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As negociações do OE2021 estão presas pelo dossier do Novo Banco. Os bloquistas apresentaram uma solução técnica que passa por desafiar o Lone Star. Os socialistas dramatizam e garantem que a ideia é perigosa.
O Novo Banco e as suas necessidades de capital continuam a pressionar as negociações do Orçamento do Estado para 2021. Com ou sem avanços noutras áreas, o debate está extremado neste ponto: o que fazer quando a instituição liderada por António Ramalho formalizar mais uma chamada de capital, que acabará por aumentar o défice?
De um lado, o Bloco de Esquerda pede ao Governo que dê luta: que abra negociações com o Lone Star e que encontre uma forma de cobrir perdas que não implique dinheiro dos contribuintes. Do outro, levantam-se vozes de alerta: a solução técnica proposta pelos bloquistas pode pôr em causa o banco e concretizá-la implicaria furar o acordo da venda.
No final da semana passada a deputada Mariana Mortágua apresentou a proposta do BE : primeiro, há que fazer uma auditoria às contas do banco para perceber se as perdas que têm sido registadas – e usadas como argumento para as sucessivas chamadas de capital – têm razão de ser. E depois, mesmo que se verifique que é preciso injetar mais dinheiro na instituição financeira, quem deve fazê-lo são os bancos.
“É preciso garantir que qualquer injeção [no Novo Banco] é feita pelos bancos, não através de um empréstimo ao Fundo de Resolução, que é uma entidade pública, mas diretamente, através de uma capitalização do Novo Banco”, defendeu a bloquista.
A exigência do BE vai mais longe do que a resposta do Governo. O secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares confirmou que o Executivo está a trabalhar numa solução em que o Estado não precisa de emprestar dinheiro ao Fundo de Resolução para meter no Novo Banco – quem empresta são os outros bancos do sistema.
Mas a ideia do Governo não convence o BE já que, venha de onde vier o financiamento, se o Fundo de Resolução, uma entidade pública, colocar mais verbas no Novo Banco estas são registadas como despesa pública, fazendo subir o défice e representando um custo para os contribuintes.
A solução do BE
O que o BE propõe, na prática, é que os outros bancos coloquem dinheiro no Novo Banco, ficando em troca com uma participação no capital da instituição. Em contrapartida, o Lone Star, e eventualmente o Fundo de Resolução, veriam a sua participação diluída pelos novos acionistas. Nesta hipótese, o Fundo de Resolução não faz parte da equação e a troca do capital por participação diminui o peso da operação para as instituições financeiras que injetam o dinheiro. Na prática, não estariam a emprestar dinheiro ao Novo Banco, estariam a comprar uma fatia dele.
Os obstáculos
A proposta do BE está longe de ser simples de adotar. Partindo do princípio em que os bancos aceitavam fazer a tal injeção de capital, o expectável seria a oposição por parte da Lone Star. O fundo de investimento tem na sua posse um acordo que lhe permite ter exatamente o mesmo valor de injeção, mas sem perder um ponto que seja da sua participação na estrutura de capital do Novo Banco. Por que razão haveria de aceitar esta ideia?
“O Lone Star pode meter o Estado em tribunal”, diz uma fonte do mercado ao Negócios, lembrando que o acordo da venda prevê que os bancos sejam os pagadores últimos das perdas do Novo Banco, mas que estão, na prática e através do mecanismo de capital contingente, “subsidiados pelo Estado”.
Mas para os bloquistas, se o problema é o contrato, então há que lutar por alterá-lo, em vez de o Estado se submeter a perdas sucessivas. “O Lone Star está a fazer uma utilização abusiva do contrato”, argumentou Mariana Mortágua, na conferência de imprensa, colocando em cima da mesa a hipótese de fraude. “Não podemos permitir que o contrato se mantenha a custa do dinheiro dos contribuintes”, frisou.
Ou seja, há que enfrentar a Lone Star e procurar melhorar os termos do acordo. Se o Governo abrir uma luta com o fundo de investimento poderá agarrar-se aos escândalos que têm vindo a público sobre as perdas declaradas pelo banco, ou até mesmo à situação de pandemia, que pode servir de justificação para mudar as regras estabelecidas. Poderá argumentar que o mecanismo de capital contingente tinha uma validade de oito anos, mas que se prepara para ser esgotado em quatro. E pode pedir contas disso.
A dramatização
Perante a sugestão dos bloquistas, João Paulo Correia, vice-presidente da bancada socialista, deitou as mãos à cabeça: “Estas são soluções perigosas e que destroem o banco”, disse, em declarações ao Negócios, depois da conferência de imprensa do BE.
O socialista argumenta que chamar novos acionistas para o capital do banco seria o mesmo que assumir, perante o Mecanismo Único de Supervisão (MUS), que o plano estratégico da instituição, na base do qual são estabelecidos os rácios de capital, falhou. E nesse caso, garante, o MUS não teria outra opção se não aumentar os rácios de capital, criando ainda mais dificuldades ao banco.
Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares
Deputada do BE
Deputado do PS