Arquivo para Outubro, 2021

Ricciardi: “Vou tentar criar um banco para regenerar o nome da família Espírito Santo”

Segunda-feira, Outubro 25th, 2021

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Público

José Maria Ricciardi, ex-administrador do BES, defende que o Novo Banco devia ter ficado na esfera do Estado até ser saneado. E confessa: “Se conseguir começar a fazer a regeneração da família Espirito Santo partirei desta vida com a consciência tranquila”.

José Maria Ricciardi volta a explicar o seu papel em toda a crise que resultou na queda do BES, numa altura em que o processo de Ricardo Salgado vive horas decisivas. Sobre a actualidade, diz-se preocupado com a crise de energia “que pode levar à falta de produtos, à alta da inflação, a uma subida das taxas de juro”, um quadro que se agrava em países com altos níveis de endividamento como Portugal. Repesca a velha tese do choque fiscal como solução para se crescer de forma sustentável e poder pagar salários mais altos, diz que Portugal tem que aproveitar a reindustrialização europeia para desenvolver o seu sector industrial e declara: a “minha geração falhou”.

Tem acompanhado os julgamentos de Ricardo Salgado e do BES?
Tenho. Mas devido à pendência dos processos em curso e devido ao facto de ter sido chamado como testemunha do Ministério Público (MP), isso leva-me a não fazer qualquer comentário.

A defesa de Ricardo Salgado mantém a tese de que todas as decisões envolvendo o BES e o GES eram tomadas pela família e os órgãos sociais, o que também o atinge.
A verdade dos factos será com certeza confirmada e nem vou pôr-me a discutir.

Há uma dúvida legítima: como é que um ex-membro do conselho de administração do BES, como foi o seu caso, pode alegar que não sabia de nada do que ali se passava?
Compreendo a dúvida e sei que nunca irei convencer toda a gente e a única coisa que posso dizer é que após seis anos de toda a minha vida ter sido passada a pente fino, escrutinadas as minhas contas, o que fiz e o que não fiz, o que sabia e o que não sabia, por uma equipa de quase 30 elementos, que incluíam sete procuradores do MP, gente do Banco de Portugal (BdP), da CMVM e da Autoridade Tributária, fui totalmente ilibado. Estas entidades têm acesso a informações que mais ninguém tem e concluíram que existia um grupo a funcionar em circuito fechado, como uma célula, com comunicações encriptadas, que recebia dinheiro de um saco azul. E que era muito difícil aos outros administradores, auditores e reguladores terem conhecimento. Uma coisa é desconfiar, outra é ter provas.

No BES chegou a ter o pelouro do risco…
Esse tema está um bocado estafado. Mas pronto, vamos ver se desta vez consigo explicar: uma pessoa pode ter desconfianças, ter dúvidas ou achar que algo não bate certo, mas não são provas. E isto não é nenhuma desculpa. Se o MP com capacidade legal, com cartas rogatórias e meios, demorou seis anos a apanhar os movimentos que passavam todos lá por fora, por offshores, com esquemas de engenharias financeiras sofisticadas… Agora ponha-se nos meus sapatos e diga-me como é que eu podia saber? Que poderes investigatórios eu tinha? Tinha menos do que um auditor. Diz que eu tinha que saber, mas eu só podia saber se o Salgado desabafasse comigo. E mesmo aos que jogavam com ele, nunca dizia tudo: a um dizia 10%, a outro mais 10%, e a outro, outros 10%. Só ele sabia de tudo. Eu era um tipo completamente marginalizado e a ES Enterprise não consolidava com o grupo. E quando comecei a ter provas transmiti-as imediatamente ao BdP.

Mas podia ter feito melhor?
Com toda a humildade digo: provavelmente sim. Mas fiz tudo o que podia, e de toda a família sou o único a continuar a trabalhar no sector financeiro, cuja idoneidade nunca me foi retirada. E estive como presidente executivo do antigo BESI até 2017 quando saí, não por razões regulatórias, mas por divergências estratégicas.

A exposição descontrolada do BES ao BESA, expressa nas contas, que passou de 3,7 mil milhões, em 2011, para 6,1 mil milhões em 2013, não lhe acendeu a luz vermelha?
Não havia exposição descontrolada. Todos os bancos em Angola tinham um rácio de transformação elevado: muito mais empréstimos do que depósitos. O problema nunca esteve nas linhas bancárias que o BES teve nas suas subsidiárias. O problema estava na carteira de crédito que existia no BESA, auditada, sujeita a testes de stress, avaliada pelo BdP, e todos nos davam os parabéns pela situação fantástica em que o banco se encontrava, diziam que estava tudo fantástico. De Angola só vinham boas notícias.

Tendo em conta os interesses de milhares de pequenos aforradores do banco, como é que nunca se interpelou sobre o que se passava no BESA [a exposição do BES ao BESA equivalia em 2014 a 47% dos fundos próprios do BES]?
Estou cansado de explicar que não podia ter tido conhecimento, não tinha qualquer responsabilidade no BESA.

O ex-governador do BdP e vice governador do BCE no Parlamento mencionou o tema BESA…
Peço-lhe que não insista.

Tenho que insistir. Vítor Constâncio disse que a exposição do BES a Angola “devia ter sido travada” pelo BdP e pelos gestores logo em 2011.
Os processos do BESA foram analisados tanto judicialmente, como pelo BdP, e as pessoas com responsabilidades foram responsabilizadas.

O MP não o acusou de ilegalidades…
Não é uma questão de ilegalidades. É que se um gestor tem uma informação e não a comunica, incorre num acto censurável, já nem falo em ilegalidade. E as conclusões de todos aqueles que avaliaram o BESA é que houve alguns administradores, como era o meu caso, que não tinham acesso ao que ali se passava.

No julgamento de José Sócrates, o MP contestou o facto do juiz Ivo Rosa ter ignorado a credibilidade do seu testemunho. A ideia é que não foi responsabilizado pelo MP e pelo BdP por ter testemunhado a favor das duas entidades.
Apenas contei o que sabia ao MP. No BdP é diferente, dei informações logo em 2012 e em 2013, assim que tive conhecimento de factos importantes graves, exercendo a minha obrigação de dever de diligência.

Tem defendido o BdP dizendo que não podia ter actuado antes de 2014, mas agora diz que lhe facultou informações em 2012 e 2013.
Com a informação que tinha, o BdP foi actuando. Há outros aspectos criticáveis tanto ao BdP, como ao Governo do dr. Pedro Passos Coelho, que foi a resolução do BES. Quem quis a solução foram as autoridades europeias, que usaram um banco centenário para fazer experiências. O resultado está à vista: um prejuízo brutal para os contribuintes portugueses, para os stakeholders do BES, accionistas, obrigacionistas, detentores de papel comercial.

Gosta de elogiar a acção de Pedro Passos Coelho enquanto primeiro-ministro, mas foi ele que decidiu resolver o BES.
Sou seu amigo e admiro-o. Mas se o tema BES tivesse sido tratado por este Governo o desfecho teria sido provavelmente outro, pois o actual primeiro-ministro sabe negociar com Bruxelas. E isto não tem nada de ideológico, o BES devia ter ficado no Estado, e ter-se negociado uma capitalização pública, tal como se fez no britânico Lloyds, o maior banco do Reino Unido, que estava numa situação extremamente difícil. O Estado ficou dono do Lloyds, contratou uma equipa muito profissional, e acabou a revender parte das suas acções com lucro para os contribuintes ingleses.

Que avaliação faz da gestão do Novo Banco?
Só posso avaliar a gestão do Novo Banco (NB) quando souber o nome dos últimos beneficiários dos fundos compradores das carteiras de activos e quando souber quanto ganharam os compradores, se 15% ou se 70%. Estamos num quadro de taxas de juro muito baixas, entre zero e meio por cento, e se a rentabilidade dos compradores [dos activos] tiver sido de 6%, de 7%, vá lá, até 15%, é aceitável. Agora se os compradores tiverem tido 60%, 70% ou 80% de lucro, já não é. E grande parte da margem de lucro foi suportada pelo Fundo de Resolução (FdR) e pelos contribuintes. Na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), os deputados não conseguiram apurar duas coisas essenciais: o nome dos compradores finais dos activos do NB e quanto é que ganharam. E sem estas informações não posso responder à sua pergunta.

Se em vez de ser detido em 75% pelo Lone Star (LS), o NB fosse detido pelo Estado, as vendas dos activos teriam tido outro impacto nos contribuintes? 
Claro. Vou fazer contas: se tenho um activo no NB [detido pelo Lone Star] que está nos meus livros por 100 e se o vendo a um intermediário por 20, e o intermediário depois o vende por 80, então os 80 que vou perder – a diferença entre os 100 registados nas contas e os 20 a que compra o intermediário – é prejuízo do banco, neste caso, suportado pelo FdR e pelos contribuintes portugueses. E o lucro que o intermediário tem, entre os 20 e os 80 é todo dele. Se o banco estivesse no Estado, então não haveria intermediários e a margem de lucro desaparecia. E seriam os departamentos de recuperação de crédito internos a vender com tempo e sem correria ao comprador final, e o banco só perderia 20 e não perderia 80. É um quarto do valor. E depois do banco saneado, era vendido e o lucro ainda iria cobrir parte ou a totalidade do que o Estado lá meteu.

Uma tia sua antes de morrer pediu à família que confiasse em si para reconstruir o grupo? 
Fui desafiado a regenerar o grupo por um elemento da minha família. Mas já não sou novo e espero ter energia e tempo pela frente para cumprir esse desejo. Ver gente da minha família impecável e séria a sofrer com a hecatombe, a vergonha e o desastre do que se passou no grupo, cria-me angústia e ansiedade. E depois de profundas investigações das autoridades judiciais e fiscais, vemos que os problemas foram causados por um número restrito da família e o resto não tem culpa. O tempo dos Távora já passou.

Propõe-se criar um banco?
Vou tentar criar um banco novo, num conceito diferente dos chamados bancos clássicos. Terá de ser pequeno, pelo menos no início, virado para o mundo digital, mas que dê às próximas gerações e aos colaboradores a possibilidade de crescer no futuro.

Está confiante que vai conseguir?
Não posso dizer que esteja, pois é muito difícil. Mas estou a fazer os possíveis para o conseguir. A família Espírito Santo era conhecida em todo lado, o melhor nome da banca portuguesa foi destruído. Se conseguir começar a fazer a sua regeneração, para que as gerações seguintes o desenvolvam, partirei desta vida com a consciência tranquila de que fiz tudo o que podia.

E o banco vai chamar-se Ricciardi ou Espírito Santo?
Isso não sei, tem que ver com o branding e com a estratégia comercial e não sei se terá algum nome de família.

O ministro das Finanças João Leão anunciou que a estimativa de crescimento para 2022 vai ser de 5,5%. Partilha do optimismo?
Nem por isso, pois o crescimento não é mais do que a recuperação da situação pandémica. Não tenho uma visão partidária das razões dos problemas estruturais do país, pois quer o PS, quer o PSD têm altas responsabilidades no nosso fraco desempenho. Portugal é um país que em termos gerais vive mal, com um dos salários mínimos mais baixos da Europa [665 euros], um salário médio de mil e tal euros, que em termos líquidos não chegará a mil euros. Mais de 80 por cento da população activa não ganha mais do que 1500 euros por mês. E, apesar dos aspectos positivos, na saúde, na educação, todos falhámos em não ter conseguido que o nível de vida da população portuguesa fosse francamente superior ao que é. A geração a que pertenço não tem muito de que se orgulhar. Portugal tem um dos níveis de produtividade mais baixos da Europa, o que quer dizer que não trabalhamos o suficiente, ou que a organização do trabalho não é das melhores, tanto no privado como no público.

Há uma ideia generalizada de que os interesses pessoais e de carreira de muitos decisores públicos e privados se sobrepõem ao interesse público e ao das empresas que gerem.
Não digo que não. É certo que há grupos que se internacionalizaram e conseguiram enfrentar as dificuldades, mas são insuficientes para o nosso crescimento. Na sociedade civil portuguesa há um problema geral, com alguns empresários da minha geração a não terem feito o trabalho de casa. Não soubemos fazer com que o país evoluísse de forma diferente. Se nos compararmos com outros países europeus estamos na cauda da Europa. Se você tiver um bolo, neste caso um PIB, se ele for pequeno, e crescer pouco e se estiver sempre a divergir [da média europeia], e se o for repartir, a maioria das pessoas viverá sempre de uma forma fraca, não há nada a fazer. Isto não é um azar, nem é uma fatalidade. Simplesmente não temos conseguido.

O Governo diz que o Orçamento para 2022 será o do investimento e da recuperação. Tem essa expectativa?
Temos um problema de falta capacidade de crescer em todos os sectores. Estamos numa espiral negativa. Para termos maior eficiência e maior capacidade de resposta temos que pagar melhor, para pagar melhor temos que crescer mais. E para crescer temos que captar muito mais investimento produtivo, e não temos tido capacidade de o trazer para Portugal, ou de dar condições para que haja investimento português. Vou dar um exemplo: A Holanda não tem qualquer riqueza natural e tem mais ou menos metade do nosso território e quase 17 milhões de habitantes. E um PIB de cerca de 750 mil milhões. Ajustando o PIB da Holanda a 10 milhões [população portuguesa], seria de 438 mil milhões, mais do dobro do nosso PIB, 125% superior. Imagine o que seria o nível de vida dos portugueses? O ordenado mínimo em Portugal seria mais de mil euros [na Holanda é de 1684,80 euros].

Nos últimos dias, o Governo anunciou que vai avançar com medidas de desagravamento fiscal dirigidas à classe média e aos mais jovens.
Acho positivo, mas altamente insuficiente. O desagravamento fiscal deveria desagravar todos os escalões e não apenas alguns. Devia haver um choque fiscal, estendido às empresas, e em grande parte compensado pelo crescimento do IVA.

A pandemia pôs em evidência as fragilidades da Europa em termos das cadeias de valor e de fornecimento?
É verdade. A Europa tem o maior PIB mundial, maior do que o dos EUA, e um nível de vida que nada tem a ver com o de outras regiões, mas atravessa um mau momento. É altura de re-industrializar a Europa, para que não dependa tanto de matérias-primas e de indústrias a larga distância. E há a consciência de que se permitiu que as cadeias de valor, as cadeias de fornecedores, se alongassem excessivamente para a Ásia, com a China agora a perder as vantagens competitivas dos baixíssimos salários. A Europa deve aproveitar esta ocasião para criar condições para diminuir o gap entre os vários países.

Em que termos pode Portugal beneficiar da estratégia de reindustrialização europeia?
A Europa quer apostar na indústria das energias renováveis, em toda a parte do equipamento relacionado com o vento, e na indústria de fabrico de telemóveis. E a França acaba de apresentar um plano com vista à sua reindustrialização. Em Portugal temos de fazer reformas estruturais para atrair investimento produtivo que aumente o PIB e permita pagar salários mais elevados e para isso temos de melhorar os níveis de produtividade. Se os portugueses ganharem mais, consomem mais, e se consomem mais, pode-se descer os impostos, porque o IVA sobe muito mais. E isto vai proporcionar que os filhos das próximas gerações, as que vão herdar uma situação péssima, com baixos salários, possam viver melhor do que os pais. Crescer é decisivo para o nosso futuro.

Todos os governos, PS ou PSD, declararam o turismo uma prioridade estratégica. Mas a pandemia pôs em evidência as suas fragilidades.
Certo. De serviços até estamos relativamente bem, pois desenvolvemos o turismo, uma actividade que como se verificou, nesta crise pandémica, ao contrário da agro-indústria, é muito mais volátil, mais sujeita a vírus, a terrorismo. A nossa aposta na indústria e na agro-indústria, que existiu, devia ter tido dois vectores: o aumento das exportações de produtos e bens transaccionáveis e a substituição de importações. De 2019 para trás, o nosso PIB per capita cresceu 8% em 20 anos, o que significa que não cresceu mais de meio por cento por ano. Já a Irlanda cresceu 100% em 20 anos, enquanto dos países ditos do centro da Europa, o que cresceu menos, cresceu 50%. O que é decisivo em termos de futuro é conseguirmos crescimentos fortes e permanentes da economia, para não divergirmos. Ouvi o dr. Sérgio Sousa Pinto dizer que somos um país de pobres e de remediados e que cabe às novas gerações alterar a situação tanto do ponto de vista político, laboral e salarial, o que exige crescimento económico.

Está preocupado como as consequências da crise dos combustíveis, já evidente no Reino Unido?
No Reino Unido a situação é agravada pela factura do “Brexit”, pois a maioria dos camionistas não eram britânicos, e daí, em parte, a falta de bens nos supermercados e produtos agrícolas. Sem querer desvalorizar os temas das alterações climáticas e das energias limpas e renováveis, acho que o tema energético tem sido tratado de forma infantil, tanto nos EUA como na UE. Quando se entra num período de transição rápida de uma economia mais que centenária e que vivia à custa da chamada energia fóssil, carvão, petróleo e gás, para a dita energia limpa, cometeu-se um erro que se vai pagar caro e cujas consequências iremos ver na inflação, nas taxas de juro e no crescimento.

Que erro “infantil” foi esse?
Quando disseram que iam acabar com a energia fóssil, que é poluente e uma das principais responsáveis pelo aquecimento global, disseram que iam apostar em alternativas que não são muito competitivas em termos de custos. Só que estas fases de transição demoram mais do que uma década e avançaram para novas soluções sem ter os meios para substituir a prática do passado. E ao mesmo tempo pararam com o investimento na energia tradicional. No caso do petróleo, um poço esgota-se em dez anos e tem-se que investir em novos. O [presidente dos EUA, Joe] Biden proibiu o investimento em novos poços nas terras federais dos EUA, o que fez com que o ciclo se interrompesse. Angola não está, neste momento, a conseguir preencher a quota que a OPEP lhe atribuiu, porque não tem investido em novos poços. A crise começou no Reino Unido e já está a alastrar.

A OPEP decidiu controlar a produção de petróleo e o preço do combustível disparou para cima dos 80 dólares pela primeira vez desde 2018.
Se a oferta não está a conseguir acompanhar o crescimento da procura, e não digo só no petróleo, mas no gás e no carvão, e se, por outro lado, as energias ditas verdes ainda não têm qualquer capacidade de substituição, vamos e estamos a assistir a uma disrupção e a uma subida de preços incrível, porque a oferta está a falhar, porque não se investiu. Sei que temos de baixar a temperatura do planeta, mas estas questões deviam ter sido estudadas de forma mais rigorosa. Os preços não param de subir e as acções das grandes companhias de energia também não param de subir.

O governo inglês já fala em controlar a subida dos preços da energia e outros em baixar os preços.
Não, isso não é possível. Baixar artificialmente os preços não será uma solução bem-sucedida porque acarreta novos custos orçamentais que se repercutem sobre os cidadãos. Deve-se procurar restabelecer as cadeias de abastecimento, encurtando-as, e permitir que se continue a investir na energia fóssil, mas, ao mesmo tempo, fazer um esforço para que seja substituída pela verde. Mas não a interromper. Esta crise resulta da conjugação de dois factores, a questão energética e a quebra das cadeias de fornecimento, porque uns países confinaram e fecharam as suas economias e a reabertura veio aos solavancos com grande instabilidade nos transportes, mesmo nos marítimos. E tudo junto pode levar a um quadro difícil de falta de produtos, de inflação muito alta, ainda que temporária, o que pode acarretar subida das taxas de juro e problemas agravados para países com altos níveis de endividamento, como é o nosso caso.

A Comissão Europeia defende o combate à crise energética com o alívio nos impostos e a reforma no mercado do gás?
A reforma já vem tarde e o crescimento da oferta do gás não é recuperável em pouco tempo. Em relação ao alívio dos impostos, para compensar a subida dos preços da energia, só funciona para países com baixos níveis de endividamento. Em Portugal, essa solução não se aplica.

Novo Banco “será reconhecido como um sucesso”, embora vá “demorar o seu tempo”, diz António Ramalho na apresentação da nova marca

Segunda-feira, Outubro 25th, 2021

Citamos

Observador

 

O presidente do Novo Banco apresentou a nova marca da instituição – “novobanco” – e diz que é o início de “um novo ciclo”. Injeção do Orçamento “não é assunto neste momento”.

Demorará o seu tempo“, mas o Novo Banco “será no futuro reconhecido como um sucesso“, afirmou esta segunda-feira António Ramalho, que apresentou a nova marca da instituição – “novobanco” – que marca o início de “um novo ciclo” que “tem como objetivo pôr o banco na rota da criação de capital”. Não excluindo vir a adquirir outros bancos, de “segunda linha”, António Ramalho diz sobre o facto de não existir uma verba prevista no Orçamento do Estado para 2022 que “não é assunto neste momento”, recordando que existe uma “divergência” com o Fundo de Resolução que está a ser avaliada pelos tribunais.

Será com esta nova marca que a instituição vai preparar os próximos três anos, a fase que o Novo Banco chama a fase de “renascer” – depois da fase de “resolver” (2014) e “reestruturar” (2017). Essa nova marca abandona a cor “desbotada” do anterior logotipo, explicou António Ramalho, notando que a nova cor é um “verde-mar” que reflete a “portugalidade”. Embora outros cenários tenham estado em cima da mesa, como reconheceu Ramalho questionado pelo Observador na conferência de imprensa, a opção foi no sentido de manter a designação Novo Banco.

A nova marca foi apresentada numa agência do banco na Avenida da República, em Lisboa, num balcão novo e mais moderno que a instituição chama balcão “master“, onde trabalham diariamente 22 colaboradores. Para já, é um tipo de balcão maior que existe no centro de Lisboa e, também, na Avenida dos Aliados, no Porto.

A nova imagem estará presente em todos os canais de comunicação do banco, desde os canais digitais, ATM, POS e cartões, assim como na rede de balcões. O processo de aplicação da nova imagem na rede física será progressivo, estando previstos 50 balcões até ao final desta semana, cerca de 100 até ao final do ano, com a restante substituição a acontecer ao longo de 2022″, diz o Novo Banco, em comunicado.

Este “processo de mudança de imagem, e de virar de página, surge após a conclusão de um processo de transição e reestruturação do banco que decorreu nos últimos sete anos, tendo agora iniciado um trajeto de crescimento e rentabilidade sustentável”, diz o banco. Esse trajeto “já foi bem visível nos resultados positivos de 137 milhões de euros registados no primeiro semestre deste ano”.

O banco apresenta resultados dos nove meses no final desta semana, e também serão “positivos”. E, além de serem positivos, são “de qualidade”, atirou António Ramalho, baseados num “crescimento da margem financeira entre 4% e 5% e redução de custos entre 4% e 5%”. “Quando a poeira assentar, quando o ruído reduzir“, vai ser reconhecido que o Novo Banco fez uma “transição com sucesso, tendo começado por ser um banco com 33% da carteira em malparado, 5% da carteira em imobiliário e um enorme custo do passivo”.

António Ramalho admitiu, também, que nesta nova fase o Novo Banco admite vir a comprar outras instituições: “Olharemos todas as oportunidades de crescimento na segunda linha de bancos“, diz Ramalho. E quanto ao próprio Novo Banco ser vendido? São perguntas para os acionistas – Lone Star e Fundo de Resolução –, acrescenta o banqueiro.

Há aqui um enorme compromisso com o mercado português e o mercado de parceiras. Ao construir um novo ciclo é porque acreditamos que o banco tem algo para dar à sociedade portuguesa”, disse António Ramalho.

Sobre as “divergências” com o Fundo de Resolução, em que o Novo Banco diz estar “convicto de ter razão”, o banco indicou na apresentação de resultados do primeiro semestre que, na sua leitura, o Fundo de Resolução lhe deve 277,4 milhões de euros. Nessa altura, o banco indicou que iria acionar os mecanismos legais para receber esse valor.

O Novo Banco tem 112 milhões bloqueados pelas Finanças e 166 milhões de euros de provisões para a venda em Espanha e para a valorização de unidades de participação), cujos impactos foram descontados dos rácios de capital do banco. A primeira “divergência” está em tribunal, na Relação, e a segunda está em tribunal arbitral.

Novo Banco. A “fraude política” que é “mentira”, a defesa dos empresários e o ataque às elites “parasitas”

Sábado, Outubro 23rd, 2021

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Observador

Novo Banco. A “fraude política” que é “mentira”, a defesa dos empresários e o ataque às elites “parasitas”

Com relatório que é “manta de retalhos”, Parlamento encerrou inquérito ao Novo Banco. “Fraude política” da resolução e venda dividiu partidos e houve dedos apontados às elites por causa de devedores.

Houve conclusões para todos os gostos, algumas contraditórias entre si, como assinalaram os deputados do CDS, Cecília Meireles, e o socialista João Paulo Correia que até leu algumas. Repetiu-se a acusação de “fraude política” na resolução do BES e na venda do Novo Banco e o seu contrário e houve muitas considerações sobre as elites, a propósito dos devedores que foram interrogados pelos deputados sobre as dívidas que deixaram por pagar e o quanto isso custou aos contribuintes.

Mais de dois meses depois de terminados os trabalhos da comissão parlamentar de inquérito ao Novo Banco, as polémicas, que marcaram as centenas de alterações propostas e um relatório que perdeu o relator e a coesão, já estavam frias. Sobretudo em tempos de crise política à volta de uma proposta orçamental que, pela primeira vez desde 2018, não tem um tostão para injetar no Novo Banco.

A fraude política e o seu desmentido

Algumas dessas polémicas reacenderam esta sexta-feira nas declarações dos deputados que protagonizaram o inquérito parlamentar. A conclusão que qualifica de “fraude política” a forma como foi apresentada a resolução do Banco Espírito Santo em 2014 pelo Governo do PSD/CDS foi uma delas.

O deputado social-democrata, Hugo Carneiro, tentou desmontar a tese que resultou “de um convénio do PS com a esquerda”, assinalando que o melhor argumento contra “essa grande falsidade está nas afirmações do então relator (o deputado do PS Fernando Anastácio), que contrariamente à sua bancada afirmou que “não existe nenhuma fraude política”.

A deputada do CDS foi mais longe ao afirmar que a tese da fraude política não é um incómodo para os partidos que suportaram o Governo de Passos Coelho. “É mentira, e reescreve a história”. Para Cecília Meireles não foi uma fraude, foi sim uma “rotura” face à prática dos governos de José Sócrates que o “PS quis esconder”.

Essa foi uma das conclusões destacadas pela esquerda. Para Duarte Alves do PCP a comissão de inquérito mostrou a “fraude política que foi a resolução do PSD/CDS” quando se criou a ideia que seria possível resolver os problemas do BES com a injeção de 4,9 mil milhões de euros que criou o Novo Banco. O socialista João Paulo Correia invocou o ex-governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, com uma das declarações que marcou este inquérito para sustentar a tese de que o Governo que veio a seguir não tinha alternativas à venda realizada em 2017 com encargos para o Estado. “Se vou vender fruta parcialmente apodrecida não posso contar com a generosidade do comprador”. E em 2014 tinham prometido que o Novo Banco era “um banco sem custos”.

Para Mariana Mortágua do Bloco de Esquerda, uma das conclusões que fica do inquérito é a de que os políticos (que estiveram nos governos do PSD/CDS ao PS) não foram capazes de ser transparentes com o país. Todos sabemos hoje que a resolução sem custos foi uma mentira contada aos portuguesas. Mas isso diz respeito também à venda feita em 2017 à Lone Star pelo Executivo do PS.

Foi “desmentida a ficção da venda sem custos para os contribuintes”, remetendo para a auditoria do Tribunal de Contas sobre a qualificação fundos de mais de três mil milhões de euros injetados no Novo Banco. Venda que “permitiu à gestão do Novo Banco Banco maximizar as injeções do Fundo de Resolução (mais de três mil milhões de euros) e promoveu a venda a “um fundo abutre com uma estrutura opaca”. E nem a comissão de inquérito conseguiu descobrir “quem manda no Novo Banco”, neste caso, quem são os últimos beneficiários da Lone Star.

A luta de classes no ataque às elites e à natureza parasitária do grande capital e a defesa do empresários

Mariana Mortágua aproveitou para responder ao “deputado Cotrim de Figueiredo” que tinha iniciado o período de declarações sobre o inquérito parlamentar atacando a “propaganda” do Bloco de Esquerda. Segundo o deputado da Iniciativa Liberal, o BE quis criar a ideia de “que todos os empresários são corruptos com o desfile de devedores arrogantes”, narrativa que a Iniciativa Liberal “quer desmontar”.

Para a deputada do Bloco, os depoimentos como os de Bernardo Moniz da Maia, Luís Filipe Vieira e Nuno Vasconcellos tornaram claros os mecanismos usados por grandes devedores para escapar às dívidas. Não representam todos os empresários, são uma elite política que foi beneficiada pelas privatizações e a  liberalização financeira. E não é preciso propaganda para o demonstrar, já que cada vez que se sentam a responder num inquérito “fica à vista de todos a arrogância e o sentido de impunidade”.

O tema já tinha sido sublinhado na intervenção do comunista Duarte Alves, para quem a comissão teve o mérito “de dar visibilidade a negócios ruinosos do BE e do Novo Banco, pondo a nu a natureza parasitária do grande capital que não confundimos com as pequenas e médias empresas. Que só foi possível com cobertura do PS e do PSD e com as privatizações e a liberalização da banca”.

A discussão sobre os devedores marcou também uma bicada do Bloco de Esquerda ao Chega quando Mariana Mortágua apontou na direção de “uma elite económica  protegida pelo PS, PSD, e CDS e que se sente bem nas hostes do Chega.” André Ventura que não esteve na comissão de inquérito contra-atacou incluindo o Bloco de Esquerda “nas elites que destroem o país há 47 anos”, numa intervenção pontuada por várias interrupções dos bloquistas. Mariana Mortágua pediu para distribuir uma investigação jornalística sobre os financiamentos de empresários ligados ao BES/GES ao partido Chega, à qual André Ventura respondeu com documentos (a entregar) sobre todos “os terroristas” nas lista do Bloco de Esquerda.

O relatório desta comissão de inquérito resultou “numa manta de retalhos em que todos têm conclusões em que se reveem, mas no qual ninguém se revê em todo as as conclusões porque algumas são incoerentes”,  sublinhou Cecília Meireles que atira culpas para o PS de ser responsável por uma “narrativa parcial” de ajuste de contas entre governos e governadores. Na defesa socialista, João Paulo Correia lê duas das conclusões que aponta como contraditórias:

  • As condições de venda do Novo Banco não permitiram a maior salvaguarda do interesse público.
  • Com a venda, o Governo criou condições para impedir a liquidação do banco e preservar a estabilidade financeira e o interesse público.

Apesar de todas as polémicas, o social-democrata Duarte Pacheco concluiu que a grande maioria dos deputados se reviu neste relatório, com a exceção de uma força política. “E percebo porquê. O mais importante era salvar o vosso querido dr. Centeno”. Para a deputada Cecília Meireles, e apesar do fim que  não a dignificou, a comissão de inquérito “teve muita utilidade. Foi possível descobrir atos que originaram as perdas, detetar erros graves da supervisão e perceber o acordo de venda que tornou previsível que os milhões de euros do Estado continuassem a ser injetados no Novo Banco.”

E no essencial todos estiveram de acordo sobre as responsabilidades apontadas aos devedores, gestores e supervisor bancário — e que foram confirmadas com a entrega à comissão de inquérito do relatório Costa Pinto sobre a atuação do Banco de Portugal no processo que resultou na resolução do BES. Duarte Alves mandou ainda recados ao presidente do Novo Banco, António Ramalho, que acusa de escrever um artigo de opinião “lamentável” questionando as conclusões da comissão de inquérito.

O deputado do PAN, Nelson Silva, destacou que o partido conseguiu fazer valer a conclusão de que o Banco de Portugal “falhou em toda a linha” no que toca à relação com o BESA (Banco Espírito Santo Angola), lamentando que os deputados do PS e do CDS tenham inviabilizado a audição de Rui Pinto que poderia ter trazido novos dados sobre as operações fictícias que lesaram o banco angolano do BES (e o BES) em 600 milhões de euros.

Padre da família Espírito Santo disse que Ricardo Salgado tinha solução para lesados do BES

Sábado, Outubro 23rd, 2021

Citamos

Diário de Notícias

O padre Avelino Pereira Alves defendeu em tribunal que o ex-banqueiro “sempre foi uma pessoa com regras e de grande confiança”.

O padre da família de Ricardo Salgado declarou esta sexta-feira hoje em tribunal que o antigo presidente do Banco Espírito Santo (BES) lhe disse que tinha uma solução para os lesados e que essa situação foi o que mais o fez sofrer.

“Sempre foi dizendo que aquilo que mais o fazia sofrer neste processo eram os lesados, porque disse que tinha solução e não lhe deram tempo”, afirmou Avelino Pereira Alves, que foi ouvido como testemunha na sétima sessão do julgamento do ex-banqueiro no Juízo Central Criminal de Lisboa, no Campus da Justiça.

Segundo o padre, que disse conhecer o arguido “há mais de 20 anos” e que todos os domingos se encontravam na missa, além de ter partilhado almoços e jantares em casa do antigo líder do BES, Ricardo Salgado “sempre foi uma pessoa com regras”, de “grande confiança” e cujo “porte firme” reconheceu admirar.

“Um homem íntegro, com valores e regras humanas e sociais bem definidas”, descreveu Avelino Pereira Alves, enfatizando a relação de amizade entre ambos: “Convivi com ele nestes momentos mais difíceis porque os amigos não devem fugir nestas ocasiões. Nestas adversidades ele tentou explicar o assunto, mas eu não quis saber. A nossa amizade está acima dessas controvérsias”.

Entretanto, no exterior do tribunal decorria uma manifestação de lesados do BES, com o som de buzinas e protestos a fazer-se ouvir também na sala de audiência.

Durante a manhã foram ainda ouvidos por videoconferência as testemunhas Alain Rukavina, advogado e liquidatário da ES International, e Ricardo Gaspar Carvalho, administrador e sócio da sociedade Shu Tian.

Já a audição de Jean-Luc Schneider, ex-administrador da ESFIL e colaborador do GES responsável pela operacionalização de transferências da conta bancária da ES Enterprises na Banque Privée Espírito Santo, ficou sujeita ao envio de uma carta rogatória para a Suíça, tendo ficado prevista a audição por videoconferência na próxima sessão do julgamento, marcada para 25 de novembro.

Ricardo Salgado responde neste julgamento por três crimes de abuso de confiança, devido a transferências de mais de 10 milhões de euros no âmbito da Operação Marquês, do qual este processo foi separado.

Juiz diz que Alzheimer não afeta capacidade de defesa de Salgado

Sexta-feira, Outubro 22nd, 2021

Citamos

Eco

Alegações finais de Salgado estão paradas até marcação da data para ouvir Jean-Luc Schneider sobre a possibilidade de prestação de depoimento por videoconferência. Alzheimer não foi aceite.

O juiz não aceitou o pedido da defesa de Ricardo Salgado para suspender o julgamento, atendendo ao relatório médico que concluía por um diagnóstico de Alzheimer que os advogados apresentaram no dia 12 de outubro ao tribunal. E admitem que esta doença não é razão suficiente para que “as capacidades de defesa do arguido estejam limitadas de tal forma que o impeçam de se defender de forma plena. Não parece decorrer do teor do atestado médico que o arguido esteja mental ou fisicamente ausente”, explica o despacho do juiz Francisco Henriques, a que o ECO teve acesso.

“A deficiência cognitiva, ou seja, a capacidade de reproduzir memórias, não é de todo impeditiva do exercício do direito de apresentar pessoalmente em julgamento a versão dos factos passados”, argumenta o juiz.

Para esta sexta-feira estavam marcadas as alegações finais mas que acabaram adiadas até ser marcado o testemunho de Jean-Luc Schneider por videoconferência. “Haverá que aguardar pela data designada para continuação da audiência de julgamento e, simultaneamente, averiguar da existência no Tribunal de possibilidades técnicas de realizar uma videoconferência para a Suíça”, lê-se no despacho.

Na passada semana, a defesa de Ricardo Salgado enviou um relatório médico ao tribunal que confirma os “sintomas de declínio cognitivo progressivo”, segundo o médico neurologista Joaquim Ferreira, que assume ainda que “após toda a investigação realizada, podemos agora concluir pelo diagnóstico de doença de Alzheimer”, segundo o relatório do médico. Um diagnóstico que se tem vindo a agravar nos últimos três meses e que o médico considera irreversível. Porém, o juiz não rejeita este relatório como meio de prova: “os atestados médicos constituem meios de prova e como tal devem ser valorados pelo Tribunal”, tal como não põe em causa a qualificação da doença de Alzheimer como uma doença neurológica. “Trata-se de matéria factual”, diz o tribunal.

O médico que seguiu o ex-presidente do Grupo Espírito Santo sustenta ainda que “Ricardo Salgado tem apresentado um agravamento progressivo das limitações cognitivas e motoras descritas” desde julho de 2021 e que “o quadro clínico de defeito cognitivo que apresenta atualmente, nomeadamente o defeito de memória, limita a sua capacidade para prestar declarações em pleno uso das suas faculdades cognitivas”. E, por isso, pediram a suspensão ou arquivamento determinados pelo tribunal. Caso não seja possível, os advogados do ex-presidente do GES defendem que “no limite, a execução de qualquer pena de prisão que viesse, eventualmente, a ser determinada (…) teria de ser imediatamente suspensa” perante o diagnóstico de doença de Alzheimer.

Mas os argumentos — mesmo os médicos — não convenceram o juiz Francisco Henriques que defendeu, no despacho desta quinta-feira, que “a degradação das faculdades cognitivas são consequência natural da longevidade humana. Em regra, o ser humano na faixa etária do arguido sofre de natural decréscimo das capacidades cognitivas”.

Por outro lado, o tribunal considera que a prestação de depoimento ou de declarações em Tribunal não constitui uma atividade “similar à prestação de provas académicas. Não é isso que se exige a um arguido, assistente, demandante ou testemunha. A prestação de declarações ou de depoimento constituem os meios de prova avaliados mais falíveis, precisamente devido à variável humana e à imprecisão da formação de memórias”.

O magistrado vai ainda mais longe ao assumir que “a limitação cognitiva do arguido não é algo que lhe seja coercivamente imposto, mas, apenas, uma limitação da natureza do ser humano, potenciado por uma doença neurológica degenerativa. Ou seja, não é o Tribunal que impõe qualquer limite ao direito de defesa do arguido, é o próprio arguido que autolimita as suas capacidades de defesa ao optar por não prestar declarações em Tribunal”.

Em julho, a defesa de Ricardo Salgado tinha pedido uma perícia médica à saúde mental do ex-banqueiro mas o tribunal recusou o pedido. Os advogados de Salgado alegaram logo na altura que os exames já realizados apontavam para “um quadro clínico de demência, nomeadamente doença de Alzheimer”. Mas o coletivo de juízes que está a julgar o ex-banqueiro, no processo separado da Operação Marquês, considerou que a perícia médico-legal pedida é desproporcional e que bastaria um atestado médico.

Venda do Novo Banco há 4 anos “foi indispensável para garantir a estabilidade financeira”, diz Máximo dos Santos

Quinta-feira, Outubro 21st, 2021

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Económico

Faz esta segunda-feira quatro anos que o banco que Bruxelas queria que fosse liquidado foi vendido à Lone Star. Luís Máximo dos Santos e Sérgio Monteiro, ambos protagonistas na operação de venda de 75% do Novo Banco, defendem ao JE que foi a solução que melhor salvaguardou a estabilidade. Numa trajetória de lucros, o Novo Banco prepara-se para apresentar a nova imagem esta semana.

Faz hoje quatro anos que os fundos de investimento geridos pelo gestora norte-americana Lone Star adquiriram uma participação maioritária de 75% no Novo Banco, que assim deixou de ser banco de transição. Essa entrada incluiu uma injeção de capital no valor total de mil milhões de euros e um mecanismo de capitalização contingente do Fundo de Resolução (FdR) de 3,89 mil milhões de euros.

A capitalização feita em 2017 pela Lone Star – sobretudo a que ficou a cargo do Fundo de Resolução no âmbito do polémico Acordo de Capitalização Contingente – permitiu salvar o Novo Banco da mais que provável insolvência, dada a má qualidade do seu balanço em 2017.

Em declarações ao Jornal Económico, o presidente do Fundo de Resolução e vice-Governador do Banco de Portugal (autoridade de resolução em Portugal), Luís Máximo dos Santos, defende que a venda do banco que nasceu das cinzas do BES foi a melhor opção para a estabilidade do sistema financeiro. “Independentemente das diferenças de opinião e divergências que possam existir sobre este tema, considero inegável que a venda do Novo Banco em 2017 foi indispensável para garantir a estabilidade financeira e, nessa medida, foi um acontecimento fundamental para o sistema financeiro português e para garantir as condições de normal desenvolvimento da economia portuguesa”, refere Máximo dos Santos.

Também em declarações ao Jornal Económico, Sérgio Monteiro – ex-secretário de Estado das Obras Públicas e arquiteto do negócio Novo Banco–Lone Star – explica que a venda de 75% do Novo Banco foi “a melhor solução de entre as que eram possíveis à luz dos Compromissos de Portugal com a Comissão Europeia. Permitiu preservar a estabilidade do sistema financeiro e dos seus depositantes”. “E dá sinais claros de estar, finalmente, a entrar na normalidade, sem necessidade de apoios públicos adicionais”, lembrou o ex-governante.

Os impactos da liquidação do Novo Banco seriam mais gravosos para o sistema financeiro, estimou recentemente a Deloitte num estudo feito a pedido do BdP. Os custos da liquidação do banco, indica o mesmo trabalho, ascenderiam a entre 20 e 25 mil milhões de euros, com um impacto direto e imediato equivalente ao valor dos depósitos cobertos, que ascendia a 14 mil milhões de euros, a serem pagos pelo Fundo de Garantia de Depósitos.

O polémico Acordo de Capitalização Contingente (CCA) nasceu da divergência entre comprador e vendedor quanto à valorização de um conjunto de ativos do Novo Banco e permitiu à Lone Star, enquanto comprador, ter uma compensação por custos de funding, perdas realizadas e imparidades relativas a um conjunto delimitado de ativos, caso os níveis de capital descessem abaixo dos níveis previamente definidos.

Foi este acordo que pôs o banco no olho do furacão político que culminou com uma Comissão Parlamentar de Inquérito este ano.

O montante total de chamadas de capital recebidas pelo Novo Banco, incluindo os 317 milhões recebidos a 4 de junho de 2021, foi de 3,29 mil milhões de euros (ficam por esgotar 600 milhões de euros). Mas existe uma diferença de 112 milhões de euros calculados entre 429 milhões de euros, que o FdR apurou como devido após conclusão do processo de verificação e os 317 milhões de euros recebidos, que estão a aguardar a avaliação da PwC e que podem ainda ser injectados no banco.

O Novo Banco, antes da venda ao Lone Star era um banco que estava ligado à máquina, e obteve em 2021 os seus primeiros lucros. No primeiro semestre teve resultados positivos de 137,7 milhões de euros, valor que compara com um prejuízo de 555,3 milhões de euros que o banco liderado por António Ramalho tinha registado na primeira metade do ano passado.

“O Novo Banco está agora a entrar na fase lucrativa”, referiu na última Comissão Parlamentar de Inquérito ao Novo Banco, Evgeny Kazarez, presidente do conselho de administração da Nani Holdings, empresa criada em 2017 pela Lone Star, para deter os 75% do banco, acrescentando que não está previsto haver mais utilizações do CCA (mecanismo de capitalização contingente) porque “na medida do possível” o plano de reestruturação está concluído.

O período de reestruturação do Novo Banco tinha de ficar concluído a 31 de dezembro de 2021.

“O Novo Banco apresentou pelo 2º trimestre consecutivo um resultado líquido positivo”, disse o banco ao mercado, acrescentando que “este desempenho demonstra a capacidade do negócio em gerar capital”.

O banco liderado por António Ramalho prepara-se para revelar a nova imagem do banco, deixando o verde e adotando o turquesa, já na sexta-feira.

Antes da venda (à Lone Star) Bruxelas queria mandar o Novo Banco abaixo

Em 2017 o optimismo quanto ao futuro do Novo Banco não era o mesmo de hoje, e os protagonistas do negócio descrevem a venda como “uma operação de dificuldade extrema e de elevada complexidade”.

Se há coisa que se pode dizer é que a venda do Novo Banco, de tão difícil, foi quase um milagre. Bruxelas olhava com desconfiança para o sucesso da operação e venda que a equipa do BdP e Fundo de Resolução (com Sérgio Monteiro ao volante) conduzia. O banco de transição que saiu do BES apresentava uma má carteira de crédito, com baixa cobertura, e baixo capital para fazer face aos riscos.

António Ramalho não se tem cansado de lembrar que “em 2015 o Novo Banco vivia numa situação dramática, em que 35% da carteira eram ativos problemáticos. Eu não geria um banco, geria um fundo de reestruturação”.

Para conseguir vender o Novo Banco depois de uma primeira tentativa falhada, foi preciso assegurar um conjunto de autorizações ao nível do Mecanismo Único de Supervisão (MUS), foi ainda preciso lidar com o Mecanismo Único de Resolução visto que se o plano da venda falhasse teria de haver um Plano B e as autoridades europeias faziam disso uma exigência.

Foi preciso assegurar a aprovação da direção da DG Comp (Direção da Concorrência) europeia. O MUS e a DG Comp foram exigentes e prudentes e era preciso, que apesar de todas as exigências, o comprador se mantivesse interessado e finalmente era preciso garantir, do ponto de vista do Fundo de Resolução que os bancos seus contribuintes não se sentiam mais penalizados face à situação anterior. Desde 4 de novembro de 2014 houve mais de 20 reuniões no plenário do supervisory board, eram reuniões em Frankfurt semana sim, semana não em que se discutiu o Novo Banco à exaustão.

“O Novo Banco manteve o franchising enquanto banco de transição, conseguiu atrair um investidor privado que põe 1.000 milhões de euros e cresceu em depósitos, são feitos que nenhum outro banco europeu nas mesmas circunstância conseguiu”, disse na altura o Banco de Portugal.

“O setor bancário nacional está hoje melhor preparado para fornecer o financiamento necessário ao desenvolvimento da economia portuguesa”, disse o então Governador do Banco de Portugal, Carlos Costa há quatro anos quando a Lone Star assinou a compra de 75% do Novo Banco.

Por seu turno, a Lone Star prometeu em 2017 devolver ao Novo Banco o estatuto “de grande instituição financeira portuguesa”.

“Hoje, o Novo Banco é uma instituição financeira sólida e bem capitalizada, posicionada para apoiar os seus clientes e ajudá-los a alcançar os seus objetivos”, tem defendido António Ramalho, que não se cansa de lembrar que o banco que dirige é o mais escrutinado da história da banca portuguesa.

Numa carta a propósito da Comissão Parlamentar de Inquérito que foi realizada este ano, o CEO do Novo Banco fez referência ao facto de durante largos meses o banco ter sido “escrutinado pela comunicação social, talvez pela opinião pública, pelo seu auditor independente, pelo Tribunal de Contas, pelo auditor especial escolhido pelo Ministério das Finanças e, finalmente, pelos deputados da Comissão de Inquérito Parlamentar (CPI) ao Novo Banco”, ao mesmo tempo que lembrou que banco nasceu de “uma das decisões mais difíceis e dramáticas da nossa história recente, o fim do universo BES”.

Além de ter sido o banco que mais auditorias teve, entre regulares e extraordinárias. Foi escrutinado já por todas as ‘big four’ do mercado da auditoria.

Seis contratos para vender o Novo Banco

Ao todo, a venda do Novo Banco ao fundo Lone Star implicou a assinatura de seis contratos, sendo que apenas dois são públicos. São eles o Acordo-Quadro entre as Finanças e o Fundo de Resolução, que permitiu os empréstimos anuais do Estado até um limite anual de 850 milhões de euros, enquanto durar um outro acordo (o de Capitalização Contingente). Mas que já não existiu em 2021 e está contemplado para 2022. Há depois um acordo entre o Estado português e a Comissão Europeia e que fundamenta a autorização de Bruxelas à venda de 75% do Novo Banco ao Lone Star.

Este acordo contempla, tal como foi tornado público, a cláusula de emergência (‘fall back’ ou capital backstop). Trata-se de uma autorização para o Estado conceder ao Novo Banco “capital adicional limitado”, que será disponibilizado apenas se surgirem necessidades de capital em circunstâncias adversas graves que não possam ser resolvidas pela Lone Star ou por outros operadores de mercado. É uma cláusula opcional com validade de cinco anos, proposta pela própria Direção-Geral da Concorrência (DG Comp) da Comissão Europeia. A validade acaba no fim do ano e o valor da capital backstop acordada entre o Estado e a Comissão Europeia (por iniciativa desta) para garantir a viabilidade a longo prazo é de 1,6 mil milhões de euros, segundo revelou este ano o Tribunal de Contas.

Além dos dois contratos públicos e do contrato de venda do banco assinado entre a Nani Holdings (da Lone Star) e o FdR, há mais três contratos. Um consiste no contrato que criou o mecanismo de capital contingente (CCA), celebrado entre o FdR e o Novo Banco, nos termos do qual o FdR, enquanto acionista, se compromete a realizar injeções de capital no caso de se materializarem certas condições cumulativas relacionadas com o desempenho de um conjunto delimitado de ativos do Novo Banco e com a evolução dos níveis de capitalização do banco.

Há ainda um contrato de servicing entre o FdR e o Novo Banco, assinado em 2018, no qual ficaram definidas as regras de gestão dos créditos improdutivos, e através do qual o FdR contratou o banco (que atua como servicer) para fazer essa gestão, sem que isso implique o pagamento de qualquer fee. Isso mesmo descreve o FdR no seu site. “Compete ao Novo Banco a gestão corrente e o servicing dos ativos abrangidos pelo CCA, sem qualquer encargo por esse serviço, pelo que será celebrado um acordo de gestão dos créditos (servicing) para regular os procedimentos e as relações entre o FdR e o Novo Banco” nestas matérias – o que acabou por ocorrer em 2018. Por último há um acordo parassocial entre os dois acionistas, anexo ao contrato de venda, assinado entre o FdR e a entidade compradora dos 75% do Novo Banco.

O relatório da CPI descreve os contratos inerentes à venda do Novo Banco em 2017, a que chama de “instrumentos jurídicos da operação”. A saber, “o Contrato de Compra e Venda e de subscrição de Ações (CCVA) do NB; o Acordo Parassocial (AP); o Acordo de Capitalização Contingente, determinando que o FdR assinasse, nesse mesmo dia, o CCVA e o AP e que praticasse todos os atos jurídicos e elaborasse os materiais necessários e adequados à boa execução dos acordos, fossem eles próprios ou do NB, incluindo a assinatura do CCA”.

O Acordo Parassocial (Shareholders Agreement) em matéria de Governação estabelece a previsão de o FdR assumir a obrigação de não exercer o seu direito de indicar membros quer para o CAE, quer para o Conselho Geral e de Supervisão, conforme imposição da Comissão Europeia, no âmbito do diálogo conduzido nos termos do regime de auxílios de Estado, subsistindo apenas os direitos de informação do Fundo que tem 25% do banco, previstos no Acordo Parassocial.

O Contrato de Compra e Venda e de Subscrição de Ações do NB (SPA) tem a previsão da obrigação de realização de um investimento total de 1.000 milhões de euros por parte do comprador em contrapartida de uma participação de 75% no capital do NB, assim como um exercício de gestão de passivos (Liability Management Exercise – LME) cuja geração de capital (CET1) não seria inferior a 500 milhões de euros.

Na cerimónia de assinatura que formalizou a venda estiveram presentes na altura o então Governador do Banco de Portugal, Carlos Costa; o vice-Governador e presidente do Fundo de Resolução, Luís Máximo dos Santos; Sérgio Monteiro, que foi o responsável por ‘montar’ a operação; e o presidente do Novo Banco, António Ramalho, entre outros administradores do banco.

Assinaram a venda Donald Quintin, da Lone Star, Carlos Costa e Luís Máximo dos Santos.

A Nani Holdings, empresa criada em 2017 pela Lone Star para deter os 75% do Novo Banco, é detida pela LSF Nani Investments, no Luxemburgo, uma entidade supervisionada pelo BCE e pelas autoridades luxemburguesas.

 

Operação Marquês: recurso do MP critica interpretação errada e viciada do juiz Ivo Rosa

Quinta-feira, Outubro 21st, 2021

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O Mirante

Ministério Público considerou, no recurso contra a decisão instrutória da Operação Marquês, que o juiz Ivo Rosa assumiu “uma interpretação errada e viciada” da tese da acusação.

O Ministério Público considerou, no recurso contra a decisão instrutória da Operação Marquês, que o juiz Ivo Rosa assumiu “uma interpretação errada e viciada” da tese da acusação.

No recurso de mais de 1.800 páginas os procuradores dizem não poder aceitar a apreciação que o juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal “fez sobre a actividade de recolha de prova, sobre a congruência da acusação, sobre a leitura dos indícios recolhidos nos autos e sobre a interpretação jurídica”, considerando que aos factos foi dada uma “sequência de forma viciosa e tendenciosa”.

O recurso visa contestar a parte em que não foram pronunciados 27 dos 28 arguidos, incluindo o ex-primeiro-ministro José Sócrates e o empresário e seu amigo Carlos Santos Silva e o ex-banqueiro Ricardo Salgado.

O MP critica a agressividade da decisão instrutória e considera que o juiz manifestou desprezo em relação à acusação sendo a principal expressão disso as “circunstâncias de a decisão instrutória ter omitido os factos relacionados com os movimentos financeiros, que ocupam uma parte significativa da acusação”.

No entender dos procuradores do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), “os factos narrados na acusação reflectem a evolução da recolha da prova e a identificação de um sentido comum para todos os movimentos financeiros detectados, face à sua contemporaneidade com negócios, contratos e operações bancárias que envolveram entidades favorecidas no seu relacionamento com o Estado”.

Em causa no processo Operação Marquês estão crimes de corrupção, branqueamento de capitais, falsificação de documentos, fraude fiscal, entre outros, tendo o MP acusado José Sócrates de 31 ilícitos.

No texto, o MP insurge-se quanto à “apreciação errada” da acusação, considerando que a decisão instrutória “perverte o sentido da acusação”, alterando “a cronologia dos factos e o sentido da ação dos arguidos”, inventando “a verificação de alegadas insuficiências e incongruências”, da acusação “para depois dizer que estão viciadas ou que são inconstitucionais”.

Na mesma argumentação, “a decisão instrutória deturpa a conjugação de indícios que suporta muitas das imputações realizadas, optando a mesma decisão por atender a indícios isolados ou desinseridos das suas circunstâncias, formatando-os para justificar uma decisão de não indiciação e consequentemente de não pronúncia”, refere o recurso.

O Ministério Público critica ainda que muita da prova recolhida, com base nos pedidos de informação bancária e cartas rogatórias, tenha sido dada como “factos inúteis” pelo juiz de instrução, sendo “integralmente omitidos e desconsiderados”.

Em contraponto, o MP reitera que os factos da acusação “reflectem a evolução da recolha da prova e a identificação de um sentido comum para todos os movimentos financeiros detectados, face à sua contemporaneidade com negócios, contratos e operações bancárias que envolveram entidades favorecidas no seu relacionamento com o Estado”, nomeadamente o grupo Lena, o Grupo Espírito Santo, os accionistas do empreendimento de Vale do Lobo, vincando que “as formas assumidas por esse favorecimento tiveram sempre a presença de José Sócrates”.

Ivo Rosa decidiu que dos 28 arguidos do caso (19 pessoas e nove empresas) só cinco – Ricardo Salgado, José Sócrates, Carlos Santos Silva, Armando Vara e João Perna – iriam a julgamento por alguns crimes, reduzindo os 189 ilícitos imputados para 17, vindo agora o MP solicitar ao Tribunal da Relação que reverta a decisão instrutória na parte de não pronuncia.

Operação Marquês. Ricardo Salgado sujeito a nova perícia?

Quinta-feira, Outubro 21st, 2021

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Renascença

Ex-homem forte do Grupo Espírito Santo quer a suspensão do julgamento, o arquivamento ou a condenação a pena suspensa e fez sabê-lo num requerimento junto ao processo, onde apresenta um atestado médico para comunicar que sofre de Alzheimer.

Ricardo Salgado nunca esteve presente nas sessões do julgamento que decorre desde julho passado, referente ao processo extraído da Operação Marquês e onde responde por três crimes de abuso de confiança ligados a uma transferência de 10 milhões de euros.

Do coletivo de juízes do Tribunal Central Criminal de Lisboa conseguiu a permissão de ausência das sessões, justificada com a pandemia e com o facto de a presença do arguido não ser imprescindível.

Agora, a defesa Ricardo Salgado pede mesmo a paragem do caso, fundamentando o pedido com um atestado médico a comprovar o diagnóstico de doença de Alzheimer.

A decisão está nas mãos do juiz Francisco Henriques, que deve seguir um de três caminhos possíveis:

  • Aceitar os indícios de que o arguido não estará capaz para enfrentar o julgamento e mandar nomear peritos que façam um relatório médico de avaliação independente e continuar com os trabalhos até chegar às suas mãos o documento;
  • Suspender o julgamento até receber a perícia;
  • Determinar que não há indícios do grau de incapacidade do arguido e prosseguir naturalmente o julgamento (uma hipótese pouco provável).

No fundo, a nova perícia, a ser realizada por especialistas do Instituto de Medicina Legal, não determinará se Ricardo Salgado era imputável à altura dos crimes, mas se o é agora para ser julgado e se está capaz de entender o julgamento e responder em consciência.

Se for declarado capaz pelos médicos, o julgamento prossegue. Se for declarado incapaz, poderá suspender-se o julgamento até que exista uma melhoria das condições de saúde do arguido – para isso, deve ser convocado periodicamente para ser reavaliado clinicamente.

Quanto ao arquivamento pedido pelo arguidonão é viável, pois, legalmente, apenas a morte extingue a responsabilidade criminal.

As perícias são conhecidas no mundo judicial por serem, por norma, demoradas. Pressupõem falar com o arguido, repetir exames e avaliar as informações clínicas apresentadas ao tribunal.

Para sexta-feira, dia 22, está agendada nova sessão do julgamento, após entrega do atestado assinado pelo neurologista Joaquim Ferreira. Ao Ministério Público, terá agora de ser dado também tempo para se pronunciar e, em última instância, perante dúvida de algum relatório poderá sempre oficiar nova perícia.

Ricardo Salgado, de 77 anos, foi diagnosticado com Alzheimer antes do Verão deste ano. A defesa fala agora em “sintomas de declínio cognitivo progressivo” e “defeito de memória, limita a sua capacidade para prestar declarações em pleno uso das faculdades cognitivas”.

Ricardo Salgado passou recibo verde de 8,5 milhões de euros

Quinta-feira, Outubro 21st, 2021

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Eco

Ex-banqueiro diz que pagamento foi um presente de um empresário em troca de conselhos de investimentos em Angola. Em causa estão cinco transferências para uma offshore.

Em 2012, Ricardo Salgado entregou nas Finanças três declarações de substituição do IRS de 2011. Numa delas, diz o Correio da Manhã(acesso pago), o banqueiro declarou 8,5 milhões de euros que recebeu de um empresário angolano através de um recibo verde.

Esta verba foi oferecida em 2011 por José Guilherme, um construtor civil da Amadora, e declarada por Ricardo Salgado como rendimentos de trabalho independente oriundos de Angola. O banqueiro justificou esta quantia como um presente de José Guilherme em troca dos conselhos que lhe dera para investimentos em Angola. Ainda tentou declarar essa verba como uma liberalidade (uma transmissão gratuita de bens), mas o Fisco não aceitou.

Salgado terá recebido uma parte das verbas de José Guilherme, segundo o caso Monte Branco, através de um familiar do construtor. A partir de uma conta no BES Angola (BESA), em 2011, foram feitas cinco transferências para a conta da Savoices, offshore de Salgado, no total de 11 milhões de dólares (8,5 milhões de euros). Três dessas operações, no valor de 7,5 milhões de dólares, terão sido feitas pelo familiar do empresário.

Processos do BdP contra o BES já valeram multas de 27 milhões

Terça-feira, Outubro 12th, 2021

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Negócios

Seis processos de contraordenação instaurados pelo BdP contra entidades do universo Espírito Santo já têm decisões judiciais, que resultaram na condenação de 16 entidades. Destas, 13 são pessoas individuais, com Salgado à cabeça.

Os processos de contraordenação instaurados pelo Banco de Portugal (BdP) a várias entidades ligadas ao Banco Espírito Santo (BES) e ao Grupo Espírito Santo (GES) já resultaram na aplicação de coimas no valor superior a 27 milhões de euros, com os tribunais a confirmarem as condenações aplicadas pelo supervisor. Mais de metade deste valor, contudo, está suspenso.

Ao todo, foram já confirmados, por decisão judicial, seis processos contraordenacionais levados a cabo pelo BdP. “As investigações contraordenacionais relacionadas com o universo GES/BES, nas quais o BdP identificou e sancionou diversas condutas praticadas naquele universo, algumas delas na origem direta da resolução do BES, foram já, quanto aos aspetos fundamentais, objeto de confirmação por decisão judicial”, começa por referir o BdP, em comunicado divulgado esta segunda-feira.

Das decisões condenatórias proferidas pelo supervisor, detalha ainda o BdP, duas já transitaram em julgado, uma foi confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa e outras três foram confirmadas por parte do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS). Dentro destes processos, registam-se 16 condenações – das quais 13 são relativas a pessoas singulares (incluindo Ricardo Salgado, ex-presidente do BES, e Amílcar Morais Pires, antigo diretor financeiro do banco) e as outras três dizem respeito a instituições (incluindo o BES).

Destas condenações resultaram várias coimas, ainda que a sua execução não se verifique em todos os casos. De um lado, estas decisões judiciais levaram à aplicação de coimas no montante aproximado de 12 milhões de euros (cúmulo jurídico) a “diversos arguidos”. Por outro lado, soma-se um montante de cerca de 15 milhões de euros, “decorrente das decisões condenatórias que se tornaram definitivas logo na fase administrativa dos processos, por não terem sido judicialmente impugnadas pelos arguidos”.

Essas coimas no valor global de 15 milhões de euros estão suspensas, isto é, os visados só pagarão se cometerem uma nova infração nos próximos anos. Vários fatores justificam as suspensões. No caso do BES e do ESFG, por exemplo, as coimas não são executadas porque estas entidades estão insolventes e o supervisor procura proteger os credores da massa falida.

Quanto às coimas que estão a ser executadas, Ricardo Salgado é o maior visado, com multas superiores a 8 milhões. O montante global já pago fica aquém daquele que é exigido pelo supervisor, uma vez que alguns dos processos em causa ainda não transitaram em julgado, ainda que as decisões judiciais já tenham sido favoráveis ao BdP em várias instâncias

 

Tribunais já decidiram 16 condenações, a maioria relativa a indivíduos.