. Repare, entendida à letra, qual é a interpretação razoável? O governador está a dizer que deliberadamente não informou sobre a real situação do Novo Banco. Ora, se é esta a interpretação das suas palavras, então é extraordinário.
Porquê?
Porque reflecte um entendimento muito peculiar das funções de um governador de um banco central, de que é possível, sejam quais forem as razões, poder não dizer aquilo que corresponde estritamente à verdade.
O contrato de venda do Novo Banco é a fonte dos problemas?
Em qualquer processo de aquisição de bancos é normal prever um mecanismo, chame-se de capital contingente, ou outro, que dê alguma garantia ao comprador sobre o valor efectivo de determinados activos. O que não é normal é a dimensão dos valores envolvidos no Novo Banco e a natureza do mecanismo criado para acompanhar e controlar a gestão dos activos cobertos pela garantia. E como os mecanismos de acompanhamento e de controlo da gestão não foram adequados, criou-se um mecanismo perverso porque induziu à partida um comportamento do accionista maioritário que tinha interesse em que o mecanismo fosse o máximo utilizado e mais depressa possível.
Houve displicência negocial por parte das autoridades nacionais?
Eu vou pôr a questão assim: se, no fim das negociações, fosse necessário dar uma garantia da dimensão da que foi dada ao comprador, então o mínimo que se esperava era que fossem criados mecanismos de controlo e acompanhamento, com alguma eficácia.
É aceitável que o Lone Star tenha ido buscar Evgeny Kazarez para presidir à Nani Holdings, a empresa que detém os 75% do Novo Banco, que integrou a equipa do Deutsche Bank que assessorou o Fundo de Resolução na venda do Novo Banco ao próprio Lone Star?
A ser assim, considero que existem conflitos de interesses que não deveriam ser aceites seja por quem for. Mas há que separar duas coisas e a linha às vezes não é fácil: o que depende da legislação existente daquilo que são procedimentos ou julgamentos éticos. Estando em causa um volume muito substancial de recursos públicos, num país com as dificuldades conhecidas, deveria implicar um escrutínio permanente e cuidadoso sobre este tipo de conflitos de interesses.
Em 2020, ao PÚBLICO o Fundo de Resolução explicou que o investimento da equipa de António Ramalho na sociedade controlada pelo Lone Star, a Nani, que indirectamente detém 75% do Novo Banco, extravasava os contratos de venda ao Lone Star, enquanto BdP alegou que a posição não era qualificada e que informou o BCE…
Essa é uma das questões que eu não entendo na actuação do BdP e do FdR, e que me choca. É que passam por cima de questões de ética e de conflito de interesse refugiando-se atrás de dispositivos de natureza legal e da Comissão Europeia. Já escrevi sobre isso há anos.
E desvalorizam-se as situações de conflitos de interesses?
A verdade é que, sendo a participação dos gestores do Novo Banco na Nani mínima [1%], a sua capacidade legal de intervenção também é reduzida. Mas o que seria natural é que esta situação também passasse por um julgamento ético dos próprios gestores do Novo Banco.
Os bancos credores da Sporting SAD pretendem desfazer-se da dívida da sociedade anónima desportiva dos “leões”, que ascende a cerca de 128 milhões de euros, segundo as contas da SAD do primeiro trimestre do atual exercício, avança esta sexta-feira a Bloomberg.
Novo Banco e Millennium bcp terão já contratado o banco de investimento Rotschild para a colocação da dívida, que se encontra sob a forma de Valores Mobiliários Obrigatoriamente Convertíveis (VMOC), refere a agência de notícias citando fontes próximas do processo.
Contactados pela Bloomberg, Novo Banco, BCP e Rotschild recusaram comentar o assunto.
Em outubro de 2019, a SAD assinou com os dois bancos um acordo de reestruturação que procedeu à alteração dos termos da opção de compra dos VMOC, tendo sido fixado um preço unitário de 0,30 euros por VMOC, o que corresponde a um “desconto” de 70% na dívida.
Então, segundo comunicou a SAD do clube de Alvalade, “o Grupo Sporting procedeu à regularização de todas as obrigações pecuniárias vencidas, encontrando-se assim em cumprimento perante os bancos”.
A SAD do Sporting garantiu uma maior folga financeira com a conquista do título de campeão nacional este ano, após 19 temporadas de “jejum”, que garante a entrada direta na fase de grupos da Liga dos Campeões, com um encaixe de cerca de 25 milhões de euros.
O que são os VMOC?
Os valores mobiliários obrigatoriamente convertíveis (VMOC) são valores mobiliários de um tipo específico. Estes títulos, que têm uma duração limitada no tempo, obrigam as sociedades emitentes a entregar aos investidores, na data pré-fixada, uma determinada quantidade de ações ou obrigações. É esta obrigatoriedade de entrega de ações ou obrigações que leva a que sejam designados de valores convertíveis. No caso de VMOC relativos a ações, os investidores tornam-se detentores de capital do emitente na altura em que expira a emissão e que se procede à entrega dos títulos acordados. No caso da Sporting SAD, isto significa que em 2026, data em que expiram as emissões de VMOC já realizadas, o Novo Banco e o BCP tornam-se accionistas, se não houver recompra dos títulos pelo clube.