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Novo Banco. O que pode fazer cair António Ramalho

Sábado, Janeiro 15th, 2022

Citamos

Observador

 

Novo Banco. O que pode fazer cair António Ramalho

Pressionado pela divulgação das escutas feitas numa investigação tributária, António Ramalho está a ser avaliado segundo regras de idoneidade que foram reforçadas pelo BCE há poucas semanas.

O BCE aprovou há poucas semanas, no final de 2021, um novo código para avaliar a idoneidade dos candidatos a gestores bancários, incluindo os que já estejam em funções. Essas novas “linhas orientadoras”mais exigentes e detalhadas, são a base sobre a qual o supervisor está a avaliar a idoneidade de António Ramalho que, como o próprio presidente do Novo Banco assinalou, está sob escrutínio constante. Ou seja, Ramalho — sob pressão pelas notícias de uma investigação conduzida pela inspeção tributária, cujas escutas vieram a público — recebeu um novo ok do supervisor em junho de 2021, mas é contínua a análise ao nível do chamado “fit and proper” – os critérios que procuram garantir que os responsáveis cumprem os critérios de capacitação e conduta necessários.

Embora a legislação subjacente não tenha mudado, estas novas “linhas orientadoras” contêm algumas diferenças e clarificações na forma como se deve procurar assegurar que os órgãos sociais das instituições de crédito “sejam compostos de forma a contribuir para uma gestão eficaz da instituição e uma tomada de decisões equilibrada”. Até porque, como diz o próprio Banco Central Europeu (BCE), “isso tem impacto não apenas na segurança e solidez da instituição de crédito em causa mas, também, do setor bancário como um todo, já que reforça a confiança do público em geral em relação às pessoas responsáveis pela gestão do setor financeiro da zona euro”.

O artigo 94.º da regulamentação do BCE fala sobre a “análise permanente da idoneidade dos gestores“, que estabelece que os bancos têm obrigação de informar, “sem demora injustificada”, a autoridade de supervisão nacional “de quaisquer factos novos que possam afetar a avaliação inicial da idoneidade ou de qualquer outra gestão que possa ter impacto sobre a idoneidade de um gestor logo que estes factos ou questões sejam do conhecimento da entidade supervisionada ou do gestor em causa”. Essa autoridade de supervisão nacional, neste caso o Banco de Portugal, tem, depois, de “notificar” o BCE desses factos, também “sem demora justificada”.

Poucos dias depois de as escutas terem sido reveladas, o Banco de Portugal garantiu que está atento e assegurou que sempre “toma a iniciativa de partilhar com o BCE toda a informação relevante sobre instituições significativas logo que a mesma chegue ao seu conhecimento e articula com o BCE de modo a permitir uma decisão ponderada sobre eventuais diligências a adotar”. O BCE veio, depois, reconhecer que já estava a “investigar” este assunto, que é “recente”, em declarações noticiadas primeiro pelo jornal Público

Depois dessa investigação, “o BCE decidirá, então, as medidas adequadas a aplicar nos termos da legislação nacional ou da União aplicável e informará a ANC relevante [Autoridade Nacional Competente, ou seja, o Banco de Portugal] destes factos sem demora injustificada”, define o ponto 2 desse artigo (94.º). E essa decisão será sempre feita à luz das ideias que estão expressas nas linhas orientadoras do supervisor, onde se inclui que “os membros dos órgãos sociais têm, a todo o momento, de ter uma reputabilidade suficientemente boa“, o que se verifica “se não houver quaisquer fundamentos objetivos e demonstráveis para sugerir outra coisa“.

Crimes, processos civis mas, também, “outros tipos de investigação”

As novas linhas orientadoras já estão em vigor, como confirmou fonte oficial do BCE ao Observador, e um ponto que densificaram é que “um candidato não é considerado de boa reputabilidade se a sua conduta pessoal ou profissional gera quaisquer dúvidas materiais sobre a sua capacidade de assegurar uma gestão saudável e prudente da instituição”. O BCE vai mais longe neste ponto, nas novas guidelines, acrescentando que “sem prejuízo de quaisquer direitos fundamentais, os registos criminais e administrativos são tidos em conta para a avaliação da boa reputabilidade, honestidade e integridade”.

Porém, o BCE nota que é frequente encontrar situações em que um determinado candidato ou responsável “está a ser, ou foi, alvo de procedimentos criminais, administrativos ou civis” mas, também, sublinha-se, “em outros tipos de investigação regulatória”. Neste ponto, “embora a presunção de inocência seja aplicável aos procedimentos criminais, o próprio facto de que um indivíduo está a ser acusado é relevante”.

Não existe qualquer acusação no caso de António Ramalho, nem está em causa qualquer tipo de “registo criminal” ou “administrativo”. Apenas veio a público um relatório de inspeção tributária noticiado pela revista Sábado onde as escutas feitas no processo levam o inspetor a concluir que houve uma “concertação” de posições entre o banco credor e Luís Filipe Vieira e que António Ramalho quis encontrar-se com o ex-presidente do Benfica poucos dias antes da sua audição parlamentar, para “preparar” o “Luís” para esse momento.

Mas determinar se os dados tornados públicos podem ser incluídos num “outro tipo de investigação regulatória” caberá ao BCE avaliar no processo que está em curso.

As escutas não surgiram no âmbito de uma investigação ao próprio Ramalho. O presidente do Novo Banco foi escutado em conversas com pessoas que, essas sim, estavam sob investigação, como o ex-administrador Vítor Fernandes. Ainda assim, as regras do BCE dizem que “nessa avaliação deve ser tida em conta toda a informação existente, relacionada com a conformidade do candidato, bem como a fase dos procedimentos e o peso das provas da alegada conduta imprópria”.

Em todo o momento, diz o BCE, entre a informação que tem de ser tida em conta por um candidato a gestor bancário (ou gestor em funções) está sempre informação relacionada com “investigações, procedimentos legais ou de supervisão ou sanções por parte de autoridade competente em que o candidato tenha estado envolvido”.

BCE exige a banqueiros “os mais elevados padrões de conduta”

O BCE determina que estes processos não se devem limitar apenas a investigações criminais. É tida em conta “informação sobre procedimentos criminais, administrativos ou civis (incluindo decisões disciplinares” mas, também, sobre quaisquer “investigações” ou “procedimentos sancionatórios”. Nas regras diz-se que, mesmo que não existam procedimentos de acusação criminal, a avaliação da reputabilidade do gestor pode basear-se em “outros factos relevantes“.

E é nesse ponto, quando se afirma que “um candidato deve cumprir elevados padrões de integridade e honestidade“, que o BCE inclui uma referência – nas novas regras aprovadas em dezembro de 2021 – sobre a relevância de “quaisquer evidências de que o candidato não tem sido transparente, aberto e cooperante” na sua relação com “as autoridades competentes”, onde se pode incluir a Assembleia da República e uma comissão parlamentar de inquérito.

Em entrevista à CNN Portugal, António Ramalho recusou qualquer tentativa de condicionar os trabalhos da comissão parlamentar de inquérito, nem relativamente a Luís Filipe Vieira nem a outras audições como a de Rui Fontes, chief risk officer do Novo Banco (que já vinha do tempo do BES), sobre o qual Ramalho terá dito que estaria a ser treinado por uma agência de comunicação e que “está muito bem preparado, vai ser monocórdico e chato, porque os gajos [os deputados] não vão perceber nada do que ele vai dizer“.

O BCE tem em conta “quaisquer provas que sugiram que o candidato atua ou atuou de uma forma que não é compatível com os mais elevados padrões de conduta“, pode ler-se na página 21 das novas regras disponíveis nesta ligação (em inglês). Essas provas podem ter origem em “quaisquer factos que sejam do domínio público“, acrescenta o supervisor.

Gestores têm de agir de forma livre de “conflitos de interesse”

O que as regras também preveem – neste caso já o previam na versão anterior destas “linhas orientadoras”, de 2018 – é que o gestor tem de atuar livre de “conflitos de interesse” e “independência de espírito”. Na definição que é feita pela legislação europeia, os gestores têm de ter certas características “comportamentais” como, por exemplo, a “coragem” de desafiar propostas de outros gestores, ou seja, conseguir “resistir ao efeito-manada” – mas, também, está previsto nas regras que o gestor não pode ter “conflitos de interesse a um nível que limitem a sua capacidade de cumprir os seus deveres de forma independente e objetiva”.

António Ramalho sublinhou, na reação televisiva, que o seu “dever fiduciário” está acima de qualquer suspeita, recusando que tenha atuado com outro intuito que não a proteção dos interesses do banco e dos seus acionistas – isto é, o fundo Lone Star e o Fundo de Resolução, que tem 23,4% do capital da instituição (reduziu a sua posição quando o Estado ficou diretamente com 1,56%) mas está contratualmente obrigado a ressarcir integralmente o banco em perdas reconhecidas num determinado perímetro de ativos problemáticos.

Neste ponto, salienta uma fonte do setor financeiro ouvida pelo Observador, António Ramalho terá de conseguir provar, por exemplo, que outros bancos credores das mesmas empresas (ligadas a Vieira) geriram as reestruturações e vendas de crédito de forma semelhante, ou seja, que o ex-presidente do SL Benfica não beneficiou de qualquer vantagem na sua relação com o Novo Banco em comparação com aquilo que teve com outros bancos. No caso da empresa Imosteps, o BCP aceitou um acordo semelhante, o que é um trunfo para o gestor, como o próprio sublinhou na entrevista à CNN Portugal.

As fontes ouvidas pelo Observador, conhecedoras destes processos, não antecipam uma decisão rápida por parte do BCE, dado que são informações recentes e de interpretação complexa. Porém, paralelamente a esse processo, já está em curso uma averiguação interna por parte do banco – Ramalho já confirmou que enviou uma carta ao departamento de compliance da instituição, que tem a obrigação estatutária de garantir o cumprimento de todas as regras regulatórias e legais a que o banco está sujeito.

Assim que o departamento de compliance terminar esse trabalho, produz um relatório que ascende aos órgãos de controlo superiores da instituição. No caso do Novo Banco, de acordo com o seu organograma estatutário, quem irá receber o relatório é o Conselho Geral e de Supervisão, liderado pelo chairman Byron Haynes, que também foi ouvido na comissão de inquérito às perdas do Novo Banco imputadas ao Fundo de Resolução, que decorreu ao longo de 2021.

As regras da supervisão preveem que, antes de qualquer outra consideração, o próprio banco é sempre responsável e responsabilizável pelos administradores que nomeia. Até ao momento, Byron Haynes, como representante-máximo da Lone Star no conselho geral do Novo Banco, tem mostrado um alinhamento pleno com a gestão da comissão executiva liderada por António Ramalho. “Mas se o BCE sinalizar que não vê o que aconteceu como um caso isolado, sem implicações mais vastas sobre a conduta do banqueiro, a última coisa que o banco quererá é comprar uma guerra com o supervisor“, comenta uma das fontes do setor financeiro ouvidas pelo Observador.

A partir daqui, o BCE pode abrir um processo de reavaliação de idoneidade ou nem sequer chegar a esse ponto, se considerar que não há elementos suficientemente sólidos. Caso opte, mesmo, por abrir um processo desse género, ele poderá acabar com um arquivamento ou, então, com um chumbo. Mas não existem muitos casos na Europa de chumbos formais de idoneidade – até porque, como explicou uma das fontes ouvidas, “nestas coisas, quando alguém percebe que enfrenta a resistência do supervisor, normalmente acaba por sair pelo próprio pé, porque é do seu interesse fazê-lo – também em Portugal isso já aconteceu muitas vezes”.

Nesta fase, sabe o Observador, António Ramalho tem colocado a tónica deste processo da sua própria pessoa, argumentando que é algo que não afeta o Novo Banco como instituição. Isto apesar da pressão política: o Bloco de Esquerda colocou em causa a conduta de António Ramalho e alegou que estas questões podem colocar em causa todo o processo de venda e saneamento da instituição, apoiado pelos contribuintes. Também no PS, esta sexta-feira um dos deputados da comissão parlamentar, João Paulo Correia, defendeu que o “Fundo de Resolução deve ponderar abrir um processo contra o Novo Banco”.

BCE continua preocupado com a viabilidade do Novo Banco

Domingo, Junho 6th, 2021

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jornaldenegocios.pt/empresas/banca—financas/detalhe/bce-continua-preocupado-com-a-viabilidade-do-novo-banco

O BCE continua preocupado com a viabibilidade do Novo Banco, segundo o relatório de 2020 da Comissão de Acompanhamento a que a Lusa teve acesso, desde logo devido ao quase esgotamento dos recursos do Fundo de Resolução.

De acordo com o Relatório de Atividade da Comissão de Acompanhamento do Novo Banco, Frankfurt enviou uma carta ao banco em que fala do “quase esgotamento” dos 3.850 milhões de euros do mecanismo de capital contigente que tem suportado o capital do banco desde 2017 e em que “refere que a viabilidade do Novo Banco continua a ser um ‘key concern’ [motivo de preocupação]”.

O BCE, acrescenta a Comissão de Acompanhamento, “mostra preocupação pela ‘frágil posição de solvência’ do banco, uma vez que este está muito exposto à evolução do crédito malparado e do imobiliário bem como a setores empresariais muito afetados pela crise pandémica.

Assim, o BCE pediu ao Novo Banco que “lhe submeta um conjunto de medidas suscetíveis de assegurar a observância dos requisitos de capital, incluindo o Pilar 2 Guidance”, lê-se no relatório.

O banco central pede um plano de médio prazo atualizado até 26 de fevereiro de 2021 “com identificação dos seus pressupostos, projeções das contas e análises de sensibilidade que reflitam diversos desenvolvimentos possíveis dos cenários micro e macro económicos”.

O relatório de 2020 da Comissão de Acompanhamento indica que o Plano de Médio Prazo para 2021-2023 do Novo Banco espera lucros de 154 milhões de euros em 2021, de 279 milhões de euros em 2022 e de 288 milhões de euros em 2023, suportando-se para esses resultados na descida das provisões.

O Novo Banco nasceu em agosto de 2014 na resolução do Banco Espírito Santo (BES).

Em 2017, aquando da venda de 75% do banco à Lone Star (que não pagou qualquer preço tendo injetado 1.000 milhões de euros), foi criado um mecanismo de capitalização contingente pelo qual o Fundo de Resolução se comprometeu a, até 2026, cobrir perdas com ativos ‘tóxicos’ com que o Novo Banco ficou do BES até 3.890 milhões de euros.

O Novo Banco já consumiu até ao momento 2.976 milhões de euros de dinheiro público ao abrigo deste mecanismo de capitalização.

Na semana passada, o ministro das Finanças, João Leão, disse que o Novo Banco deverá receber este ano mais 429 milhões de euros do Fundo de Resolução, abaixo dos 598 milhões de euros pedidos pelo banco.

Se ao valor já consumido pelo Novo Banco (2.976 milhões de euros) se somarem os 429 milhões de euros referidos pelo ministro das Finanças, o Novo Banco passa a ter recebido 3.405 milhões de euros, ou seja, 87,5% do valor que estava previsto no mecanismo de capitalização.

António Ramalho ainda sem OK do BCE para novo mandato no Novo Banco

Quarta-feira, Março 24th, 2021

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Expresso

Após saídas motivadas por divergências com acionista, nova gestão — praticamente igual — ainda não tem nova autorização

Os americanos da Lone Star já reconduziram António Ramalho para permanecer à frente dos destinos do Novo Banco até 2024, mas o Banco Central Europeu (BCE) ainda não deu a obrigatória autorização. Apesar de eleito em outubro, é ainda a terminar o anterior mandato, sem a luz verde do supervisor, que Ramalho vai pedir mais centenas de milhões ao Fundo de Resolução.

Tribunal de Justiça volta a dar razão ao BCE no caso que o opõe à ESFG

Quarta-feira, Outubro 21st, 2020

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Negócios

O BCE rejeita conceder acesso aos documentos relativos a decisões tomadas nos últimos dias do BES. O Tribunal de Justiça europeu volta a dar-lhe razão.

A Espírito Santo Financial Group (ESFG), empresa do antigo Grupo Espírito Santo (GES), voltou a perder em tribunal contra o Banco Central Europeu (BCE). Em causa está a recusa do regulador da banca europeia em conceder acesso a algumas partes de documentos relativos a decisões tomadas nos últimos dias do Banco Espírito Santo (BES).

A decisão é do Tribunal de Justiça da União Europeia e foi proferida esta quarta-feira, 21 de outubro, e é já o segundo processo que a ESFG perde contra o BCE.

O caso remonta a 2014, quando o BES começou a recorrer às operações de crédito do Eurosistema, recebendo, a partir de 17 de julho desse ano, liquidez de emergência cedida pelo Banco de Portugal. O BCE começou por não se opor a esta medida, impondo um limite máximo ao montante de crédito que poderia ser cedido ao BES.

Mais tarde, a 1 de agosto de 2014, o BCE decidiu suspender o estatuto do BES de contraparte da política monetária do Eurosistema, impedindo o banco de aceder aos instrumentos de crédito que permitiam que continuasse a operar. Esta decisão obrigou o banco a pagar a totalidade da sua dívida ao Eurosistema, de 10 mil milhões de euros. O banco não conseguiria cumprir esta obrigação e, dois dias depois, seria alvo de uma medida de resolução.

A Espírito Santo Financial (ESF), detida pela ESFG, maior acionista do BES, entrou então em processo de insolvência e pediu ao BCE para aceder aos documentos relativos àquela decisão. O BCE concedeu um acesso apenas parcial a estes documentos, omitindo, entre outros factos, os montantes do crédito que foram concedidos ao BES, bem como o limite máximo de crédito que tinha sido imposto.

É nesta altura que surgem os processos judiciais. Há dois: o primeiro é iniciado 2015, quando a ESF veio exigir ao BCE o acesso total aos documentos relativos à decisão de 1 de agosto de 2014. Esse já foi concluído no final do ano passado, com o Tribunal de Justiça europeu a dar razão ao BCE.

Mas também este pedido acabou por cair. No ano passado, o Tribunal Geral da União Europeia chegou a anular a decisão do BCE de negar o acesso aos documentos requeridos. Contudo, o regulador europeu contestou esta decisão no Tribunal de Justiça europeu, que decide agora anular a decisão do Tribunal Geral.

No acórdão agora conhecido, o Tribunal de Justiça considera que o Tribunal Geral cometeu um erro ao ter julgado que o BCE não justificou a decisão de negar o acesso aos documentos, já que os Estatutos do BCE determina, precisamente, que o conteúdo das reuniões do Conselho do BCE é confidencial. Tornar público o o conteúdo destas decisões é, assim, totalmente facultativo.

Governo pediu ao Novo Banco para só requerer 400 milhões ao Fundo de Resolução em 2021

Domingo, Outubro 4th, 2020

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Económico

A revelação foi feita por Francisco Louçã, fundador do Bloco de Esquerda, no habitual comentário da SIC. Louçã diz que “a solução de não entregar agora ao Estado mas pedir uma autorização orçamental para o Fundo de Resolução fazer este pagamento com empréstimo dos bancos, não passa no Parlamento”. Mas não acredita que o Novo Banco faça cair o Governo e abra uma crise política.

O fundador do Bloco de Esquerda, Francisco Louçã, revelou esta sexta-feira, no seu habitual comentário da SIC, que o Governo propôs ao Novo Banco só pedir 400 milhões de euros ao Fundo de Resolução (FdR) em 2021 por conta das necessidades de capital apuradas em 2020. Desta forma, o Novo Banco pediria um montante mais baixo e portanto mais próximo do valor que o Fundo de Resolução tem disponível em recursos próprios. Os recursos do FdR provêm, essencialmente, das receitas provenientes da contribuição sobre o setor bancário, das contribuições iniciais e periódicas entregues pelas instituições participantes, bem como dos rendimentos da aplicação de recursos.

O Fundo recebeu 253,8 milhões de euros em contribuições “provenientes, direta ou indiretamente, do setor bancário” em 2019 e destes 185 milhões foram usados para injectar os 1.035 milhões na capitalização do Novo Banco ao abrigo do Acordo de Capitalização Contingente. Os restantes 850 milhões foram emprestados pelo Estado ao abrigo do acordo-quadro que foi aprovado em Conselho de Ministros, em outubro de 2017, numa resolução assinada diretamente pelo primeiro-ministro. Esse Conselho de Ministros autorizou o “Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, a celebrar, pelo Estado Português, enquanto garante último da estabilidade financeira, um acordo-quadro com o Fundo de Resolução, com vista à disponibilização de meios financeiros ao Fundo de Resolução, se e quando se afigurar necessário, para a satisfação de obrigações contratuais que venham eventualmente a decorrer da operação de venda da participação de 75 % do capital social do Novo Banco”.

No comentário da SIC, Louçã acrescentou que a outra solução do Governo, para ultrapassar o impasse criado pela posição do partido de esquerda radical,  no que toca ao financiamento do Novo Banco, consiste no convite a um sindicato bancário para financiar o Fundo de Resolução. O Jornal Económico avançou na edição desta sexta-feira que esse sindicato seria liderado pela CGD e composto pelo BCP, Santander Totta e BPI.

Francisco Louçã disse na SIC que “esta solução de não entregar agora ao Estado mas pedir uma autorização orçamental para o Fundo de Resolução fazer este pagamento com empréstimo dos bancos, não passa no Parlamento”.

O comentador revela assim que o Bloco de Esquerda não vai aprovar o Orçamento de Estado, o que Mariana Mortágua na conferência de imprensa desta sexta-feira nunca chegou a dizer perentoriamente.

Nessa antevisão de chumbo do OE caso o Fundo de Resolução financie o Novo Banco, Louçã conta também com o PSD e invoca que Rui Rio disse que não aprovava o empréstimo do Estado ao FdR no Orçamento se não houvesse uma nova auditoria até lá, coisa que não é possível já que a data de entrega ao Parlamento está prevista para dia 12.

Se o Orçamento de Estado não passar o Governo cai e haverá eleições antecipadas, o que dado o apertado calendário face às eleições presidenciais deixaria, por um longo período, o Governo em gestão corrente, numa altura crucial em que o Executivo tem de discutir com Bruxelas a chegada dos maiores fundos europeus da história.

Mas Louçã acha que o Governo não vai criar uma crise política para o FdR injetar 912 milhões no Novo Banco.

Francisco Louçã realçou que as receitas do Fundo de Resolução – entidade pública, detida pelos bancos e gerida pelo Banco de Portugal – “resultam da contribuição sobre o setor bancário, que é receita do Estado”.

Em 2019 o valor recebido pelo Estado “ascendeu a 179,2 milhões de euros, montante que foi integralmente
entregue ao Fundo de Resolução no decurso do segundo semestre de 2019”, segundo as contas da entidade liderada por Luís Máximo dos Santos.

O Bloco de Esquerda, em conferência de imprensa, nesta sexta-feira, propôs a capitalização direta do Novo Banco pelos bancos sem intervenção do Fundo de Resolução. A proposta do Bloco feita ao Governo no âmbito da negociação do Orçamento do Estado de 2021 e apresentada publicamente depois de não ter havido resposta por parte do Executivo de António Costa, consiste num aumento de capital do Novo Banco que os bancos subscrevessem, clarificou Louçã.

Louçã disse, na sua análise, que o Governo apressou-se a dizer que “essa proposta era ilegal e depois admitiu que era legal mediante uma autorização prévia do Banco Central Europeu”. Recorde-se BCE tem de autorizar todas as aquisições de participações qualificadas nos bancos da zona euro.

O Governo já fez saber que está disponível para aceitar a exigência do Bloco de que não haja mais empréstimos do Orçamento ao Fundo de Resolução. Mas está a trabalhar numa via alternativa que respeite os contratos assinados, o que também não agrada ao partido de esquerda radical.

Louçã defendeu também que se conteste em tribunal, no futuro, os contratos assinados no âmbito da venda do Novo Banco ao Lone Star.

Esta operação proposta pelo Bloco é inviável, segundo fontes do sector financeiro. Para além de que não faz caducar o Acordo de Capitalização Contingente que continuaria em vigor, O que significa que o Novo Banco continuaria a poder acionar o capital acordado até ao limite dos 3,89 mil milhões de euros, ou seja, os 912 milhões de euros.

Esta proposta é inviável porque está estabelecido por acordo que o Lone Star não pode nunca ter menos de 75%. Portanto um aumento de capital em que os bancos entrassem como acionistas do Novo Banco diluiria o Fundo de Resolução que tem 25%, e deixaria a entidade pública de fora das futuras mais valias que venham a ocorrer na venda do banco.

Depois há ainda o direito do Estado de converter os créditos fiscais (dos ativos por impostos diferidos elegíveis) do Novo Banco em capital, o que poderia levar o Tesouro a ficar com 13% do banco, fatia que seria retirada ao Fundo de Resolução. Aliás, fontes do setor questionam porque é que o Estado não converte os créditos fiscais e se torna acionista do Novo Banco, o que, em teoria, poderia dar direito a nomear um administrador.

Os contratos assinados no âmbito da venda do Novo Banco ao Lone Star, em 2017, incluem compromissos com Bruxelas, para além do Acordo Quadro em que o Governo de António Costa se comprometeu em financiar o FdR até 850 milhões por ano, para que o Fundo cumpra o Acordo de Capitalização Contingente.

Os bancos capitalizarem os concorrentes implicaria uma autorização prévia do BCE, uma vez que o supervisor que tem de autorizar todas as participações qualificadas no Novo Banco, mas também implicaria uma análise da autoridade da Concorrência, uma vez que se trata de concentração no setor.

As nossas fontes avançam que a proposta do Bloco de Esquerda não teria acolhimento nas instituições europeias.

O Bloco de Esquerda defendeu hoje em conferência de imprensa que “se este é um problema entre bancos como nos têm dito, então ele tem de ser resolvido entre bancos, sem colocar o Fundo de Resolução, os contribuintes a intermediar e a garantir esta capitalização”, segundo Mariana Mortágua

O Bloco quer que sejam os bancos a assegurar diretamente as necessidades de capitalização do Novo Banco, sem passar pelo Fundo de Resolução, e sem “sobrecarregar” os contribuintes com novos empréstimos do Estado ou dos bancos à entidade que tem feito as intervenções na banca.

A gestão financeira do FdR é cabe à Comissão Diretiva do Fundo e os recursos financeiros disponíveis são aplicados com base num plano de aplicações financeiras acordado entre o FdR e o Banco de Portugal.

PS quer conhecer a opinião do BCE sobre a auditoria da Deloitte ao Novo Banco

Terça-feira, Setembro 22nd, 2020

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Económico

O grupo parlamentar do PS quer que o Banco de Portugal e o Novo Banco enviem a carta do Banco Central Europeu, referida por António Ramalho na audição no Parlamento, sobre a auditoria da Deloitte. Pedido é votado na quarta-feira.

O PS quer que o Novo Banco e o Banco de Portugal (BdP) enviem, mesmo que a título confidencial, a análise do Banco Central Europeu à auditoria da Deloitte ao Novo Banco/BES. O pedido do grupo parlamentar socialista será votado esta quarta-feira na Comissão de Orçamento e Finanças (COF), dois dias antes da votação no Parlamento da constituição de uma eventual Comissão Parlamentar de Inquérito à instituição liderada por António Ramalho.

Os deputados do PS pedem que “seja solicitado ao Novo Banco e ao Banco de Portugal, a disponibilização, ainda que a título confidencial, a carta do Banco Central Europeu, referida pelo Sr. Presidente da Comissão Executiva do Novo Banco na sua audição nesta comissão a 15 setembro 2020, de análise e resposta à auditoria especial, elaborada pela Deloitte, ao Novo Banco”, no requerimento, entregue na semana passada, a que o Jornal Económico teve acesso.

O presidente executivo do Novo Banco esteve na terça-feira passada no Parlamento a prestar esclarecimentos aos deputados sobre a auditoria da Deloitte, a alienação das carteiras de imóveis e créditos detidos por aquela entidade bancária, tendo avançado ainda informação sobre o parecer independente solicitado pela própria instituição à venda de imóveis.

A auditoria da Deloitte ao Novo Banco/BES tem estado sob polémica, apesar do Parlamento ter publicado há duas semanas o relatório, mas expurgado das partes consideradas confidenciais. Porém, há partidos que querem a divulgação integral do relatório, como o Bloco de Esquerda que apresentou um requerimento, cuja votação adiada há duas semanas irá ocorrer esta quarta-feira.

O relatório revelava perdas líquidas de 4.042 milhões de euros no Novo Banco – entre 4 de agosto de 2014 e 31 de dezembro de 2018 – e outras conclusões, como a venda de imóveis foram realizadas por valores inferiores, em alguns casos de forma significativa, face a às últimas avaliações, sinalizando que o Novo Banco “não tinha implementado procedimentos de análise e justificação formal das variações ocorridas nas avaliações obtidas, comparativamente às avaliações anteriormente disponíveis”.

Expôs ainda que os períodos em que as perdas geradas com operações de crédito e outros ativos mais pesaram no balanço do Novo Banco foram os anos 2017 e 2018, precisamente após a venda de 75% do banco ao Lone Star e à inerente constituição do mecanismo de capitalização contingente a cargo do Fundo de Resolução, somando 1.024 milhões.

Em causa nas audições tem estado ainda o facto da Deloitte Espanha ter assessorado o Novo Banco na venda GNB Vida, num processo que foi desencadeado em 2017 e concluído em 2019, apesar da consultora num comunicado enviado às redações já ter afastado qualquer impedimento de realizar a auditoria independente.

Decisão do Tribunal Arbitral sobre diferendo de 200 milhões entre Novo Banco e Fundo de Resolução esperada em 2021

Quinta-feira, Março 5th, 2020

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Económico

O Banco Central Europeu defende que o Novo Banco deve sair do regime contabilístico transitório, que limitava o impacto nos rácios de capital até 2023, para um regime de total implementação, em que esse faseamento já não existe e o impacto é imediato. Essa mudança poderá acelerar a chamada de capital ao Fundo de Resolução. Mas só em 2021.

O diferendo entre o Novo Banco e o Fundo de Resolução, por causa do banco passar do regime transitório da IFRS 9 (a que aderiu em 2018 e que serviu para mitigar o impacto das imparidades no rácio de capital) para a adoção integral das novas regras internacionais de contabilidade, vai estar em julgamento em Tribunal Arbitral no ano de 2020.  Segundo apurou o Jornal Económico, a decisão do tribunal só será esperada no início de 2021.

Desta forma, o impacto em capital, caso o Tribunal Arbitral dê razão ao Novo Banco, só terá efeitos em 2021. Pelo que uma decisão favorável ao banco não irá empolar as chamadas de capital ao Fundo de Resolução este ano, que já estão determinadas em 1.037 milhões de euros.

O Expresso noticiou que havia um diferendo entre o banco e o Fundo de Resolução, que tem um valor de 200 milhões, e que acabará por ser decidido no Tribunal Arbitral. António Ramalho confirmou o diferendo durante a conferência de imprensa sobre os resultados anuais do Novo Banco, na sexta-feira, e disse que “essa divergência será resolvida de acordo com o mecanismo contratual, que é o mecanismo de Tribunal Arbitral organizado”.

Fonte ligada ao processo disse ao Jornal Económico que o montante será, no entanto, definido no âmbito desta decisão do tribunal.

Em 2019, o Novo Banco pediu para deixar o regime transitório da IFRS 9 (normas internacionais de contabilidade). Uma das alterações das normas IFRS 9 está relacionada com a constituição de imparidades, já que passaram a ser constituídas para perdas expectáveis ao longo da vida dos créditos e não para perdas efectivas, como era antes.

O risco de isto causar um aumento súbito das estimativas de perdas esperadas (Expected Credit Loss – ECL), o que provocaria uma descida abrupta e significativa dos rácios de capital regulamentares Common Equity Tier 1 (CET1), levou a que o Novo Banco, em 2018, pedisse para aderir ao regime transitório.

O presidente da instituição financeira disse que, na conferência de imprensa da semana passada, depois de o Novo Banco ter pedido em 2019 para sair do regime transitório, o Banco Central Europeu (BCE) deu luz verde a essa mudança (saída do regime contabilístico transitório, que limitava o impacto do regime nos rácios de capital até 2023, para a total implementação, em que esse faseamento já não existe e o impacto é imediato).

Confrontado pelo JE, o BCE disse que “esta foi uma decisão tomada pelo Novo Banco e é um passo na direção certa para limpar seu balanço”.

No entanto o Fundo de Resolução, que detém 25% do banco e a responsabilidade de injectar eventuais necessidades de capital através do mecanismo de capital contingente (CCA), não está de acordo, porque essa alteração poderá obrigar a mais injeções no Novo Banco e a acelerar o recurso ao mecanismo que tem um tecto máximo de 3,89 mil milhões de euros.

Na conferência de imprensa António Ramalho confirmou que “o que há é uma possibilidade de reporte regulatório em que está em causa efeitos do IFRS 9 em termos transitórios ou não. Mas que não tem efeito nas contas”. O CEO recordou que os outros bancos não estão no regime transitório, mas sim no “fully loaded”, e o Novo Banco quer deixar de estar no regime transitório.

Sair do regime transitório significa a aplicação integral da IFRS 9, o que pode conduzir a um súbito aumento significativo das provisões para perdas de crédito esperadas e, por conseguinte, a uma súbita diminuição dos fundos próprios principais de nível 1 das instituições. Pelo que a saída do regime transitório pode acelerar as chamadas de capital ao mecanismo de capital contingente do Fundo de Resolução, tal como avançou o Jornal Económico.

Os bancos da União Europeia sujeitos ao International Financial Reporting Standards (IFRS) tiveram de implementar o IFRS 9 a partir de 1 de janeiro de 2018.

Em maio de 2017, a UE adotou um período de transição de cinco anos para mitigar o impacto sobre os níveis de capital regulamentar da implementação do IFRS 9.

O capital do Novo Banco está protegido pelo CCA do Fundo de Resolução. António Ramalho comparou a compensação de 2,98 mil milhões pedida ao Fundo de Resolução desde 2017, com as perdas estimadas quando o mecanismo foi criado no âmbito da venda de 75% ao Lone Star. “É o valor mais baixo dos três agregados solicitáveis para efeitos da capitalização da instituição: entre o valor contratual máximo de 3,89 mil milhões; o valor das perdas com os ativos que estão no CCA, e que se situa em 3,57 mil milhões; e o valor do capital necessário para o cumprimento dos rácios exigíveis que é de 2,98 mil milhões”, explicou o CEO do banco. Ramalho adiantou ainda que “este valor fica aquém do valor que estava previsto nos acordos públicos realizados ente o Estado português, o Banco Central Europeu e a União Europeia, em todos os cenários aí previstos”.

 

Fundo de Resolução trava ainda mais capital para Novo Banco

Segunda-feira, Fevereiro 24th, 2020

Citamos

Expresso

Banco pede regime que traz necessidades adicionais. BCE aceitou, Fundo não

O Novo Banco pediu, o Banco Central Europeu (BCE) deu luz verde, o Fundo de Resolução levantou dúvidas e, agora, o banco não deverá pôr essa autorização em prática. Mais especificamente, o Novo Banco pediu ao seu supervisor uma autorização que poderá afetar os seus fundos próprios, colocando pressão adicional imediata sobre os seus rácios de capital, o que poderá ter implicações na necessidade de dinheiro para cobrir eventuais insuficiências. O Fundo de Resolução está contra e não quer ser responsável por cobrir essas necessidades. Após questões colocadas pelo Expresso aos envolvidos, ficou claro que, afinal, a solicitação, que Frankfurt até vê com bons olhos, não deverá ser implementada pelo banco. Mesmo assim, havendo divergências, aquele veículo que funciona junto do Banco de Portugal admite dirimir o assunto nas instâncias próprias.

Tudo se deve à contabilidade: o banco, detido pela Lone Star em 75% e pelo Fundo de Resolução em 25%, pediu para abandonar o regime transitório da Norma Internacional de Relato Financeiro de Instrumentos Financeiros (a chamada IFRS9), abraçando já a sua total implementação.

 

BCE pode negar acesso de documentos sobre resolução do BES

Terça-feira, Dezembro 24th, 2019

Citamos

Dinheiro Vivo

Tribunal da Justiça Europeu decidiu que BCE não tem de divulgar documentos e, ainda, que a autoridade monetária é que decide se recusa ou não o acesso

O Tribunal da Justiça da União Europeia decidiu que o Banco Central Europeu (BCE) pode negar o acesso aos documentos sobre a resolução do Banco Espírito Santo (BES), no âmbito do processo que opõe o banco central à Espírito Santo Financial (ESF).

“O n.° 1 do dispositivo do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 26 de abril de 2018, Espírito Santo Financial, é anulado na medida em que, nesse número, o Tribunal Geral anulou a Decisão do Banco Central Europeu (BCE) de 1 de abril de 2015, que recusa parcialmente o acesso a certos documentos relativos à Decisão do BCE de 1 de agosto de 2014 referente ao Banco Espírito Santo SA na parte em que, nessa decisão, o BCE recusou o acesso ao montante do crédito que figura nos excertos da ata que registou a Decisão do Conselho do BCE de 28 de julho de 2014”, pode ler-se no acórdão divulgado, esta quinta-feira.

Em causa está o facto de o BES ter começado a recorrer às operações de crédito do Eurosistema, em 2014, recebendo a partir de 17 de julho desse ano, liquidez de emergência cedida pelo Banco de Portugal. Dias mais tarde, o Conselho do BCE decidiu não se opor à cedência de liquidez de emergência ao BES dentro de um limite máximo, até à reunião ordinária seguinte. Mas, a 1 de agosto de 2014, o Conselho do BCE tomou a decisão de suspender o acesso do BES aos instrumentos de crédito da política monetária “por razões de prudência”, ordenando ao banco liderado por Ricardo Salgado que devolvesse a totalidade do montante concedido.

A decisão obrigou o banco a pagar a totalidade da dívida ao Eurosistema, de 10 mil milhões de euros. O BES não conseguiu cumprir com o pagamento e, dois dias depois, foi alvo de uma medida de resolução. Posteriormente, a ESF pediu ao BCE para aceder aos documentos relativos àquela decisão, acesso esse concedido de forma parcial, omitindo os montantes de créditos concedidos ao BES e ainda o limite máximo de crédito que tinha sido imposto. Em 2015, a ESF exigiu o acesso total aos documentos. Em abril de 2018, o Tribunal Geral deu parcialmente razão à ESF, pelo que o BCE contestou. Agora o Tribunal da Justiça vem anular tal decisão. Segundo esta entidade, o BCE não tem de fundamentar as decisões de ocultar informação das suas decisões, podendo decidir se recusa ou não o acesso às informações. A autoridade monetária anula assim a decisão do Tribunal Geral que, por sua parte, anulava a decisão do BCE de não divulgar a informação.

PARECER DO BANCO CENTRAL EUROPEU de 21 maio de 2019 sobre a revisão do regime jurídico do sistema de supervisão financeira português

Quinta-feira, Maio 23rd, 2019

Citamos

Banco Central Europeu

PARECER DO BANCO CENTRAL EUROPEU
de 21 maio de 2019
sobre a revisão do regime jurídico do sistema de supervisão financeira português
(CON/2019/19)
Introdução e base jurídica
Em 11 de janeiro de 2019, o Banco Central Europeu (BCE) recebeu do Ministro das Finanças de
Portugal um pedido de parecer sobre uma Proposta de Lei que procede à reforma da governação
institucional do Banco de Portugal (BdP) e do quadro institucional do sistema de supervisão financeira
português (a seguir «Proposta de Lei»).
A competência do BCE para emitir parecer resulta do disposto no artigo 127.º, n.º 4, e no artigo 282.º,
n.º 5, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), bem como no artigo 2.º, n.º 1,
terceiro e sexto travessões, da Decisão 98/415/CE1 do Conselho, uma vez que a Proposta de Lei está
relacionada com um banco central nacional, com regras aplicáveis às instituições financeiras, na medida
em que influenciem significativamente a estabilidade das instituições e dos mercados financeiros, e com
as atribuições específicas cometidas ao BCE em matéria de supervisão prudencial de instituições de
crédito nos termos do artigo 127.º, n.º 6, TFUE. O presente parecer foi aprovado pelo Conselho do BCE
nos termos do artigo 17.º-5, primeiro período, do Regulamento Interno do BCE.

1. Finalidade da Proposta de Lei
1.1. Os dois principais objetivos da Proposta de Lei são proceder à reforma da governação
institucional do BdP e à reforma do quadro institucional do sistema de supervisão financeira
português.
Reforma da governação institucional do Banco de Portugal
1.2. Nos termos da Proposta de Lei, o conselho de administração do BdP sofre uma ligeira redução
em termos de tamanho, passando a ser formado pelo governador do BdP, um ou dois vicegovernadores e três ou quatro membros do conselho de administração, em vez dos atuais três a
cinco. Atualmente, o governador é designado pelo Conselho de Ministros sob proposta do
Ministro das Finanças, após audição da comissão parlamentar competente, ao passo que os
demais membros do conselho de administração do BdP são designados pelo Conselho de
Ministros sob proposta do governador, após audição da comissão parlamentar competente. Nos
termos da Proposta de Lei, o governador deixa de ter intervenção no processo de designação

1 Decisão 98/415/CE do Conselho, de 29 de junho de 1998, relativa à consulta do Banco Central Europeu pelas
autoridades nacionais sobre projetos de disposições legais (JO L 189 de 3.7.1998, p. 42).

 

dos demais membros do conselho de administração do BdP, os quais, juntamente com o
governador, passam a ser designados pelo Conselho de Ministros sob proposta do Ministro das
Finanças, após audição da comissão parlamentar competente. A Proposta de Lei também
determina que a designação, ou proposta de designação, dos membros do conselho de
administração não pode ocorrer nos seis meses anteriores ao fim da legislatura em curso ou
entre a convocação de eleições para a Assembleia da República ou a demissão do Governo e a
investidura parlamentar do Governo recém-designado, salvo se se verificar a vacatura dos
cargos em causa e a urgência da designação, caso em que as referidas designação ou proposta
de designação dependem ainda de confirmação pelo Governo recém-designado. Além disso,
segundo a Proposta de Lei, os membros do conselho de administração do BdP têm de ser
escolhidos de entre pessoas com reconhecida idoneidade, aptidão, sentido de interesse público,
experiência profissional, capacidade de gestão, conhecimento e competência técnica relevantes
e adequados ao exercício das respetivas funções.

.
1.3. O mandato atual dos membros do conselho de administração é de cinco anos, podendo ser
renovado uma vez pelo Conselho de Ministros por um prazo idêntico. De acordo com a Proposta
de Lei, a duração do mandato é aumentada de cinco para sete anos, mas os mandatos deixam
de ser renováveis.
1.4. Presentemente, os membros do conselho de administração só podem ser exonerados pelo
Conselho de Ministros se se verificar algum dos factos previstos no artigo 14.º-2 dos Estatutos
do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu (a seguir «Estatutos do
SEBC»). De acordo com a Proposta de Lei, os membros do conselho de administração só
podem ser exonerados por resolução do Conselho de Ministros, sob proposta do Ministro das
Finanças ou recomendação da Assembleia da República, em casos excecionais e devidamente
fundamentados, se deixarem de preencher os requisitos necessários ao exercício das suas
funções ou se tiverem cometido falta grave. Para estes efeitos, a Proposta de Lei prevê as
seguintes causas de exoneração: i) incapacidade permanente; ii) interdição ou inabilitação
decretada judicialmente; iii) incompatibilidade para exercício do mandato; iv) condenação, por
sentença transitada em julgado, em crime doloso, que coloque em causa a idoneidade para o
exercício do cargo; ou v) cumprimento de pena de prisão. A Proposta de Lei também prevê que
a Assembleia da República possa recomendar ao Governo que exonere membros do conselho
de administração do BdP. A Proposta de Lei prevê ainda que os mandatos dos membros do
conselho de administração e do governador possam cessar em caso de fusão ou cisão do BdP.
1.5. Hoje em dia, a remuneração dos membros do conselho de administração é fixada anualmente
por uma comissão composta pelo Ministro das Finanças (ou um seu representante), pelo
presidente do conselho de auditoria e por um ex-governador designado pelo conselho consultivo,
e não pode integrar qualquer componente variável. Nos termos da Proposta de Lei, a remuneração é fixada por uma comissão que funciona junto do Ministério das Finanças, não
podendo ser fixada com efeitos retroativos nem ser alterada no decurso do mandato.
1.6. A Proposta de Lei dispõe que o BdP deve observar os seguintes princípios no exercício das suas
competências, sem prejuízo da observância dos princípios gerais de direito administrativo:
qualidade e eficiência no exercício da sua atividade e na gestão económico-financeira; gestão
por objetivos; avaliação regular; transparência na sua atuação através da disponibilização de
informação sobre a sua atividade, organização e funcionamento, incluindo sobre o custo da sua
atividade para os destinatários dos poderes do BdP; e transparência no funcionamento dos
órgãos e na gestão do pessoal.
1.7. A Proposta de Lei introduz um novo dever de prestação de informações ao Ministro das
Finanças sobre a execução do orçamento, as contas e os planos e relatórios de atividades,
anuais e plurianuais do BdP. A Proposta de Lei determina que o BdP deve enviar o seu relatório
anual à Assembleia da República, que emitirá um parecer sobre esse relatório, e prevê a
prestação de informações pelos membros dos órgãos do BdP a comissões parlamentares, bem
como a divulgação de informações na Internet.
1.8. A Proposta de Lei mantém a atual disposição da Lei Orgânica do BdP segundo a qual o BdP não
está sujeito à fiscalização do Tribunal de Contas no que diz respeito à sua participação no
desempenho das atribuições cometidas ao Sistema Europeu de Bancos Centrais (SEBC).
Paralelamente, a Proposta de Lei introduz uma nova disposição nos termos da qual o BdP não
fica sujeito ao regime de inspeção e auditoria dos serviços do Estado no que diz respeito às
matérias relativas à sua participação no desempenho das atribuições cometidas ao SEBC.
1.9. A Proposta de Lei altera as disposições que regulam a responsabilidade dos membros dos
órgãos e dos trabalhadores do BdP e dispõe que os mesmos respondem direta e pessoalmente
pelos atos e omissões que pratiquem no exercício das suas funções. A este respeito, a Proposta
de Lei estabelece que o regime da responsabilidade civil do Estado é aplicável ao BdP.
1.10. A Proposta de Lei proíbe: a) a delegação das atribuições do BdP noutras entidades; b) o
exercício, pelo BdP, de outras atividades fora do âmbito das suas atribuições; c) a utilização,
pelo BdP, de recursos próprios para finalidades diversas das que lhes tenham sido cometidas; d)
a garantia, pelo BdP, do cumprimento de obrigações de outras entidades; e e) a criação, ou
participação na criação, pelo BdP, de entidades com fins lucrativos ou adquirir participações em
tais entidades, exceto nas situações expressamente previstas na lei. A Proposta de Lei também
impõe condições suplementares à contratação de serviços externos, a qual só é permitida desde
que seja devidamente demonstrada a impossibilidade, a ineficiência ou a intempestividade da
satisfação das necessidades pelos recursos próprios do BdP.
1.11. A Proposta de Lei dispõe que os membros do conselho de administração do BdP devem evitar
qualquer situação suscetível de influenciar, limitar ou impedir a sua capacidade de atuar com integral independência, isenção e imparcialidade no desempenho das respectivas funções. A
Proposta de Lei estabelece normas deontológicas relativas às incompatibilidades, operações
financeiras privadas, restrições aplicáveis após a cessação do mandato (incluindo
compensação), e ofertas e benefícios. A Proposta de Lei cria uma comissão de ética para
analisar e emitir declarações em matéria de conflito de interesses e exercer algumas
responsabilidades específicas. A comissão de ética é composta por um membro designado pelo
conselho de administração, um membro designado pelo conselho de auditoria, e um membro
designado por estes dois membros, o qual preside à comissão de ética. Os membros da
comissão de ética devem ser escolhidos de entre pessoas de reconhecida idoneidade, probidade
e independência, sem vínculo ou relação contratual com o BdP. A Proposta de Lei também
dispõe em matéria de incompatibilidades e conflitos de interesses dos trabalhadores do BdP,
assim como de recrutamento de trabalhadores.
1.12. A Proposta de Lei introduz indicadores de desempenho aplicáveis ao BdP que têm por objeto
refletir o conjunto das atividades prosseguidas e dos resultados obtidos, com vista a promover a
eficiência, eficácia e qualidade da sua atividade. O sistema de indicadores de desempenho, que
deve ser implementado pelo BdP, deve ter uma relação concreta com o plano de actividades do
Banco e a gestão de recursos humanos, incluindo a avaliação do desempenho dos
trabalhadores.
1.13. A Proposta de Lei procede à reforma do conselho de auditoria do BdP, vindo alterar a sua
designação e a sua composição, a duração do mandato dos seus membros e correspondente
remuneração. A Proposta de Lei também procede à reforma do conselho consultivo do BdP,
vindo alterar a sua composição, a periodicidade das suas reuniões e o seu funcionamento.
1.14. A Proposta de Lei confere poderes de «resolução de conflitos» ao BdP, em paralelo com outros
poderes de regulação, de supervisão e sancionatórios.
1.15. A Proposta de Lei autoriza o BdP a cobrar taxas em contrapartida dos serviços que presta e dos
atos que pratica. A Proposta de Lei também autoriza o BdP a liquidar e cobrar taxas em nome e
por conta de outras entidades, nacionais ou europeias.
Reforma do sistema de supervisão financeira português
1.16. Para além das alterações introduzidas na governação institucional do BdP, a Proposta de Lei cria
um Sistema Nacional de Supervisão Financeira (SNSF) composto por cinco autoridades: o BdP,
a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (a seguir «Autoridade dos Mercados»), a
Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (a seguir «Autoridade dos
Seguros»), a Autoridade de Resolução e Administração de Sistemas de Garantia (a seguir
«Autoridade de Resolução»), a qual é criada através da Proposta de Lei e será a nova
autoridade de resolução, e o Conselho Nacional de Supervisores Financeiros (CNSF), que será
responsável pela coordenação entre as autoridades de supervisão e também a nova autoridade macroprudencial. Em consequência, o BdP deixará de ser a autoridade nacional responsável
pela supervisão macroprudencial, bem como a autoridade de resolução bancária. A Proposta de
Lei introduz novos estatutos para as Autoridades dos Mercados, dos Seguros e de Resolução,
bem como para o CNSF. A Proposta de Lei também introduz disposições sobre a colaboração e
a troca de informações entre as diferentes autoridades.
1.17. A Proposta de Lei cria um Comité Nacional para a Estabilidade Financeira (CNEF), um
organismo consultivo do Ministro das Finanças em matéria de estabilidade financeira,
responsável pela articulação entre o SNSF e as políticas económicas, financeiras e orçamentais
do Estado. O CNEF será presidido pelo Ministro das Finanças e os demais membros incluem o
governador do Banco de Portugal e os presidentes (ou o seu equivalente) das outras entidades
que compõem o SNSF.
1.18. A Proposta de Lei introduz a possibilidade de atribuições de supervisão poderem ser cometidas
ao BdP, mas prosseguidas por uma pessoa coletiva de direito público diferente sob a
dependência do BdP.
1.19. A Proposta de Lei introduz várias alterações ao Regime Geral das Instituições de Crédito e das
Sociedades Financeiras (a seguir «RGICSF»)2 e a outra legislação para refletir o facto de que o
BdP deixaria de ser a autoridade macroprudencial e a autoridade de resolução. No regime do
dever de segredo aplicável às instituições de crédito, foram acrescentadas duas possibilidades
adicionais de divulgação de informação pelo BdP ao CNSF e à Autoridade de Resolução.
1.20. A Proposta de Lei dispõe que as atribuições do CNSF, na sua qualidade de autoridade
macroprudencial nacional, são: i) a definição da política macroprudencial nacional, em harmonia
com a política macroprudencial definida pelo Comité Europeu do Risco Sistémico (CERS); ii) a
identificação, o acompanhamento e a avaliação dos riscos sistémicos, tendo em conta as
especificidades do setor financeiro nacional; e iii) a adoção de medidas de prevenção, mitigação
ou redução dos riscos sistémicos e o acompanhamento da respetiva implementação.
1.21. A Proposta de Lei dispõe que as atribuições do CNSF em matérias com natureza ou impacto
transversal no setor financeiro visam salvaguardar a estabilidade do setor financeiro português.
A Proposta de Lei também dispõe que as autoridades de supervisão devem propor ao CNSF a
adoção de medidas macroprudenciais com impacto transversal no setor financeiro destinadas a
prevenir ou mitigar riscos sistémicos. A Proposta de Lei dá poderes ao CNSF para adotar as
medidas macroprudenciais harmonizadas ao nível da União previstas no Regulamento (UE) n.º
575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho3 e na Diretiva 2013/36/UE do Parlamento

2 Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92 relativo ao regime jurídico das instituições de crédito e sociedades financeiras
(Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro).
3 Regulamento (UE) n.º 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo aos
requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o
Regulamento (UE) n.º 648/2012 (JO L 176 de 27.6.2013, p. 1)

Europeu e do Conselho4
, relativa às instituições de crédito, em certos casos sob proposta do
BdP. A Proposta de Lei também dispõe que o CNSF pode delegar nas autoridades de
supervisão a implementação das medidas adotadas. A Proposta de Lei dispõe ainda que as
autoridades de supervisão devem informar o CNSF da sua intenção de adotar medidas
macroprudenciais sem impacto transversal no setor financeiro.
1.22. Relativamente ao papel do BdP no CNSF, a Proposta de Lei dispõe que o conselho de
administração do CNSF é composto por sete membros, incluindo dois representantes do BdP. O
governador do BdP conduzirá as reuniões do conselho de administração do CNSF destinadas à
discussão ou deliberação de matérias macroprudenciais e representará o CNSF com direito de
voto no Conselho Geral do CERS.
1.23. A Proposta de Lei dispõe que o CNSF deve colaborar com o CERS, as autoridades
macroprudenciais de outros Estados, o BCE, as autoridades europeias de supervisão e
quaisquer entidades ou organizações relevantes no domínio da estabilidade financeira.
1.24. A Proposta de Lei cria uma comissão de avaliação e remunerações com a missão de emitir
parecer técnico sobre as propostas de designação dos membros dos órgãos de administração
de todas as entidades do SNSF, incluindo o BdP. Estes pareceres limitam-se a uma avaliação
dos requisitos estabelecidos na lei, bem como à verificação do cumprimento das regras de
incompatibilidades e impedimentos aplicáveis. A referida comissão é também responsável por
fixar o estatuto remuneratório dos referidos membros, tendo em conta critérios comuns a todas
as entidades que compõem o SNSF, incluindo a atividade da respetiva entidade tendo por
referência os resultados do sistema de indicadores de desempenho. A comissão será composta
por um membro designado por cada autoridade de supervisão que compõe o SNSF, sendo o seu
presidente designado pelo Ministro das Finanças. A comissão funcionará junto do Ministério das
Finanças, sendo as despesas decorrentes do seu funcionamento suportadas pelos encargos
gerais deste ministério.
Financiamento parcial da Autoridade da Concorrência portuguesa pelo Banco de Portugal
1.25. A Proposta de Lei dispõe que o financiamento da Autoridade da Concorrência portuguesa será
assegurado por prestações periódicas do BdP, para além de prestações de outras autoridades
sectoriais, bem como pelas taxas cobradas no âmbito da atividade específica da Autoridade da
Concorrência.

4 Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa ao acesso à atividade
das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, que
altera a Diretiva 2002/87/CE e revoga as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE (JO L 176 de 27.6.2013, p. 338).

2. Observações
2.1 Duração mínima do mandato do governador do Banco de Portugal e fundamentos para a sua
exoneração
2.1.1. Para garantir a independência dos governadores dos bancos centrais nacionais (BCN) e dos
membros do Conselho do BCE, cada Estado-Membro tem de garantir a compatibilidade dos
estatutos do seu BCN com os Tratados e com os Estatutos do SEBC quanto à duração do
mandato do governador e aos fundamentos para a sua exoneração5
.
Duração mínima do mandato
2.1.2. Embora a Proposta de Lei preveja em geral uma duração do mandato de sete anos6
, superior à
duração mínima de cinco anos exigida pelo artigo 14.º-2 dos Estatutos do SEBC, a disposição
relativa à designação do governador de entre um dos membros do conselho de administração do
BdP durante o seu mandato7
, não é compatível com os Estatutos do SEBC, na medida em que
dispõe que o antigo membro do conselho de administração do BdP é designado para as funções
de governador apenas pelo período remanescente da duração inicial do seu mandato. Dado que
o período remanescente da duração inicial do mandato do antigo membro do conselho de
administração do BdP (designado como governador) pode ser inferior a cinco anos, a duração
mínima do mandato prescrita pelos Estatutos do SEBC não seria respeitada. Em consequência,
para ser consentânea com os Estatutos do SEBC, a Proposta de Lei tem de ser alterada para
garantir que a duração do mandato do governador não pode ser inferior a cinco anos, incluindo
nos casos em que o governador seja designado de entre os membros do conselho de
administração do BdP.
Fundamentos de exoneração do governador
2.1.3. Um governador só pode ser exonerado se «deixar de preencher os requisitos necessários ao
exercício das [suas funções] ou se tiver cometido falta grave»8
. O BCE é da opinião que os
conceitos subjacentes às circunstâncias em que um governador pode ser exonerado são
conceitos autónomos do direito da União9
, cuja aplicação e interpretação não dependem de um
contexto nacional, independentemente de tais conceitos estarem também incorporados na Lei
Orgânica do BdP.

5 Artigo 131.º TFUE e artigos 14.º-1, e 14.º-2, dos Estatutos do SEBC. Ver também, nesta matéria, o Relatório de
Convergência do BCE de 2018, ponto 2.2.3, p. 24. Disponível no sítio web do BCE em www.ecb.europa.eu.
6 Artigo 33.º, n.º 2, da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
7 Artigo 33.º, n.º 4, da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
8 Artigo 14.º-2 dos Estatutos do SEBC.
9 Ver, no mesmo sentido, conclusões da advogada-geral Juliene Kokott de 19 de dezembro de 2018, Rimšēvičs v
Latvia, processos apensos C-202/18 e C-238/18, ECLI:EU:C:2018:1030, n.º 77.

2.1.4. Considerada por esta perspetiva, a Lei Orgânica do BdP é compatível com os Estatutos do
SEBC, na medida em que reproduz a redação do artigo 14.º-2 dos Estatutos do SEBC10. No
entanto, a Lei Orgânica do BdP11 teria de ser clarificada no sentido de não pretender definir em
termos mais alargados o âmbito de aplicação do artigo 14.º-2 dos Estatutos do SEBC12, em
especial no que respeita às circunstâncias em que o governador pode ser exonerado.
2.1.5. Uma vez que, depois de ser designado, um governador não pode ser exonerado com um
fundamento diferente dos previstos no artigo 14.º-2 dos Estatutos do SEBC, a Lei Orgânica do
BdP é incompatível com os Estatutos do SEBC, na medida em que prevê a possibilidade de a
designação de um governador depender de confirmação por um Governo recém-designado13.
Isto porque a falta dessa confirmação produziria efeitos equivalentes à exoneração do
governador com um fundamento diferente dos previstos no artigo 14.º-2 dos Estatutos do SEBC,
em especial dado que, nesses casos, o desiderato de salvaguardar a liberdade do governador
face a influência política deixaria de poder ser alcançado.
2.1.6. Pelos mesmos motivos, a Lei Orgânica do BdP é incompatível com os Estatutos do SEBC, na
medida em que prevê que o mandato do governador pode cessar em caso de fusão ou cisão do
BdP14. Independentemente de o BdP ser objeto de um processo de reestruturação, o governador
só pode ser exonerado se deixar de preencher os requisitos necessários ao exercício das suas
funções ou se tiver cometido falta grave.
2.1.7. Relativamente ao processo de exoneração do governador, o BCE nota que, na sequência das
alterações introduzidas pela Proposta de Lei, não só o Governo mas também a Assembleia da
República podem propor ao Conselho de Ministros a cessação do mandato do governador.
Embora seja compatível com os Estatutos do SEBC, esta disposição pode criar um nível
suplementar de pressão política sobre o exercício das responsabilidades do governador.
2.2 Salvaguardas da independência dos restantes membros do conselho de administração do Banco
de Portugal
Todos os membros de órgãos de decisão dos BCN têm de exercer os poderes e executar com
independência as atribuições e deveres que lhes são conferidos pelos Tratados e pelos
Estatutos do SEBC15. Dado que tanto o governador como os demais membros do conselho de
administração do BdP estão envolvidos na execução de atribuições relacionadas com o SEBC16,

10 Artigo 33.º, n.º 8, da Lei Orgânica do BdP.
11 Em especial, artigo 33., n.º 9, da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
12 Reproduzido no artigo 33.º, n.º 8, da Lei Orgânica do BdP.
13 Artigo 27.º, n.º 5, da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
14 Artigo 33.º, n.º 12, alínea d), da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
15 Artigo 130.º TFUE e artigo 7.º dos Estatutos do SEBC.
16 Ver ponto 2.2 do Parecer CON/2014/51 e ponto 3.1.3 do Parecer CON/2018/23. Todos os pareceres do BCE são
publicados no sítio web do BCE em www.ecb.europa.eu.

 

o BCE congratula-se com o facto de as disposições da Lei Orgânica do BdP relativas à
inamovibilidade se aplicarem não apenas ao governador mas também aos demais membros do
conselho de administração do BdP, para salvaguarda da sua independência.
Consequentemente, a autoridade que procede à consulta deve ter em conta as observações
formuladas no ponto 2.1 também no que diz respeito aos restantes membros do conselho de
administração do BdP.
2.3 Critérios para designação do governador e dos demais membros do conselho de administração
do Banco de Portugal
O BCE faz notar que os critérios de «sentido de interesse público» e «aptidão» introduzidos pela
Proposta de Lei nos critérios a serem considerados na designação do conselho de administração
do BdP são um pouco vagos e, por conseguinte, podem ser de difícil interpretação e aplicação
prática. Em consequência, o BCE sugere que os critérios se reduzam aos restantes termos
propostos, os quais estão já estabelecidos de longa data, como «idoneidade» e «experiência
profissional»17, ou são mais comuns na área monetária e bancária.
2.4 Normas deontológicas e criação da comissão de ética do Banco de Portugal
2.4.1. O BCE nota que os BCN e as autoridades nacionais competentes (ANC) devem cumprir a
Orientação (UE) 2015/855 do Banco Central Europeu (BCE/2015/11)18, que estabelece os
princípios do Código Deontológico do Eurosistema, e a Orientação (UE) 2015/856 do Banco
Central Europeu (BCE/2015/12)19, que estabelece os princípios do Código Deontológico do
Mecanismo Único de Supervisão (MUS). Nesta matéria, o BCE nota que o BdP já implementou
estas Orientações. A Proposta de Lei pode portanto ser vista como um complemento aos três
normativos internos através dos quais o BdP implementou as Orientações20. As Orientações do
BCE estabelecem os padrões mínimos aplicáveis às regras deontológicas e não impedem a
aplicação, por parte dos BCN ou pelas ANC, de normas deontológicas mais rigorosas aos
membros dos órgãos dos bancos centrais do Eurosistema e a autoridades nacionais
responsáveis pela supervisão prudencial de instituições de crédito.

17 Ver, por exemplo, artigo 283.º, n.º 2, TFUE e artigo 11.º-2 dos Estatutos do SEBC.
18 Orientação (UE) 2015/855 do Banco Central Europeu, de 12 de março de 2015, que estabelece os princípios do
Código Deontológico do Eurosistema e revoga a Orientação BCE/2002/6 relativa aos padrões mínimos de conduta
a observar pelo Banco Central Europeu e pelos bancos centrais nacionais ao realizarem operações de política
monetária e operações cambiais que envolvam os ativos de reserva do BCE e ao gerirem esses ativos
(BCE/2015/11) (JO L 135, 2.6.2015, p.23).
19 Orientação (UE) 2015/856 do Banco Central Europeu, de 12 de março de 2015, que estabelece os princípios do
Código Deontológico do Mecanismo Único de Supervisão (BCE/2015/12) (JO L 135, 2.6.2015, p.29).
20 Regulamento da Comissão de Ética e dos Deveres Gerais de Conduta dos Trabalhadores do Banco de Portugal,
um regulamento interno do BdP que estabelece regras sobre o funcionamento da comissão de ética e a conduta
deontológica dos trabalhadores do BdP; Código de Conduta dos Membros do Conselho de Administração do Banco
de Portugal, um código de conduta interno aplicável aos membros do conselho de administração do BdP; e Código
de Conduta dos Membros do Conselho de Auditoria do Banco de Portugal, o código de conduta aplicável ao
conselho de auditoria do BdP.

 

2.4.2. O BCE congratula-se com o facto de as normas deontológicas serem acompanhadas pela
criação de uma comissão de ética com assento na lei. No que se refere à composição da
comissão de ética, a independência dos seus membros não deve suscitar quaisquer dúvidas.
Embora não possam ter qualquer vínculo ou relação contratual com o BdP, devem, no entanto,
dotar-se de uma sólida compreensão dos objetivos, das atribuições e da governação do BdP.
Além disso, a exigência de unanimidade para as decisões da comissão de ética21 salvaguarda a
idoneidade e a imparcialidade das suas decisões, implicando que não podem ser tomadas
decisões contra o voto do membro designado pelo conselho de administração do BdP ou do
membro designado pelo conselho de auditoria do BdP. No entanto, o BCE assinala que qualquer
intervenção pela comissão de ética nos processos de contratação de serviços externos,
conforme previsto na Proposta de Lei22, não pode prejudicar a capacidade do BdP de prosseguir
eficientemente as suas atribuições nem a sua autonomia organizacional.
2.4.3. Além disso, o BCE esclarece que todas as normas deontológicas estão sujeitas ao cumprimento
do princípio da proporcionalidade enquanto princípio geral de direito. Tal significa que também a
aplicação das regras de incompatibilidade a dirigentes e equiparados, tal como previsto na Lei
Orgânica do BdP, e os prazos de restrição aplicáveis aos membros do conselho de
administração e aos trabalhadores do BdP, nos termos previstos na Proposta de Lei23, não
devem ser desproporcionados ou prejudicar indevidamente a capacidade de recrutar
trabalhadores qualificados. Nesta matéria, o BCE faz referência às correspondentes normas
previstas no Código de Conduta dos Altos Responsáveis do BCE aprovado pelo Conselho do
BCE.
2.5 Disposições relativas aos procedimentos de recrutamento e contratação do Banco de Portugal
2.5.1. A Proposta de Lei sujeita o BdP a regras específicas relativas: a) ao recrutamento externo de
dirigentes e equiparados; e b) à contratação pública. O BCE considera que os procedimentos de
recrutamento concursais, incluindo os procedimentos externos, são uma importante ferramenta
de gestão para um BCN. Ao mesmo tempo, deverá levar-se em conta a capacidade do BdP para
manter nos seus quadros pessoal altamente qualificado através do desenvolvimento de
percursos de carreira internos. Para salvaguardar a capacidade do BdP de reter trabalhadores
qualificados24, o BCE sugere ainda que a Proposta de Lei seja clarificada no sentido de não
obrigar a que esses procedimentos sejam executados a intervalos regulares, por exemplo de três

21 Artigo 49.º-C, n.º 4, da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
22 Artigo 49.º-B, n.º 1, alínea f), da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
23 Artigo 6.º, alínea b), da Proposta de Lei e artigo 40.º-B, n.os 7 a 10, e artigo 57.º-A, n.º 2, da Lei Orgânica do BdP,
na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
24 Como tem sido uniformemente referido pelo BCE nos seus Relatórios de Convergência, os Estados-Membros não
podem prejudicar a capacidade de um BCN contratar e manter o pessoal qualificado necessário ao desempenho
das atribuições que lhe são cometidas pelos Tratados e pelos Estatutos do SEBC.

 

em três anos, dado que a Proposta de Lei estabelece um mandato de três anos para as posições
de direção.
2.5.2. No mesmo sentido, as condições suplementares a serem respeitadas pelo BdP na contratação
de serviços externos25 não devem prejudicar a sua capacidade de prosseguir eficazmente as
suas atribuições. Este princípio operacional também está refletido no Princípio 2, critério 6, dos
Princípios Fundamentais de Basileia para uma Supervisão Bancária Eficaz (a seguir «Princípios
Fundamentais de Basileia»)26, segundo os quais os supervisores devem ter recursos adequados
para exercer uma supervisão e uma fiscalização eficazes.
2.6 Regime de auditoria das atividades do Banco de Portugal
2.6.1. As contas do BCE e dos BCN têm de ser fiscalizadas por auditores externos independentes,
designados mediante recomendação do Conselho do BCE e aprovados pelo Conselho da UE.
Os auditores têm de ter plenos poderes para examinar todos os livros e contas do BCE e dos
BCN, assim como para obter informações completas sobre as suas operações27. O regime
nacional de auditoria das atividades de um BCN deve ter estes requisitos em conta.
2.6.2. O BCE nota que, nos termos da Proposta de Lei, o BdP continua sujeito a auditorias pelo
Tribunal de Contas, excetuando no que se refere à sua participação no desempenho das
atribuições cometidas ao SEBC28.
2.6.3. Na sequência das alterações introduzidas pela Proposta de Lei – segundo as quais o BdP não
está sujeito ao regime de inspeção e auditoria dos serviços do Estado no que diz respeito à sua
participação no desempenho das atribuições cometidas ao SEBC29 – o BCE entende que o BdP,
para além das supramencionadas auditorias pelo Tribunal de Contas, ficaria também sujeito a
outros tipos de auditorias e inspeções dos serviços do Estado30 em todas as áreas não relativas
à sua participação no desempenho das atribuições cometidas ao SEBC. Tais auditorias e
inspeções dos serviços do Estado seriam executadas por serviços administrativos do Estado,
como a Inspeção-Geral de Finanças (a seguir «IGF»)31. A IGF é um serviço administrativo que
funciona junto do Ministério das Finanças e que atua sob controlo hierárquico direto do Ministro

25 Ver artigo 52.º-B da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
26 Comité de Basileia de Supervisão Bancária, “Princípios Fundamentais para uma Supervisão Bancária Eficaz”,
disponível no sítio web do Banco de Pagamentos Internacionais em www.bis.org.
27 Artigo 27.º dos Estatutos do SEBC.
28 Artigos 54.º, n.º 7 e 64.º, n.º 2, alínea d) da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
29 Artigo 54.º, n.º 6, da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
30 Ver Decreto-Lei n.º 276/2007 que aprova o regime jurídico da atividade de inspeção da administração direta e
indireta do Estado (Decreto-Lei n.º 276/2007, de 31 de Julho).
31 Ver artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 276/2007 que aprova o regime jurídico da atividade de inspeção da
administração direta e indireta do Estado, bem como o Decreto-Lei n.º 96/2012, de 23 de Abril, relativo à
Inspeção-Geral de Finanças, que aprova a orgânica da Inspeção-Geral de Finanças.

 

das Finanças ou do Secretário de Estado competente32, e goza de autonomia técnica no
exercício das suas atribuições33. A IGF é responsável por assegurar o controlo da gestão
financeira do Estado, compreendendo o controlo da legalidade e a auditoria financeira e de
gestão, incluindo inspeções34. Entre outras atribuições, a IGF é responsável pela auditoria e pelo
controlo nos domínios orçamental, económico, financeiro e patrimonial, bem como por auditorias
de sistemas e de desempenho, inspeções, análises de natureza económico-financeira e outros
tipos de exames fiscais e ações de controlo relativos às entidades abrangidas pela sua
intervenção. A IGF é ainda responsável por realizar inspeções, inquéritos, sindicâncias e
averiguações a quaisquer serviços públicos ou pessoas coletivas de direito público, para
avaliação da qualidade dos serviços, através da respetiva eficácia e eficiência, bem como
desenvolver o procedimento disciplinar, quando for o caso, nas entidades abrangidas pela sua
intervenção.
2.6.4. O BCE também entende que, nos termos da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada
pela Proposta de Lei, a exclusão explícita da participação no desempenho das atribuições
cometidas ao SEBC por parte do BdP das auditorias e inspeções que os serviços do Estado e o
Tribunal de Contas podem realizar35 implica que todas as outras atividades do BdP podem ser
incluídas no âmbito de tais inspeções e auditorias.
2.6.5. A este respeito, o BCE tem afirmado repetidamente36 que os serviços de auditoria ou
organismos semelhantes de um Estado-Membro aos quais forem cometidas essas atribuições,
como a IGF ou o Tribunal de Contas, têm de respeitar um certo número de salvaguardas
destinadas a preservar a independência do BCN: a) o âmbito do controlo tem de ser claramente
definido no quadro jurídico aplicável; b) tal controlo tem ser aplicado sem prejuízo das atividades
dos auditores externos independentes do BCN de exame dos livros e das contas do BCN; c) a
auditoria deve respeitar a proibição de procurar influenciar os membros dos órgãos de decisão
do BCN no desempenho das suas atribuições relacionadas com o SEBC e deve ser efetuada
numa base não política, independente e puramente profissional. Complementarmente, as
auditorias relativas a atividades de supervisão do BdP não devem: i) estender-se à aplicação e à
interpretação de normas jurídicas e de práticas de supervisão no contexto do MUS; nem ii) incluir
32 Ver artigo 15.° do Decreto-Lei n.° 276/2007. Igualmente, de acordo com a Lei Orgânica do Ministério das Finanças,
aprovada pelo Decreto-Lei n.º 117/2011, de 15 de dezembro, a IGF foi constituída como um «serviço central» que
integra, nesse Ministério, a administração direta do Estado [artigo 4.º, alínea c) do Decreto-Lei n.º 117/2011]. Os
«serviços centrais» são unidades organizativas dentro da administração direta do Estado sujeitas ao poder
hierárquico do respetivo membro do Governo [ver artigo 2.º, n.º 1, e artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 4/2004, que
estabelece os princípios e normas a que deve obedecer a organização da administração direta do Estado].

33 Ver artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 276/2007.
34 Ver artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 96/2012.
35 Artigo 54.º, n.os 6 e 7, e artigo 64.º, n.º 2, alínea d), da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela
Proposta de Lei.
36 Ver, por exemplo, ponto 3.1.1 do Parecer CON/2018/45, ponto 2.2 do Parecer CON/2017/24 e ponto 2.2 do Parecer
CON/2016/59, bem como o Relatório de Convergência do BCE de 2018, ponto 2.2.3, p.28.

 

ou interferir com as atribuições cometidas ao BCE pelo Regulamento (UE) n.º 1024/2013 do
Conselho37. Dado o âmbito alargado dos poderes da IGF e o facto de a IGF consistir num
serviço administrativo que funciona junto do Ministério das Finanças, sob controlo hierárquico
direto do Ministro das Finanças, as inspeções e auditorias realizadas por um serviço desta
natureza não seriam compatíveis com as salvaguardas supramencionadas destinadas a
preservar a independência do BdP.
2.7 Obrigações do Banco de Portugal em matéria de transparência e de prestação de informações à
Assembleia da República
2.7.1. À imagem de quaisquer deveres de transparência, as normas sobre a informação a ser
publicada no sítio web do BdP38 têm de ser compatíveis com as obrigações em matéria de dever
de segredo consagradas nos Estatutos do SEBC39 e no direito derivado da União40, tendo
especialmente em conta a importância da confidencialidade nos contextos da supervisão
bancária e da gestão de crises. Em consequência, o BCE entende que as considerações
subjacentes às exceções aplicáveis à publicação de certas informações previstas na Lei
Orgânica do BdP se aplicariam não apenas às súmulas das reuniões dos órgãos do BdP mas
também aos pareceres e aos relatórios do conselho consultivo e do conselho de auditoria.
2.7.2. Além disso, quanto aos pareceres e aos relatórios do conselho consultivo e do conselho de
auditoria, o BCE sugere que se pondere cuidadosamente o impacto da publicação dos pareceres
e dos relatórios desses órgãos internos do BdP no funcionamento e no processo decisório do
BdP, tendo também em conta considerações de estabilidade financeira resultantes do impacto
dessa publicação no mercado, em especial quando disserem respeito a assuntos internos do
BdP e se destinarem exclusivamente a uso interno do BdP.
2.7.3. Por fim, quanto à divulgação de informação a comissões parlamentares por membros dos órgãos
internos do BdP41, o BCE assinala que têm de ser postas em prática salvaguardas adequadas
para garantir que as obrigações em matéria de dever de segredo consagradas no direito da
União são respeitadas, incluindo condições para divulgação de informação confidencial de
supervisão42.

37 Regulamento (UE) n.º 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao Banco Central Europeu
atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito
(JO L 287 de 29.10.2013, p. 63).
38 Artigo 66.º, n.º 1, e artigo 67.º da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
39 Artigo 37.º dos Estatutos do SEBC.
40 Ver, por exemplo, artigo 27.º do Regulamento (UE) n.º 1024/2013.
41 Artigo 66.º, n.º 3, da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
42 Ver, por exemplo, artigo 59.º da Diretiva 2013/36/UE.

 

2.8 Responsabilidade do Banco de Portugal e dos seus trabalhadores
2.8.1 A Proposta de Lei altera o quadro de responsabilidade aplicável aos membros do conselho de
administração e aos trabalhadores do BdP, designadamente, ao eliminar as atuais disposições
de acordo com as quais as ações para efetivação da responsabilidade relacionadas com o
desempenho das atribuições do BdP por essas pessoas só podem ser interpostas contra o
próprio BdP, que tem posteriormente direito de regresso contra os seus trabalhadores quanto
aos danos incorridos. De acordo com a Proposta de Lei43, os membros dos órgãos sociais do
BdP (governador, conselho de administração, conselho de auditoria, conselho consultivo e
comissão de ética), bem como os seus trabalhadores, respondem pessoalmente pelo
desempenho das suas atribuições, podendo ser demandados judicialmente diretamente por
terceiros. Neste caso, o apoio jurídico aos membros dos órgãos sociais e aos trabalhadores do
BdP seria, no entanto, garantido por este, sem prejuízo do seu direito de regresso contra eles, se
for esse o caso. Além disso, nos termos da Proposta de Lei, o regime da responsabilidade civil
do Estado44 aplica-se ao BdP, o que confere aos membros do conselho de administração e aos
trabalhadores do BdP um nível de proteção segundo o qual podem responder pelos atos e
omissões cometidos com culpa leve, que representa um baixo grau de negligência, no
cumprimento das suas funções. Tal significa que não se exige que essas pessoas tenham
atuado com dolo ou com negligência grosseira45.
2.8.2 O BCE nota que o novo regime de responsabilidade pode ter um especial impacto nos
trabalhadores do BdP que desempenhem atribuições de supervisão, dado que a adoção de
decisões individuais de supervisão na prossecução dessas atribuições comporta o risco de
ações intentadas contra o supervisor pela instituição de crédito supervisionada ou por outras
partes interessadas afetadas. Essas ações podem dizer respeito, por exemplo, a uma alegada
perda de receitas, perda de oportunidades de negócio, danos causados à reputação comercial,
etc. De facto, as ações desta natureza podem ser intentadas independentemente da correção
das medidas prudenciais adotadas, especialmente quando estiverem envolvidos vários tipos de
partes interessadas com interesses conflituantes, por exemplo os credores de um banco em
dificuldades. Para responder a este risco de contencioso presente na atividade dos supervisores
prudenciais, o Princípio 2 dos Princípios Fundamentais de Basileia dispõe que: a) as leis devem
proteger o supervisor e os seus trabalhadores de ações judiciais relativas a atos e/ou omissões
praticados de boa-fé no exercício das suas funções; e b) o supervisor e os seus trabalhadores
devem ser adequadamente protegidos dos custos associados à defesa dos atos e/ou omissões

43 Artigo 62.º da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
44 Artigo 64.º, n.º 2, alínea c), da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
45 Ver artigo 7.º da Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro.

 

 

praticados de boa-fé no exercício das suas funções46. O BCE assinala que, embora a
determinação do âmbito da responsabilidade associada ao desempenho das atribuições das
ANC seja, em princípio, uma matéria de direito nacional, também é importante para o
funcionamento do MUS que os regimes nacionais de responsabilidade prevejam padrões de
proteção jurídica consentâneos com os Princípios Fundamentais de Basileia. Se a proteção
jurídica disponibilizada aos trabalhadores do BdP for inadequada, a posição dos trabalhadores
do BdP envolvidos em equipas de supervisão conjuntas (ESC) no contexto do MUS pode ficar
comprometida, uma vez que as instruções dadas a esses trabalhadores pelo coordenador da
ESC nos termos do artigo 6.º, n.º 1, do Regulamento (UE) n.º 468/2014 do Banco Central
Europeu47 podem levar a ações contra esses trabalhadores baseadas na sua responsabilidade
pessoal. Por conseguinte, o BCE sugere que seja mantido o atual regime da responsabilidade,
que está alinhado com os Princípios Fundamentais de Basileia, segundo o qual as ações só
podem ser intentadas contra o BdP, excluindo portanto a responsabilidade individual direta dos
membros dos órgãos sociais e dos trabalhadores do BdP.
2.8.3 Neste contexto, o BCE relembra que o Princípio 2 dos Princípios Fundamentais de Basileia exige
que os supervisores bancários tenham independência operacional, o que implica, em especial,
que: i) não haja interferência governamental ou sectorial que comprometa a independência
operacional do supervisor e ii) o supervisor goze de total liberdade para tomar medidas ou
decisões de supervisão relativamente a bancos e grupos bancários sujeitos à sua supervisão.
2.8.4 O BCE nota que o novo regime de responsabilidade pode ter um especial impacto nos membros
do Conselho de Administração e nos trabalhadores do BdP também no contexto de gestão de
crises, em que o BdP pode ter necessidade de actuar de modo eficaz e rápido, com vista a
salvaguardar a estabilidade do sistema financeiro português.
2.9 Comissão de avaliação e remunerações
Conforme tem sido repetidamente afirmado pelo BCE, os Estados-Membros não podem
prejudicar a capacidade de um BCN para contratar e manter o pessoal qualificado necessário ao
desempenho independente das atribuições que lhe são cometidas pelos Tratados e pelos
Estatutos do SEBC48. Em consequência, as alterações às regras sobre o exercício dos poderes
da comissão de avaliação e remunerações em matéria de fixação da remuneração de todos os
46 Princípio 2, critério 9.
47 Regulamento (UE) n.º 468/2014 do Banco Central Europeu, de 16 de abril de 2014, que estabelece o quadro de
cooperação, no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão, entre o Banco Central Europeu e as autoridades
nacionais competentes e com as autoridades nacionais designadas (Regulamento-Quadro do MUS) (BCE/2014/17)
(JO L 141 de 14.5.2014, p. 1).

48 Ver, por exemplo, ponto 2.2 do Parecer CON/2008/9, ponto 3.2.2 do Parecer CON/2008/10, pontos 2.2 e 2.3 do
Parecer CON/2009/45, ponto 2.2 do Parecer CON/2009/47, ponto 4.1 do Parecer CON/2010/42, ponto 3.1.1 do
Parecer CON/2010/51, ponto 2.1 do Parecer CON/2013/92, ponto 3.1.1 do Parecer CON/2014/12 e ponto 4.1.1 do
Parecer CON/2014/38.

 

membros do órgão de administração de todas as entidades que constituem o SNSF, incluindo o
BdP49, no que respeita à remuneração dos membros dos órgãos de decisão do BdP e dos seus
trabalhadores, teriam de ser decididas em colaboração estreita e efetiva com os órgãos de
decisão do BdP para garantir a capacidade continuada do BCN de desempenhar as suas
atribuições com independência50.
2.10 Proibição de financiamento monetário
2.10.1 No que diz respeito ao BdP, os limites decorrentes da proibição de financiamento monetário
prevista no artigo 123.º, n.º 1, TFUE devem ser tidos em conta na conceção do novo quadro
institucional do sistema de supervisão financeira em Portugal. O BCE tem afirmado
repetidamente que a legislação nacional não pode exigir que um BCN financie o exercício de
funções do setor público51, uma vez que tal teria um efeito equivalente a uma concessão de
crédito. Logo, embora uma concessão de crédito implique uma obrigação de reembolso dos
fundos, o artigo 123.º, n.º 1, TFUE também se aplica a formas de financiamento que não
impliquem uma obrigação de reembolso dos fundos.
2.10.2 Em especial, o BCE nota que a Proposta de Lei prevê o financiamento da Autoridade da
Concorrência pelo BdP, entre outros52. No entanto, não há qualquer indicação de que a
autorização dada pela Proposta de Lei ao BdP para liquidar e cobrar taxas em nome e por conta
de outras entidades, nacionais ou europeias53, confie ao BdP a tarefa de cobrar taxas no âmbito
da atividade específica da Autoridade da Concorrência.
2.10.3 O projetado financiamento da Autoridade da Concorrência pelo BdP seria incompatível com a
proibição de financiamento monetário prevista no artigo 123.º, n.º 1, TFUE, que, entre outros
aspetos, proíbe a concessão de créditos, sob a forma de descobertos ou sob qualquer outra
forma, por um BCN a favor do setor público. Na medida em que a atividade da Autoridade da
Concorrência seja financiada não só por fundos fornecidos por autoridades reguladoras setoriais
e por taxas cobradas no âmbito da sua atividade específica mas também por fundos fornecidos
pelo BdP, o objetivo do artigo 123.º, n.º 1, TFUE, isto é, a manutenção de uma sólida política
orçamental por parte dos Estados-Membros, é contornado54.
2.10.4 Pelos mesmos motivos, a prossecução de atribuições, cometidas ao BdP, por uma pessoa
coletiva de direito público diferente, não pode ser prevista de uma forma que o BdP
simplesmente financie uma pessoa coletiva de direito público sem ter controlo sobre a mesma,

49 Artigo 32.º da Proposta de Lei.
50 Ver ponto 2.1 do Parecer CON/2013/92 e ponto 4.1.1 do Parecer CON/2014/38.
51 Ver Relatório de Convergência do BCE de 2018, ponto 2.2.5.1 pp. 30.
52 Ver artigo 5.º, n.º 3, do Regime Jurídico da Concorrência e artigo 35.º, n.º 1, dos Estatutos da Autoridade da
Concorrência, na redação que lhes é dada pela Proposta de Lei.
53 Artigo 52.º-A, n.º 3, da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
54 Ver pontos 2.3 e 2.4 do Parecer CON/2017/43.

 

por exemplo, um esquema semelhante ao projetado financiamento da Autoridade da
Concorrência. Neste contexto, importaria determinar se a contribuição financeira do BdP é
proporcional à participação geral e influência do BdP no desempenho das atribuições da pessoa
coletiva pública em causa.
2.11 Possibilidade de atribuições de supervisão cometidas ao Banco de Portugal serem prosseguidas
por uma pessoa coletiva de direito público diferente
2.11.1 O BCE entende que, nesta fase, a Proposta de Lei só prevê a possibilidade de, no futuro, serem
cometidas atribuições de supervisão a uma pessoa coletiva de direito público diferente, sob a
dependência ou a autoridade do BdP55. Nos termos do artigo 127, n.º 4, e do artigo 282.º, n.º 5,
TFUE, o BCE teria de ser consultado sobre legislação complementar que estabelecesse ou
desenvolvesse o quadro em que as atribuições de supervisão atualmente cometidas ao BdP
fossem exercidas por uma pessoa coletiva de direito público diferente. Além disso, o BCE
recomenda que qualquer eventual recurso à cláusula que prevê tal possibilidade seja precedido
por colaboração estreita e efetiva com o BdP, tendo devidamente em conta a opinião do BdP,
para garantir a independência operacional do supervisor bancário.
2.11.2 O Princípio 2 dos Princípios Fundamentais de Basileia exige que os supervisores bancários
tenham independência operacional (com as implicações referidas acima no ponto 2.8.3). Este
princípio está refletido em relação ao MUS no artigo 19.º do Regulamento do MUS, que exige
que as ANC que compõem o MUS devem agir de forma independente e que os governos dos
Estados-Membros e outros organismos devem respeitar essa independência. Por conseguinte, o
BCE recomenda que as disposições relativas à criação e ao funcionamento de uma pessoa
coletiva de direito público separada responsável por desempenhar atribuições de supervisão sob
a autoridade do BdP incluam expressamente salvaguardas de independência de tal entidade
análogas às previstas na Lei Orgânica do BdP.
2.11.3 O BCE recomenda que as disposições relativas à criação e ao funcionamento de uma pessoa
coletiva de direito público separada, em conjunto com a Lei Orgânica do BdP, garantam a
atribuição clara do estatuto de ANC em Portugal e especifiquem a competência do BdP para
conduzir o desempenho das funções da ANC no seio do MUS, em especial as relacionadas com
a participação no Conselho de Supervisão, nas ESC e noutras estruturas do MUS. Além disso, a
criação de uma pessoa coletiva de direito público separada responsável por atribuições de
supervisão prudencial sob a autoridade do BdP não deve interferir com o desempenho efetivo de
outras atribuições do BdP relacionadas com o funcionamento do Sistema Europeu de
Supervisores Financeiros, tais como o contributo do BdP para o trabalho do CERS, assim como

55 Artigo 17.º, n.º 6, da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.

 

com as atribuições acessórias do BdP relacionadas com o funcionamento do Mecanismo Único
de Resolução, tais como as atribuições relacionadas com o planeamento da resolução.
2.12 Poderes do Banco de Portugal em matéria de resolução de conflitos
Relativamente aos poderes de «resolução de conflitos» a serem conferidos ao BdP nos termos
da Proposta de Lei56, conjuntamente com outros poderes de regulação, supervisão e
sancionatórios, o BCE considera que o termo «resolução de conflitos» não é claro neste
contexto. Estes poderes atualmente não estão conferidos ao BdP, dado que não fazem parte do
atual conjunto de poderes conferidos ao BdP para supervisionar as relações entre os bancos e
os seus clientes. O BCE sugere que a Proposta de Lei seja clarificada quanto a este ponto.
2.13 Conselho Nacional de Supervisores Financeiros
A Proposta de Lei não é clara quanto às atribuições do CNSF em matéria de coordenação das
respostas a pedidos de entidades nacionais e estrangeiras, bem como de organizações
internacionais57. O impacto deste poder deve ser avaliado cuidadosamente porque se todos os
pedidos tiverem de ser endereçados ao CNSF e coordenados por esta entidade, essa situação
pode causar um atraso considerável na capacidade do BdP de responder enquanto ANC no
contexto do MUS.
2.14 Papel do Banco de Portugal na política macroprudencial
2.14.1 O BCE apoia a conceção efetiva de um quadro de política macroprudencial nos
Estados-Membros, em linha com os princípios orientadores expressos na Recomendação
CERS/2011/3 do Comité Europeu do Risco Sistémico58. É tomada nota da atribuição ao CNSF
da coordenação entre autoridades de supervisão e dos poderes de agir como nova autoridade
macroprudencial. No entanto, nos Estados-Membros com um mercado financeiro relativamente
pequeno, como é o caso de Portugal, existem argumentos, de uma perspetiva de eficiência e de
sinergias, a favor da concentração das responsabilidades de supervisão e macroprudenciais
numa única autoridade59.
2.14.2 De acordo com o considerando 24 do Regulamento (UE) n.º 1092/2010 do Parlamento Europeu
e do Conselho60 e com a Recomendação CERS/2011/3, o BCE e os BCN devem desempenhar

 

56 Artigo 12.º-B da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
57 Artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do projeto de Estatutos do CNSF, juntos à Proposta de Lei como Anexo III.
58 Recomendação do Comité Europeu do Risco Sistémico, de 22 de dezembro de 2011, relativa ao mandato
macroprudencial das autoridades nacionais (CERS/2011/3) (JO C 41 de 14.2.2012, p. 1).
59 Ver ponto 4 do Parecer CON/2005/39 e ponto 2 do Parecer CON/2013/56.
60 Regulamento (UE) n.º 1092/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de novembro de 2010, relativo à
supervisão macroprudencial do sistema financeiro na União Europeia e que cria o Comité Europeu do Risco
Sistémico (JO L 331 de 15.12.2010, p. 1). O considerando 24 do Regulamento dispõe: «O BCE e os bancos
centrais nacionais deverão desempenhar um papel de primeiro plano na supervisão macroprudencial, devido à sua
experiência e às responsabilidades que têm na área da estabilidade financeira. Os supervisores nacionais deverão
participar, contribuindo com os seus conhecimentos específicos. A participação dos supervisores microprudenciais
nos trabalhos do [CERS] é essencial para assegurar que a avaliação do risco macroprudencial se baseie em

 

um papel de primeiro plano na supervisão macroprudencial, devido à sua experiência e às
responsabilidades que têm na área da estabilidade financeira61. No entanto, é duvidoso ou, no
mínimo, pouco claro se a Proposta de Lei cumpre este princípio62. Apesar do facto de a Proposta
de Lei prever que o governador do Banco de Portugal dirija as discussões sobre matérias
macroprudenciais durante as reuniões do conselho de administração do CNSF63, tendo em conta
que o BdP só teria dois representantes no conselho de administração do CNSF64, parece
duvidoso que BdP mantenha um papel de primeiro plano em matéria de política
macroprudencial. Além disso, o facto de que o governador do BdP representaria o CNSF com
direito de voto no Conselho Geral do CERS não parece, por si só, conferir um papel de primeiro
plano para o BdP.
2.14.3 A interação entre o BdP e o CNSF relativamente à avaliação do risco sistémico e à
implementação de medidas macroprudenciais também parece pouco clara. Nos termos da
Proposta de Lei, parece que o CNSF e o BdP avaliariam o risco sistémico em paralelo. No
entanto, a interação entre o BdP e a nova autoridade macroprudencial ou a nova autoridade
designada65 não está claramente definida na Proposta de Lei, o que causa preocupação quanto
à implementação do novo regime macroprudencial e, em especial, ao acionamento de
instrumentos macroprudenciais. A participação do BdP no CNSF deverá permitir um
acompanhamento efetivo dos riscos sistémicos identificados durante a atividade analítica do
BdP. Deverá ser considerada a atribuição de um papel mais proeminente ao BdP, não apenas
na disponibilização de apoio analítico ao CNSF, mas também na condução da forma como o
CNSF trabalha. Da mesma forma, a Proposta de Lei poderia ser mais clara no que diz respeito à
alocação de atribuições relativamente ao acionamento desses instrumentos (ver ponto 2.15).
informações completas e exatas sobre a evolução do sistema financeiro. Assim, os presidentes das [AESs] deverão
ser membros com direito de voto. Nas reuniões do Conselho Geral deverá participar, sem direito de voto, um
representante das autoridades nacionais de supervisão competentes de cada Estado-Membro. Num espírito de
abertura, 15 personalidades independentes deverão facultar ao [CERS] competências técnicas externas através do
Comité Científico Consultivo».
61 Ver também ponto 4 do Parecer CON/2005/39, ponto 2 do Parecer CON/2013/56, ponto 2.1 do Parecer
CON/2013/66, ponto 2.1 do Parecer CON/2013/54, ponto 2.1 do Parecer CON/2013/45, ponto 2.1 do Parecer
CON/2013/30, ponto 5.2 do Parecer CON/2014/46, ponto 2.3 do Parecer CON/2014/21 e ponto 3.1 do Parecer
2019/10.
62 Conforme foi assinalado pelo CERS, o papel de primeiro plano de um banco central é garantido pelo facto de que: i)
o banco central é a autoridade macroprudencial; ii) o banco central tem a maioria dos representantes com direito de
voto no conselho nos casos em que as decisões são aprovadas por maioria; ou não são conferidos poderes de veto
a outros membros do conselho, nos casos em que as decisões são aprovadas por unanimidade; iii) o banco central
conduz a análise macroprudencial; iv) o banco central prepara os principais documentos a serem discutidos pelo
conselho; v) e/ou o banco central é responsável por assegurar o secretariado do conselho; (vi) e/ou o governador
do banco central preside ao conselho e tem voto de qualidade.

63 Artigo 30.º, nº 1, e artigo 36.º, n.º 5, dos Estatutos do CNSF, juntos à Proposta de Lei como Anexo III.
64 Artigo 36.º dos Estatutos do CNSF, juntos à Proposta de Lei como Anexo III.
65 Infere-se do texto da Proposta de Lei, embora em termos não inteiramente claros, que o CNSF passa a ser a
autoridade designada, bem como a autoridade macroprudencial, em vez do BdP

 

2.14.4 Por último, o BCE congratula-se com as disposições da Proposta de Lei que dispõem que o
CNSF deve colaborar, entre outras entidades, com o BCE, o CERS e outras autoridades
macroprudenciais nacionais66. Conforme já foi anteriormente assinalado pelo BCE67, deve ser
assegurado que a nova autoridade macroprudencial também colabore e partilhe dados e
informações com o BCE e o CERS, de acordo com as Recomendações do CERS.
2.15 Âmbito e alocação de poderes entre a autoridade macroprudencial e o BdP no seu papel de
autoridade sectorial
2.15.1 Devem estabelecer-se procedimentos claros e céleres para a atribuição de instrumentos à
autoridade macroprudencial, que tem de deter o controlo dos instrumentos adequados para
prosseguir os seus objetivos68. Não é claro na Proposta de Lei se o CNSF tem poder decisório
ou o poder para fazer recomendações públicas sobre instrumentos macroprudenciais existentes,
assim como o poder de tomar decisões sobre novos instrumentos macroprudenciais ou fazer
recomendações relacionadas ao legislador. Poderia, igualmente, ser clarificado qual destas
entidades (o CNSF ou o BdP) será responsável por aplicar decisões macroprudenciais, incluindo
o exercício do poder sancionatório, bem como quais os instrumentos que ficam sob o controlo
direto do CNSF e quais ficam sob o controlo do BdP. Além disso, não é claro que significado se
pretende atribuir a medidas de natureza transversal, dado que não existe na Proposta de Lei
qualquer critério expresso para o efeito69.
2.15.2 A Proposta de Lei dispõe que o CNSF é responsável pela adoção de medidas e pelo
acompanhamento da respetiva implementação70. Todavia, não é claro se esta adoção de
medidas só diz respeito a medidas com impacto transversal ou também a quaisquer outras
medidas macroprudenciais, porquanto são conferidos ao CNSF poderes para adotar as medidas
macroprudenciais harmonizadas da União previstas no Regulamento (UE) n.º 575/2013 e na
Diretiva 2013/36/EU, que se aplicam unicamente a instituições de crédito, enquanto que,
segundo outras disposições da Proposta de Lei, o CNSF deverá apenas ser informado pelas
autoridades de supervisão da sua intenção de adotar medidas macroprudenciais que não
tenham um impacto transversal no setor financeiro. Além disso, também não é claro como é que
a autoridade de supervisão competente irá interagir com a autoridade
macroprudencial/autoridade designada relativamente ao acionamento dos artigos 124.º e 164.º
do Regulamento (UE) n.º 575/2013, que se aplicam às posições em risco de bancos relativas a
imóveis residenciais e comerciais, com base em preocupações de estabilidade financeira.

66 Artigo 19.º, n.º 2, e artigo 22.º dos Estatutos do CNSF, juntos à Proposta de Lei como Anexo III.
67 Ver ponto 2.4 do Parecer CON/2013/54 e ponto 2.6 do Parecer CON/2013/70.
68 Recomendação C(4) da Recomendação CERS/2011/3.
69 Ver, em especial, o artigo 6.º e o artigo 26.º, n.º 1, dos Estatutos do CNSF, juntos à Proposta de Lei como Anexo III.
70 Artigo 19.º dos Estatutos do CNSF, juntos à Proposta de Lei como Anexo III.

2.15.3 Uma clara identificação dos instrumentos macroprudenciais (incluindo medidas harmonizadas e
não harmonizadas da União) a que o CNSF e, quando aplicável, autoridades de supervisão
sectoriais, como o BdP, podem recorrer seria portanto vista com bons olhos, permitindo maior
clareza no exercício de poderes macroprudenciais.
2.16 Papel do Banco de Portugal no planeamento da resolução
2.16.1 Embora a Proposta de Lei preveja a criação da Autoridade de Resolução, que assumiria as
responsabilidades do BdP como autoridade nacional de resolução (ANR) designada, o BdP
reteria determinadas competências relacionadas com o planeamento da resolução nos termos
da Proposta de Lei71, ao passo que a Autoridade de Resolução passaria a ser responsável por
exercer os poderes e as ferramentas de resolução. Deve notar-se que, nos termos da Diretiva
2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho72, as ANR são responsáveis por elaborar
planos de resolução, ao passo que as ANC, na aceção do Regulamento (UE) n.º 575/2013, têm
um papel puramente consultivo, salvo se estas forem também designadas como ANR73. Parece
que o papel do BdP como ANC74 não constituiria, por si só, base jurídica suficiente para que
mantenha competências em matéria de planeamento da resolução, na falta da sua designação
como ANR.
2.16.2 Neste contexto, também se assinala que os artigos correspondentes do RGICSF relativos aos
planos de resolução75 são alterados pela Proposta de Lei, no sentido de substituir as referências
ao BdP por referências genéricas à «autoridade de resolução». Por conseguinte, seria útil
clarificar a base jurídica com fundamento na qual o BdP assumiria atribuições acessórias
relacionadas com a resolução, dado que aparentemente deixaria de ser a ANR76. A identificação
inequívoca da autoridade de resolução ou das autoridades designadas por Portugal de acordo
com o artigo 3.º da Diretiva 2014/59/UE em relação à totalidade ou parte das competências nela
previstas, consoante as circunstâncias, pode também ser importante para a ANC, na aceção do
Regulamento (UE) n.º 575/2013, no que diz respeito às atividades de troca de informações e de
colaboração face à autoridade ou autoridades de resolução relevantes, nos termos do quadro
jurídico aplicável.

71 Artigo 17.º-A da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei e artigo 2.º, n.º 1, e artigo 8.º
dos Estatutos da Autoridade de Resolução, juntos à Proposta de Lei como Anexo IV.
72 Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, que estabelece um
enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento e que
altera a Diretiva 82/891/CEE do Conselho, e as Diretivas 2001/24/CE, 2002/47/CE, 2004/25/CE, 2005/56/CE,
2007/36/CE, 2011/35/UE, 2012/30/UE e 2013/36/UE e os Regulamentos (UE) n.º 1093/2010 e (UE) n.º 648/2012
do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 173 de 12.6.2014, p. 190).
73 Ver artigo 10.º da Diretiva 2014/59/UE.
74 Ver artigo 17.º da Lei Orgânica do BdP, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
75 Em especial, artigo 116.º-J do RGICSF, na redação que lhe é dada pela Proposta de Lei.
76 Em especial, a relação entre as referências no RGICSF a «autoridade de resolução» fora do Título VIII, Capítulo III
do RGICSF e o artigo 2.º, n.º 1 do projeto de Estatutos da Autoridade de Resolução, que classificam esta última
como ANR, deve portanto ser clarificada.

 

2.16.3 Além disso, a segregação de atribuições relacionadas com a resolução, em especial, a
segregação do planeamento da resolução e o exercício de poderes e ferramentas de resolução,
é permitida pela Diretiva 2014/59/UE, excecionalmente, na medida em que se garanta que essa
separação não prejudica a eficácia das medidas de resolução. A separação cria a necessidade
de uma colaboração mais estreita e de uma partilha adequada de informações entre a
Autoridade de Resolução e o BdP, nomeadamente para garantir que podem ser tomadas
medidas de resolução atempadas. Para este fim, seria aconselhável rever e reforçar a
adequação das disposições relevantes da Proposta de Lei em matéria de colaboração, incluindo
a partilha de informações entre autoridades. No entanto, independentemente da adequação dos
mecanismos de colaboração e partilha de informações, a consolidação de funções de resolução
pode servir para melhorar a eficácia do processo de resolução, que já é complexo por si só77.
Face à complexidade elevada desse processo, devem evitar-se dificuldades operacionais e
práticas decorrentes de eventuais áreas cinzentas na distribuição de competências entre
autoridades. Dado que o BdP assumiria a liderança do planeamento da resolução e a Autoridade
de Resolução seria responsável pela execução das ferramentas de resolução, seria importante
existir um entendimento comum sobre o plano de resolução78, considerando também que existe
risco para a reputação do BdP caso a execução dos planos de resolução pela Autoridade de
Resolução não seja bem sucedida.
2.16.4 Relativamente à criação de uma nova autoridade responsável pelo exercício de poderes e
ferramentas de resolução, os Estados-Membros devem assegurar que a autoridade competente
e a autoridade de resolução mantenham um intercâmbio adequado de informações com o banco
central, quando este último não seja ele próprio a autoridade de resolução79.
O presente parecer será publicado no sítio web do BCE.
Feito em Frankfurt am Main, em 21 de maio de 2019.
[assinado]
O Presidente do BCE
Mario DRAGHI
77 Ver Spain: Financial Sector Assessment Program-Technical Note-Bank Resolution and Crisis Management
Frameworks, Fundo Monetário Internacional (FMI), 13 de novembro de 2017. Disponível no sítio web do FMI em
www.imf.org.
78 Ver ponto 3.2 do Parecer CON/2015/19.
79 Ver ponto 3.1 do Parecer CON/2012/99.