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Lesados do BES querem Carlos Costa e membros do Governo arguidos no caso GES

Terça-feira, Setembro 21st, 2021

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Eco

Lesados do BES querem Carlos Costa e membros do Governo arguidos no caso GES

Quase 200 lesados do BES são agora assistentes no caso GES e pediram, na abertura de instrução, que Carlos Costa e Passos Coelho, PM à data da resolução do banco, sejam também arguidos.

Os lesados do BES — que já são assistentes no caso do Universo Espírito Santo/GES — pediram a instrução do processo em que um dos objetivos principais passa por apurar as responsabilidades criminais dos supervisores e governantes, à data da resolução do BES, em agosto de 2014. Ou seja: Carlos Costa e o titular do Governo, Pedro Passos Coelho, pelo menos. Para isso, fazem o pedido ao juiz de instrução — que neste caso pode vir a ser Carlos Alexandre ou Ivo Rosa — para que a investigação seja mais aprofundada, já que defendem que Ricardo Salgado não pode ser o único a ser incriminado.

O requerimento — a que o ECO/Advocatus teve acesso — revela que “a estratégia da acusação parece ser a de incriminar o Ricardo Salgado e uma dúzia de colaboradores e de ilibar as responsabilidades dos agentes políticos da resolução, dos membros da administração do BdP, dos membros dos órgão sociais das empresas onde que foram cometidas irregularidades e, muito em especial, dos contabilistas responsáveis pelas escritas que se dizem falsificadas e dos auditores que garantiram que tais escritas foram falsificadas, bem como dos membros de conselhos fiscais”, diz o documento assinado pelo advogado Miguel Reis.

Para isso, pedem que a investigação criminal no caso GES não se limite a Ricardo Salgado, já que se criou uma “falsa ideia de que Ricardo Salgado era uma espécie de ‘dono disto tudo’ apenas para branquear o assalto pelo Banco de Portugal ao principal banco português”.

Por isso, o que é que os cerca de 170 lesados do BES pedem, em concreto?

  • Uma adequada investigação criminal, no país e no estrangeiro, de forma a apurar a verdade material dos factos que conduziram à resolução do BES;
  • Que sejam constituídos arguidos o governador Carlos Costa e administradores do Banco de Portugal, investigando se os seus atos e comportamentos na fase anterior e na fase posterior à medida de resolução;
  • Que sejam constituídos arguidos todos os indivíduos que desempenharam funções nos órgãos sociais do BES e das empresas do GES que sejam devedoras, investigando-se as suas responsabilidades na criação do “buraco” financeiro;
  • Que sejam constituídos arguidos os membros dos órgãos sociais do Novo Banco para que esclareçam como chegou a esse banco o património que era do BES e quais as contrapartidas nas escritas de um e outro;
  • Que se constituam como arguidos os revisores oficiais de contas e os auditores do BES nos últimos quatro anos anteriores à resolução, para que expliquem as divergências entre o que consta dos relatórios de contas do BES e o que foi afirmado pelo BdP;
  • Que se investiguem as condições e as circunstâncias da destruição da garantia soberana do República de Angola, apreendendo-se todos os documentos existentes e apurando-se onde está a dita garantia;
  • Que se investigue o destino que tiveram os fundos que, alegadamente, foram contabilizados a débito do BESA não tendo sido, porém, enviados para Angola;
  • Que se proceda à apreensão de toda a “escrita mercantil” e dos computadores do BES de forma a evitar a sua destruição, que impedirá a descoberta da verdade material e que se proceda a exame pericial dessa escrita, de forma adequada a explicar as divergências entre as informações dos balanços e demonstrações de resultados anteriores à medida de resolução e dos que foram publicados depois dela;
  • Que se ordene a apreensão de todos os bens das pessoas acima citadas, de forma a assegurar que elas não os delapidem, reduzindo a zero a garantia das suas obrigações;
  • Que se ouçam um a um os aqui assistentes (lesados do BES) para que possam explicar ao Tribunal as circunstâncias em que forem enganados e oferecer provas dos enganos de que foram vítimas.

A figura processual de assistente, diz-nos a lei, é uma espécie de “colaborador do Ministério Público” e que passa a ter poderes que lhe permitam intervir diretamente no andamento do processo. Pode assim intervir no inquérito e na instrução, oferecendo provas e requerendo as diligências que considere necessárias, como foi o caso agora com este pedido de instrução. O assistente tem ainda outros direitos, com destaque para os relativos à fase de julgamento. Pode, nomeadamente, participar na audiência, fazer alegações no final desta através do seu advogado, pronunciar‑se sobre os meios de prova, arrolar testemunhas e questionar diretamente essas testemunhas e as arroladas pelo arguido.

O grupo de lesados em questão considera, assim, que “Ricardo Salgado não tinha sequer, sozinho, poderes fazer o que lhe é imputado”, que a generalidade dos factos que lhe são imputados são relativos à atividade de órgãos colegiais e que, nesse sentido, “a acusação constitui um excelente instrumento de trabalho, para que se questione… quem são os outros”.

O advogado do grupo de quase 200 lesados argumenta assim que “esta causa (o universo criminal conexo com a resolução do BES) tem que ir a julgamento, mas consideramos que o julgamento pode ser um fracasso se não se melhorar a investigação e se não se imputarem responsabilidade a todos os que agiram e participaram, com dolo ou mera culpa, no quadro da ação penal que antecedeu a resolução do BES”.

E que argumentação apresentam os lesados do BES?

  • “A mera incriminação do Ricardo Salgado e de alguns dos seus compagnons de route não só não é suficiente como não passa de uma espécie de ópera bufa, com vista a reduzir ou anular as responsabilidades do Estado e do Banco de Portugal pelos prejuízos que causaram aos investidores, especialmente aos pequenos”;
  • “A medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal ao Banco Espírito Santo foi uma operação obscura, que suscita uma série de dúvidas e indicia, de forma muito clara, a prática de atos que são sancionados pela lei penal e que, por isso mesmo, têm que ser investigados como é próprio dos crimes”;
  • “E porque é que (Carlos Costa) mentiu ao próprio Presidente da República, que disse claramente, a 27 de julho de 2014, que as informações de que o Banco Espírito Santo era seguro lhe forma garantidas pelo Banco de Portugal. Estivemos, obviamente, perante manobras políticas, porque é, essencialmente, político tudo o que tem a ver com a resolução”;
  • “A verdade nua e crua é que enquanto o Ricardo Salgado presidiu ao Conselho de Administração do BES, sempre foram cumpridas as obrigações assumidas para com os assistentes”;
  • “É do conhecimento comum que, durante anos, o BES criou empregos dourados para políticos de todos os partidos e era uma entidade querida de todos os clubes de futebol, dos jornais e das televisões. Se o arguido Ricardo Salgado fosse o DDT não tinha permitido o que aconteceu por determinação do Banco de Portugal”;
  • “Os diretores do Banco de Portugal dedicados à supervisão foram empregar-se na PWC e que esta é a “entidade independente” contratada pelo BdP para proceder à avaliação. É legítimo questionar se esses funcionários não influenciaram a medida de resolução, com a intenção de obterem benefícios pessoais, com um novo emprego, projetado pelo facto de terem sido responsáveis pela área de supervisão no Banco de Portugal”;
  • “Os assistentes foram, enganados porque, em ação conjunta, os responsáveis pelo Banco Espírito Santo, os responsáveis pelo Banco de Portugal e os responsáveis pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, com a cobertura do Primeiro Ministro, dos membros do Governo e do próprio Presidente da República, os enganaram e os induziram na ideia de que o Banco Espírito Santo era um banco sólido, que merecia toda a confiança”.
  • “Não pode continuar a branquear-se a realidade, ocultando-se ou omitindo-se que o Banco de Portugal é uma autoridade de polícia financeira, não havendo nenhuma razão para tolerar as omissões dos seus funcionários e, muito menos, que os seus funcionários possam aproveitar-se do exercício das funções para se venderem a entidades comerciais que só os contratam em razão da informação que têm”.
  • “Ao decidir como decidiu, no sentido de não cobrar nem tomar providências para a cobrança de quaisquer créditos sobre as demais entidades do Grupo Espírito Santo, o Banco de Portugal agiu de forma adequada a proteger essas entidades devedoras e a prejudicar os acionistas e demais investidores do Banco Espírito Santo”;
  • “A resolução do BES foi uma operação muito mais lesiva dos direitos dos cidadãos em geral e dos investidores em particular do que as nacionalizações da banca, a seguir ao 11 de março de 1975”;
  • “O património que constituía garantia geral das obrigações dos assistentes foi generosamente desviado e delapidado, em termos que carecem de investigação criminal, por serem enormes os indícios de gestão danosa”;
  • “Reitera-se que até ao dia 4 de agosto de 2014, não tiveram nenhuma razão de queixa de ninguém, porque o Banco Espírito Santo S.A. sempre cumpriu, rigorosa e pontualmente as suas obrigações de pagamento e nunca nenhum dos reguladores avisou de que havia qualquer tipo de risco relativamente aos investimentos que fizeram”.

 a 31 de dezembro de 2014, em representação de 170 lesados do BES, o advogado Miguel Reis subscreveu uma queixa criminal contra “desconhecidos, porém identificáveis” no Tribunal Central de Investigação Criminal requerendo a abertura do devido inquérito para a investigação de indícios de crime que, do nosso ponto de vista, justificavam o procedimento criminal. “Mas o juiz Carlos Alexandre chutou-nos para canto”. O Tribunal Central de Instrução Criminal “nem sequer nos respondeu, não autuando o processo e chutando com o mesmo para o DIAP, onde está parado desde 13 de janeiro de 2015”, explica o mesmo advogado.

Em 2017 foi encontrada uma solução (entre a associação de lesados, Governo, CMVM e BdP) para os clientes que, aos balcões do BES, investiram 434 milhões de euros em papel comercial das empresas Espírito Santo Financial e Rio Forte, e cujo investimento perderam com o colapso do Grupo Espírito Santo (no verão de 2014).

A solução implicou que os lesados que aderiram ao Fundo de Recuperação de Créditos recuperam 75% do valor investido, num máximo de 250 mil euros, isto se tiverem aplicações até 500 mil euros. Já acima desse valor, o valor recuperado é de 50% do investimento.

“O mais louco fim de semana das últimas décadas”: Conheça os bastidores da resolução do BES

Quinta-feira, Agosto 5th, 2021

Citamos

Económico

Faz esta terça-feira sete anos anos que caiu um banco centenário. Era a última pedra a cair de todo o edifício do Grupo Espírito Santo que ruíra por contas falsas e endividamento excessivo. Os lesados foram muitos e espalhados por todos os cantos do mundo e ainda hoje se fazem ouvir em manifestações, protestos, ações judiciais e comunicados.

Às 22h45 de domingo, 3 de Agosto de 2014, Carlos Costa falou ao país e anunciou a resolução que ditou o fim do Banco Espírito Santo. Com um discurso solene em que diz “o Conselho de Administração do Banco de Portugal deliberou hoje [3 de agosto de 2014] aplicar ao Banco Espírito Santo SA uma Medida de Resolução”.

“A generalidade da atividade e do património do BES é transferida para um banco novo denominado de Novo Banco devidamente capitalizado e expurgado de ativos problemáticos”, dizia Carlos Costa.

Mais tarde verificou-se que afinal não tinha sido suficiente essa expurga de ativos problemáticos, havia mais para retirar e só isso explica o mecanismo de capitalização contingente (de 3,89 mil milhões de euros) a cargo do Fundo de Resolução nacional que teve de ser criado para que o Novo Banco conseguisse ser vendido ao Lone Star. Pelo caminho fica uma tentativa de venda falhada e a necessidade de recapitalização do banco com a retransmissão de cinco séries de obrigações seniores detidas pelos fundos institucionais (entre eles a BlackRock e a Pimco, e que agora se agruparam no Novo Note Group ) de 100 mil euros de subscrição mínima, para o BES em dezembro de 2015. O que levou o Banco de Portugal em 2015 a escolher apenas estas cinco séries de obrigações seniores para recapitalizar o Novo Banco, que na altura se defrontava com um gap de 2 mil milhões entre o valor real dos ativos e o seu valor contabilístico? O supervisor escolheu as cinco séries de obrigações seniores (já não havia credores subordinados) porque eram as únicas que tinham um valor unitário de 100 mil euros e que tinham sido colocadas em institucionais no mercado primário.

Pelo caminho um processo do Goldman Sachs que o Banco de Portugal ganhou recentemente em Londres. Em causa o facto de a 3 de julho de 2014 (a um mês da resolução), a Oak Finance Luxembourg ter celebrado com o BES um “facility agreement” (contrato de financiamento), regido por lei inglesa e sujeito à jurisdição dos tribunais ingleses, nos termos do qual a Oak Finance emprestou cerca de 835 milhões de dólares ao BES. Com essa operação António Esteves, à data ‘partner’ do Goldman Sachs com responsabilidade pelo mercado português, acaba por sair do banco norte-americano.

Faz esta terça-feira sete anos que caiu um banco centenário. Era a última pedra a cair de todo o edifício do Grupo Espírito Santo que ruíra por contas falsas e endividamento excessivo. Os lesados foram muitos e espalhados por todos os cantos do mundo e ainda hoje se fazem ouvir em manifestações, protestos e comunicados, mesmo depois de alguns terem já sido salvos por soluções financeiras lideradas pelo Governo e reguladores.

Recordemos o que se passou nesse famoso fim de semana em que o BES desaparece e que está descrito no livro O Fim da Era Espírito Santo:

Esse foi o mais louco fim-de-semana das últimas décadas. Quem o viveu nunca mais o esquece. A solução para recapitalizar o Banco Espírito Santo haveria de se encontrar em 48 horas. Segunda-feira, dia 4 de Agosto, teria que haver uma resposta à situação. Um resgate, que precisava da participação da Comissão Europeia, que tem de aprovar toda a espécie de apoios do Estado. Por isso, uma equipa da Direcção-Geral da Concorrência, de Bruxelas, está em contacto directo com o Banco de Portugal, por telefone, que o tempo não dava para perder horas e minutos em aeroportos e voos. O Banco de Portugal contratara uma equipa de advogados, da sociedade Vieira de Almeida & Associados. Ao todo estão cerca de 60 pessoas a trabalhar para desenhar a solução e a alteração à lei bancária para dar poder a Carlos Costa para implementar a solução, a Resolução.

Economistas, técnicos do Banco de Portugal, advogados da sociedade de João Vieira de Almeida – que tinha à frente neste projecto Pedro Cassiano Santos, notários, membros do Governo, todos reunidos para uma maratona de 48 horas, encomendavam sandwiches ao almoço e jantar, as mangas estavam arregaçadas para fazer face ao calor, ainda que moderado, de Agosto, águas em garrafas com fartura, papelada e muitos telefones, computadores, tablets e livros com leis. Quase ninguém dormiu. Muitas videoconferências, Carlos Costa com Carlos Tavares, Carlos Costa com Mário Draghi. A elaboração da complexa solução para o BES obrigou a horas infindáveis de reuniões e acertos técnicos, com uma equipe de juristas, técnicos e economistas, e tudo o que mais se mostrasse necessário para cumprir o prazo limite para entrar em vigor, que era na segunda-feira.

Vítor Bento, José Honório, João Moreira Rato só souberam da Resolução na sexta-feira e à noite. A Ministra das Finanças reuniu-se na véspera, quinta-feira, com Vítor Bento, a pedido do presidente do BES onde lhe explica quais são as alternativas legais para a intervenção do Estado. Nesta altura já se sabia que havia a fortíssima possibilidade de ser necessária a ajuda do Estado. Era a primeira vez que a administração do Novo Banco se reunia com a Ministra das Finanças. Vítor Bento ouve da boca de Maria Luís Albuquerque, que já vinha contactando com os manda-chuvas de Bruxelas, que havia a possibilidade de ser aplicada a Medida de Resolução, prevista na nova legislação europeia, ao BES. É nesse dia que Vítor Bento ouve falar pela primeira vez de tal medida. Ficou pasmado, estava à espera do dinheiro do Estado nos mesmos moldes que tinha sido usado para o BCP e para o BPI, com os famosos Coco´s, já sabendo que havia um novo enquadramento legal do bail-in, que passara a exigir que os accionistas fossem os primeiros a ser chamados num caso de resgate e que os detentores de obrigações convertíveis fossem chamados a converter em capital, ou coisa que o valha, mas ainda assim não esperavam nada do que veio a acontecer. Atenção, não é nada de estranhar que assim pensassem os três mosqueteiros do BES, se bem se lembram até há uns dias atrás o próprio Governador, para acalmar as hostes dos clientes, falava da existência, em último caso, da linha de recapitalização da troika.

Ficaram surpreendidos os administradores recém-chegados ao BES. Vítor Bento disse a Maria Luís que não era isto que estava à espera e não era para isto que tinha sido convidado. – Ninguém me avisou disso! Terá dito o novo banqueiro. Maria Luís lá lhe respondeu que podia se ter reunido com ela mais cedo e se ainda não o tinha feito até agora é porque não tinha achado importante fazê-lo.  

Até esta altura estudava-se uma forma de levantar capital privado, sendo para isso preciso aprovar previamente uma dispensa do direito de preferência dos accionistas à época. Penso que Vítor Bento e a sua equipe imaginavam uma solução mista, entre privados e Estado com CoCo´s (as tão faladas obrigações convertíveis em capital contingente que salvaram o BCP, o BPI e o Banif). Na impossibilidade de isso ser assim, e perante a forte possibilidade de cisão do BES num banco-bom e num banco-mau, Vítor Bento não viu logo que isso fosse impeditivo de concretizar o projecto de médio e longo prazo a que se tinha proposto quando aceitou o emprego. Vamos ser sinceros, esta nova Medida de Resolução tinha sido aprovada na Assembleia da República, mas poucos a leram, e Vítor Bento também não a tinha lido. Não sabia que a lei limitava, em princípio, a vida de um banco transitório a dois anos. Ninguém nesta altura conhecia a lei em profundidade. Há até um célebre episódio de a Ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, que confrontada no debate no Parlamento, com as características da Resolução aplicada ao BES, perguntou aos deputados críticos se chegaram a ler a lei que aprovaram?

O Governo aprovara nessa quinta-feira, em Conselho de Ministros, uma legislação que aperfeiçoa a Medida de Resolução com o fito de a aplicar no banco. Era um diploma que permitiu fazer o resgate nos moldes em que foi feito: a protecção dos depósitos de accionistas com menos de 2% através de uma mudança no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras. Aquela lei que depois acaba por permitir o congelamento das contas. No Conselho de Ministros apenas o Primeiro-Ministro, o seu chefe de gabinete, a Ministra das Finanças, e o Vice-primeiro Ministro, Paulo Portas, sabem do facto concreto, a que se poderá aplicar a nova lei.

Carlos Costa nesse primeiro dia de Agosto, um sábado, quando já se conheciam os trágicos e imensos prejuízos trimestrais do BES, determina que a partir desse momento é necessária a autorização prévia do Banco de Portugal para qualquer reembolso total ou parcial, ou mesmo a simples movimentação a débito de contas de depósito e os pagamentos de créditos, para todos os accionistas relevantes e todos os gestores do BES e parentes. Uma atitude drástica nunca antes vista em Portugal. As contas ficam imediatamente congeladas. O Governador parecia ter mandado aplicar o grau máximo de tolerância mínima. Todas as empresas do grupo ficaram sem sequer poder pagar aos seus fornecedores. Hotéis, Hospitais, Agências de Viagens, tudo de repente fica sem meio de pagar contas. Paralisaram centenas de empresas que compunham o universo GES.

Não sei se voltaremos a assistir um grand finale como este. No primeiro fim-de-semana das férias de Verão, o BES desaparecia, ao fim de 145 anos. Sem ao menos exéquias fúnebres. Não ficava pedra sobre pedra.

As discussões e os trabalhos na reunião de sábado do Banco de Portugal eram sobre pormenores. Deus está nos detalhes. O que fica no banco bom e no banco mau? Que leis têm de se aprovar ou alterar? Qual a legislação para um banco de transição? Quem paga o quê? Quanto dinheiro é preciso deixar no banco mau?

O banco de transição tem de ser vendido no prazo de dois anos e tem de mudar a imagem imediatamente a seguir, é o que diz a lei.

Maria Luís Albuquerque e Paulo Portas decidiram no domingo, 3 de Agosto, alterar o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, alterando pormenores que permitissem a venda do banco de transição, ou seja, do Novo Banco. Sem esta modificação, o Banco de Portugal convidava outras instituições a apresentarem propostas de aquisição e, depois dessa venda, o banco de transição era dissolvido. Porque mudara essa lei? Porque assim que se conheceram as limitações legais da venda do Novo Banco, a administração de Vítor Bento não estava disponível para continuar se a venda fosse feita imediatamente. Talvez essa consideração dos três administradores tivesse impulsionado a mudança da lei de maneira a não exigir a extinção do banco de transição. É que se se demitissem logo a seguir o banco poderia afundar-se com a fuga de depósitos.

Com as alterações introduzidas no domingo, mesmo no caso da alienação de toda a instituição de transição, “o banco mantém a sua existência cessando a aplicação do regime aplicável aos bancos de transição”.

Fora aprovado nesse domingo uma alteração que permitia que a venda do Novo Banco não estivesse limitada apenas a instituições de crédito. É essa mudança que depois obriga a uma alteração dos estatutos do Novo Banco, que vai ser feita no dia 8 de Setembro, ainda com Vítor Bento, e é a partir daí que passa a ser possível a solução da dispersão das acções do novo banco na bolsa. Um modelo de capitalismo popular que existe por exemplo nos CTT, e que tem a vantagem de manter a gestão. A venda do Novo Banco podia ser feita em bolsa. Isso dava esperança aos novos administradores. E sob condições especiais permitia talvez até esticar a coisa até aos cinco anos. Mas será que esse prazo, ainda que alargado daria para um modelo tipo Oferta Pública de Venda, em que a pulverização do capital desse para que este triunvirato continuasse a liderar o banco? Parecia que sim, mas afinal à medida que o tempo foi avançando, o Banco de Portugal inclinava-se para o não. Tudo parecia conduzir a uma venda de acordo com o que estava previsto na lei original dos bancos de transição, para um limite de dois anos. Mas não nos apressemos.

Houve, naquele fim-de-semana de Agosto, mesmo um conselho de ministros por meios electrónicos em que os dois Governantes aprovaram tais modificações, que modernidade! A fazer inveja ao apartamento 202 parisiense da Cidade e as Serras, do Eça. Era o site Observador que dizia que houve um conselho de ministros através de assinaturas electrónicas. O documento foi ainda no domingo até Belém, onde recebeu o aval do Presidente da República e na segunda-feira foi oficializado em Diário da República. Tal era a urgência que aguçou o engenho.

Quando a CMVM interrompeu as negociações em bolsa do BES na sexta-feira, o presidente deste organismo de supervisão também já estava informado.

Na lei dos bancos que se designa de Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras constam as regras sob as quais se regem tais sociedades e há nesse regime “a possibilidade de o Banco de Portugal aplicar Medidas de Resolução em instituições sujeitas à sua supervisão nas modalidades de alienação total ou parcial da actividade ou transferência parcial ou total da actividade para bancos de transição”.

Na nova versão, o Governo quis delinear que “o Banco de Portugal ou o banco de transição, se autorizado nos termos do número seguinte, pode, assegurando a transparência do processo, promover a sua alienação [do banco de transição] através dos meios que forem considerados os mais adequados tendo em conta as condições de mercado existentes na altura”.

Passou a haver uma maior liberdade para que o regulador do sector financeiro decida a forma como vai alienar o banco de transição. Na versão inicial, era preciso que houvesse um convite por parte do Banco de Portugal para uma oferta de aquisição.

Com as leis aprovadas foi criado o Novo Banco, o banco de transição que ficou com os “activos bons” do Banco Espírito Santo e que o regulador quer alienar no mais curto prazo de tempo possível.

Agora, com as regras introduzidas, o regulador liderado por Carlos Costa já pode promover a venda do banco da forma que entender e não precisa de o dissolver no final.

Carlos Costa explicara que foi no Sábado que chegaram a Lisboa técnicos do BCE e da Comissão Europeia para delinear a solução a aplicar ao BES, que viria a ser tomada e anunciada ao país na noite de domingo. “A dimensão e a enorme complexidade dos trabalhos preparatórios desta medida exigiram ao Banco de Portugal uma concentração excepcional de esforço. Durante o fim-de-semana foi necessário desenvolver todas as diligências para garantir que na segunda-feira, 4 de Agosto, o Novo Banco se encontrava operacional. Foi também necessário proceder à avaliação dos activos, estimar as necessidades de capital, preparar instrumentos regulamentares, nomear os órgãos sociais das novas entidades, preparar diversos documentos de comunicação e articular todo o processo com a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Ministério das Finanças”, confessa Carlos Costa aos deputados aonde será mais uma vez chamado para explicar o resgate do Banco Espírito Santo.

“A única coisa que sabíamos na sexta-feira ao almoço era que, em reunião por teleconferência entre os membros do Conselho de Governadores do Banco Central Europeu, na segunda-feira tínhamos uma data limite até à qual tínhamos de ter uma solução e tínhamos de ser nós a encontrar a solução”, conta o Governador do Banco de Portugal.

Até à hora de almoço de Sábado dia 1 de Agosto, estava ainda a ser trabalhada a solução da recapitalização que permitisse a entrada de investidores privados. Bancos mas também fundos foram convidados a estudar o assunto. Até o BPI tinha sido convidado a entrar na corrida pelo Governador, o banco aceita estudar o dossier, mas nesta altura ainda sem grande convicção. Carlos Costa tinha convidado os bancos portugueses, o Santander Totta incluído. O BCP estava condicionado pelo dinheiro da troika que ainda lá tinha, e cujas regras impedem aquisições em tempos de ajuda do Estado. Mas podia-se contornar com uma autorização especial, no entanto Nuno Amado não quer mais um imbróglio no seu banco.

Subitamente, a partir da hora de almoço, tudo mudou. O Conselho do Banco Central Europeu determinou a suspensão do acesso do Banco Espírito Santo às operações de política monetária com efeitos a partir de 4 de Agosto. O BCE obrigou o BES a “reembolsar integralmente” o crédito contraído junto do banco central no mesmo dia em que suspendeu o acesso às suas linhas de financiamento. Era uma tragédia. À hora de almoço, por videoconferência com o Conselho de Governadores do BCE, Carlos Costa é informado de que o BES iria deixar de ter acesso a financiamento do banco central por não cumprir os rácios mínimos de capital. “Têm de resolver o problema”, foi o aviso deixado por Mário Draghi, um italiano com boa pinta que comandava os destinos do banco central europeu e que tinha sido apontado como o grande combatente à crise do euro.

A família Espírito Santo foi queimada…foi a cobaia…da Europa! Gritava um accionista que acabara de ouvir Carlos Costa a anunciar os motivos que levaram à extinção do Banco Espírito Santo, e a criação do Novo Banco, um banco muito alegre e com ar primaveril.

Este Mecanismo era a primeira vez que se aplicava, nunca se tinha aplicado antes em nenhum lado e a nenhum banco. Estava com esta aplicação a descobrir-se o caminho às apalpadelas, e a descobrir as limitações pelo caminho.

A Societé Générale, um banco demasiado conhecido para ser apresentado, refere mais tarde num daqueles relatórios sobre os bancos europeus, ” Se o colapso do BES acontecesse seis meses depois de ter feito testes de stress aos bancos, a credibilidade do BCE ficaria fortemente afectada”. Esses testes de stress ficaram sempre aquém da eficácia. Muitos bancos europeus derrocaram depois de terem passado os testes do BCE. Mario Draghi não podia passar por mais um vexame. O colapso do BES marcaria o ritmo de um banco central europeu mais duro e implacável com os bancos.

É preciso que ver que a lei europeia de ajuda aos bancos, entre os anos 2012 – altura em que o BCP e o BPI e mais tarde o Banif recorreram ao plano de recapitalização através da “utilização da linha de recapitalização pública temporária e reembolsável” – e 2014 tinha mudado muito, até nisso o Banco Espírito Santo teve azar. À custa das indignações populares, a lei que põe dinheiro dos Estado a recapitalizar os bancos tinha sofrido pesadas alterações.

Desde o dia 1 de Janeiro deste ano que qualquer banco que precisasse de recorrer à ajuda do Estado para se recapitalizar encontraria um novo cenário pela frente. Ao contrário do que aconteceu com o BCP, BPI e o Banif – que receberam auxílios estatais à cabeça, a que foram associados depois investimentos privados – as novas regras pretendem que ocorra precisamente o contrário. Não restam aqui muitas dúvidas, quem deu o empurrão final para a extinção do Banco Espírito Santo foi o Conselho de Governadores, por teleconferência. Foi o BCE que provocou o último suspiro do banco. Quem empresta dinheiro é quem manda no mundo, uma verdade que Ricardo Salgado cedo aprendera.

Desde Janeiro que havia uma lei nova. Há um provérbio popular que diz “Deus me livre de justiças novas e chaminés velhas”, aqui havia uma lei nova que mudava o destino do BES. O bail-in, como lhe chamam os técnicos, nunca tinha sido usado e foi o banco que era da família Espírito Santo e de milhares de outros accionistas que foi usado como cobaia para testar o mecanismo, dito de Resolução. Foi assim uma lei nova que veio introduzir o princípio da repartição de encargos, ficando taxativamente estabelecido que devem ser os accionistas e depois os credores subordinados os primeiros a ser chamados em caso de perdas ou necessidade de capital. Mais do que apenas pôr fim ao impacto político dos auxílios estatais uma das grandes lições das recentes crises foi a de que há que impedir o contágio entre o risco soberano e o risco do sistema financeiro. Na nova lei europeia só os depositantes, obrigacionistas comuns e titulares de outro tipo de dívida ficam protegidos da necessidade de participar na recapitalização dos bancos

O Novo Banco nasce e logo surge uma nova imagem. Era com borboletas para dar a ideia de renascimento mas todos viam nela a vida efémera, pois as borboletas não duram muito, algumas só duram um dia. Uma imposição da Comissão Europeia, bem se vê, esta mudança de imagem brusca.

A Medida de Resolução precisa de um Fundo de Resolução. Já existia o Fundo, mas não tinha fundos. A quem pertence o Fundo de Resolução que tutela o banco transitório? Aos bancos todos do sistema. Caiu-lhes no colo as asneiras do BES.

Como não havia dinheiro no Fundo de Resolução, o fundo tinha apenas 367 milhões de euros, e como os bancos não têm assim quase cinco biliões para dispensar, como é que se encontra a solução? O dinheiro da troika empresta ao Fundo. O Novo Banco nasce com uma borboleta e 4,9 mil milhões de euros de capital.

Vamos lá a ver como era financiado o dono do Novo Banco: Dos 4,9 mil milhões de euros que o Fundo de Resolução terá de pôr no Novo Banco, começa por ficar definido que os bancos reforçam o fundo até aos 500 milhões de euros. Seria uma contribuição dos cerca de 80 bancos que operam em Portugal e que fazem parte do Fundo, e os restantes 4,4 mil milhões viriam do dinheiro da troika, como empréstimo. O empréstimo do Estado ao Fundo de Resolução será temporário e substituível por empréstimos de instituições de crédito. Estava decidido. Esta decisão muda entretanto. Os bancos optam por emprestar mais e pagar menos ao Fundo. A banca propôs trocar essa contribuição por um empréstimo, o que foi aceite pelo Governo, diminuindo a parcela emprestada pelo Tesouro de 4,4 mil para 3,9 mil milhões de euros. Os bancos emprestam 635 milhões, que é o que falta para chegar aos mil milhões. Para os bancos é mais vantajoso dar um empréstimo já que este não afecta os resultados, ao contrário da contribuição. Além disso, com o aumento da participação financeira no Fundo, passam a ter um poder de decisão maior na alienação do Novo Banco. Pensavam.

Enquanto o empréstimo dos bancos ainda se concretizava o Estado faz o adiantamento por conta dos Bancos, no valor de 635 milhões de euros. Para pagar este empréstimo ao Tesouro, os bancos organizam-se entre si. Chegam a acordo. Alguns bancos vão conceder um empréstimo, que substitui esse do Estado, já não de 635 milhões de euros, mas de 700 milhões de euros, ao Fundo gerido pelo Banco de Portugal. São oito as instituições envolvidas neste empréstimo – Caixa Geral de Depósitos, BCP, BPI, Santander Totta, Crédito Agrícola, Montepio Geral, BIC, Banco Popular. Mas, uma vez que a contribuição de cada banco será ponderada em função da sua dimensão, os bancos com maior quota de mercado darão um maior contributo. O banco do Estado e o BCP assumem a fatia de leão. Os 65 milhões de euros que sobram dos mil milhões, servem para que o Fundo de Resolução tenha folga financeira para “assegurar o pagamento futuro de juros devidos pelo Fundo de Resolução ao Estado, nos termos do Contrato de Empréstimo do Estado”.

O que será dos 3,9 mil milhões que o Estado empresta ao Fundo de Resolução? Todos se perguntam. Mas a resposta estava na ponta da língua, será pago com o produto da venda do banco e se o produto da venda não for suficiente são os outros bancos, os concorrentes, que vão ter de suportar esse custo. Se por hipótese, muito remota, acredita-se, o Novo Banco fosse vendido com lucro, esse reverteria para o banco-mau.

A partir desse dia passou a haver um “banco bom” e um “mau”. O “banco bom” fica com os activos, como os depósitos e os créditos, bons. O “banco mau” ficou com os activos tóxicos, perdeu a licença bancária e é lá que se encontram os accionistas, que terão perdido tudo o que investiram. Muitos dos arruinados ainda eram do tempo do Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa, não percebiam nada do que se tinha passado e viam nesta resolução, ou resgate, ou como lhe quiserem chamar, a segunda espoliação do BES. Perder dinheiro é tido como a calamidade de uma vida para um homem. Um desgosto de amor, um divórcio, uma separação nada é, comparado à perda de muito dinheiro. Os homens podem esquecer um amor perdido, mas uns milhares que desaparecem de uma conta nunca mais se esquecem. Esta paixão pelo dinheiro é muito masculina.

O velho Banco Espírito Santo passara a ser uma instituição em quarentena com os seus créditos e dívidas difíceis de resolver, como se de uma doença contagiosa se tratasse, é lhe retirada a licença bancária e ao lado nasce um banco novo com dinheiro, créditos recuperáveis, provisões guardadas, dívidas pagáveis, as subsidiárias melhores e que dão lucro, e toda uma série de colaboradores e imóveis. Do bad bank, como lhe chamam na gíria do mundo financeiro, nem sinal das acções, obrigações subordinadas, nem se sabe ao menos onde fica a sede. Ficou tudo arruinado.

 

Venda do NB? Foi como “vender cabaz de fruta parcialmente apodrecida”

Quarta-feira, Maio 19th, 2021

Citamos

Notícias ao Minuto

O ex-governador do Banco de Portugal é hoje ouvido presencialmente na comissão de inquérito ao Novo Banco, no início de uma semana de audições a vários responsáveis do setor.

Oantigo governador do Banco de Portugal (BdP) Carlos Costa comparou, esta segunda-feira, a venda do Novo Banco à “venda de um cabaz de fruta que está parcialmente apodrecida”. Carlos Costa está a ser ouvido pelos deputados na comissão parlamentar de inquérito ao Novo Banco.

“A questão é sempre a mesma: eu vou vender um capaz de fruta que parcialmente está apodrecida. Eu não posso contar com a benevolência ou generosidade do comprador para que ele me pague toda a fruta como sendo de qualidade”, disse Carlos Costa hoje no Parlamento.

Respondendo à deputada Cecília Meireles (CDS-PP) na Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução, o antigo governador do banco central considerou necessário “ter em consideração o custo de não vender, que era apodrecer a fruta toda”, ou seja, a liquidação do banco.

Carlos Costa começou por dizer, no início da sessão, que já participou em 12 audiências do Parlamento ao Banco Espírito Santo (BES) e ao Novo Banco, ao longo dos últimos anos. São “mais de 70 horas”, referiu, acrescentando que não falará em nome de nenhuma instituição, “mas sim em nome próprio”.

“Qualquer processo de aquisição, seja entre privados, seja um processo resultante de uma resolução, tem cláusulas de contingência onde o vendedor dá garantias ao comprador sobre contingências futuras. Em segundo, o modelo de resolução seguido no caso do BES foi o que a lei permitia e o Banco de Portugal cumpriu rigorosamente aquilo que permitia, o que significa que o balanço do banco de transição foi constituído de acordo com as regras“, disse Carlos Costa, acrescentando que as mesmas são as contabilísticas, as do principio da continuidade de negócio e do uso da melhor informação disponível.

A audição do antigo governador do BdP deverá versar sobre o Acordo de Capital Contingente (ACC) negociado aquando da venda, que permitiu o recurso do Novo Banco a empréstimos anuais do Fundo de Resolução, em grande parte financiados com dinheiro do Tesouro público, bem como à conduta do BdP em todo o processo.

Carlos Costa estava à frente do BdP quando o Novo Banco foi vendido à Nani Holdings, subsidiária do fundo Lone Star, em 2017, bem como aquando da venda falhada em 2015, processos que têm sido analisados pelos deputados da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução.

Na recente auditoria do Tribunal de Contas (TdC)ao Financiamento Público ao Novo Banco, os juízes dão conta de que “faltou transparência na comunicação do impacto da resolução do Banco Espírito Santo e da venda do Novo Banco na sustentabilidade das finanças públicas”.

[Notícia atualizada às 16h27]

Novo Banco. “Ninguém tem ideia de quantas vezes estivemos na borda do precipício” antes da venda de 2017 – como aconteceu

Quarta-feira, Maio 19th, 2021

Citamos

Observador

Ex-governador ataca conclusões “deslocadas” do relatório Costa Pinto sobre atuação no BES e falha de contraditório que travou reflexão. Novo Banco esteve à beira de cair várias vezes antes da venda.

Histórico de atualizações
  • Termina audição de Carlos Costa, que mesmo a acabar recorda que veio ao parlamento 51 vezes

    Quase cinco horas e meia depois de ter arrancado, termina a audição de Carlos Costa. Fernando Negrão tem um momento diz que espera encontrar o ex-governador no futuro, de saúde, mas não em comissões de inquérito. “Por exemplo numa estação de serviço, como já aconteceu, ou noutro sítio qualquer”.

    Carlos Costa recorda que já conta com 51 presenças no parlamento e diz que compreende as argumentações mais aguerridas dos deputados.

    Fica aqui a cobertura ao minuto. Dentro em breve o Observador vai colocar neste liveblog um resumo da audição de hoje a Carlos Costa. Até já.

  • Carlos Costa sobre a decisão judicial quanto à KPMG. “Não é uma derrota, senão tinha de considerar todas as outras como vitórias”.

    Uma última pergunta de João Paulo Correia (PS), sobre o processo de contra-ordenação do Banco de Portugal movido contra a KPMG devido a falhas de prestação de informação no caso BES. Mas essa condenação foi revertida por duas instâncias judiciais. “Não acha que foi uma derrota para a sua governação?”

    “De forma nenhuma. De forma nenhuma”, diz Carlos Costa, que diz que o tribunal não pôs em causa os factos do processo, mas apenas a fundamentação jurídica de enquadramento. “Não é uma derrota, senão tinha de considerar todas as outras como vitórias”.

    “E o papel do governador do Banco de Portugal não é colecionar vitórias ou derrotas, é defender a aplicação do Estado de Direito”, conclui.

  • “Não estou a ver a Comissão Europeia a querer fazer a ‘via sacra’ que fez o Banco de Portugal” no caso BES

    Carlos Costa considera que os bancos de transição “serão uma figura cada vez menos frequente”. “Não estou a ver a Comissão Europeia a querer fazer a via sacra que fez o Banco de Portugal enquanto Autoridade de Resolução Nacional”, responde ao deputado Hugo Carneiro, do PSD.

    Se houver essa necessidade, o que vai acontecer, é a solução de “venda de ativos e passivos”, como aconteceu em Espanha. Mas isso implica que haja uma entidade compradora, com dimensão para acomodar essa compra.

    No caso português foi uma questão que não se punha. “Foi imaginada, chegou-se a pensar, mas na fase em que se pensava numa recapitalização privada e não na fase de resolução”, que criou uma grande incerteza quanto à qualidade do balanço.

  • “Ficássemos nós ‘À Espera de Godot’ em 4 de agosto e teríamos tido o maior sismo financeiro na economia portuguesa”

    Carlos Costa descontrai e diz que, “como é final do dia”, vai “usar uma imagem do Becket”. Antes da resolução do BES decidida pelo governo de Pedro Passos Coelho “estavam todos à espera de Godot”, diz. “E à espera de Godot não é a solução para a segunda-feira, 4 de agosto. Ficássemos nós ‘À Espera de Godot’ em 4 de agosto e teríamos tido o maior sismo financeiro na economia portuguesa”.

    “As pessoas não têm a noção da extensão das cicatrizes que teria [esta situação]”, complementa. E dá o exemplo do que se passou no sistema financeiro grego: “Não termos passado esse Rubicão, não ter perdido a confiança, é um ativo intangível muito importante para o sistema financeiro, para as empresas e para o público em geral”.

  • No cenário em que estava o BES, “a única bóia de salvação era criar um banco de transição”

    Carlos Costa enumera o cenário que tornava, no seu entender, inevitável a resolução do BES e a criação de um banco de transição. Ou seja, corta a linha de raciocínio anterior de Barroco de Melo (PS). “Quando se constata que o banco está a incumprir os rácios de solvência, que está em situação de incumprimento e que lhe vai ser retirada a licença bancária, que está em risco de corrida aos depósitos e que o BCE lhe vai retirar o estatuto de contratante, a única bóia de salvação é criar um banco de transição.

    “É este banco de transição que salva 1 milhão e 800 mil depositantes, salva a continuidade do financiamento e salva a continuidade dos pagamentos. Foi isso que nos fizemos”, atira.

    “É óbvio que comparando um banco de transição com um banco recapitalizado a situação é diferente, porque o banco recapitalizado não tinha o limite temporal”.

  • “Eu não tenho evidência que tenha sido feito um pedido formal de recapitalização pública do BES”

    Eduardo Barroco de Melo (PS) insiste com Carlos Costa sobre o porquê de o Governo de Passos Coelho ter “atirado o BES para uma resolução que desvalorizava o banco”, em detrimento de uma capitalização pública.

    “O mecanismo que está previsto na lei é que a recapitalização pública tem de solicitada pelo Conselho de Administração do Banco e pelos acionistas ao Governo. E eu não tenho evidência que tenha sido feito um pedido formal. Não tendo havido evidência de um pedido formal, também não há evidência de recusa”, diz simplesmente o ex-governador do Banco de Portugal.

    Caso tivesse havido um pedido de recapitalização pública, acrescenta Carlos Costa, “teria havido todas as consequências enumeradas por Maria Luís Albuquerque [ministra das Finanças na altura], nomeadamente no que diz respeito à diluição dos acionistas. E foi isso que, provavelmente, os levou a não fazer”. “Uma coisa era conservar o valor do banco e outra coisa perder o valor da participação”, sublinha em jeito de conclusão.

  • Governo de Centeno foi avisado sobre retransmissão de obrigações para o banco mau

    Respostas a Mariana Mortágua. Ex-governador diz que houve um diálogo prévio com o Governo sobre a retransmissão das obrigações do Novo Banco para o BES no final de 2015.
    Esta decisão tomada nos primeiros dias do Governo socialista — que ao mesmo estava a lidar com a queda do Banif — deixou o então ministro Mário Centeno furioso porque teve um impacto negativo nos custos de financiamento de Portugal, com grandes fundos a boicotar a dívida portuguesa. Não fica no entanto claro se Centeno teve alguma palavra a dizer sobre esta decisão que foi uma espécie de segunda resolução no final de 2015.
    Carlos Costa defende ainda em resposta à deputada do Bloco que é preciso refletir sobre o sistema sancionatório numa lógica binária. Precisa de uma lógica gradativa para apanhar infrações repetidas, “sem lançar a bomba atómica”.
    Sobre a colaboração com o Banco Nacional de Angola, o ex-governador admite depende muito de quem está à frente da instituição. O BNA tem alguma necessidade de capacitação técnica, mas não podemos olhar para a sua atuação apenas com base na supervisão do BESA, defende. Com o BFA não houve problemas de cooperação.
  • Comissão de Acompanhamento do Novo Banco “está entre a bigorna e o martelo”, diz Carlos Costa

    O ex-governador inicia uma extensa defesa do trabalho da Comissão de Acompanhamento do Novo Banco. “Temos de ter uma atitude de apoio à comissão de acompanhamento, sabendo que eles estão ali numa posição… entre a bigorna e o martelo. Numa situação muito difícil de acesso e análise de informação. Conheço a competência técnica de alguns, tenho por eles, pessoalmente, muita consideração e julgo que ficaram beliscados no seu prestígio pessoal devido uma tarefa muito exigente e difícil”.

    Ou seja, o antigo responsável salienta que a comissão “é uma peça charneira neste processo de controlo, mas que trabalha situação difícil”. “Em vez de qualquer crítica, merecem um estimulante encorajamento”, conclui.

    Sobre os eventuais conflitos de interesse dos auditores e agentes de verificação – que, recordou Hugo Carneiro, trabalham muitas vezes para os fiscalizadores e para os fiscalizados – Carlos Costa começa por dizer nestas entidades “existem chinese walls”.

    “Mas as chinese walls nem sempre funcionam…”, ressalva. E refere que o mercado dos auditores “é oligopolista”, ou seja dominado por menos de uma mão cheia de empresas. “Quando o número de intervenientes é limitado, no final do dia temos quase só um disponível para fazer a tarefa. O que lhe dá uma enorme vantagem para fixar o preço”, explica o ex-governador.

    “Mas não tenho nenhuma solução na manga. Enfim, todos percebem que é preciso evitar abusos de posição e respeitar as chinese walls”, diz apenas.

  • “Ótimo seria que Bruxelas tivesse autorizado o Fundo de Resolução a ter assento na administração do Novo Banco”

    Hugo Carneiro, do PSD, inicia as suas perguntas. “Considera que o sistema de controlo do acionista controlador ficou completamente acautelado? Isto porque a gestão pode influenciar as chamadas de capital…”, alerta o deputado social-democrata.

    Carlos Costa atira a questão para Bruxelas. “O ótimo – em termos de sistema de controlo – seria que a Comissão Europeia tivesse autorizado o Fundo de Resolução a ter assento no Conselho de Administração [do Novo Banco], porque, embora a comissão de acompanhamento esteja dentro, não tem a mesma autoridade sobre a recolha de informação do que alguém que está dentro do conselho de adminstração”, defende o ex-governador.

    Mas como a Comissão Europeia não autorizou, salienta Carlos Costa, o Fundo de Resolução está “dependente da recolha de informação por parte da comissão de acompanhamento”. “Como é obvio, a dificuldade da tarefa da comissão de acompanhamento é tanto maior quanto maior for a história do crédito, das histórias de cada um daqueles processos. É muito mais difícil de perceber do que aquilo que está nos números, não tenhamos dúvidas”.

  • Relatório Costa Pinto. “A maior falha foi não ter contraditório para permitir reflexão interna”

    Carlos Costa volta a atribuir as culpas do queda do banco ao buraco de 1,5 mil milhões de euros à operação Eurofin, “um problema gerado em outra galáxia e que aterra nas contas semestrais no dia 30 de julho”.
    Ainda sobre o relatório Costa Pinto, esclarece que se a avaliação Costa Pinto tivesse apresentado indícios, teria pedido uma auditoria.
    “A maior falha foi não ter tido um contraditório em termos canónicos e permitir uma grande reflexão interna. Estamos a ver apenas metade da lua”.
  • Bruxelas travou nome Novo BES. Foi preciso inventar marca Novo Banco em 10 minutos e pedir autorização ao BCP

    Carlos Costa detalha agora os momentos dramáticos e caricatos que acompanharam os últimos do dia do Banco Espírito Santo a caminho da resolução.
    O BCE comunica-lhe quinta-feira à noite que ia tirar o estatuto de contraparte ao BES no dia seguinte, o que obrigava a devolver 10 mil milhões de financiamento. Isto depois do banco ter entrado em incumprimento após os resultados semestrais.
    A resolução era a única solução que podia impedir o pior, defende. Foi necessário garantir que na segunda-feira tínhamos um banco de transição operacional. Nunca será feita justiça à equipa de 60 pessoas que trabalhou neste processo.
    Faltava poucos minutos para o prazo final dado pelo BCE quando a DG Comp (direção da concorrência europeia) pergunta qual o nome do banco de transição. Novo BES? Não pode ser, avisa. Foi preciso arranjar uma marca nova em 10 minutos. E foi aí que apareceu o Novo Banco. A marca tinha sido registada pelo BCP no passado e foi ainda preciso autorização. “Podia ser um berbicacho. Não podia ser o banco xis”.
  • Resolução foi decidida pelo Banco de Portugal? “É verdade. A batata quente chegou às minhas mãos”, mas não havia alternativa

    Decisão de resolução do BES foi do Banco de Portugal? Sim, confirma Carlos Costa, mas dá uma longa explicação ao deputado socialista Barroco de Melo para concluir que não tinha alternativa.

    A lei prevê a capitalização privada, a capitalização privada e a resolução. A capitalização privada era melhor que a pública e a pública era melhor que a resolução. Para a primeira eram necessários investidores e para a outra era necessário um pedido formalizado. Se as duas coisas não funcionam, vai acontecer o que Passos Coelho disse: “a Batata quente passa para o BdP que tem a opção entre a liquidação, com efeitos devastadores e a resolução. “A opção para o Banco de Portugal só podia ser uma: resolução com banco de transição.

    “A batata quente chegou às minhas mãos, é verdade”.

  • “‘Burden sharing’ do final de 2015 não foi uma operação de recapitalização. Foi operação de atribuição de perdas

    Carlos Costa recorda ainda que o Novo Banco “conseguiu satisfazer exigências adicionais de capital na ordem dos 4 mil milhões, não através da geração orgânica de capital, mas numa lógica de disponibilização de ativos e de gestão do risco, de redução das perdas”.

    “Gostaria que não usasse a ideia de que o ‘burden sharing’ do final de 2015 foi uma operação de recapitalização. Não foi, foi de uma operação de atribuição de perdas. Porque a recapitalização não era possível. Era apenas a absorção de perdas que tinham ficado por atribuir aos credores, na sequência de chamada que está na lei”.

  • Se o banco tivesse entrado mais cedo no verde o Fundo de Resolução seria beneficiado, diz Carlos Costa

    Cecília Meireles insiste nas explicações acerca do Mecanismo de Capitalização Contingente. “Este mecanismo define-se por carência e não por diferença”, diz a deputada, salientando que “se houver muitas perdas num ano, mas se – no limite – houver ganhos nas mesmas operações no ano a seguir já o NB não é obrigado a devolver”. E acrescenta, tal como diz o Tribunal de Contas, o financiamento do Fundo de Resolução ao Novo Banco “tem correspondido ao défice de capital”.

    A pergunta é simples: “Como é que o Banco de Portugal esperava que o mecanismo fosse aplicado?”

    Carlos Costa diz que percebe agora a questão da assimetria. “Os rácios de capital refletem a atividade do banco e não apenas as perdas. Significa isto que – e aqui há um dilema do ponto e visto da contagem das perdas e do calendário de perdas – se o banco entrasse mais cedo no verde, significa geração endógena de capital. E essa iria beneficiar o Fundo de Resolução”. Só que isso não aconteceu.

    “Como a atividade recorrente do banco ainda não entrou em terreno positivo, esta atividade está a comprimir os rácios e automaticamente está a limitar o benefício do travão [que consta no mecanismo de capitalização]. Mas isto não significa que o travão não seja bom, apenas tem um uso limitado por força de a atividade recorrente ter demorado mais tempo a entrar no positivo”.

  • Carlos Costa falou em opções alternativas à venda? “Não era porque as considerasse exequíveis. Era um aviso à navegação”

    Carlos Costa responde às primeiras pergunta da segunda ronda, da deputada Cecília Meireles (CDS-PP). A deputada evoca uma entrevista do então governador em 2017, na qual este admite que havia outras opções à venda do banco nos termos em que foi feita. “Vender com lucro seria por, pelo menos, 4.901 euros milhões de euros. E foi vendido sem receber nada em troca, com o compromisso de meter lá mais 3.890 milhões de euros. Vai um mar de diferença, quase 10 mil milhões de diferença. Que alternativas havia à venda?”

    “Nessa altura havia quem defendesse opções diferentes”, diz Carlos Costa, salientando que as suas palavras – que diz não recordar exatamente – constituíam um “aviso à navegação”. “Não era porque considerasse que fosse exequível. Havia quem o considerasse. E o que eu estava a dizer era que quem o considerasse exequível teria de ter presente os objetivos a atingir”.

  • Tinha poder para remover Salgado? Banco de Portugal não usou quadro legal de 2014 porque o BES era um banco sistémico

    Duarte Alves volta ao relatório Costa Pinto para confrontar Carlos Costa com a conclusão de que o Banco de Portugal tinha instrumentos no RGIC (Regime geral de instituições de crédito) para afastar mais cedo Ricardo Salgado da presidência do BES.
    Carlos Costa discorda desta conclusão que, do seu ponto de vista, é contrariada no capítulo 8 do documento (feito por outro dos membros da comissão de avaliação”. “Não sei se o autor do capítulo 8 concorda. É uma questão de fundamentação e não de opinião”.
    Mas fundamenta também que não foi possível reunir provas que configurassem um caso de justiça. Se tivéssemos do um caso fraco, poderia ser pior. Carlos Costa defendeu ainda que o Banco de Portugal “andou no fio da navalha” e no “limite das normas” ao agir de forma a convencer Salgado a sair voluntariamente (esteve para ser em março de 2014, mas acabou por ficar até fazer o último aumento de capital).
    A aplicação desses artigos a um banco sistémico teria consequências sistémicas. No mercado, a reputação continuava intacta, apesar do BdP estar a forçar. “Imaginem o que seria em termos de dimensão financeira”
    Carlos Costa desvalorizou o impacto (no imediato) da incerteza da garantia soberana de Angola para a queda do BES. E até a exposição ao Grupo Espírito Santo, para o qual existia uma provisão. “O fator causal não foi o GES. Foram as operações que foram descobertas nas contas” do primeiro semestre de 2014. A fraude da Eurofin, que tirou mais de mil milhões de euros ao BES, e a carta de conforto dada à Petróleos da Venezuela.
  • Duarte Alves do PCP questiona o antigo governador sobre o “tráfego” entre o Banco de Portugal e a PwC a propósito das mudanças de emprego de dois antigos diretores de supervisão que voltaram nas mesmas funções.
    Luís Costa Ferreira e Pedro Machado (que já foram ouvidos nesta comissão) foram para a PwC após a resolução do BES.
    Carlos Costa lembra que à data não existia impedimento nas normas internas do Banco de Portugal e assinala que os dois foram para funções de consultoria e não de auditoria (apesar da consultoria ser sobre supervisão).
    E destaca que as auditoras não estão debaixo da supervisão do BdP.
    Para ser um conflito de interesses tinha de ser ao contrário, indicou o ex-governador. Para Carlos Costa, a recontratação dos dois quadros “até foi um enriquecimento para o banco”. Recusa a ideia de que foi decisão sua recontratar Luís Costa Ferreira, (descrito por Duarte Alves como um homem da sua confiança). Diz que foi por proposta da então vice-governadora Elisa Ferreira. No caso de Pedro Machado até destaca as qualidades profissionais que o levaram a ser contratado pelo mecanismo europeu de resolução por” mérito próprio”.
  • Problema dos ativos tóxicos está “quase resolvido”, diz Carlos Costa

    Questionado por Mariana Mortágua sobre qual é a sua opinião sobre o papel das autoridades europeias neste processo, em particular a autoridade da concorrência europeia, Carlos Costa diz que teve uma “troca de correspondência muito dura” com a Comissão Europeia e com a DGComp desde 2011

    “Orgulho-me disso, porque estavam a tratar os problemas de cada um dos bancos ignorando a sua componente sistémica, nomeadamente quando impunham como remédios a contração da atividade dos bancos”, diz Carlos Costa, lembrando que fez “várias vezes, longos e-mails sobre isso”.

    Depois, na segunda fase, nos casos específicos, o diálogo que existe sobre uma autorização sobre auxílio de Estado (protagonizado pelo Ministério das Finanças, com o apoio do BdP) houve, diz Carlos Costa, “uma atitude muito pró-ativa”. “Mas as agendas não eram coincidentes – a agenda a Comissão Europeia é uma agenda preocupada com a aceleração da limpeza dos balanços dos bancos independentemente das preocupações sistémicas, ao passo que o Banco de Portugal tem uma maior preocupação com a situação sistémica”.

    Em 2016, recorda Carlos Costa, houve um “grande consenso” em Portugal entre o primeiro-ministro, o Presidente da República e o governador do Banco de Portugal para avançar com a redução dos ativos improdutivos porque isso estava a penalizar a banca nacional em três planos:

    Primeiro, no plano prudencial, levava à exigência de rácios de capital maiores. Segundo, no mercado, isso estava a penalizar os múltiplos a que negociavam as ações dos bancos portugueses. Além disso, por via da penalização nos rácios de capital, isso também penalizava a concessão de crédito à economia.

    Para isso, era preciso capital e acionistas disponíveis para cobrir as perdas associadas e “infelizmente, tirando o caso da CGD e os bancos espanhóis”, houve uma “dificuldade” a esse nível.

    Entretanto, porém, Carlos Costa diz que a questão [dos ativos problemáticos] está “quase resolvida”.

  • Reestruturações de dívida a grandes devedores? São situações que se passam a “um nível muito micro”

    Mariana Mortágua pergunta a Carlos Costa sobre reestruturações de dívida que só adiaram o registo de perdas em casos de grandes devedores, como Luís Filipe Vieira e Bernardo Moniz da Maia – e essa prática decorreu até 2015, sublinha a deputada do BE.

    “Não lhe posso responder a isso porque não estava no Novo Banco, obviamente. A única coisa que posso dizer é que há regras muito precisas em termos de supervisão para evitar o chamado ‘evergreening’”, diz Carlos Costa.

    Mas qual foi a posição que o supervisor quanto a isso? Carlos Costa sublinha que isso foi em 2015 e desde novembro de 2014 que a supervisão era do Mecanismo Único de Supervisão, o SSM. “Haverá uma explicação mas não serei que a posso propiciar”, diz Carlos Costa.

    Se o banco tivesse tido que assumir 300, 400, 500 milhões de euros em perdas destes clientes, como é que tinha sido? Carlos Costa lembra que não tinha “responsabilidade direta sobre a supervisão” e estas situações “passam-se a um nível “muito micro”.

    Mas sabia destas práticas? “Uma coisa é saber delas, outra coisa é saber o tratamento que foi dado em termos prudenciais e o tratamento que foi dado em termos contabilísticos. Não posso responder porque se respondesse estaria a fazê-lo na base de uma presunção, que é a presunção das regras aplicadas – deixo essa questão para quem acompanhou diretamente o assunto”.

  • Carlos Costa confirma que foi Maria Luís que definiu valor do capital inicial pelo mínimo

    Mariana Mortágua, do BE, pergunta a Carlos Costa se foi o Banco de Portugal que criou a narrativa de que não haveria custos para os contribuintes e que o banco podia ser vendido com lucro.

    “Não encontra nenhuma declaração minha de que o banco poderia ser vendido com lucro, apenas ‘a um preço interessante’, mas isso não tem a ver senão com a obtenção do melhor preço nas circunstâncias”, responde Carlos Costa.

    Sobre a resolução, Carlos Costa não sabe dizer se foi o Banco de Portugal que fez a notificação preliminar à Comissão Europeia, alguns dias antes. “Se o fez foi na condição de mandatado, porque os contactos com a Comissão Europeia são sempre feitos pela Ministério das Finanças”, diz Carlos Costa, recusando – “claro que não” – que o Ministério das Finanças estaria alheado dessa comunicação.

    A deputada do BE alega, também, que há “declarações contraditórias” sobre o capital inicial e sobre a informação de que Maria Luís Albuquerque teria “limitado” o montante a 4.900 milhões de euros, quando o Banco de Portugal recomendara cerca de 500 milhões a mais.

    “O dr. Costa Ferreira e prof. Pedro Duarte Neves tinham mandato para tentar criar uma almofada de capital tão grande quanto possível – e fizeram o seu papel. De lá, vieram com uma resposta. Não era necessário rasgarmos as nossas vestes, depois veríamos o que podíamos fazer, mas 4,9 mil milhões foi o valor encontrado que satisfez as três preocupações [BdP, Ministério das Finanças e Comissão Europeia]”.

    Quem é que determinou que o montante ficasse no mínimo do intervalo possível? “Foi o Ministério das Finanças, mas se não tivesse sido o Ministério das Finanças tínhamos depois um problema com a Comissão Europeia”, responde Carlos Costa.

    Então, “o Ministério das Finanças fez o papel da Comissão Europeia”, acusa Mariana Mortágua, advogando que Maria Luís Albuquerque “prestou declarações falsas” à comissão de inquérito ao dizer que não tomou uma decisão política na definição do valor.

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  • Carlos Costa achava que Costa Pinto ia fazer o contraditório, mas não o pediu. Comentários dos serviços ficaram de fora

    Mónica Quintela pergunta a Carlos Costa porque não houve contraditório dos serviços do Banco de Portugal na avaliação independente pedida a João Costa Pinto.
    Carlos Costa começa por dizer não era possível nos termos do exercício fazê-lo e revela que foram pedidos comentários aos serviços que constam do dossiê que está no Banco de Portugal. Mas ficaram de fora do “relatório de avaliação” Costa Pinto que é “uma unidade fechada” e não foram enviados ao Parlamento. Os serviços fizeram comentário fora do contexto do relatório, não podem ser assumidos no relatório como contraditório.
    Mas não deu instrução para haver contraditório? Carlos Costa admite por fim que não colocou essa indicação no pedido, porque “para mim era implícita, mas não foi explicita”. O ex-governador contraria ainda a tese de que meteu o relatório na gaveta.
    “Ninguém que tivesse legitimidade deixou de ter acesso. Não saiu da gaveta, a comissão é que entrou na sala agora.”
    Indica ainda que o documento foi carregado no sistema acessível ao conselho de adminstração depois das conclusões terem sido reveladas.
    Pedro Machado e Luís Costa Ferreira, diretores de supervisão no tempo de resolução do BES, não estavam no Banco de Portugal nessa data, por isso não tiveram acesso, explica.
    A deputada do PSD pergunta a Carlos Costa pelos documentos entregues em anexo ao relatório e que sustentam o mesmo. E diz que o Banco de Portugal respondeu ao Parlamento que esses anexos “não constavam dos arquivos do BdP”. E Costa Pinto disse no Parlamento que os entregou a si, insiste. O governador responde que estarão no BdP
  • “Não há qualquer acrimónia” para com Costa Pinto

    Mónica Quintela volta ao tema do relatório Costa Pinto.
    O ex-governador mantém um discurso duplo sobre o documento que descreve como “um trabalho muito importante nos 8 capítulos e nas recomendações”, ao mesmo tempo que “tenho pena que não tenha feito o acompanhamento de provas e tenho pena que haja inconsistências. São opiniões que não têm por base o direito e a jurisprudência”.
    E volta à tese de que as recomendações contrariam as conclusões. “Estou muito agradecido ao trabalho, mas “tenho pena, porque teria sido obra completa se tivesse tido tempo para fazer contraditório”, como seria natural num exercício à moda anglo-saxónica.
    Confrontado com a ideia de que tem alguma acrimónia para com Costa Pinto, refuta. “Não tenho qualquer acrimónia”.
    Acrescenta que Costa Pinto foi escolhido que tinha conhecimentos sobre o Banco de Portugal. “Entendia que era a pessoa ideal para personificar uma avaliação institucional”.
    O ex-governador sublinhou ainda que o trabalho teria de ser feito com uma total independência. O governador tem de estar disponível para falar, mas qualquer intervenção seria limitativa do exercício que gostaria de ter.
  • “Eu não defendi o contrato, defendi sim a necessidade de venda” do Novo Banco

    O ex-governador volta a ser confrontado com o que disse no passado sobre os custos da venda do Novo Banco pela deputada do PSD, Mónica Quintela
    “Prefiro dizer que é uma operação financeira em que o Estado tem a legítima expectativa de recuperar o que emprestou com remuneração em cima. A minha convicção era que o Estado ia recuperar os valores emprestados com as contribuições do banco”. Mas a partir do momento que o Fundo está no perímetro das contas públicas, passou a contar para a despesa pública.
    Carlos Costa volta a remeter várias respostas para Luís Máximo dos Santos, o presidente do Fundo de Resolução, que será ouvido amanhã. Como a explicação para o contrato ser redigido em inglês. Mas diz que é normal estes contratos serem redigidos em inglês.
    Carlos Costa corrige ainda uma conclusão da deputada. “Eu não defendi o contrato, defendi sim a necessidade de venda (ao então ministro das Finanças) face ao custo de oportunidade que resultaria da sua não concretização”.
  • Novo Banco. “Ninguém tem ideia de quantas vezes estivemos na borda do precipício”, diz Carlos Costa

    Carlos Costa diz, a propósito da venda falhada, em 2016, que os compradores se afastaram por “razões totalmente alheias ao processo de venda”. Foram convidados a reiniciar e “explicaram que não estavam em condições de reiniciar”. Porém, um fator que estava a “contaminar” as propostas era as incertezas relacionadas com o valor do banco. Por isso é que na vez seguinte se tentou considerar mais esse problema, de forma a melhorar as ofertas que viessem a ser feitas.

    Carlos Costa garante que quaisquer ofertas que viessem a ser apresentadas, concorrendo com a Lone Star, teriam sempre uma componente de salvaguarda dos ativos problemáticos – alguns até queriam que esses ativos se extraíssem do banco. Mas não se chegou tão longe, diz Carlos Costa.

    Carlos Costa responde, também, sobre as dúvidas que sempre foram colocadas sobre a sobrevivência do Novo Banco, incluindo numa carta de Stock da Cunha. “Surpresa? Nenhuma”, diz Carlos Costa – “nós tínhamos uma almofada de 1,2 pontos percentuais” no capital, havia exigências adicionais e “obviamente quem está do lado do banco, tal como quem está na supervisão, percebe que está numa lâmina onde o risco de cair é grande“, diz Carlos Costa, elogiando as administrações do banco.

    O deputado do PS refere-se, depois, a uma carta do BCE de fevereiro de 2017 a pedir um plano de contingência de liquidação caso fracassasse a venda. “Estávamos no fim de linha, tínhamos de avaliar muito concretamente o que preferíamos: preferíamos aceitar uma proposta com todos os elementos ou correr o risco de entrar num processo de liquidação ordenada, em que teríamos garantias com o Fundo de Garantia de Depósitos, com os depósitos não garantidos….”

    Ninguém tem ideia de quantas vezes estivemos na borda do precipício”, diz Carlos Costa, em referência ao período antes da venda (de 2017), “e ninguém tem ideia de que os maiores beneficiários foram os depositantes, os clientes, os outros bancos – que se esquecem por vezes de que a perda de confiança afeta depois todos os bancos – e foi a economia portuguesa”.

  • Novo Banco “banco bom”. “Queria que eu tivesse anunciado, nessa noite, que tinha criado uma coisa da qual deviam fugir?”

    E faz sentido ter apresentado o Novo Banco como um “banco bom”? João Paulo Correia pergunta a Carlos Costa se está arrependido.

    “Não, eu anunciei como banco de transição, que iria continuar a funcionar no apoio e financiamento à economia e garantir os depósitos”, diz Carlos Costa, continuando: “Queria que eu tivesse anunciado, nessa noite, que tinha criado uma coisa da qual deviam fugir?”

    “Era um banco que tinha os mesmos riscos no seu balanço que qualquer outro banco, só com a especificidade de não ter um horizonte alargado e o acionista não poder fazer injeções de mais capital”, conclui o ex-governador.

  • O valor inicial do Novo Banco. BdP queria mais, Ministério das Finanças queria menos

    Mais uma questão do PS, sobre o capital inicial do Novo Banco, que é responsabilidade do Ministério das Finanças, do Banco de Portugal e da Comissão Europeia, confirma Carlos Costa.

    “Como é que ficou fechado o valor”, pergunta João Paulo Correia.

    “Foi o valor que fez o compromisso entre as três entidades”, diz Carlos Costa, notando que nestas situações o supervisor está “sempre à espera de mais”, o Ministério das Finanças “está sempre à espera de menos” e a Comissão Europeia tem um “teto que resulta da limitação da concorrência sem ajudas de Estado”.

  • O PS pergunta, agora, sobre o convite a Vítor Bento e sobre se indicou ou não que a linha de recapitalização pública estava disponível.

    “Primeiro, eu não convidei o dr. Vitor Bento e a equipa. O dr. Vitor Bento foi convidado pelo acionista Ricardo Salgado, o dr. Moreira Rato foi convidado pelo acionista Credit Agricole e o dr. José Honório apareceu nessa lista certamente pela iniciativa do acionista BES”, começa por dizer Carlos Costa.

    Depois, “quando o banco foi resolvido era necessário assegurar a continuidade de um conselho de administração e nessa altura eu convidei a equipa dirigente a continuar”.

    “A questão da linha de capitalização é uma linha que se coloca ainda na fase prévia e o que foi dito não foi que estava disponível a linha de recapitalização – o que foi dito é que havia mecanismos de recapitalização previstos, obviamente os que estão consagrados na lei mas quem queria pedir esses mecanismos tinham de os acionar não junto do Banco de Portugal mas do Ministério das Finanças”, diz Carlos Costa.

    João Paulo Correia diz que todos os membros da equipa de Vítor Bento garantiam o contrário, que disseram na comissão que tinham a ideia de que a linha estava disponível. Mas Carlos Costa diz que nunca poderiam pensar isso porque não cabia ao Banco de Portugal dizer se a linha estava ou não disponível: “não há nenhum dinheiro público que saia, a título de recapitalização, sem preencher o que está na linha”.

  • “O Banco de Portugal não pôde, não poderia, não deu equivalência de risco” à garantia angolana

    Sobre a garantia angolana, João Paulo Correia diz que algumas entidades disseram na CPI que era uma garantia “política” (porque garantias de Estado são negociadas no plano político). “Confirma”?

    “Eu não entro nessa taxonomia. O que eu digo é que houve uma garantia dada ao abrigo do enquadramento jurídico angolano e só nesse enquadramento pode ser validar. O Banco de Portugal não tinha de validar a garantia ou não, o que tinha de verificar era se do ponto de vista prudencial era se dispunha de informação para saber se aquela garantia podia ser tida em conta para uma equivalência de tratamento em termos de risco. E como não foram entregues ao Banco de Portugal os elementos que eram necessários para o efeito, o Banco de Portugal não pôde, não poderia, não deu essa equivalência”.

    “Isto não afeta em nada o valor da garantia no quadro jurídico angolano”, acrescenta Carlos Costa, dizendo que essa questão tem de ser dirimida no sistema jurídico angolano. “O Banco de Portugal sobre isso nunca se pronunciou, que fique claro”, sublinha Carlos Costa.

  • E porque não afastou Ricardo Salgado mais cedo, o incumprimento dos planos determinados pelo Banco de Portugal não era suficiente, pergunta João Paulo Correia, do PS.

    “Eu entreguei três atos de jurisprudência que demonstram que à luz do enquadramento legal da época o afastamento é algo que implica a compilação de provas – e isso foi um processo permanente no Banco [de Portugal], houve todo um circuito de questionamento acerca de notícias e afirmações e isso teve o momento alto quando um dos membros da família trouxe ao Banco de Portugal provas factualmente operativas do ponto de vista do afastamento”. Uma referência a José Maria Ricciardi, em maio de 2014.

    “O afastamento da família foi anunciado no final do primeiro trimestre, pedindo um plano de sucessão e um plano de saída, que tinha de passar pela convocatória de uma assembleia-geral, partindo sempre do princípio de que estávamos sempre a operar puxando ao limite o enquadramento legal que existia, como já disse o dr. Pedro Machado” [já ouvido nesta comissão.

    “Não houve nenhuma complacência nessa matéria, houve um grande rigor do ponto de vista da constituição de provas. Não basta ter sentimentos, não basta ter indícios”, assevera Carlos Costa, lembrando que estava em curso um aumento de capital e que o BdP aceitou que a assembleia-geral fosse adiada até junho para permitir o aumento de capital.

    Carlos Costa diz que não faria sentido excluir os novos acionistas (envolvidos no aumento da capital) do direito de escolher os órgãos sociais.

    Carlos Costa termina com uma frase que trouxe no bolso: “A reputação de Ricardo Salgado no mercado era superior à reputação que tinha dentro do Banco de Portugal“.

  • E porque é que “nada acontecia” e Salgado não cumpria as recomendações, pergunta João Paulo Correia?

    Isso é o que o dr. deputado conclui com base em informação deficiente”, diz Carlos Costa, pedindo a João Paulo Correia que vá consultar todas as injunções aplicadas ao BES e lembra o acórdão do tribunal do círculo de Lisboa, que entregou à CPI hoje, que “demonstra que a insolvência do banco não foi resultado da inação do Banco de Portugal, a inação do Banco de Portugal levou a que até final de junho o banco estivesse adequadamente capitalizado”.

    O que provocou a queda do banco foi perdas surpreendentes, de 1.500 milhões, com títulos colocados na Eurofin. E eu gostaria muito, até para ser interessante do ponto de vista da CPI, que a CPI consultasse a ata da última reunião da administração e aí se constata que grande parte do conselho de administração não tinha conhecimento daquelas operações e vai constatar que a surpresa não foi só para o auditor, não só para o conselho de administração mas obviamente também para o supervisor”, diz Carlos Costa.

    Sobre o problema dos grandes riscos, “essa foi uma área que eu herdei e não se resolve da noite para o dia“, diz Carlos Costa.

  • BdP tinha “postura epistolar”. Carlos Costa recusa acusação com (mais) críticas a Costa Pinto

    Também João Paulo Correia, do PS, fala sobre o relatório Costa Pinto e sobre as principais críticas à governação de Carlos Costa. “Ao ler o relatório, depreendo que existia uma grande muralha: os técnicos que sempre foram acompanhando em toda a largura o que se estava a passar com o BES e, do outro lado da muralha, só ignorava as notas, respondia com despachos um ano depois, tinha uma postura epistolar, limitava-se a escrever cartas… Essa é a grande conclusão que tiramos”.

    Se o dr. Costa Pinto tivesse tido o cuidado de falar comigo, saberia que com o Dr. Salgado tive seguramente 15 reuniões, o que significa que não tinha uma postura epistolar. Essas reuniões foram sempre muito injuntivas, desde logo a primeira em final de junho [de 2010], quando lhe indiquei que passaria a ter uma supervisão consolidada”

    Outra crítica a Costa Pinto. “Se o dr. Costa Pinto tivesse tido o cuidado de falar com as direções perceberia que se há matéria de que me prezo é ter introduzido uma grande proximidade entre o conselho de administração e os serviços”, assegura Carlos Costa.

    Mais: “Comigo, começou a ser regular – e Costa Pinto era testemunha – a apresentação pelos técnicos (não pelos diretores) das questões relacionadas com os bancos, havia reuniões regulares”.

    Mais, ainda: “Se o dr. Costa Pinto tivesse tido o cuidado de falar comigo, saberia que o afastamento de Ricardo Salgado e família foi resultado de reuniões presenciais. A relação epistolar existe mas é necessária por uma questão de segurança administrativa. Eu não posso comunicar ao Dr. Ricardo Salgado que vai passar a ser supervisionado em base consolidada sem depois enviar uma carta onde está aquilo que lhe comuniquei pessoalmente”.

  • Supervisor queria mais capital no Novo Banco. O valor de 4.900 milhões resultou do compromisso com Finanças e Bruxelas

    Cotrim de Figueiredo retoma ainda o tema dos ativos do balanço original estarem sobrevalorizados.
    O ex-governador repete uma explicação dada já a Cecília Meireles. Todos os balanços dos bancos são elaborados com base em perdas incorridas e no método de continuidade de negócio. Quando há recessão, verifica.se essa sobrevalorização dos ativos que idealmente é diluída no tempo.
    Questionado sobre o Banco de Portugal querer um capital inicial do Novo Banco mais alto de 5,5 mil milhões, Carlos Costa confirma. Explica que os 4,9 mil milhões de euros resultaram do compromisso entre o que supervisor queria (mais), o que o ministério das Finanças achou (sempre demais) e o que Comissão queria evitar (a distorção da concorrência).
    Conciliou três interesses parcialmente contraditórios, o que deu um ́rácio de 9,2%. Carlos Costa reafirma que este capital não se destinava a cobrir antecipadamente as perdas por registar, porque isso estaria a subverter o mecanismo de resolução que imputa perdas aos credores.
    E faz uma homenagem aos gestores do banco na fase pós resolução que foram capazes de responder a exigências mais acentuadas em circunstâncias muito difíceis e sem mais capital.
  • Novo Banco vai custar aos contribuintes? “Se tudo correr como o previsto”, o valor final (VAL) será positivo para o Estado

    O deputado do Iniciativa Liberal Cotrim de Figueiredo regressa ao tema central da auditoria do Tribunal de Contas. Em que cenário é que pode não haver custos para contribuintes?
    Não entro em discussão de taxonomia e de contabilidade pública, responde Carlos Costa. O Fundo de Resolução foi criado para ser financiado pelos bancos. A resolução do BES ocorre quando o fundo não tem recursos, dai o recurso a um empréstimo público que vai ser recuperado .Se tudo for recuperado, se tudo correr como o previsto, no final o VAL (valor atualizado líquido) desta operação será positivo para o Estado.
    O deputado lembra que a UTAO fez cáculos diferentes.
    Carlos Costa explica que está a partir do princípio que os bancos vão pagar a contribuição ao Fundo e de que não vai haver cedência política. “Parece pouco improvável que haja um VAL negativo se os pressupostos se cumprirem.” Mas a Caixa tem de ser assumida como um dos bancos. Se deduzir a Caixa (banco público) vai dar negativo”. O contribuinte fez empréstimo reembolsável a longo prazo”.
  • Para terminar, Cecília Meireles diz perceber porque é que o Relatório Costa Pinto demorou tanto tempo a ser entregue. E pergunta sobre o limite dos grandes riscos, sucessivamente furado (uma questão que já vinha do mandato de Constâncio). Cecília Meireles diz que o relatório mostra que foi feito muito pouco nos anos de Carlos Costa sobre essa matéria da exposição do BES a grandes riscos (empresas do grupo). “Porque é que não agiu mais cedo?”, pergunta Cecília Meireles.

    “Agi mais cedo. Eu tomei posse a 10 de junho, no dia 9 de julho o banco foi obrigado a fazer supervisão e apresentação de contas a nível consolidada. Essa foi uma das fases mais tensas no relacionamento do BdP com o BES”, diz Carlos Costa. Depois, “a partir daí é que se inicia o processo de identificação do perímetro e na sequência da análise do perímetro é que houve injunções no sentido da simplificação da estrutura”.

    O problema é que “a fase de preparação de decisão não é num ápice“, diz Carlos Costa, aludindo a uma “tensão logo no início de julho [de 2010] que resulta de uma resistência [de Ricardo Salgado] em aceitar a supervisão consolidada do grupo”.

    Depois, diz Carlos Costa, há uma tempo de “estudo” e um tempo de “concretização”. “Não basta dizer ‘olha esta operação tem de ser descontinuada’, não é realista pensar que é no dia seguinte que ela vai ser descontinuada”, diz Carlos Costa.

    “Desde 9 de fevereiro de 2013, o Banco de Portugal tinha a funcionar um grupo de trabalho que acompanhava em permanência as notícias relacionadas com as pessoas que faziam parte do conselho de administração [do BES], para reunir provas, indícios, para as integrar no enquadramento legal e a jurisprudência da época”, diz Carlos Costa, dizendo que “lamenta que este facto, repleto de ação, não tenha constituído um capítulo autónomo dentro do relatório”.

    “Eu gostaria de salientar o seguintes: “os [primeiros] oito capítulos do relatório são bons capítulos, a única coisa que está deslocada é as conclusões, porque não correspondem ao capítulo 8, das condicionantes, nem às recomendações“.

  • Mais dinheiro além dos 3,89 mil milhões? “Backstop” é uma “vantagem” para Portugal, diz Carlos Costa

    A deputada do CDS-PP também fala sobre o chamado “backstop”, a cláusula que previa que o Estado injetasse ainda mais dinheiro no Novo Banco – para Carlos Costa, isso é uma “vantagem” para o Estado português, porque prevê uma possível alternativa “caso tudo corresse mal” à liquidação, “com todas as consequências que daí decorrem”.

    “Não é uma obrigação, é uma faculdade – é uma vantagem, eu diria“, diz o ex-governador. Ou seja, para Carlos Costa, esse é um aspeto positivo da negociação portuguesa, que enfrentou, como Sérgio Monteiro já tinha dito, “muito ceticismo” da parte da Comissão Europeia de que as coisas corressem bem.

    Ainda assim, Carlos Costa comenta que, na sua perceção, o Novo Banco já tem neste momento capacidade para “voar” sem ajuda. “Se tivesse chegado ao fim do ano, sem essa cláusula, o Estado português não teria a possibilidade de salvaguardar a estabilidade financeira”, diz Carlos Costa, comparando aquele “backstop” com ter uma “garrafa de oxigénio” lá em casa.

  • BdP nunca fez estimativa de uso da “garantia”. Sérgio Monteiro “não tem varinha mágica, ninguém tem”, diz Carlos Costa

    Mais uma pergunta da deputada do CDS-PP. Havia no Banco de Portugal uma estimativa acerca de quanto do mecanismo de capital contingente é que poderia ser utilizado (face ao total de 3.890 milhões)?

    “Não, o Banco de Portugal nunca fez uma estimativa”, diz Costa, acrescentando, porém, que pessoas mais próximas desse dossiê podem, também à luz da sua experiência profissional, ter “sentimentos acerca disso“, sobre se poderá ou não ser usado “na totalidade”. Recorde-se que Sérgio Monteiro indicou que havia uma “expectativa” de que apenas houvesse 1.500 milhões em perdas (o que não é o mesmo que consumo de capital do mecanismo).

    Carlos Costa recorda a afirmação de Sérgio Monteiro, que é um “técnico altamente qualificado” e conhecia bem os ativos que ali estavam. “Todavia ele não tem uma varinha mágica, nenhum de nós tem, nem consegue antecipar o apetite de mercado por aqueles ativos, portanto depende muito das circunstâncias”, diz Carlos Costa.

  • Conflito de interesses de Evgeny Kazarez. Supervisor europeu deu “luz verde”, diz Costa

    Outra pergunta de Cecília Meireles. Porque é que a empresa que compra não é a Lone Star mas, sim, uma empresa chamada Nani Holdings?

    Carlos Costa diz que isso não tem qualquer relevância para a venda mas lembra que a Nani Holdings está sediada num país da zona euro e isso traz alguma “vantagem”. Por outro lado, o ex-governador lembra que a Lone Star é um conglomerado com várias entidades, uma entidade “chapéu” a partir da qual se organiza o processo de compra.

    A deputada do CDS-PP confronta Carlos Costa com o que disse o líder da Nani Holdings, que confirmou que fez consultoria em nome do Deutsche Bank na venda do Novo Banco. O Banco de Portugal sabia e não houve problema.

    Nessa altura, “quando ele trabalhou no Deutsche Bank para prestar assessoria não era chefe de equipa nem era dos mais relevantes”, diz Carlos Costa. “Depois, ele passa um período em que não está em contacto com a realidade do Novo Banco e, depois, apresenta-se (ao BCE) como candidato à presidência – se a autoridade de supervisão achou que não havia conflitos, não seria eu a contrariar a autoridade de supervisão”. “Quem decide, em última instância, é o SSM”, o supervisor europeu.

  • Carlos Costa remete para audição de Máximo dos Santos esclarecimento sobre críticas do Tribunal de Contas

    Cecília Meireles introduz a crítica do Tribunal de Contas, de que o mecanismo de capital contingente é desequilibrado, por poder incluir perdas acumuladas e não apenas do ano anterior.

    O ex-governador começa por responder que está há 9 meses afastado das funções e, por isso, “como o cirurgião, pode perder a mão”, ou seja, cometer “lapsos” na ilustração dos argumentos. Por isso, pede a Cecília Meireles que esclareça esse ponto com Luís Máximo dos Santos, vice-governador e presidente do Fundo de Resolução, que amanhã vai ser ouvido nesta mesma comissão e tem melhor conhecimento de causa sobre essas questões, diz Carlos Costa.

    “É um ponto de detalhe”, diz Carlos Costa, lembrando que não tem o contrato de venda à sua frente – “o dr. Luís Máximo terá todo o cuidado de lhe responder com toda a fundamentação”.

  • Cecília Meireles pergunta porque é que é a Lone Star que faz a minuta onde está definido o mecanismo de capital contingente – a que chama “garantia disfarçada”. Carlos Costa explica que é sempre assim porque é o comprador que tem de entregar uma base de negociação que o vendedor aceita ou não aceita.

    Aliás, na primeira tentativa de venda aconteceu isso: houve uma oferta não-vinculativa, houve análise aprofundada (due diligence) mas não houve uma conversão em proposta vinculativa.

    Cecília Meireles questiona se só a Lone Star pediu um CCA, um mecanismo. “Vários dos interessados sempre indicaram que gostariam de dispor, na fase da negociação vinculativa, de um mecanismo semelhante”, diz Carlos Costa.

  • Venda do Novo Banco foi como “vender um cabaz de fruta que está parcialmente apodrecida”

    Carlos Costa gosta de analogias e metáforas, é famoso por isso. A venda do Novo Banco foi como “eu vou vender um cabaz de fruta que está parcialmente apodrecida. Não posso contar com a benevolência ou generosidade do comprador para que ele me pague toda a fruta como sendo de qualidade. A única coisa que tenho como comparação é ter em consideração o custo de não vender (que era deixar apodrecer a fruta toda). Alternativa era vender a fruta mais barata do que seria possível no mercado”.

    “Se se fez aquilo que se devia fazer, que é constituir um processo de venda aberto, transparente e competitivo, ninguém pode dizer que não se fez o melhor para obter o melhor valor, numa situação em que temos um tempo-limite, uma espada de Dâmocles que é o risco de liquidação, que poderia custar mais de 20 mil milhões à economia portuguesa”, segundo alguns cálculos referidos por Carlos Costa.

    Trata-se de recuperar o máximo porque pudermos, porque o prejuízo causado não foi causado no momento da venda, foi causado entre 2000 e 2010/11/12 por operações de crédito ou operações de financiamento que eram, elas em si, desastrosas”.

    “Infelizmente estamos a discutir as consequências, mas não podemos perder de vista as causas”, termina Carlos Costa, salientando que ninguém ambiciona ter um grande banco a cair durante o seu mandato. Mas a atuação do Banco de Portugal tem de ser interpretada à luz de não ter havido instabilidade financeira, não ter havido corrida aos depósitos e não ter havido dificuldades no financiamento das empresas.

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  • “Caiu-nos nas mãos um banco que entrou em insolvência”, diz Carlos Costa

    Cecília Meireles diz que pode ter havido um “monumental erro de perceção” porque se estava à espera de um preço interessante mas só se o Estado der uma garantia sobre 7.500 milhões em ativos. A deputada diz que se criou uma expectativa de que se podia vender o banco por “um preço interessante”.

    “Um preço interessante tem a ver com aquilo que é a situação de partida e a situação do mercado”, diz Carlos Costa, acrescentando que um “preço interessante” seria composto por dois itens: uma avaliação para um “banco expurgado dos ativos não-produtivos e depois uma negociação interessante sobre a parte não produtiva”.

    “Em função das circunstâncias do mercado, em 2017, em função dos interesses revelados e em função dos múltiplos aplicados é ou não um preço interessante? Eu posso dizer-lhe que há fenómenos de aumento de capital os múltiplos foram 0,25 [no Novo Banco foi 0,43]”, recorda Carlos Costa.

    O ex-governador diz que “o Banco de Portugal implicitamente recebe 25%” que ficam para o Fundo de Resolução (que vendeu 75% ao Lone Star). “Havia dois anos para vender o banco, havia o risco de liquidação do banco e grande desconfiança das autoridades europeias relativamente à possibilidade de vender, havia um plano de contingência que correspondia a uma liquidação, que teria um custo muito superior ao que terá a venda que foi realizada”.

    Qual foi o custo de agir e o custo de não agir? E o custo de agir foi incomparavelmente inferior ao custo de não agir“, defende Carlos Costa. Não foi uma opção pelo melhor, foi uma opção pelo “menos mau”, diz Carlos Costa, dizendo que “nos caiu nas mãos um banco que entrou em insolvência no dia 30 de junho de 2014”

  • Regra usada para criar balanço do Novo Banco implicava que teria de haver mais imparidades no futuro

    Cecília Meireles do CDS responde que as vindas de Carlos Costa ao Parlamento são um “reflexo do que se passou na banca”. E começa pelo mais recente, recordando uma declarações de Carlos Costa de que a venda do Novo Banco teria de garantir um preço interessante para minimizar perdas.
    Sabendo que o Fundo garantiu um preço zero, e uma capitalização de mil milhões e um custo que já vai em 3 mil milhões. Foi um preço interessante para Portugal?
    Qualquer processo de aquisição tem cláusulas de contingência para o futuro. Carlos Costa diz que lei da altura da resolução implicava usar a melhor informação disponível. As imparidades não são as esperadas, são as imparidades ocorridas. Para um pacote de ativos, é sempre previsível que até à data da venda haja surpresas porque não estava refletido o valor económico. Tem como consequência, que os ativos vão registar novas imparidades, à medida que se registam novos incumprimentos.
    Carlos Costa prossegue numa longa explicação regras europeias de resolução bancária, dizendo que se tivesse sido usada a metodologia em vigor, o balanço inicial teria sido menor, mas teria havido mais partilha de perdas com credores.
    O grande busilis, reconhece, era o pacote de ativos de risco de 12,5 mil milhões de euros que iriam entrar no mecanismo de capital contingente. O comprador não era forçado a aceitá-las. E destaca o mérito do travão introduzido no valor das perdas aceites para chamadas de capital. E diz que a redução dos ativos maus pelo Novo Banco também ajudou a reduzir as necessidades de capital, a prazo.
    O mecanismo de capital contingente é inerente a uma venda onde há incerteza. O comprador quis a cobertura. Mas o que for para lá dos 3,89 milhões de euros é a sua responsabilidade.
  • Carlos Costa diz já ter sido ouvido 12 vezes sobre BES/Novo Banco na Assembleia da República

    O ex-governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, faz intervenção inicial para dizer que já depôs sobre o BES e Novo Banco 12 vezes da Assembleia da República – mais de 70 horas. E terá dito a Fernando Negrão, antes desta sessão, que já foi ouvido sobre os mais variados temas cerca de 50 vezes.

    Sobre o BES/Novo Banco, Carlos Costa pede para se anexar ao acervo desta comissão as audições anteriores além de uma decisão de tribunal administrativo sobre idoneidade e, informação, “a título de exemplo”, sobre um caso em Itália sobre definição dos capitais próprios iniciais numa instituição de crédito.

    Por outro lado, não estando em funções, apenas falará em seu nome próprio e não em nome de qualquer instituição.

    Carlos Costa confrontado pelos deputados sobre o “relatório secreto”, pela primeira vez

    Esta será a primeira vez que os deputados têm oportunidade, pelo menos com conhecimento de causa, de confrontar Carlos Costa com as conclusões do chamado Relatório Costa Pinto, que o Observador divulgou em exclusivo a 13 de abril.

     

    Este domingo, o Observador publicou, também, um texto onde se analisam as possíveis razões pelas quais este relatório nunca viu a luz do dia e só foi enviado aos deputados quando houve uma alteração legislativa que passou a conferir às comissões parlamentares de inquérito o acesso a informação protegida por sigilo bancário.

  • Boa tarde. O Observador vai acompanhar a semana mais intensa de audições da comissão de inquérito às perdas do Novo Banco imputadas ao Fundo de Resolução.

    Esta segunda-feira é a vez do ex-governador do Banco de Portugal. Para terça-feira, estão agendadas as audições do presidente do Fundo de Resolução, Máximo dos Santos, e de Mário Centeno, governador do Banco de Portugal.

    Para quarta-feira, está marcada a ida de António Ramalho, presidente do Novo Banco.

    Este ciclo de audições aos responsáveis da supervisão e do banco tem como tema principal a auditoria do Tribunal de Contas.

    Quinta-feira à tarde, está prevista a audição por vídeoconferência de outro grande “devedor”, Nuno Vasconcellos, dono da Ongoing.

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“Se tu julgas que consegues manter este documento na gaveta…” Bastidores: o que levou Carlos Costa a não revelar o relatório do BES

Quarta-feira, Maio 19th, 2021

Citamos

Observador

“Se tu julgas que consegues manter este documento na gaveta…” Bastidores: o que levou Carlos Costa a não revelar o relatório do BES

Ex-Governador vai esta 2ª feira ao parlamento e será confrontado com o relatório sobre a sua atuação no caso BES, noticiado pelo Observador. Esta é a história secreta por detrás desse documento.

“Se tu julgas, Carlos, que consegues manter este documento na gaveta por muito tempo, estás enganado. Um dia alguém o vai divulgar – e, até que esse dia chegue, muita gente vai ver no relatório até aquilo que lá não está. Não percebes isso?”

O aviso foi feito numa das últimas vezes em que os dois se falaram. Hoje, estão de relações cortadas: Carlos Costa, o então Governador do Banco de Portugal, e João Costa Pinto, o principal autor do “relatório secreto” sobre a atuação do supervisor no caso BES (noticiado em exclusivo pelo Observador a 13 de abril, praticamente seis anos depois da conclusão). Esta é a história nebulosa de como esse relatório surgiu, como foi feito e as razões pelas quais nunca foi tornado público por Carlos Costa – que esta segunda-feira, no parlamento, será confrontado pela primeira vez com as suas duras conclusões.

Para contar a história por detrás deste enigmático documento, que nos últimos anos se afirmou como o segredo mais bem guardado da banca portuguesa, o Observador consultou várias fontes que testemunharam de perto como este trabalho, esta ideia peregrina de Carlos Costa, acabou por abalar o Banco de Portugal de alto a baixo, levando os fiéis de um lado e do outro a cerrarem fileiras – e, daí, a difundirem visões totalmente opostas acerca das verdadeiras motivações e supostas “agendas escondidas” dos dois principais intervenientes.

Quem acha que João Costa Pinto fez um trabalho sério e corajoso, quem pertence a esse lado da “barricada”, considera que Carlos Costa cometeu um erro ao encomendar um trabalho que, achava o governador, iria ser uma defesa da atuação do Banco de Portugal no caso BES – identificando-se algumas falhas, claro, mas alegando-se que, globalmente, o supervisor não poderia ter feito muito mais do que fez, à luz do quadro legal que existia.

Também nessa linha de raciocínio, os críticos do ex-governador acreditam que quando este percebeu que o trabalho era tudo menos isso – que tinha, afinal, conclusões violentas sobre a forma como o Banco de Portugal tinha agido no caso BES – Carlos Costa ensaiou uma tentativa atabalhoada de evitar a publicação do relatório, ao mesmo tempo que era pressionado por várias pessoas à sua volta, que também se sentiram atingidas e ameaçadas pelas conclusões do trabalho e que “meteram medo ao governador”, disse uma fonte.

A “muralha de gente” que se ergueu para “meter medo” a Carlos Costa

Essa “muralha de gente”, que segundo os críticos de Carlos Costa se terá erguido no Banco de Portugal para “neutralizar” o relatório Costa Pinto, terá incluído pessoas como o vice-governador Pedro Duarte Neves (que em março de 2021, nesta comissão de inquérito, disse só ter lido o relatório em 2016) e José Queiró, homem da confiança de Carlos Costa, ex-diretor do departamento jurídico e o “todo-poderoso” secretário-geral e dos conselhos do Banco de Portugal (ainda no cargo, embora hoje sem a mesma influência, devido à mudança de governador).

Os críticos do ex-governador acreditam que quando este percebeu que o relatório tinha, afinal, conclusões violentas sobre a forma como o BdP tinha agido, Carlos Costa ensaiou uma tentativa atabalhoada de evitar a publicação, ao mesmo tempo que era pressionado por várias pessoas à sua volta, que também se sentiram atingidas. “Meteram medo ao governador”, disse uma fonte.

O que aconteceria se o relatório fosse publicado na íntegra, incluindo a duríssima prosa que estava no último capítulo, o das Conclusões? Era aí que se dizia que o Banco de Portugal podia e devia ter feito muito mais, e mais cedo, para evitar o colapso do BES. Recorde-se que o relatório, quando foi encomendado, foi propagandeado por Carlos Costa como uma absoluta inovação na banca portuguesa e, até, na Europa continental – uma análise independente à boa imagem dos “livros verdes” e “livros brancos” anglo-saxónicos.

No final, porém, acabou por apenas se divulgar uma súmula inócua das recomendações (expurgada do contexto arrasador escrito pela equipa de Costa Pinto), através de um simples comunicado exposto no site do Banco de Portugal.

Quando, depois de terminado o relatório, Carlos Costa o leu e o deu a ler aos seus próximos, terá sido avisado. E se o relatório for divulgado na íntegra e for usado em tribunal pelos (chamados) “lesados do BES”, ou outros, para argumentar que o supervisor falhou? E se isto acaba com uma responsabilização direta ao próprio governador? E se daqui puder advir uma responsabilização civil ou, mesmo, patrimonial para o governador?

É nisto que acreditam os críticos de Carlos Costa, que o governador teve medo, que houve quem metesse medo ao governador – e que, por essa razão, o documento foi enfiado na gaveta.

Os meses em que o país financeiro “fervilhava” para saber quem seria o próximo governador

Há, porém, uma outra versão desta história. Os próximos do ex-governador têm uma leitura diferente sobre o relatório e, sobretudo, sobre as pretensas “segundas intenções” de quem o escreveu, que podem explicar porque é que Costa Pinto o escreveu da forma que o fez, sobretudo o capítulo final. Um capítulo final que, por vezes, não “joga” com as muitas referências às condicionantes e à “infeliz letra da lei” que impediram que o Banco de Portugal, por exemplo, conseguisse afastar Ricardo Salgado mais rapidamente.

Estávamos no final de 2014. O país ainda mal refeito do choque que foi o colapso do banco (e do grupo) Espírito Santo mas quando ainda se acreditava, pelo menos, que o Novo Banco seria rapidamente vendido a um dos vários interessados que se dizia existirem. A Lisboa financeira fervilhava para saber quem seria o próximo governador – se Carlos Costa seria reconduzido ou se outra pessoa tomaria o seu lugar. Pode ter sido aqui que Costa Pinto terá visto a sua oportunidade, acredita a fação que acha que o relatório foi usado como trampolim.

No Ministério das Finanças já não estava Vítor Gaspar, com quem Carlos Costa tinha (e ainda tem) uma ótima relação. A interação com a sucessora, Maria Luís Albuquerque, era cortês, mas não era comparável à que havia com Gaspar. Alguns acreditavam mesmo que Maria Luís Albuquerque tinha em mente outro nome para governador – o nome de alguém que até já tinha sido colocado na administração do Banco de Portugal, António Varela.

Nesse contexto, foi Pedro Passos Coelho, mais do que qualquer outro, que fez com que Carlos Costa fosse reconduzido. Em parte pelo facto de, naquela altura, se estar a meio de vários processos importantes – como a própria venda do Novo Banco –, uma mudança de governador não pareceu oportuna aos olhos do então primeiro-ministro. Confirmou-se, então, a recondução de Carlos Costa, no verão de 2015. E não foi uma decisão bem vista pelo PS, quando se estava a poucos meses de eleições e António Costa liderava as sondagens.

A esse propósito, nessa altura, ninguém escondia que vários dos “sábios” escolhidos pelo líder do PS para preparar o seu programa económico eram perfeitamente “ministeriáveis”. E o mais proeminente desses “ministeriáveis” era Mário Centeno, proto-ministro das Finanças, que tinha (e ainda tem) uma relação péssima com Carlos Costa, por razões que o Observador contou, em detalhe (aqui).

Chegado o mês de outubro, o PS de António Costa perderia as eleições para a coligação liderada por Passos Coelho, mas acabou, porém, a formar governo graças ao apoio da “geringonça”. Centeno saltou para as Finanças e começou a tormenta.

“Vais-te meter numa coisa dessas, olha que isso é muito complicado…”

Recuemos de novo até ao final de 2014, até ao momento em que ainda não se sabia quem, dali a uns meses, estaria sentado à cabeça do conselho de administração do Banco de Portugal. Carlos Costa mostrava-se disponível para a recondução mas, sendo um eterno formalista, ter-se-á convencido de que um eventual segundo mandato começaria com maior legitimidade se o grande trauma do primeiro mandato – a queda do BES – tivesse sido analisado por uma “comissão independente” e desse exercício tivessem saído reparos construtivos sobre a supervisão do Banco de Portugal e notas sobre a legislação que deveria mudar.

O governador decidiu, assim, nomear uma “Comissão de Avaliação às decisões e à atuação do Banco de Portugal na supervisão do Banco Espírito Santo“, através de despacho do próprio Governador, assinado no dia 14 de novembro de 2014.

Carlos Costa mostrava-se disponível para a recondução mas ter-se-á convencido de que um eventual segundo mandato começaria com maior legitimidade se o grande trauma do primeiro mandato – a queda do BES – tivesse sido analisado por uma “comissão independente” e desse exercício tivessem saído reparos construtivos sobre a supervisão do Banco de Portugal e notas sobre a legislação que deveria mudar.

Carlos Costa – mais uma vez, um formalista – decidiu que quem havia de liderar a comissão seria o presidente do conselho de auditoria. Outra coisa poder-se-ia estranhar. Na ocasião, o cargo era ocupado por João Costa Pinto, com quem tinha uma relação de mais de quatro décadas, desde que os dois percorreram os mesmos corredores como jovens estudantes do Instituto Comercial do Porto.

Tinha sido pela mão de Carlos Costa que João Costa Pinto se tornara presidente do conselho de auditoria do Banco de Portugal, em outubro de 2014 – uma nomeação que se deve ao facto de, tal como o seu antecessor na auditoria, Emílio Rui Vilar, também João Costa Pinto ter sido no passado vice-governador. Além disso, naquela altura, era uma figura sem outros conflitos de interesse que impedissem a nomeação.

Cerca de um mês depois de Costa Pinto ter tomado posse, Carlos Costa sentou-se com o seu recém-nomeado presidente do conselho de auditoria e mostrou-lhe o despacho que se preparava para assinar.

Aí lia-se que “a Comissão avaliará a atuação do Banco de Portugal enquanto autoridade de supervisão bancária no período que antecedeu a aplicação da medida de resolução ao BES, de forma a apurar eventuais deficiências e oportunidades de melhoria, à luz do enquadramento jurídico vigente e das práticas de referência, na organização e condução dos processos de supervisão (quer ao nível dos serviços departamentais, quer ao nível dos processos de decisão pelo Conselho de Administração)”.

Costa Pinto terá mostrado alguma hesitação, perguntando a Carlos Costa se queria mesmo fazer aquilo, ordenar um trabalho com características que não eram tradição na Europa Continental. “Vais-te meter numa coisa dessas, isso é muito complicado…”, terá dito Costa Pinto a Carlos Costa, segundo uma das fontes ouvidas pelo Observador.

Mas o governador estava “determinado” – o trabalho era para se fazer. E era para se fazer até “final de abril de 2015”, como estabelecia o despacho, prazo que coincidia com o momento em que a decisão sobre a recondução (ou não recondução) seria tomada pelo Governo. Quanto às hesitações de Costa Pinto, disse apenas: “Se não quiser fazer, vou ter de arranjar outra pessoa”. E Costa Pinto acedeu.

Quatro meses para dissecar todos os fatores que levaram à queda do BES

Havia pouco mais de quatro meses para fazer o trabalho. Costa Pinto terá exigido três condições: serem-lhe colocados à disposição todos os meios necessários para fazer a análise (documentos e entrevistas com quadros); não ter limites temporais na análise, no sentido de poder abranger anos anteriores ao período de referência, que eram os três anos anteriores ao colapso; e, finalmente, Costa Pinto queria ter total liberdade para escolher os outros membros da comissão.

Nesse último ponto, Carlos Costa deu toda a liberdade, mas terá sugerido dois nomes para, se Costa Pinto concordasse, pertencerem à comissão: Norberto Rosa e Maximiano Pinheiro, dois economistas que eram consultores-séniores do Banco de Portugal. Costa Pinto aceitou a sugestão e definiu, depois, os outros dois nomes que queria que integrassem a comissão: dois juristas, José Robin de Andrade, um low profile que é dos melhores especialistas portugueses em Direito Administrativo, e Luís Silva Morais, mais versado nas áreas do Direito Financeiro e Direito Europeu.

O trabalho iniciou-se e, em pouco tempo, a comissão percebeu que ia precisar de ajuda para tratar o imenso volume de documentação que existia para analisar. Daí que se tenha contratado a Boston Consulting Group (BCG) que, a dada altura, teve cerca de uma dezena de pessoas a trabalhar com a comissão, contribuindo com relatórios sobre áreas específicas.

Esses relatórios eram, depois, trabalhados por Costa Pinto e pelos restantes membros da comissão, nas longas sessões de trabalho em que se “partia pedra” e se tentava encontrar consensos entre as sensibilidades e visões, mais ou menos conservadoras, dos diferentes membros. A matéria mais controversa era a questão do afastamento de Ricardo Salgado, um ponto crucial (ainda mais crucial sabendo-se o que se sabe hoje) mas que todos reconheciam ser um ponto onde o Banco de Portugal caminhava sobre gelo finíssimo e qualquer erro poderia ser a salvação do banqueiro.

Foram, também, entrevistados quadros do banco, nas diferentes áreas – audições que estão resumidas nos anexos do relatório. Um dos entrevistados nesse processo, com quem o Observador falou, disse ter estranhado ter passado uma porção inesperadamente grande da sessão não a responder, mas sim a ouvir Costa Pinto falar e a discorrer sobre as opiniões que parecia já ter sobre o que se tinha passado.

Era difícil abrir um processo de reavaliação de idoneidade a Ricardo Salgado? Talvez, mas Costa Pinto sustentou, desde logo – e isso, depois, está nas conclusões do relatório – que havia outras formas mais indiretas de travar o banqueiro. Podia ter-se nomeado uma comissão administrativa para o banco (como tinha acontecido no Crédito Agrícola, uma instituição por onde Costa Pinto também tinha passado, precisamente quando foi substituir uma comissão administrativa), podiam ter sido lá colocados administradores com poder de veto, etc.

Nada disso foi feito, em parte porque o BES era um banco sistémico, talvez o mais sistémico da banca portuguesa numa certa perspetiva – por isso, o Banco de Portugal não achou que aquela situação fosse comparável a casos anteriores, como os do Crédito Agrícola, até pelo potencial impacto para o BES e para toda a banca de se afastar alguém como Ricardo Salgado.

A proximidade de Costa Pinto com Mário Centeno (que se mantém)

Nos últimos anos, Costa Pinto tem sido muito assertivo nas críticas à forma como o dossiê do BES/Novo Banco foi gerido, críticas que em vários pontos são alinhadas com as que também são feitas por Mário Centeno – com quem tinha (e ainda tem) uma relação de grande empatia.

E é por causa dessa empatia – e, até, proximidade – que os críticos de Costa Pinto ouvidos pelo Observador associam o teor violento das conclusões do seu relatório ao que pode ter sido a ambição do próprio Costa Pinto de ascender ao cargo de governador, navegando a mudança de maré política que se adivinhava já naquela altura.

O trabalho foi terminado a 30 de abril de 2015. Costa Pinto entregou a Carlos Costa uma versão preliminar e, logo aí, o governador ficou em pânico – encarregou os serviços jurídicos de perceber junto do presidente da comissão independente se não queria rever vários aspetos das conclusões do relatório que tinham, na sua ótica, erros e vulnerabilidades.

Costa Pinto não mostrou abertura para alterar o que quer que fosse, segundo as informações recolhidas pelo Observador. E não se mostrou aberto a que às quase 500 páginas do relatório fosse acrescentado um capítulo com contraditório – Costa Pinto não achava que fosse em sede daquele trabalho que tivesse de haver qualquer contraditório, nada no despacho original o previa.

Para os próximos de Carlos Costa, Costa Pinto recusou acrescentar esse contraditório – que, de facto, costuma existir nos tais “livros brancos” anglo-saxónicos em que o trabalho, originalmente, se inspirou – por duas razões: primeiro, porque poderia fragilizar as conclusões e, segundo, porque certamente iria atrasar todo o processo, provavelmente para depois do momento em que Costa Pinto pudesse, como suspeitam os seus críticos, aproveitar a divulgação do relatório para ganhar balanço numa pretensa tentativa de tomar o lugar de Carlos Costa.

Para os próximos de Carlos Costa, Costa Pinto recusou acrescentar o contraditório por duas razões: primeiro, porque poderia fragilizar as conclusões e, segundo, porque certamente iria atrasar todo o processo, provavelmente para depois do momento em que Costa Pinto pudesse, como suspeitam os seus críticos, aproveitar a divulgação do relatório para ganhar maior elã numa pretensa tentativa de tomar o lugar de Carlos Costa.

A versão final e definitiva foi entregue ao final do dia 19 de maio. Foi marcada para o dia 25 de maio uma reunião do conselho de administração, para as 16h, onde Costa Pinto apresentou o relatório a todos os membros. Uma das fontes ouvidas pelo Observador, próxima de Carlos Costa, indica que cada administrador recebeu uma cópia impressa das conclusões, em papel timbrado e marca de água com o respetivo nome, e tinha acesso ao sistema documental interno para poder obter a versão integral.

De acordo com essa mesma fonte, todos os administradores receberam a sua cópia das conclusões mas houve um que, depois, veio devolvê-la, formalmente – justificando essa decisão com a discordância de base com a decisão de avançar com aquela análise.

Uma outra fonte contactada pelo Observador, que estava presente, garante que isso é totalmente falso, que ninguém recebeu nenhuma cópia física e que apenas foram lidas as conclusões, em voz alta, por Costa Pinto.

Carlos Costa decidiu pedir comentários aos serviços, nas áreas que lhes diziam respeito, mas, na cúpula, a análise dominante entre os administradores terá sido que o relatório tinha várias falhas, sendo a mais grave a falta de um contraditório. Por isso, segundo as fontes ouvidas pelo Observador desse “lado da barricada”, a visão geral na cúpula do Banco de Portugal foi no sentido de não dar grande seguimento às recomendações do relatório, nem o divulgar fora da cúpula do Banco de Portugal – daí a perceção de que foi enfiado na gaveta por Carlos Costa.

Depois de ter sido solicitado aos diretores dos departamentos de supervisão e dos serviços jurídicos que produzissem comentários, em março de 2016 o conselho de administração revisitou o tema e daí surgiu um despacho de conclusão de Carlos Costa.

Nesse despacho, o governador considerou que as sugestões de alteração do quadro legislativo foram ponderadas tanto na elaboração dos pareceres sobre propostas do governo como na elaboração da proposta de Código da Atividade Bancária. Frisou, também, que os factos não indiciavam falhas que justificassem uma auditoria interna e, por outro lado, afirmou que o relatório tinha ignorado os limites da atuação que era possível para se concentrar na defesa de uma intervenção à luz do que entendia ser um quadro normativo desejável.

E, assim, ponto final. Se um poderá ter querido este relatório para ser reconduzido não “em ombros” mas, de algum modo, mais legitimado, o outro poderá ter usado aquela oportunidade para se posicionar de forma potencialmente decisiva para um cargo que sempre sonhou ocupar. “Foi um punhal“, resumiu uma das fontes ouvidas pelo Observador, próxima de Carlos Costa.

É entre estas duas suposições – que, na verdade, não são mutuamente exclusivas – que se divide a leitura que hoje é feita deste intrigante caso, sobre o qual os deputados vão esta segunda-feira, a partir das 15h, confrontar Carlos Costa. E como entretanto tiveram acesso ao documento que estava sob sigilo, vão fazê-lo pela primeira vez com pleno conhecimento de causa.

(Texto atualizado às 10h de segunda-feira, 17 de maio, com informação sobre a reunião do conselho de administração do Banco de Portugal em que Costa Pinto apresentou o trabalho.)

Novo Banco. Carlos Costa contraria administradores do BES quanto à capitalização pública

Quarta-feira, Maio 19th, 2021

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RTP

O ex-governador do Banco de Portugal (BdP), Carlos Costa, disse hoje que não garantiu que a capitalização pública do BES fosse efetivada, divergindo das palavras de antigos administradores do banco na comissão de inquérito ao Novo Banco.

“O que foi dito não é que tinha a linha de capitalização, é que existiam mecanismos de capitalização previstos, que são os que estão consagrados na lei, e naturalmente que as pessoas tinham que acionar esses mecanismos, não junto do Banco de Portugal, mas junto do Ministério das Finanças”, referiu hoje na comissão de inquérito ao Novo Banco.

Respondendo ao deputado João Paulo Correia (PS) na Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução, Carlos Costa disse que o Governo, através das Finanças, era “o interlocutor para efeitos de recapitalização, como foi para o BPI, BCP e para os outros bancos”.

O deputado socialista lembrou que antigos administradores do BES e Novo Banco como Vítor Bento, João Moreira Rato e José Ramalho tinham dito que o governador do Banco de Portugal tinha assegurado essa linha de capitalização.

O ex-governador referiu que “qualquer um deles sabe que quem dispõe da linha não é o Banco de Portugal”, mas sim o Ministério das Finanças.

“Para que não haja confusões: uma coisa é dizer que há a linha, outra coisa é dizer que eu garanto que se utiliza a linha”, lembrando que, “na época, o dinheiro resultante ainda estava disponível, e a mobilização desse dinheiro tinha que ser feita de acordo com os mecanismos estabelecidos na lei”, disse Carlos Costa.

O antigo governador do BdP afirmou que “garantir a existência da disponibilidade da linha para recapitalização pressupõe preencher os requisitos para ter acesso à linha”.

Numa audição no dia 24 de março, José Honório disse que Carlos Costa lhe assegurou que teria lugar uma capitalização pública do banco caso houvesse problemas.

Perante a reticência de Honório em aceitar o cargo, de acordo com o antigo administrador do banco, o então governador do BdP disse para não estar “preocupado”.

“Aí temos a linha de recapitalização pública do banco”, disse Carlos Costa a José Honório, de acordo com o relato do último na comissão de inquérito ao Novo Banco.

No dia anterior, o antigo presidente do BES e Novo Banco Vítor Bento já tinha dito que ex-ministra das Finanças Maria Luís Albuquerque, com quem só falou uma vez, não lhe mentiu e deixou claro a inexistência de vontade política para um apoio público ao banco.

Vítor Bento já tinha recordado que o BdP tinha dado “reiteradas garantias públicas que estava disponível a linha de capitalização pública”, não lhe passando “pela cabeça” que “não tivesse havido um acerto de posições prévia” com o governo.

Novo Banco. Carlos Costa pede para ser ouvido remotamente na comissão de inquérito

Sábado, Março 6th, 2021

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Observador

Novo Banco. Carlos Costa pede para ser ouvido remotamente na comissão de inquérito

Carlos Costa “invoca a sua idade, fragilidades de saúde e o estado de emergência e respetivo confinamento” para não se apresentar presencialmente à Assembleia da República, pedindo uma audição remota.

O ex-governador do Banco de Portugal (BdP), Carlos Costa, pediu à comissão de inquérito sobre o Novo Banco para ser ouvido remotamente, por videoconferência, devido à sua idade e fragilidades de saúde, segundo informação enviada aos deputados.

Cumpre-nos informar que o ex-governador do BdP, Dr. Carlos Costa, cuja audição está marcada para o próximo dia 16 de março, às 15h, diz não ter condições de saúde para estar pessoalmente presente na audição”, pode ler-se no email da comissão a que a Lusa teve acesso.

A notícia foi inicialmente avançada pelo Expresso, e de acordo com o email, Carlos Costa “invoca a sua idade, fragilidades de saúde e o estado de emergência e respetivo confinamento” para não ser ouvido presencialmente.

No mesmo documento, o presidente da comissão, o deputado Fernando Negrão (PSD), pede aos deputados que decidam “com brevidade” acerca do requerimento do antigo governador do banco central.

Na terça-feira, Fernando Negrão tinha dito à Lusa que a comissão de inquérito estava “com dificuldades em contactar” Carlos Costa, tendo deixado em aberto uma data para a sua audição: 16 de março, às 15h00 horas.

De acordo com uma comunicação interna da comissão a que a Lusa teve acesso, na terça-feira, “feitos todos os contactos, designadamente com o Banco de Portugal” ainda não tinha sido possível obter o seu contacto.

O antigo governador disse entretanto ao jornal Público ter estado sempre contactável. A Lusa questionou o BdP acerca do sucedido, mas não obteve resposta.

As audições, conforme decisão tomada em janeiro pela comissão, serão presenciais, tendo sido aprovada uma norma pelos deputados que levará ao reagendamento caso o depoente esteja em isolamento devido à pandemia de Covid-19.

Fernando Negrão explicou ainda à agência Lusa que quando esta ronda das primeiras inquirições estiver para acabar, a comissão de inquérito fará um novo calendário para ouvir outros nomes.

Em 18 de fevereiro, o parlamento aprovou uma nova suspensão dos trabalhos da comissão parlamentar de inquérito ao Novo Banco por mais 15 dias devido à pandemia de Covid-19.

O presidente da comissão tinha então explicado à Lusa que a natureza dos trabalhos implica que as audições sejam presenciais, o que estava bastante restringido com o estado de emergência em vigor.

A Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco tomou posse no dia 15 de dezembro de 2020, tendo resultado das propostas aprovadas de BE, PS e Iniciativa Liberal para a sua constituição.

De entre os pedidos de audição estão o ministro das Finanças, João Leão, os ex-ministros Mário Centeno (PS) e Maria Luís Albuquerque (PSD-CDS), o ex-governador do Banco de Portugal Vítor Constâncio, a comissária europeia Elisa Ferreira, o dirigente benfiquista Luís Filipe Vieira ou o ‘hacker’ Rui Pinto.

De acordo com um calendário de audições a que a Lusa teve acesso, e confirmado pelo presidente da comissão, Fernando Negrão, as duas primeiras inquirições realizar-se-ão no dia 10 de março, quarta-feira, sendo ouvido João Costa Pinto, antigo presidente do Conselho de Auditoria do Banco de Portugal (BdP), às 09:30, e Pedro Machado, atual diretor do departamento de Serviços Jurídicos e antigo diretor-adjunto do departamento de Supervisão Prudencial, às 15:00.

A comissão “deve funcionar pelo prazo mais curto que permita cumprir os seus objetivos, não ultrapassando os 120 dias”, e tem quatro pontos no seu objeto.

Os quatro pontos abrangem o “período antecedente à resolução e relativo à constituição do NB [Novo Banco]”, o “período antecedente e relativo à alienação”, o “período após alienação” e ainda pretende “avaliar a atuação dos governos, BdP [Banco de Portugal], FdR [Fundo de Resolução] e Comissão de Acompanhamento no quadro da defesa do interesse público”.

Na comissão, o PS tem sete efetivos, o PSD quatro e o BE dois, enquanto PCP, CDS-PP, PAN e Iniciativa Liberal estão representados, cada um, por um deputado efetivo, num total de 17.

Novo Banco. Audições da comissão de inquérito arrancam com dificuldades em contactar Carlos Costa

Terça-feira, Março 2nd, 2021

Citamos

Novo Banco. Audições da comissão de inquérito arrancam com dificuldades em contactar Carlos Costa

Após um adiamento de 15 dias devido à pandemia, Fernando Negrão confirmou que as primeiras inquirições realizar-se-ão no dia 10 de março e aponta uma dificuldade: Carlos Costa está incontactável.

As audições da comissão de inquérito ao Novo Banco arrancam em 10 março, uma primeira ronda na qual os deputados querem ouvir o antigo governador do Banco de Portugal Carlos Costa, que o parlamento “está com dificuldades em contactar”.

De acordo com um calendário de audições a que a Lusa teve acesso, e confirmado pelo presidente da comissão, Fernando Negrão, as duas primeiras inquirições realizar-se-ão no dia 10 de março, quarta-feira, sendo ouvido João Costa Pinto, antigo presidente do Conselho de Auditoria do Banco de Portugal (BdP), às 09h30, e Pedro Machado, atual diretor do departamento de Serviços Jurídicos e antigo diretor-adjunto do departamento de Supervisão Prudencial, às 15h00.

À agência Lusa, o presidente da comissão de inquérito, Fernando Negrão (PSD), disse que a comissão de inquérito “está com dificuldades em contactar” Carlos Costa, mas deixou, de qualquer forma, uma data em aberto para a sua inquirição, 16 de março, às 15h00.

De acordo com uma comunicação interna da comissão a que a Lusa teve acesso, “feitos todos os contactos, designadamente com o Banco de Portugal, ainda não foi possível obter o seu contacto”.

Para 16 de março está também marcada, de manhã, a audição de Vitor Constâncio, também ex-governador e antigo vice-presidente do Banco Central Europeu (BCE).

Segundo o mesmo calendário, no dia 12, sexta-feira, pelas 09h30 será ouvido o atual diretor de Supervisão Prudencial do BdP, Luís Costa Ferreira, e pelas 15h00 o antigo vice-governador da instituição Pedro Duarte Neves.

Depois do dia 16 dedicado às audições dos antigos governadores, as audições prosseguem na quinta-feira, 18 de março, a João Moreira Rato, e a José Honório, no dia 19, sendo que ambos foram administradores do BES/Novo Banco.

No dia 23 de março de manhã será ouvido o vogal do Fundo de Resolução Pedro Ventura, e o antigo presidente do Novo Banco Vítor Bento será ouvido da parte da tarde (15h00).

Estas audições, conforme decisão tomada em janeiro pela comissão, serão presenciais, tendo sido aprovada uma norma pelos deputados que levará ao reagendamento caso o depoente esteja em isolamento devido à pandemia de Covid-19.

Fernando Negrão explicou ainda à agência Lusa que quando esta ronda das primeiras inquirições estiver para acabar, a comissão de inquérito fará um novo calendário para ouvir outros nomes.

Em 18 de fevereiro, o parlamento aprovou uma nova suspensão dos trabalhos da comissão parlamentar de inquérito ao Novo Banco por mais 15 dias devido à pandemia de Covid-19.

O presidente da comissão tinha então explicado à Lusa que a natureza dos trabalhos implica que as audições sejam presenciais, o que estava bastante restringido com o estado de emergência em vigor.

A Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco tomou posse no dia 15 de dezembro de 2020, tendo resultado das propostas aprovadas de BE, PS e Iniciativa Liberal para a sua constituição.

De entre os pedidos de audição estão o ministro das Finanças, João Leão, os ex-ministros Mário Centeno (PS) e Maria Luís Albuquerque (PSD-CDS), o ex-governador do Banco de Portugal Vítor Constâncio, a comissária europeia Elisa Ferreira, o dirigente benfiquista Luís Filipe Vieira ou o “hacker” Rui Pinto.

Na sequência destes pedidos, o Novo Banco anunciou a criação de uma equipa especial de mais de 40 colaboradores, liderada pelo presidente executivo, António Ramalho, para responder “ao fluxo de documentação” solicitada.

A documentação solicitada no âmbito da comissão de inquérito pode ultrapassar um milhão de páginas, estimou o Novo Banco, e a operação montada para a resposta da entidade bancária poderá ter um custo superior a 3,25 milhões de euros.

A comissão “deve funcionar pelo prazo mais curto que permita cumprir os seus objetivos, não ultrapassando os 120 dias”, e tem quatro pontos no seu objeto.

Os quatro pontos abrangem o “período antecedente à resolução e relativo à constituição do NB [Novo Banco]”, o “período antecedente e relativo à alienação”, o “período após alienação” e ainda pretende “avaliar a atuação dos governos, BdP [Banco de Portugal], FdR [Fundo de Resolução] e Comissão de Acompanhamento no quadro da defesa do interesse público”.

Na comissão, o PS tem sete efetivos, o PSD quatro e o BE dois, enquanto PCP, CDS-PP, PAN e Iniciativa Liberal estão representados, cada um, por um deputado efetivo, num total de 17.

De Passos a Costa e de Salgado a Ramalho: quem poderá ser chamado à CPI sobre as perdas do Novo Banco

Sexta-feira, Dezembro 18th, 2020

Citamos

Económico

Comissão Parlamentar de Inquérito pretende apurar as responsabilidades pelas perdas do Novo Banco que justificam as chamadas de capital ao Fundo de Resolução, desde o fim do BES até agora. Lista de nomes será definida e poderá incluir membros dos últimos executivos do PSD/CDS e do PS, banqueiros ligados ao BES/Novo Banco e o antigo Governador do Banco de Portugal.

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução (FdR) toma posse esta terça-feira, às 12h00, na sala do Senado do Parlamento.

Nos próximos 120 dias, até 15 de abril de 2021, a CPI vai investigar a origem e o fundamento das perdas do banco liderado por António Ramalho, o seu processo de venda à Lone Star, a resolução do BES e os ativos que passaram para o balanço de abertura do Novo Banco. Para isso, vai chamar personalidades políticas dos Governos e de outras instituições que estiveram ligadas ao processo. Por isso, poderá ser chamado um extenso leque de responsáveis que, mais ou menos remotamente, estão ligados às perdas do Novo Banco.

Presidida pelo deputado do PSD, Fernando Negrão, a CPI será composta pelos também sociais democratas Duarte Pacheco, Hugo Carneiro, Filipa Roseta e Mónica Quintela, sabe o JE. O grupo parlamentar do PS será coordenado por João Paulo Correia, devendo Cecília Meireles e Mariana Mortágua representar os grupos parlamentares do CDS e do BE, respetivamente, que também são deputadas efetivas da Comissão de Orçamento e Finanças (COF), a comissão competente para os assuntos relacionados com a banca. Segundo noticiou o “Expresso” esta segunda-feira, João Cotrim de Figueiredo, deputado único da Iniciativa Liberal, terá assento na CPI, assim como um deputado do PAN e um do PCP.

A CPI vai agora indicar as personalidades que serão chamadas ao Parlamento e definir uma estratégia de prioridades, isto é, determinar quem deve ser ouvido primeiro. A lista não está, pois, concluída, mas atendendo aos três momentos da cronologia BES/Novo Banco que será objeto da investigação parlamentar, deverá incluir repetentes que já prestaram depoimentos no Parlamento, ora na CPI ao BES, ora na COF.

O presidente executivo do Novo Banco, António Ramalho, tem dito (por diversas vezes) que preside ao banco mais escrutinado em Portugal e talvez da Europa. É supervisionado pelo Banco Central Europeu (BCE) e pelo Banco de Portugal (BdP), presta contas ao acionista minoritário — o Fundo de Resolução (FdR) —  e a uma comissão de acompanhamento que ausculta as perdas que dão origem às injeções públicas de capital ao abrigo do Mecanismo de Capital Contingente (CCA). É um banco obrigado a seguir um plano de reestruturação imposto pela Direção Geral da Concorrência europeia, definido durante o processo de venda de 75% do capital ao fundo Lone Star, em 2017. Foi ainda alvo de uma auditoria externa levada a cabo pela Deloitte, pedida pelas Finanças, votada no Parlamento e concluída este ano, e está a ser auditado novamente pelo Tribunal de Contas, a pedido dos deputados. O Novo Banco acabou por se tornar num tema que está no centro de um emaranhado de decisões institucionais e políticas e de obrigações contratuais que a Assembleia da República quer perceber se têm lesado o Estado português e os contribuintes em milhares de milhões de euros.

No passado dia 25 de setembro, a Assembleia da República aprovou a constituição da CPI às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao FdR, órgão da dependência do BdP e liderado por Luís Máximo dos Santos que, desde 2017, capitalizou a instituição de crédito em quase três mil milhões de euros ao abrigo do CCA devido a perdas relacionadas com determinados ativos. Da esquerda à direita, são vendas que o poder político tem afirmado terem sido feitas, nas palavras de Rui Rio, “ao desbarato”, e que justificaram a constituição desta CPI. Perdas essas que, em 2019, levaram o Ministério das Finanças, na altura liderado pelo atual governador do BdP, Mário Centeno, a considerar “indispensável” a realização de uma auditoria ao processo de concessão dos créditos incluídos no CCA — 1.149 milhões por conta das perdas incorridas em 2018 e 792 milhões por contas das perdas de 2017. Esta auditoria, que investigou o BES, desde 2000 até à sua resolução, em 2014, e o Novo Banco, desde a sua criação até 2018, foi concluída este ano pela Deloitte, tendo a auditora chegado à conclusão que as perdas do Novo Banco se deveram “fundamentalmente” à exposição a ativos “que tiveram origem no período de atividade do BES”. A Assembleia da República torceu o nariz às conclusões da auditoria, tendo o BE alegado que não garantiu “independência” por ter auditado a venda da seguradora GNB Vida pelo Novo Banco, numa operação assessorada pela Deloitte Espanha, na sequência de uma notícia do JE. Por isso, o Parlamento pediu nova auditoria, que está agora a cargo de uma entidade pública — o Tribunal de Contas — e  que, até ficar concluída, não autoriza o FdR a transferir 476 milhões de euros para o Novo Banco em 2021.

Ricardo Salgado, assim como alguns elementos da sua comissão executiva do BES, deverão voltar ao Parlamento para prestar esclarecimentos, uma vez que a CPI pretende investigar o período antecedente à resolução do banco e à constituição do Novo Banco.

Outros nomes como Amílcar Morais Pires, Joaquim Goes, António Sotto, João Freixa ou Rui Silveira, ex-administradores do BES, poderão ser chamados pelos grupos parlamentares a prestar esclarecimentos de forma a que a Assembleia da República possa “apurar e avaliar as práticas de gestão do BES e seus responsáveis, na medida em que possam ter conduzido a perdas e variações patrimoniais negativas justificativas nos montantes pagos e a pagar pelo FdR ao Novo Banco”.

Carlos Costa, ex-governador do BdP que resolveu o BES, e Pedro Duarte Neves, à data homem forte da supervisão do banco central à data, também deverão ser chamados, uma vez que a CPI pretende apurar se o supervisor atuou de forma adequada “no período que antecedeu a resolução”, em especial a seleção de ativos que passaram do BES para o balanço de abertura Novo Banco e que foram avaliados pela PwC.

É ainda possível que o sucessor de Ricardo Salgado na liderança do BES, Vítor Bento, e o seu CFO, João Moreira Rato, também possam ser chamados à CPI, uma vez que acompanharam a resolução do BES e a criação do Novo Banco.

A ser chamado, Carlos Costa também deverá responder a algumas questões relacionadas com a venda do Novo Banco porque a CPI vai investigar os processos de venda do banco — houve dois —, assim como o consultor do BdP, Sérgio Monteiro, que foi o arquiteto da venda do banco à Lone Star e que também já foi à COF falar sobre tema.

Neste momento da cronologia do Novo Banco, antigas e atuais figuras políticas poderão ser chamadas pelos deputados, uma vez que a CPI quer saber se os contratos conexos com a venda do banco foram “diligentemente negociados” pelo Estado, durante o início da ‘geringonça’ liderada por António Costa. Neste sentido, não será de descartar um depoimento por escrito do primeiro-ministro, sendo ainda provável que o atual governador do BdP e ex-ministro das Finanças, Mário Centeno, responda às questões dos deputados, assim como o seu anterior secretário de Estado das Finanças, Ricardo Mourinho Félix, hoje no Banco Europeu de Investimento.

Representantes da Lone Star também poderão estar na calha para ser ouvidos pelo Parlamento.

Os deputados vão ainda avaliar a retransmissão de obrigações séniores do Novo Banco para o BES, que capitalizou a instituição de crédito em 1.985 milhões de euros, que assim deixou de assumir esta dívida, após uma decisão do BdP, em dezembro de 2015, na altura liderado por Carlos Costa.

As perdas do Novo Banco que fundamentam as injeções de capital do FdR ao abrigo do CCA deverão levar a CPI a chamar também Luís Máximo dos Santos, presidente do FdR, e José Rodrigues de Jesus, líder da comissão de acompanhamento do Novo Banco, entidade incumbida de analisar várias operações do banco quando estão em causa ativos cobertos pelo CCA.

E, porque as operações que estão na origem dessas perdas que são cobertas pelo CCA também vão ser investigadas pela CPI, o Parlamento deverá chamar António Ramalho e membros antigos ou atuais da comissão executiva do Novo Banco.

Além destes e de outros nomes, segundo o objeto da CPI, Assembleia da República poderá pedir o depoimento de outras duas figuras políticas que, em 2014, estiveram associadas à resolução do BES e à criação do Novo Banco: o antigo primeiro ministro social democrata, Pedro Passos Coelho, e a sua então ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque. Isto porque a CPI pretende “avaliar a atuação dos Governos (…) no quadro da defesa do interesse público” — o do PSD/CDS e o da ‘geringonça’ do PS.

Carlos Costa reafirma que auditora deveria ter comunicado reservas sobre BESA

Quarta-feira, Outubro 28th, 2020

Citamos

Eco

Carlos Costa reafirma que auditora deveria ter comunicado reservas sobre BESA

 

Carlos Costa afirmou que a garantia soberana emitida pelo Estado angolano remetia para um anexo que nunca foi do conhecimento do BdP, salientando que o BESA nunca a executou.

Oex-governador do Banco de Portugal disse esta terça-feira que a garantia do Estado angolano à carteira de crédito do BESA não ilibava a auditora externa de comunicar ao supervisor os motivos que a levaram a emitir reservas.

Num depoimento no Tribunal da Concorrência, no âmbito do julgamento das impugnações às coimas num valor global próximo dos 5 milhões de euros aplicadas pelo Banco de Portugal (BdP) à auditora KPMG e a cinco dos seus administradores, Carlos Costa procurou justificar a condenação administrativa proferida em junho de 2019.

Na sessão, que decorreu ao longo de todo o dia e ficou marcada por alguns momentos de crispação, Carlos Costa chegou a insurgir-se contra o que considerou ser a “agressividade despropositada para com quem exerceu funções públicas” da inquirição conduzida por um dos mandatários da KPMG, sublinhando a sua qualidade de testemunha e não de acusado, o que levou Duarte Santana Lopes a retorquir que também os arguidos neste processo, “acusados de mentir” pelo BdP, têm o direito à defesa do seu bom nome.

Carlos Costa afirmou que a garantia soberana emitida pelo Estado angolano remetia para um anexo que nunca foi do conhecimento do BdP e salientou o facto de o BESA nunca a ter executado. Admitindo que a garantia cobrisse as imparidades, para o ex-governador do BdP isso não invalida o facto de terem ocorrido e de ter existido crédito mal concedido, sem que o auditor tenha prestado essa informação ao supervisor.

Na sua decisão, de 22 de janeiro de 2019, que culminou com a autuação em 17 de junho desse ano, o BdP considerou ter ficado provado que, entre 2011 e, pelo menos, dezembro de 2013, a KPMG e os cinco associados visados sabiam que, no âmbito do seu trabalho de auditoria, nomeadamente para efeitos de certificação das contas consolidadas do BES, não tinham acesso a informação essencial sobre a carteira de crédito do BESA e que, pelo menos a partir de janeiro de 2014, sabiam que existia um conjunto de dossiers de créditos considerados incobráveis.

Para o BdP, tais factos deveriam ter determinado a emissão de uma reserva às contas consolidadas do BES e deveriam ter sido comunicados ao supervisor.

A juíza Vanda Miguel questionou Carlos Costa sobre o facto de em meados de 2014 o próprio presidente executivo do BESA, Rui Guerra, ter admitido que o retrato “caótico” contido nas atas da Assembleia-Geral de outubro de 2013, espelhado na notícia do Expresso de 7 de junho, tinha sido alterado com informação entretanto prestada e confrontou o antigo governador com os argumentos de que houve prestação de informação já invocados neste julgamento pela KPMG.

A juíza questionou ainda Carlos Costa sobre a existência de uma garantia soberana e o facto de existir reconhecimento e cooperação com o supervisor angolano (o Banco Nacional de Angola).

No julgamento, que decorre desde o passado dia 3 de setembro no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, em Santarém, está em causa a condenação, pelo Banco de Portugal, da KPMG ao pagamento de uma coima de 3 milhões de euros, do seu presidente, Sikander Sattar, de 450.000 euros, de Inês Neves (425.000 euros), de Fernando Antunes (400.000 euros), de Inês Filipe (375.000 euros) e de Silvia Gomes (225.000 euros), de que todos recorreram.