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Sentença do Tribunal de Justiça Europeu sobre os documentos do BES
Quinta-feira, Outubro 22nd, 2020Tribunal da Relação anula despacho de Ivo Rosa e obriga-o a analisar declarações de Hélder Bataglia
Sexta-feira, Setembro 11th, 2020Citamos
Observador
Tribunal da Relação anula despacho de Ivo Rosa e obriga-o a analisar declarações de Hélder Bataglia
Juiz de instrução da Operação Marquês obrigado a analisar prova testemunhal de ex-líder da Escom sobre transferências relacionadas com José Sócrates, o seu primo e Ricardo Salgado.
O Tribunal da Relação de Lisboa deu razão ao Ministério Público e anulou uma vez mais um despacho de Ivo Rosa, censurando-o por “extravasar as suas competências”, por esquecer o que determina a jurisprudência e por confundir “conceitos jurídicos” básicos. Desta vez foi na Operação Marquês e no centro do acórdão assinado pelos desembargadores Ricardo Cardoso e Artur Vargues estão declarações relevantes de Hélder Bataglia, ex-líder da Escom, que o juiz que lidera a fase de instrução criminal da Operação Marquês terá agora de ter em conta na sua decisão instrutória, que deverá ser conhecida até ao final deste ano. É a 14.ª derrota para Ivo Rosa na Relação de Lisboa em menos de três anos.
As declarações de Bataglia foram proferidas no processo Monte Branco e dizem respeito ao esquema de branqueamento de capitais de Francisco Canas (o principal suspeito daquele processo, que morreu em janeiro de 2017) que alegadamente permitiu a transferência de cerca de dois milhões de euros para contas bancárias na Suíça controladas por Carlos Santos Silva (alegado testa-de-ferro do ex-primeiro-ministro José Sócrates) e por Armando Vara (ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos). Tais transferências são, segundo a acusação do Ministério Público, uma alegada contrapartida paga a José Sócrates e Armando Vara pela aprovação um crédito de mais de 197 milhões de euros na Caixa Geral de Depósitos para um grupo de investidores liderados por Bataglia comprarem o resort algarvio Vale do Lobo. Bataglia fez igualmente declarações sobre transferências para o primo de José Sócrates e para Ricardo Salgado através das suas sociedades offshore Green Emerald e Overview Investments.
Decisão “revela confusão de conceitos jurídicos” e “extravassa competências”
Ivo Rosa tinha decidido a 21 de junho de 2019 anular a prova testemunhal de Hélder Bataglia, argumentando que a lei apenas permite que as declarações prestadas num determinado processo sejam utilizadas como prova nos mesmos autos em que foram proferidas. Como as declarações de Bataglia tinham sido feitas no âmbito do caso Monte Branco, então não podiam ser transferidas para a Operação Marquês para “formar qualquer juízo de indiciação” na fase de instrução.
O procurador Rosário Teixeira recorreu para a Relação de Lisboa argumentando que o juiz Ivo Rosa estava a extrapolar e a invocar para a fase de instrução criminal uma norma que apenas é usada durante a fase de julgamento. “A valoração de determinado meio de prova em fase de julgamento é questão diversa da possibilidade de utilização desses mesmos meios de prova em fase de inquérito ou de instrução”, escreveu o procurador no seu recurso.
Os desembargadores Ricardo Cardoso e Artur Vargues deram total razão ao procurador Rosário Teixeira. Num acórdão sintético (apenas 25 páginas) mas assertivo, o relator Ricardo Cardoso censura o raciocínio jurídico do juiz Ivo Rosa.
Em primeiro lugar, os desembargadores dizem que a decisão de Ivo Rosa “revela a confusão de conceitos jurídicos, de competência e funções do juiz de instrução”. E porquê?
Porque Ivo Rosa invoca normas do Código de Processo Penal que “se reportam às regras da audiência de julgamento, pelo que a decisão recorrida subverte e antecipa para a fase de instrução uma norma dirigida e integrada no regime da fase de julgamento”.
Ou seja, e como o Ministério Público tinha argumentado, o juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal confunde conceitos jurídicos e “possibilidades de prova”, “sem querer perceber que o que está em causa é um mesmo objecto de prova e não um mesmo processo.”
Mais: de acordo com o relator do acórdão da Relação, Ivo Rosa “olvida o enunciado princípio de que o juízo de probabilidade razoável de condenação” aplicável “à pronúncia ou não pronúncia, não equivale ao juízo de certeza exigido ao juiz de julgamento na condenação”, escreve o desembargador Ricardo Cardoso.
Por isso, mesmo a Relação de Lisboa considera que, “ao pronunciar-se sobre a possibilidade de utilização em julgamento da prova por declarações como arguido de Hélder Bataglia constante da aludida certidão”, o juiz Ivo Rosa “extravasou a sua competência”, que está limitada pela lei, “violando a exclusiva competência do tribunal de julgamento pretendendo subtrair tal competência ao tribunal próprio dessa fase final ao efectuar a apreciação desses elementos de prova que só o juiz do julgamento tem competência para valorar”.
Por isso mesmo, os desembargadores Ricardo Cardoso e Artur Vargues declararam a nulidade insanável do despacho de Ivo Rosa que anulou a prova testemunhal de Hélder Bataglia e reafirmaram “a possibilidade de utilização como prova, em sede de instrução,” das declarações do ex-líder da Escom proferidas no caso Monte Branco.
Uma decisão idêntica já tinha sido tomada pela Relação de Lisboa em dezembro de 2019 em relação a um outro despacho de Ivo Rosa na Operação Marquês em que o juiz de instrução tinha determinado a anulação a transmissão da prova testemunhal de Ricardo Salgado no caso Universo Espírito Santo e Monte Branco.
BES: Constitucional nega desproporcionalidade nas multas a Salgado e Morais Pires
Terça-feira, Janeiro 14th, 2020Citamos
O Tribunal Constitucional (TC) tornou hoje público o acórdão que manteve as multas aos ex-administradores do Banco Espírito Santo (BES) Ricardo Salgado e Amílcar Morais Pires, rejeitando recursos que pediam a desproporcionalidade das coimas aplicadas.
No acórdão hoje publicado no ‘site’ do TC, assinado pelo juiz Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro, o órgão decidiu “não julgar inconstitucionais as normas indicadas nas alíneas d) a m) e o) do requerimento de recurso interposto por B., bem como a norma constante da 5.ª questão indicada por A. no seu requerimento de recurso”.
As normas indicadas nas alíneas d) a m) de um dos recursos pretendiam a declaração de inconstitucionalidade de várias normas do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), nomeadamente de várias alíneas dos artigos 210.º, 211.º, 213.º ou 215.º, “por violação do disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP [Constituição da República Portuguesa], que consagra o principio da proporcionalidade”.
Segundo o TC, num dos recursos, umas formulações “dizem respeito à hipótese de concurso de contraordenações, outras a contraordenações específicas; umas dizem respeito ao limite máximo de coima abstratamente aplicável, outras às coimas concretamente aplicadas e outras, ainda, a ambos”.
“Nunca seria possível cogitar a inconstitucionalidade do limite máximo de uma coima em razão da mera circunstância de ele exceder o máximo de multa permitido para casos de responsabilidade penal – o (único) enunciado normativo que, neste ponto, o recorrente traz à consideração deste Tribunal no seu recurso”, argumenta o TC no acórdão.
A instituição sediada no palácio Ratton considerou inclusivamente que “a falta de fundamento destas questões torna-se ainda mais manifesta quando se considera a circunstância de se estar aqui perante um domínio sancionatório que integra «ilícitos especialmente graves relacionados com a atividade de instituições de crédito e atividade financeira em que apenas pode estar em causa o perigo para os bens jurídicos ou já danos especialmente graves para a atividade financeira e para pessoas singulares»”.
Para o TC, “o potencial «prejuízo para o equilíbrio financeiro» destas instituições é muito elevado e tem como inerência igualmente elevados riscos sistémicos e que, por conseguinte, existem «várias e importantes razões» para se concluir que se «justificam limites bastante elevados para as coimas nesta área»”.
“Assim, não só não se afigura arbitrária […], como se afigura até absolutamente plausível a opção do legislador de lançar aí mão de elevadas coimas, sanções estas que – convém recordar, apesar de ser evidente –, ao contrário da pena de multa, são insuscetíveis de conversão em prisão subsidiária e em relação às quais, também por isto, aquela liberdade legislativa é significativamente mais ampla”, pode ler-se no acórdão.
O TC recusou o recurso do ex-presidente do BES Ricardo Salgado à contraordenação do Banco de Portugal, tendo o ex-banqueiro de pagar a coima de 3,7 milhões de euros.
A informação foi avançada no domingo à noite pelo político do PSD Luís Marques Mendes no seu comentário semanal no canal de televisão SIC e confirmada hoje pela Lusa junto de fontes ligadas ao processo.
Contactado pela Lusa, o Banco de Portugal indicou que não faz comentários sobre processos judiciais. A assessoria de Ricardo Salgado também não comenta.
Este processo diz respeito à falsificação das contas da Espírito Santo Internacional (ESI), ‘holding’ de controlo do Grupo Espírito Santo (com dívida escondida e sobreavaliação de ativos) e a venda de títulos de dívida dessa empresa a clientes do BES quando as contas estavam viciadas.
Após a decisão do TC, segundo fonte contactada pela Lusa, o processo vai seguir para o tribunal de Santarém, onde caberá ao Ministério Público tomar medidas para que se cumpra a condenação, nomeadamente o pagamento dos 3,7 milhões de euros por Salgado.
Amílcar Morais Pires recorreu da coima, tendo no seu caso o tribunal de Santarém baixado a multa de 600 mil para 350 mil euros e o Tribunal da Relação julgou totalmente improcedente o recurso.
Tribunal dá força à Patris para processar KPMG
Segunda-feira, Julho 8th, 2019Citamos
O Tribunal da Relação de Lisboa considera que o fundo de recuperação de créditos, gerido pela Patris, pode dar início a um processo para pedir uma indemnização à KPMG em nome dos clientes lesados do papel comercial do BES.
A Patris vai avançar com um processo contra a KPMG para pedir uma indemnização em nome dos clientes lesados do papel comercial do Banco Espírito Santo (BES). Uma decisão que ganhou força depois de o Tribunal da Relação de Lisboa ter concordado que o fundo de recuperação de créditos, gerido pela empresa e que representa os clientes do banco que desapareceu no verão de 2014, fica habilitado a avançar com esta ação.
“A KPMG ocultou do mercado a crescentemente gravosa situação financeira do Grupo Espírito Santo [GES] e a consequente perda do valor dos instrumentos financeiros das sociedades”, lê-se no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, com data de 9 de abril, a que o Negócios teve acesso. E continua: “Perante o que foi exposto ao mercado e aos investidores pela KPMG, o autor legitimamente confiou na solvabilidade do réu”, o que o levou a subscrever papel comercial do GES ao balcão do BES.
A auditora não pode, assim, “deixar de ser responsabilizada pela sua atuação culposa, impedindo o acesso do autor a demonstrações financeiras fidedignas e prejudicando a perceção dos riscos reais envolvidos na compra de instrumentos financeiros ou a sua aquisição posterior no mercado secundário”, refere ainda o acórdão. Foi com base nestes argumentos que o tribunal acabou por decidir contra a deliberação da primeira instância, que deu razão à KPMG. Para a auditora, o fundo de recuperação de créditos não poderia representar o cliente neste caso porque não estariam em causa créditos relacionados com a detenção de papel comercial, mas “sim com alegadas práticas indevidas da KPMG na qualidade de auditora e de revisora oficial” do BES. Porém, esta não é a posição da Relação de Lisboa, relembrando o que está definido na legislação que regula os fundos de recuperação: “O fundo tem perante os devedores dos créditos objeto de cessão e quaisquer entidades que tenham garantido ou que de outro modo sejam responsáveis pelo pagamento ou compensação dos prejuízos sofridos pelos cedentes os mesmos direitos que cabiam, legal e contratualmente, aos cedentes”, incluindo “quaisquer créditos indemnizatórios”. Ou seja, entre estas entidades inclui-se a KPMG enquanto auditora do banco até à sua resolução, em agosto de 2014.
“Demonstrando-se a culposa e gravíssima incúria da entidade que exercia na altura as funções de revisora oficial de contas”, a KPMG “terá de ser considerada como sujeito passivo da obrigação de indemnizar”, defende a Relação de Lisboa, garantindo que os “fundamentos invocados” são “legalmente inadmissíveis”.
Patris preparada para avançar
A decisão agora conhecida, de considerar o fundo de recuperação de créditos “habilitado” a prosseguir no processo principal em substituição do cliente lesado, dá agora força à Patris para avançar para tribunal contra a KPMG. E é isso mesmo que vai acontecer, conforme afirmou fonte do Fundo de Recuperação de Créditos de clientes do BES ao Negócios. O objetivo é pedir à KPMG uma compensação pelos danos sofridos pelos subscritores do papel comercial do GES, na qualidade de auditora da instituição financeira liderada por Ricardo Salgado.
Este não é, contudo, o primeiro processo que a empresa que gere o fundo coloca contra entidades ou pessoas relacionadas com o BES. O pedido de indemnização à KPMG segue-se a outras sete ações judiciais avançadas pela Patris, no valor global de 3.626 milhões de euros, contra o Banco Espírito Santo de Investimento – o antigo banco de investimento da família Espírito Santo e que é hoje o Haitong – e seis antigos administradores, conforme avançou o Jornal Económico, no início de junho. A cada um dos seis ex-administradores e entidade financeira são reclamados 518 milhões de euros. Estas ações juntam-se a ainda a outras que deram entrada em tribunal, no final de março, contra 58 antigos gestores do BES e do GES. Só este conjunto de ações judiciais supera os 30 mil milhões de euros.
Em conjunto com estes processos contra os ex-administradores e entidades envolvidas, admitiu-se ainda que, numa fase seguinte, o fundo de recuperação de créditos iria preparar mais ações contra os auditores, nomeadamente a KPMG e a EY, bem como pedidos de indemnização a seguradoras estrangeiras, devido aos seguros contratados por conta dos gestores do BES, como é o caso da Zurich.
Estes processos fazem parte da solução que foi assinada com o Governo, no final de 2016, numa tentativa de recuperar parte do dinheiro perdido em papel comercial das empresas do GES. Até agora, os clientes lesados já receberam mais de 200 milhões de euros.
Lesados com 200 milhões de euros
O Ministério das Finanças anunciou, no mês passado, que os lesados do papel comercial do BES receberam a segunda prestação, no valor de cerca de 76 milhões de euros, ao abrigo dos respetivos contratos de adesão ao Fundo de Recuperação de Créditos. Em comunicado, o Ministério adiantou que até junho de 2020 será paga a terceira (e última) prestação, à qual, tal como à segunda, foi “concedida uma garantia [do Estado] até a um máximo de 152,8 milhões de euros”. Com o pagamento da segunda tranche, os lesados já receberam um total de 203 milhões, o que representa mais de 70% do valor que será devolvido pelo fundo de recuperação de créditos gerido pela Patris. Os clientes com aplicações até 500 mil euros recebem 75% do seu investimento até um máximo de 250 mil euros. As colocações superiores a 500 mil euros vão ser devolvidas em 50% do seu valor.
Resolução do BES: ‘Garantia Angola’ nunca foi aceite pelo Banco de Portugal
Quinta-feira, Março 21st, 2019Citamos
O Banco de Portugal “nunca questionou a validade da garantia soberana”, mas acabou por não a considerar, aquando da resolução, porque faltavam dois anexos onde constavam os créditos e ativos imobiliários que estavam a ser cobertos pela garantia, impossibilitando o supervisor bancário nacional de proceder à análise da garantia soberana.
Era “firme, definitiva e irrevogável”, mas o Banco de Portugal não aceitou a conhecida ‘Garantia Angola’, no valor de 5,7 mil milhões de dólares, que o governo angolano, então liderado por José Eduardo dos Santos, deu ao Banco Espírito Santo Angola (BESA), filial do Banco Espírito Santo, no final de 2013.
Na altura, o montante da ‘Garantia Angola’ correspondia a cerca de 4,6 mil milhões de euros.
No acórdão do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa (TAC), que julgou improcedente o pedido de impugnação da deliberação de resolução do BES pelo supervisor bancário, de 3 de agosto de 2014, os juízes consideraram que resultou “claramente do probatório que o BES não forneceu ao Banco de Portugal (…) as informações necessárias à elegibilidade da [não aceitação da ‘Garantia Angola’] para efeitos prudenciais”.
Fonte próxima do processo explicou ao Jornal Económico que o BdP “nunca questionou a validade da garantia soberana”, mas acabou por não a considerar, aquando da resolução, porque faltavam dois anexos onde constavam os créditos e ativos imobiliários cobertos pela garantia, impossibilitando o supervisor bancário nacional de proceder à análise da garantia soberana.
O Tribunal deu como provado que, após insistência do BdP, o BES nunca entregou esses dois anexos.
De acordo com a mesma fonte, dois dias antes da resolução do BES, o Banco Nacional Angolano pôs em causa a garantia soberana, situação que foi comunicada ao BdP. O governo angolano acabou por revogar a garantia no dia 4 de agosto de 2014, um dia depois da resolução do BES.
Antes, no final de julho de 2014, o Banco Nacional de Angola, após inspeção ao BESA, descobriu a existência de créditos problemáticos que não estavam cobertos pela garantia soberana angolana.
Recorde-se que o acórdão foi votado por unanimidade por todos os 20 juízes do TAC de Lisboa sendo passível de recurso para as instâncias superiores.
O que relata o acórdão?
Apesar da complexidade do seu teor e da legislação citada, esta sentença faz um importante resumo do que se passou nos BES nos meses antes da resolução: nos finais de 2013, o BdP “intensificou vigilância” ao BES; em 14 de fevereiro de 2014 a proibição do BES de vender papel comercial do Grupo Espírito Santo (GES) sem autorização do banco central; a determinação em 14 de fevereiro de medidas de reforço dos rácios de capital (que leva ao aumento de capital de junho, de 1.045 milhões de euros); as medidas que obrigam à substituição dos administradores do BES em julho (destaque para a saída de Salgado e substituição pelo economista Vítor Bento, caindo a hipótese de subir a presidente Morais Pires, braço-direito de Salgado no banco).
A imposição em 22 de julho de uma provisão especial de 2.000 milhões de euros para riscos da exposição ao (GES); a fuga de depósitos que se intensifica após 10 de julho e que ascenderá a seis mil milhões de euros; a intimação em 29 de julho para um plano de recapitalização com recurso a fundos privados (nunca aconteceria porque, segundo o Banco de Portugal, anteriores interessados desapareceram); a apresentação, em 30 de julho de 2014, de prejuízos históricos de 3.557,3 milhões de euros, referentes ao primeiro semestre, mais 1.500 milhões de euros do que os comunicados em 10 de julho, devido à descoberta de perdas por recompra de obrigações próprias e de garantias prestadas a um credor da Venezuela (as cartas de conforto); e, por fim, a retirada pelo Banco Central Europeu do estatuto de contraparte ao BES, exigindo-lhe a devolução dos 10 mil milhões de euros que lhe tinha emprestado.
Todos estes eventos confluíram na resolução do BES, em 03 de agosto de 2014, considerando o tribunal que, perante solvabilidade insuficiente e falta de liquidez, “não havia um cenário alternativo [à resolução] que não fosse o da liquidação”, o que seria ainda pior já que, além de ter custos para os credores e acionistas, prejudicaria ainda “o erário público e bem assim o contribuinte e ainda o depositante”.
Quanto à alternativa de injeção de dinheiro pelo Estado, diz o tribunal que isso teria de ser uma decisão do Governo, não do Banco de Portugal, e que mesmo essa só teria benefícios para os credores subordinados e os acionistas.
Os principais fundamentos da decisão do tribunal a favor do BdP na resolução do BES
Quarta-feira, Março 20th, 2019Citamos
O Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa decidiu a favor do Banco de Portugal quanto à resolução do BES, referindo factos em torno da atuação do regulador, mas também da instituição financeira.
Atuação do Banco de Portugal
A justiça nota que,”desde os finais de 2013, que o Banco de Portugal intensificou a vigilância sobre o BES” e que “não se poderia exigir” ao banco liderado por Carlos Costa, “no quadro da regulação, uma atuação diferente da que teve”.
Informação divulgada
Quanto à informação que foi revelada pelo Banco de Portugal antes da medida de resolução, em agosto de 2014, o tribunal considerou que “toda e qualquer comunicação ou exteriorização por parte do Banco de Portugal, anterior a 28 de julho [de 2014] é certa, correta e verdadeira, face aos dados de que dispunha naquelas datas”.
Atuação do Banco Espírito Santo
Já sobre a ação do banco então liderado por Ricardo Salgado, o Tribunal Administrativo verificou “ocultação ou simulação de dados contabilísticos” fornecidos pelo BES. E que esta “situação de desconformidade e ocultação nas contas do BES da verdadeira realidade em que se encontrava desde o início de 2014 (…) só veio ao conhecimento do Banco de Portugal nos cinco dias anteriores ao da apresentação de resultados no dia 30 de julho de 2014”.
Necessidade de resolução
“Perante as concretas circunstâncias em que o BES se encontrava, não havia um cenário alternativo” ao da resolução, refere o tribunal no acórdão, que considera que “ainda que a medida de resolução seja um remédio muito forte, não significa que o cenário alternativo não seja ainda pior, o da ‘morte imediata’ de um banco através de um processo de liquidação imediato e desordenado”.
Fundamentação
Os autores dos processos acusam o Banco de Portugal de falta de fundamentação quanto à decisão tomada no verão de 2014. Relativamente a esta questão, o tribunal deixa claro que o banco “fundamentou suficientemente” e que a medida de resolução foi “razoável”.
Constituição de provisões
Quanto à imposição de constituição de provisões de dois mil milhões de euros ao BES, que Ricardo Salgado considerou ilegal, o tribunal explica que este passo foi dado “após análise e ponderação dos dados fornecidos na sequência” de várias diligências.
“Garantia angola”
O BES Angola tinha uma garantia soberana do Estado angolano, que não chegou a ser acionada. Sobre esta questão, a justiça considera que “quanto ‘à não aceitação da Garantia Angola’ e bem assim da falta de elegibilidade ao nível prudencial, resulta claramente do probatório que o BES não forneceu ao Banco de Portugal – não obstante a insistência deste último para o efeito – as informações necessárias à elegibilidade da mesma para efeitos prudenciais”, não estando em causa a validade da garantia.
Novo Banco: Resolução julgada legal e constitucional pelo Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa
Domingo, Março 17th, 2019Citamos
“Perante as circunstâncias em que o BES se encontrava, não havia um cenário alternativo (à resolução) que não fosse a liquidação do BES, pois não mantinha sequer condições de manter o exercício da atividade, sendo totalmente hipotético e inverosímil qualquer outro cenário que não aquele”, diz o acórdão.
O Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa considerou que a resolução do Banco Espírito Santo respeitou a lei e a Constituição ao ter julgado improcedente a ação apresentada por um conjunto de acionistas e investidores do BES, noticiou o jornal Expresso.
Os autores da ação apresentaram uma ação contra o Banco de Portugal (BdP) e pretendiam a “reversão” resolução do BES efetuada pelo regulador bancário em agosto de 2014, que criou o Novo Banco e separou os ativos tóxicos do banco resolvido. “Na impossibilidade de uma reversão da resolução querem ser ressarcidos”, lê-se.
O Tribunal julgou infundados os argumentos de inconstitucionalidade apresentado pelos autores – que incluía um conjunto de fundos e de entidades gestoras internacionais – como “a violação da reserva legislativa do Parlamento, a violação do direito de propriedade privada e dos princípios da igualdade e da justa indemnização”.
O colégio de juízos, composto por 20 magistrados e que deliberou de forma unânime, rejeitou ainda “as múltiplas ilegalidades imputadas à deliberação [de Resolução], nomeadamente a violação dos princípios da boa-fé, da proteção da confiança e da proporcionalidade, assim como disposições do direito europeu”.
A sentença do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa ainda é passível de recurso e aproveita mais 24 processos similares, na medida em que o órgão de justiça utilizou o mecanismo de resolução de processos em massa, previsto no Processo dos Tribunais Administrativos, que permite estender a decisão de uma determinada ação a outras ações cujas matérias de direito essencial sejam idênticas – neste caso, impugnar a deliberação de resolução do BES pelo BdP no dia 3 de agosto de 2014.
O acórdão, que serve de jurisprudência para as ações pendentes, diz que “a resolução era a única alternativa e acusa a gestão de Salgado de ocultação ou simulação de dados contabilísticos”.
Os juízes concordaram que o “BdP intensificou a sua vigilância sobre o BES desde finais de 2013” e que, “perante as circunstâncias em que o BES se encontrava, não havia um cenário alternativo (à resolução) que não fosse a liquidação do BES, pois não mantinha sequer condições de manter o exercício da atividade, sendo totalmente hipotético e inverosímil qualquer outro cenário que não aquele”.
Relação decide que Novo Banco que tinha custódia de títulos da PT devia ter alertado clientes para factos relevantes do emitente
Quinta-feira, Janeiro 31st, 2019Citamos
“O tribunal veio tomar uma decisão histórica ao admitir que o banco que tenha sob sua custódia títulos tem o dever de informar o seu cliente das vicissitudes atinentes [relativos] à entidade emissora suscetíveis de se repercutirem negativamente nos resultados e solidez do produto adquirido”, diz o advogado a propósito deste Acórdão do Tribunal da Relação.
O Tribunal da Relação, num acórdão que data de 8 de janeiro, considera que os bancos que tinham à sua guarda obrigações da Portugal Telecom tinham de avisar clientes de factores da entidade emitente suscetíveis de se repercutirem negativamente nos resultados e solidez do produto adquirido.
O acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa a que o Jornal Económico teve acesso refere na sua decisão que “o banco [cujo nome foi deliberadamente ocultado no documento enviado, mas que o jornal sabe ser o Novo Banco], enquanto intermediário financeiro, sabia que tinha ocorrido uma alteração do emitente [da PT para a Oi] tal como sabia que tinha sido antecipada a maturidade dos produtos para quem pretendesse exercer esse direito, de 27 de julho de 2016 para 30 de junho de 2015, bem como estava a par da degradação económico-financeira da Oi e suas subsidiárias, inclusive da, PTIF [Portugal Telecom International Finance”. Ora “ao omitir tal informação, o Réu [Novo Banco] impediu o Autor [da ação] de tomar decisões a que tinha direito, de forma esclarecida e livre”, diz o acórdão.
A decisão do Tribunal da Relação surge na sequência de um recurso, interposto pelo lesado com títulos da PT (autor desta ação judicial), a uma decisão do Tribunal da Primeira Instância, que ilibava o Novo Banco de qualquer responsabilidade pelas perdas com obrigações da PT, por entender que é necessário que exista entre o cliente e o Banco um contrato ou de gestão de carteiras ou de consultoria para investimento. E que, portanto, a mera custódia de títulos não dava ao banco deveres de informar os seus clientes sobre determinados factos relevantes para a evolução do valor dos títulos.
O autor da ação recorreu para a segunda instância e o Tribunal da Relação deu razão ao Recurso e “desmente” a decisão do Tribunal da Primeira Instância e por isso o tribunal vai ter de voltar a julgar o caso.
“Na pendência da execução de um contrato de depósito e registo de instrumentos financeiros, o intermediário financeiro e custodiante não pode alhear-se das vicissitudes atinentes à entidade emissora das obrigações bem como à alteração da maturidade dos produtos, fatores suscetíveis de se repercutirem negativamente nos resultados e solidez do produto adquirido, cabendo-lhe informar o investidor de modo a habilitá-lo a poder adotar, tempestivamente, condutas que minimizem ou previnam riscos não despiciendos e conhecidos, que ameacem a normal conservação e frutificação dos instrumentos financeiros”, lê-se no acórdão.
“Nesta medida, e atentas as soluções plausíveis da questão de direito substantiva, justifica-se que os autos prossigam na 1ª instância com a realização de audiência prévia tendo em vista a seleção dos temas da prova atinentes à conduta imputada pelos Autores ao Réu , posteriormente à Medida de Resolução do Banco de Portugal”, lê-se no acórdão.
A decisão do Tribunal da Relação é a seguinte: “Pelo exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação, ordenando-se que os autos prossigam na 1ª instância com realização de audiência prévia tendo em vista a seleção dos temas da prova atinentes à conduta imputada pelos Autores ao Réu, posteriormente à Medida de Resolução do Banco de Portugal, com tramitação dos termos normais subsequentes”. E ainda, “no mais, julga-se improcedente a apelação. Custas pela apelante e pela apelada, na proporção de 50%, na vertente de custas de parte (Artigos 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº6 e 663º, nº2, do Código de Processo Civil)”, refere a decisão.
Recorde-se que na Resolução do BES, em agosto de 2014, o Banco de Portugal previu explicitamente que não havia transferência de responsabilidades do Banco Espírito Santo para o Novo Banco. No entanto esta “alteração do garante da emissão de obrigações (da PT para a Oi), ocorre já em 2015, no tempo do Novo Banco.
O advogado Ricardo Marques Candeias, managing partner da Candeias & Associados, que acompanha mais de 700 credores da PT, com valores representativos na ordem dos 25 milhões de euros, e que em Portugal representa judicialmente 160 lesados com títulos no valor de 9,5 milhões de euros, citou o caso de uma decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de início de janeiro deste ano, para defender que, os lesados com títulos da Portugal Telecom podem reclamar indemnizações aos bancos.
“O tribunal veio tomar uma decisão histórica ao admitir que o banco que tenha sob sua custódia ações e obrigações tem o dever de informar o seu cliente, possuidor desses títulos, das vicissitudes atinentes [relativos] à entidade emissora suscetíveis de se repercutirem negativamente nos resultados e solidez do produto adquirido”, diz o advogado.
Ricardo Candeias diz que esta “é uma decisão histórica e de consideráveis proporções” pois o Tribunal Superior “refere claramente que basta a custódia dos títulos para recair sobre o Banco esse dever. Não é necessário que exista entre o cliente e o Banco um contrato por exemplo de gestão de carteiras ou de consultoria para investimento”
“O tribunal veio tomar uma decisão histórica ao admitir que o banco que tenha sob sua custódia ações e obrigações tem o dever de informar o seu cliente, possuidor desses títulos, das vicissitudes atinentes [relativos] à entidade emissora suscetíveis de se repercutirem negativamente nos resultados e solidez do produto adquirido”, diz o advogado.
“Esta decisão coincide com o entendimento sempre defendido pela Candeias & Associados, Sociedade de Advogados, de que, no caso da Portugal Telecom, os subscritores de obrigações deveriam ter sido informados pelos Bancos que tinham a custódia dos seus títulos das várias vicissitudes que foram surgindo ao longo dos últimos cinco anos naquela empresa e suas participadas, nomeadamente o não reembolso dos cerca de 900 milhões de dívida Rio Forte, a venda da PT Portugal à Altice, bem como a alteração do garante (PT para Oi) nas obrigações emitidas pela PT e pela Portugal Telecom International Finance (PTIF)”, adinata o advogado.
Diz ainda Ricardo Candeias, que “ao tomar esta decisão o Tribunal abre claramente a possibilidade de também os acionistas da PT poderem exigir indemnizações aos bancos em que tinham a custódia dos seus títulos por não terem sido informados das várias vicissitudes que ocorreram com aquela empresa ao longo dos seus últimos anos, isto é, pelo menos, desde 2013”.
Existem 900 milhões de ações da Pharol, antiga PT, e Ricardo Marques Candeias, managing partner da Candeias & Associados considera que a desvalorização média ocorrida nas ações PT desde 2014, ou seja, a diferença entre o valor pelo qual adquiriram as ações e a cotação atual, é de cerca de 3,23 euros por ação. Isto significa que os bancos custodiantes podem ser responsabilizados a pagar um valor total que ronde os 2,9 mil milhões de euros aos seus clientes titulares de ações PT. “Por exemplo, um acionista PT que tenha tido em 10.000 ações da PT em janeiro de 2014 pode ser indemnizado pelo seu banco no valor de 32.300 euros”, diz o advogado.
Para Ricardo Marques Candeias, esta decisão do Tribunal da Relação terá um considerável impacto nos processos judiciais pendentes em que lesados titulares de obrigações emitidas pela PT pedem indemnizações aos bancos, exactamente por não terem sido informados das vicissitudes que ocorreram com a PT desde, pelo menos, 2013″.