Arquivo para a categoria ‘Dívida pública’

Já não há Banco de Portugal

Domingo, Maio 29th, 2016

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A Estátua do Sal Opinião Nicolau Santos in Expresso Diário 27/05/2016

Cada vez é mais evidente que o Banco de Portugal já não é o Banco de Portugal, mas uma agência do Banco Central Europeu, que atua por ordens de Frankfurt e que, quando decide pela sua cabeça, desculpa-se depois com as ordens que supostamente vêm de fora. Os exemplos já são muitos mas hoje surgiu mais um.

Pelo seu estatuto orgânico, o Banco de Portugal apenas obedece ao BCE. O governador é inamovível e não pode ser demitido pelo Governo, a não ser no caso de falha grave (mas até agora nunca tal aconteceu em nenhum país da União Europeia). E quando o país foi obrigado a cortar duramente em salários e reformas, os funcionários do Banco de Portugal mantiveram-se olimpicamente “a latere” desse esforço.

A primeira grande confusão veio, contudo, com a resolução do BES. Supostamente, o BCE decidiu exigir num fim-de-semana uma linha de crédito de três mil milhões concedida ao banco e impedir o seu acesso para se refinanciar junto do Eurosistema. O Governo PSD/CDS não lutou contra esta imposição, o Banco de Portugal também não e o terceiro maior banco do sistema, na altura já liderado por uma pessoa escolhida e convidada pelo próprio governador, Vítor Bento, foi mesmo riscado do mapa, com prejuízos enormes para milhares de depositantes e acionistas e para a economia nacional.

Não contente com isto o Banco de Portugal voltou a ter uma atuação perfeitamente opaca no caso do Banif, cuja resolução impôs em Dezembro de 2015, depois de ter assistido de forma passiva à aparente degradação da situação, tanto mais que tinha um homem nomeado por si na administração do banco, que depois passou a ser o responsável pela supervisão do banco central. Para além do custo para acionistas e clientes, desta vez os contribuintes também receberam uma fatura de três mil milhões para pagar. E o governador atirou responsabilidades para cima de todos (o presidente do Banif, o anterior e o atual Governo, a Comissão e o BCE), menos para si próprio.

Não contente com isso, o Banco de Portugal decidiu de repente passar cinco emissões obrigacionistas que estavam no Novo Banco para o banco mau, o que atraiu as atenções dos investidores internacionais para a situação do país e pressionou as taxas de juro da dívida pública para a alta, além de criar uma desconfiança acrescida na atração de investimento estrangeiro e novas pressões das agências de rating.

Agora, pelos vistos, o Banco de Portugal quebrou uma regra que se repetia anualmente: entregar os seus dividendos ao Estado em Abril, já que fecha as suas contas em Março. Pois bem, este ano passou essa entrega para Maio, o que está a ser um motivo adicional para em Bruxelas se pedir que o país seja alvo de sanções (pelos resultados de 2015) e que ponha em prática novas medidas (porque a evolução orçamental não está em linha com o previsto).

Disse o primeiro-ministro que, se o Banco de Portugal tivesse entregue as verbas em causa em Abril, a evolução orçamental estaria em linha com o previsto e seria mesmo mais favorável. Mais: explicou que bastaria isso para que o défice estivesse com uma evolução melhor, mesmo que o Banco de Portugal, justificando-se com uma alteração de regras, vá entregar este ano ao Estado apenas um terço do que entregou em anos anteriores.

Ora mesmo sem uma pessoa ser adepto das teorias da conspiração, começam a ser casos demais contra os interesses do país. Ou se levarmos a teoria ainda um pouco mais longe, começam a ser casos demais contra o atual Governo, com que obviamente o governador não compartilha as mesmas opções económicas e ideológicas.

Convenhamos, por isso, que Carlos Costa começa a estar a mais na liderança do Banco de Portugal. Mas como manifestamente não se vai demitir, então talvez seja boa ideia começar a chamar-lhe funcionário superior do BCE e não governador do Banco de Portugal – que, como digo, já não existe. O que há é uma casta de funcionários, que não estão sujeitos às leis do país, liderados por um senhor que está sempre do lado de Bruxelas e Frankfurt – e não de Portugal.

Banco de Portugal aconselha bancos a comprarem menos dívida pública

Quinta-feira, Maio 26th, 2016

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Expresso

“O aumento da exposição dos bancos a títulos de dívida soberana durante a crise económica e financeira ainda não foi materialmente revertido”, refere um relatório divulgado esta quarta-feira

O Banco de Portugal (BdP) aconselhou esta quarta-feira as instituições financeiras a comprarem menos dívida pública para fazer face às novas regras, numa altura em que os rácios de capital dos bancos portugueses continuam a ser dos mais baixos da Europa.

No Relatório de Estabilidade Financeira , o BdP salienta que “o aumento da exposição dos bancos a títulos de dívida soberana durante a crise económica e financeira ainda não foi materialmente revertido”.

Numa altura em que se perspetivam alterações regulamentares “mais exigentes no tratamento prudencial do soberano”, o banco central considera que esta exposição “constitui uma preocupação acrescida”.

Isto também porque “as exigências regulamentares de solvabilidade são crescentes e os rácios de capital dos bancos portugueses continuam a ser dos mais reduzidos da Europa”.

Nesse sentido, o BdP destaca que “o novo quadro regulamentar, tendo como objetivo a estabilidade financeira, não deixa de levantar desafios para o sistema bancário europeu na atual conjuntura”.

Assim, o Banco de Portugal considera que “as instituições financeiras deverão realizar uma diversificação prudente da carteira de títulos de dívida, para mitigar os riscos associados ao aumento dos prémios de risco e fazer face às alterações regulamentares”.

E defende: “É fundamental que a revisão do tratamento prudencial da dívida soberana – em discussão nas instâncias internacionais – seja prudente e faseada, garantindo uma convergência consistente e gradual para o novo enquadramento”.

No Relatório de Estabilidade, o banco central conclui que houve uma intensificação para a materialização dos riscos à estabilidade financeira, destacando, entre eles, o “aumento da volatilidade dos mercados”, relacionada também com a “deterioração do sentimento dos mercados relativamente aos bancos europeus, num contexto de transição para um enquadramento regulamentar mais exigente”.

No caso português, escreve a instituição, “essa deterioração é acentuada pelas vulnerabilidades das instituições de crédito nacionais, designadamente quanto à baixa rendibilidade, à qualidade dos ativos em balanço e aos rácios de capital”.

Redução da dívida depende da venda de ativos do Novo Banco e da Oitante

Quarta-feira, Maio 18th, 2016

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Notícias ao Minuto

O CFP alertou hoje para que a redução da dívida prevista pelo Governo “está dependente” das amortizações antecipadas, que, por sua vez, dependem da alienação de ativos do Novo Banco e da Oitante, operações que comportam riscos.

Na sua análise ao Programa de Estabilidade 2016 – 2020, hoje divulgada, o Conselho de Finanças Públicas (CFP) adverte que “a trajetória da dívida pública está dependente das amortizações antecipadas previstas e da utilização de depósitos da administração central”.

A instituição liderada por Teodora Cardoso recorda que, para 2016, o Ministério das Finanças prevê “continuar a efetuar amortizações antecipadas de empréstimos com base nas receitas da alienação dos ativos do Novo Banco, da Oitante [a sociedade-veículo para onde foram transferidos os ativos do Banif que o Santander Totta não quis comprar] e do reembolso dos CoCo’s [instrumentos de capital contingente]” e considera que “estas operações comportam o risco associado ao momento e ao valor de venda destes ativos”.

De acordo com o CFP, “a materialização destes elementos de risco poderá colocar em causa a estratégia de amortização de dívida pública e, por esta via, a redução do rácio da dívida pública” apresentada no Programa de Estabilidade, que aponta para que, no final de 2020, a dívida caia para os 110,3% do Produto Interno Bruto (PIB).

Já em dezembro do ano passado, em entrevista à Lusa, a presidente da Agência de Gestão do Crédito e da Dívida Pública (IGCP), Cristina Casalinho, tinha referido que a devolução antecipada do empréstimo pedido ao Fundo Monetário Internacional (FMI) depende da venda do Novo Banco e da alienação dos ativos do Banif que ficaram no veículo público.

Em 2015, Portugal desembolsou antecipadamente 8,4 mil milhões de euros ao Fundo: 6,6 mil milhões em março e mais 1,8 mil milhões em julho e, em 2016, foram já devolvidos 2 mil milhões dos 4,6 mil milhões de euros que o Estado prevê amortizar de forma antecipada.

Ao todo, Portugal já devolveu 36% do valor total do empréstimo contraído junto do FMI, no âmbito do programa de resgate, que terminou em 2014.

Quanto aos depósitos da administração central, o CFP refere que a sua utilização “está dependente de circunstâncias ligadas à própria gestão da dívida face às condições de financiamento no mercado” e acrescenta que, no final de 2015, estes depósitos ascendiam a 7,4% do PIB, “estando prevista no horizonte temporal do Programa de Estabilidade uma utilização intensiva” dos depósitos da administração central, “que levará a que no final de 2020 representem apenas 4,4% do PIB”.

No mesmo documento, o CFP afirma que a trajetória da dívida pública que consta do Programa de Estabilidade até 2020 “supera os requisitos mínimos de redução da dívida pública aplicáveis a Portugal”, e resume as regras europeias a que Portugal ficará obrigado, admitindo que sairá do Procedimento dos Défices Excessivos (PDE) com base no desempenho orçamental deste ano.

Segundo estas regras, se Portugal sair do PDE em 2016, “os três anos subsequentes [2017 a 2019] serão considerados como período transitório” e, nesse período, o rácio da dívida previsto no Programa de Estabilidade “cumpre o ajustamento mínimo exigido”.

“A partir de 2020 inclusive aplica-se a regra de redução da dívida ao ritmo de um vigésimo por ano, a qual também é cumprida nas projeções do Ministério das Finanças”, aponta ainda o CFP.

Governo não espera gastar mais com Novo Banco

Quarta-feira, Abril 27th, 2016

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Observador

O ministro das Finanças, Mário Centeno, assegurou esta terça-feira que a solução para o Novo Banco deverá ser encontrada sem esforço adicional para o contribuinte.

O Governo não espera gastar mais com o Novo Banco. Mário Centeno, ministro das Finanças, disse esta terça-feira no Parlamento que a solução deverá ser encontrada sem novos impactos nas contas públicas.

Em resposta à deputada Mariana Mortágua, Centeno defendeu que “a regularização do Novo Banco é importante para a estabilização do sistema financeiro português”. Mas lembrou que o impacto da resolução do banco foi reconhecido nas contas de 2014 e garantiu que o Governo quer que os efeitos se fiquem por aí.

“O detentor do Novo Banco é o fundo de resolução, que está dentro das administrações públicas, e por isso todos queremos que a solução seja feita no contexto do esforço que já foi feito e que não exista mais nenhum esforço orçamental do que aquele que foi feito”, garantiu o ministro das Finanças, que era ouvido ao abrigo do regimento, na comissão parlamentar de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa.

Banco – Banco Mau = Banco Bom. Mas alguém tem de pagar a separação

Terça-feira, Abril 12th, 2016

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Observador

Costa, primeiro-ministro, defende criação de veículo para limpar a banca dos ativos de má qualidade. Uma solução que Costa, o governador, também tem apoiado. Mas esta separação exige financiamento.

O primeiro-ministro defendeu a ideia de transferir empréstimos de má qualidade para um veículo autónomo para libertar o sistema financeiro do peso deste crédito malparado. A sugestão de António Costa, feita no fim de semana em entrevista à TSF e ao Diário de Notícias, surge como resposta às dificuldades que ainda persistem de financiamento à economia e às empresas. E surge, também, numa altura em que em Itália se está a preparar uma solução semelhante.

As perdas no crédito obrigam as instituições bancárias a reconhecer imparidades e constituir provisões no balanço — ou seja, colocar lucros de parte. Desde o início da crise, calcula-se que a banca nacional já tenha destruído mais de 40 mil milhões de euros em imparidades. E, mesmo assim, o crédito em incumprimento que está nos bancos representa um travão à concessão de novo crédito, além de ser uma pressão sobre os rácios, exigindo mais capital que os investidores não têm interesse em aplicar quando os bancos estão tão pouco, ou mesmo nada lucrativos.

O que defendeu António Costa:

Temos de trabalhar com as instituições regulatórias, com as instituições financeiras na resolução dos chamados Non Performing Loans [crédito malparado] e acho que era útil para o país encontrar um veículo de resolução do crédito malparado, de forma a libertar o sistema financeiro de um ónus que dificulta uma participação mais ativa nas necessidades de financiamento das empresas portuguesas”.

Em causa estaria a criação de um fundo – uma espécie de super-bancomau (Bad Bank) que estenderia a todo o sistema o modelo que foi desenvolvido a nível individual para o Banco Espírito Santo e, também, para o Banif, os dois bancos que foram alvo de resolução.

E foi precisamente a intervenção das autoridades nestas duas instituições e as faturas pesadas para os contribuintes, no caso do Banif,e para o sistema bancário, no caso do BES, que têm vindo a dar força a esta possibilidade. Em Portugal, todos sabem que a banca e o Estado não aguentam mais resoluções. A do Banco Espírito Santo obrigou o Fundo de Resolução a pedir um empréstimo ao Estado que terá de reembolsar com o produto da venda do Novo Banco. Se não for suficiente, e é quase certo que não será, terá de ser o sistema bancário a assumir a diferença.

E apesar de muitos acreditarem que o pior já passou, a evolução do crédito malparado, que continua a crescer, e a persistência de prejuízos em instituições como a Caixa Geral de Depósitos, o Novo Banco e o Montepio são sinais de preocupação.

Por outro lado, o governo já assumiu que terá de haver um novo aumento de capital na Caixa Geral de Depósitos. A criação de um veículo para acolher os ativos problemáticos do sistema bancário, poderia ser uma espécie de plano B no esforço de saneamento do banco público. Ainda nesta entrevista, o primeiro-ministro insiste que a Comissão Europeia não pode impedir o acionista público de capitalizar o banco, em nome da defesa da concorrência.

A proposta de Costa aproxima-se do modelo que tem sido defendido publicamente por outro Costa. No caso, Carlos Costa. Ainda na audição na comissão de inquérito ao Banif, o governador lamentou que Portugal não tivesse podido aplicar um modelo em linha com os utilizados na Irlanda e em Espanha por falta de condições das finanças públicas. Em termos simples, a dívida pública nacional era demasiado elevada para que houvesse possibilidade de assumir de uma assentada estas responsabilidades — sem que o nível da dívida subisse para níveis considerados insustentáveis.

Em entrevista ao Expresso, o governador foi claro na defesa de uma “solução para retirar do balanço dos bancos os ativos punitivos através da sua colocação em veículos que permitissem depois a sua venda a investidores finais”.

Preferindo evitar a expressão Bad Bank, Carlos Costa admitia então que se podia “criar um veículo como se fez em Espanha, onde são colocados ativos que não são core (nucleares) dos bancos e que não geram rendimento ou que precisam de mais tempo para gerá-lo”. O governador assume ainda que já abordou o tema com o governo.

Solução afastada em 2011 porque faria disparar dívida

A ideia não é nova e chegou a ser equacionada quando foi negociado o memorando de assistência com a troika. No caso irlandês, a limpeza do balanço da banca foi feita à custa da dívida pública, o que no caso português colocaria uma pressão insuportável sobre o endividamento do Estado — em causa estavam cerca de 40 a 50 mil milhões de euros, segundo números recentes revelados pelo antigo primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho — uma dimensão que poderia arrastar Portugal para um resgate mais longo e mais caro. Não se sabe que valores estariam em causa hoje.

Outra consequência seria a “nacionalização” de quase toda a banca privada, o que explica a resistência inicial dos banqueiros a este modelo.

Por outro lado, a troika quis diferenciar os casos português e espanhol. O primeiro era um problema de dívida pública, o segundo era um problema bancário. Ainda assim ficou reservado um pacote de 12 mil milhões de euros para financiar as necessidades nos bancos portugueses, do qual durante o resgate só foi usado metade para empréstimos aos bancos. E nada impedia que a solução de veículo para ativos tóxicos pudesse entretanto vir a ser implementada.

A Espanha aplicou uma receita parecida em 2012 quando negociou com as instituições europeias um mini-resgate, no valor de cerca de 40 mil milhões de euros, para limpar o balanço dos bancos problemáticos, sobretudo das cajas regionais. Mas quer o modelo irlandês, de “nacionalização” das perdas dos bancos e das próprias instituições, quer o modelo espanhol, envolveram fundos públicos, ainda que financiados pelas instituições internacionais. Ou seja, o Estado está sempre na linha da frente, ainda que não venha ser diretamente o financiador.

A Associação Portuguesa de Bancos (APB) confirma que propôs em 2011 ao governo liderado por Pedro Passos Coelho o lançamento de um veículo de resolução do crédito malparado, uma solução que não avançou, segundo revelou à agência Lusa fonte oficial da entidade. “Note-se que a própria APB, em 2011, propôs ao governo de então a constituição de um veículo para a aquisição de crédito malparado, solução que não foi acolhida”, afirmou a porta-voz da APB. “Entretanto, as diferentes instituições financeiras do mercado — com particularidades distintas – têm vindo a desenvolver um intenso trabalho, ainda em curso, de reparação dos seus balanços, nomeadamente no quadro das novas exigências regulatórias e de supervisão”, sublinhou.

Segundo a associação que representa os bancos que atuam em Portugal, “o agravamento da situação económica do país, verificado desde a crise da dívida soberana, provocou um aumento muito significativo dos níveis de incumprimento, em particular nas empresas, onde o rácio de crédito em risco subiu de 6,1%, em 2010, para 19,8% em 2015”. A entidade liderada por Fernando Faria de Oliveira salientou que “esta é uma realidade que se observa, de resto, em vários países da Europa” e que “países como Chipre, Grécia, Irlanda, Eslovénia e Itália apresentavam, em 2014, rácios de incumprimento superiores aos verificados em Portugal”. E destacou: “Nessa medida, vemos naturalmente com agrado que se reflita e se discutam soluções que contribuam para acelerar a recuperação ou a venda dos créditos em mora, promovendo o fortalecimento do sistema bancário europeu”. De acordo com a APB, “tais soluções deverão ser compatíveis com o quadro comunitário e permitir minimizar potenciais perdas de capital”.

A APB considerou ainda que “é igualmente indispensável e urgente atuar no sentido da eliminação dos constrangimentos de natureza fiscal, legal e judicial que dificultam a resolução do elevado nível de crédito vencido das empresas”.

Um osso duro de roer: Concorrência europeia

Uma das hipóteses que está em cima da mesa seria o financiamento privado deste veículo através da emissão de títulos — de unidades de participação ou de dívida — em mercado — uma forma de antecipar as receitas futuras esperadas com a rentabilização deste património (titularização). Sendo no entanto estes ativos de alto risco, uma operação desta natureza exigiria um conforto adicional para atrair investidores privados, o que só poderia ser feito com o recurso agarantias do Estado. E aí seria importante assegurar que estas garantias não irão pesar na dívida pública, a não ser no caso de serem acionadas.

Mas o principal travão a esta solução seria a autoridade da concorrência europeia. A poderosa e temida DG Comp que tem a última palavra na aprovação de ajudas de Estado e cujas objeções foram determinantes para o desfecho do caso Banif. No início deste ano, a DG Comp chumbou uma proposta similar feita pela Itália que, no entanto, deverá insistir.

Segundo uma notícia do Financial Times de domingo, Itália promoveu esta segunda-feira uma reunião em Roma com executivos dos principais bancos italianos para acertar detalhes num eventual “plano de último recurso” para resgatar a banca do país. O jornal financeiro apurou que o plano italiano terá algumas semelhanças com a criação do fundo Sareb, criado em Espanha. “O problema é que as regras europeias nos auxílios de Estado de então já não são as mesmas que existem hoje”, disse ao Observador um especialista do setor financeiro.

Do que se sabe sobre este possível fundo italiano, este assumiria a forma de um veículo de capitais privados que receberia a injeção de cinco mil milhões em capital. Esse capital seria injetado pelos vários bancos do sistema financeiro italiano, proporcionalmente à sua escala. Mas não seriam apenas os bancos – seguradoras e gestoras de ativos também participariam. Segundo o Financial Times, com esse capital acionista, o veículo teria, também, capacidade para emitir dívida e passaria a comprar ações dos bancos em dificuldades. Este veículo operaria em conjunção com um segundo fundo, que que compraria crédito em risco a preços do mercado.

António Costa não deu pormenores sobre como seria este “veículo” financeiro em Portugal. E quando questionado sobre um novo apoio financeiro internacional para resolver os problemas do setor bancário, remete a resposta para as instituições europeias.

“O que posso acrescentar é que não vivo indiferente ao tema e, por isso, tenho-me empenhado em que o tema possa ser solução. Que designámos uma unidade de missão para fazer um trabalho muito aprofundado sobre a capitalização das empresas portuguesas, das quais não está excluído o sistema financeiro”.

Na entrevista ao Expresso, também Carlos Costa reconhece que uma solução desta natureza deverá ser uma solução europeia, ou pelo menos, ter o apoio europeu. Numa intervenção feita em janeiro na Universidade Católica, o governador abriu também a porta a uma resposta mais do que nacional.

Tendo o financiamento na Europa dominado pelo sistema bancário, há que assegurar que os bancos têm a possibilidade de titularizar os seus créditos e de colocar esses títulos junto de investidores institucionais. Tal permitirá, por um lado, que os bancos europeus libertem fundos para financiamento de investimento, tenham alternativas de acesso ao mercado de capitais e, por outro lado, que seguradoras e fundos de pensões, que atualmente fazem aplicações em títulos de longo prazo emitidos fora da Europa, disponham de oportunidades de investimento em títulos europeus.”

E quem paga?

A solução do fundo de ativos maus teria de ultrapassar outro teste, neste caso o dos próprios bancos. Para além de exigir financiamento ao novo veículo, a transferência destes ativos poderia, no curto prazo, agravar as necessidades de capital dos próprios bancos. Isto se a sua passagem fosse feita a um desconto (haircut) significativo em relação ao valor de balanço, obrigando as instituições a reconhecer perdas. Se o preço for demasiado baixo, há o risco de os bancos não terem interesse em vender, preferindo assumir gradualmente as imparidades à medida que se materializam, como tem feito nos últimos anos.

O governador reconheceu aliás na entrevista ao Expresso que esta transferência não pode acontecer de forma sistemática e “enquanto os bancos tiverem de suportar perdas de capital significativas”.

Por outro lado, e para viabilizar uma solução que apostasse no financiamento privado em mercado mas com aval do Estado, seria necessário acautelar que estasgarantias públicas não iriam à dívida pública, o que em tese não é impossível, mas teria de ser validado pelo organismo estatístico europeu, o Eurostat. O impacto nas contas públicas chegaria apenas no caso de estas garantias virem a ser acionadas, o que levaria logo as perdas ao défice.

E essa é a grande reserva já manifestada pelos partidos à esquerda em relação à sugestão de António Costa. Catarina Martins do Bloco de Esquerda e Jerónimo de Sousa do PCP manifestaram apreensão face ao risco de mais um encargo para os contribuintes.

Já o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que falava à margem dos 140 anos da Caixa Geral de Depósitos, mostrou abertura:

Essa é uma fórmula que já foi ponderada ou utilizada noutras economias e portanto nesse sentido não é uma realidade nova, que longe de significar um juízo negativo sobre o sistema financeiro, pelo contrário, olhando para outros exemplos, é uma prova de confiança no sistema financeiro e uma ajuda adicional para fortalecer um sistema financeiro como o sistema financeiro português.”

Contactado pela TSF, o PSD não reagiu, mas o partido que fez parte da coligação que esteve no governo, o CDS criticou a forma como o primeiro-ministro revelou esta intenção. O deputado João Almeida adianto que o partido tenciona colocar perguntas a António Costa sobre o tema, manifestando ainda o receio que que, uma vez mais, seja o contribuinte a pagar.

 

 

 

Novo Banco: venda direta ou ida para a Bolsa em aberto

Terça-feira, Março 8th, 2016

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Expresso

Banco de Portugal espera que a segunda tentativa de venda aconteça até junho. Em cima da mesa está a hipótese de o banco ser alienado em parcelas

O segundo concurso para a venda do Novo Banco vai ser mais flexível do que a primeira tentativa de venda que fracassou em toda a linha. Segundo apurou o Expresso, o processo de venda, anunciado em janeiro, deverá estar concluído até junho e poderá ser concretizado através da colocação em bolsa e/ou através de venda direta, com a entrada de um acionista do sector financeiro.

O objetivo é tornar o banco mais apetecível num processo mais competitivo e otimizar a receita daí decorrente. A favor da venda este ano está o facto de o Novo Banco ter sido recapitalizado através da transferência de cinco emissões de dívida sénior para o BES ‘mau’, no valor de 1985 milhões de euros, o que permitiu à instituição liderada por Eduardo Stock da Cunha reduzir as necessidades de capital no curto e médio prazo. O rácio de capital ficou nos 13,6%.

São dois caminhos – encontrar um comprador estratégico da banca ao mesmo tempo que se abre a porta ao mercado de capitais – que serão trilhados em simultâneo. Este modelo passa pela divulgação de um caderno de encargos que apenas será público no final de maio. Antes disso a equipa de assessores farão uma ronda por vários países e investidores internacionais, nomeadamente fundos britânicos e norte-americanos. Estas apresentações servem para contactar informalmente o mercado, informando os investidores sobre os impactos da reestruturação que está a ser feita, e com isso atrair o maior número de potenciais interessados possível. Entre eles, além de fundos, estão os bancos espanhóis Santander Totta (que acabou de comprar o Banif em dezembro por 150 milhões de euros) e La Caixa (o maior acionista do BPI), que são vistos com bons olhos pelo Banco Central Europeu (BCE), que tem apelado a uma concentração do mercado bancário, e pela Direção Geral da Concorrência da Comissão Europeia (DGCom). Estes dois bancos já foram sondados pelo Banco de Portugal como noticiou o Expresso.

Existe a possbilidade de vender apenas o negócio bancário doméstico (à semelhança do que aconteceu com o Banif) e desinvestir em outros ativos não estratégicos e créditos em incumprimento. Está também em aberto a venda em separado da seguradora do grupo, a GNB Seguros. Para isso será criado um novo veículo (side bank) para acomodar estes ativos a vender. Mas este cenário irá depender da prospeção de mercado que será feita antes de ser tomada uma decisão final. Uma coisa é certa, sem tempo para finalizar a reestruturação do banco já aprovada pela DGCom, quaisquer que sejam os pressupostos da venda assentarão sempre em cenários de crescimento e execução conservadores.

Recorde-se que o Novo Banco pode ser vendido até agosto de 2017, mas nesse caso, se nada for feito entretanto, o banco liderado por Eduardo Stock da Cunha terá de ser vendido na sua totalidade e não por áreas de negócios. É uma corrida contra o tempo, numa altura em que o desconto que o mercado está a fazer à banca é elevado.

ENCAIXE DA VENDA SERÁ PARA REDUZIR A DÍVIDA PÚBLICA

A receita da venda do Novo Banco como um todo, em partes ou através da sua colocação em bolsa será consignada para reduzir a dívida pública. Descontado o valor que está a penalizar a banca europeia e atendendo a que o Novo banco tem custos de reestruturação pela frente e não deu ainda provas do seu resultado, as contas dos potenciais compradores não cobrem nem de perto nem de longe os 4,9 mil milhões já injetados no Banco.

Jerónimo insiste na renegociação da dívida e na nacionalização do Novo Banco

Segunda-feira, Março 7th, 2016

Citamos

TVI

Secretário-geral do PCP defende as “medidas positivas” do Orçamento do Estado, apesar das suas “contradições e limitações”

O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, defendeu este domingo as “medidas positivas” do Orçamento do Estado, apesar das suas “contradições e limitações”, insistindo, por outro lado, na renegociação da dívida enacionalização do Novo Banco.

Num comício de comemoração do 95.º aniversário do PCP, na Aula Magna, em Lisboa, Jerónimo de Sousa fez a defesa de uma política “que inscreva a inadiável renegociação da dívida como condição de desenvolvimento, que recupere a soberania económica, orçamental e monetária”.

“É possível e é viável encetar outro caminho mobilizando recursos que a renegociação da dívida permite libertar, com uma política fiscal que propomos, por via da devida tributação sobre os dividendos, a especulação financeira, o património mobiliário, com a recuperação, pelo controlo público, de setores essenciais ao desenvolvimento do país, como é caso da banca”, afirmou o líder comunista.

Jerónimo de Sousa referiu-se às propostas comunistas “para resolver o problema da dívida”, que apresentarão em breve no parlamento, “mas também para atacar a gangrena que se alarga no sistema financeiro, que tem arruinado as finanças públicas e sem resolver nenhum dos seus problemas, nem do desenvolvimento do país”.

“Por isso, a par da renegociação da dívida também proposta pelo PCP para o controlo público da banca, ganha redobrada atualidade também a proposta que recentemente apresentámos com vista à nacionalização do Novo Banco”, sustentou.

Numa intervenção de cerca de uma hora, depois de momentos musicais e de poesia e de intervenções de responsáveis da JCP e da Organização de Lisboa, Jerónimo de Sousa defendeu que “é justo olhar para o Orçamento, que ainda não está fechado, não só pelo que vale, incluindo o que transporta de medidas positivas, mas também pelo que impede”.

“E o que impede é o aprofundamento do desastre a que conduziram o país e o contínuo prosseguimento da sua agenda de empobrecimento dos trabalhadores e do povo que estava em curso”, declarou.

“É sabido que este não é o nosso orçamento, mas sim um documento da responsabilidade do PS que, apesar de expressar ou poder vir a expressar os compromissos que foram assumidos no quadro das posições conjuntas, está e continua marcado pela matriz essencial das opções dos seus autores”, ressalvou.

Contudo, apontou, o orçamento contém “sinais de inversão de um rumo que não se pode subestimar” e “ousa, apesar do Governo aceitar os critérios e as orientações determinadas por Bruxelas, questionar o rumo das reformas ditas estruturais, e atreve-se a devolver salários, atreve-se a devolver direitos”.

“Um conjunto de razões para que o PCP tivesse votado favoravelmente na generalidade a proposta de orçamento. Um voto que, naturalmente, não ilude contradições e limitações”, afirmou.

Jerónimo de Sousa apontou o aumento do imposto sobre os combustíveis, uma insuficiente tributação sobre o “grande património mobiliário”, a “inexistência de uma resposta estrutural ao problema da dívida, a não consideração do aumento do valor real das pensões ou a manutenção de restrições impostas aos trabalhadores e serviços da Administração Pública”.

Fitch corta perspetiva do rating português para “estável”

Sábado, Março 5th, 2016

Citamos

RTP

A agência Fitch manteve o rating da dívida portuguesa em “BB+”, o primeiro nível da categoria “lixo”, mas baixou o “outlook” de “positivo” para “estável”. A agência de notação financeira justificou a decisão com o défice de 2015, que ficou “muito aquém” da meta, e com os riscos sobre o défice deste ano.

No relatório emitido esta sexta-feira à noite, a Fitch refere que o desempenho orçamental do país ficou “muito além das metas em 2015, com o défice a atingir os 4,2 por cento do PIB, comparativamente com os 2,7 por cento estimados inicialmente”.
“Excluindo os 2,2 mil milhões de euros de resgate ao Banif acordados em dezembro último, o défice poderá ficar acima de 3 por cento. Perante este cenário, o país não vai sair do Procedimento por Défices Excessivos esta primavera, como estava agendado”, explica a agência de rating.

A Fitch acrescenta que a redução do défice, que se situava nos 7,2 por cento em 2014 (3,4 por cento excluindo medidas extraordinárias) ficou a dever-se ao “crescimento modesto” e não às medidas estruturais, porque a consolidação orçamental ficou “suspensa” com as eleições legislativas de outubro.

A Fitch lança ainda o alerta sobre as previsões do Governo para 2016. A agência sublinha que a meta de défice de 2,2 por cento está “em risco”, uma vez que assenta em “pressupostos otimistas” em relação ao crescimento económico e à evolução dos preços.
Perto do “ponto de rutura”
Além disso, acrescenta a agência, permanece “alguma incerteza sobre a forma como o novo governo vai financiar o fosso que resulta da reversão de medidas anunciadas para este ano, já que algumas das medidas do lado da receita poderão ser difíceis de implementar em pleno”.

O acordo de incidência parlamentar entre o PS, o Bloco de Esquerda e o PCP levanta dúvidas à agência de notação financeira. “Equilibrar os compromissos europeus com as exigências do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista está a ser um desafio, e aumenta consideravelmente os riscos políticos a curto prazo”, consideram os técnicos.

Que concluem, num tom ainda mais pessimista, que “a necessidade de implementar mais medidas de austeridade nos orçamentos de 2016 ou de 2017 poderá ser o ponto de rutura para a coligação”.

A Fitch aponta para um défice de 2,8 por cento do PIB este ano.
Deceções e avisos
Sobre a fraca redução da dívida pública, a Fitch aponta culpas à resolução do Banif e ao fracasso da venda do Novo Banco. A menor consolidação orçamental levou assim a agência a deteriorar as previsões para a redução da dívida a médio prazo. A Fitch espera que a dívida pública portuguesa caia para os 122 por cento em 2020, face às projeções de março do ano passado, que admitiam uma dívida de 117,5 por cento na mesma data.

A agência sublinha ainda o nível “desapontante” do investimento em 2015. Para este ano a agência espera que o aumento do consumo, a redução do desemprego e os custos mais baixos da energia continuem a impulsionar o crescimento “moderado” da economia, que a Fitch espera ser de 1,6 por cento.

Em tom de alerta a Fitch sublinha que pode vir a baixar o rating de Portugal caso o país não consiga reduzir o rácio da dívida pública ou se o crescimento da economia ficar abaixo das expetativas, o que poderá ter um efeito negativo no setor financeiro e nas finanças públicas.

A Fitch é uma das três agências de rating que mantém a nota da dívida portuguesa no nível “lixo”.
Governo confiante
O Governo reagiu à decisão da Fitch através de um comunicado enviado à agência Lusa. O Ministério das Finanças diz-se confiante “que a execução do Orçamento de Estado e a redução da dívida bruta ao longo de 2016 permitirá a revisão em alta do rating da República numa próxima avaliação”.

O Ministério chefiado por Mário Centeno nota que “revisão da previsão é justificada pela Fitch com a trajetória ascendente da dívida, que vem do passado e que, no início do ano, foi afetada pela injeção de capital no Banif”.

 

Novo Banco e a “dívida senior”. Gato escaldado de água fria tem medo, dizem os analistas

Quarta-feira, Fevereiro 24th, 2016

Citamos

Observador

Obrigações “senior” que o Banco de Portugal protegeu estão a negociar a 70% do valor. Instituição garantiu que não haverá mais perdas, mas especialistas duvidam. Há uma proposta para “corrigir o erro”

Once bitten, twice shy ou, em português, gato escaldado de água fria tem medo.

A negociação em mercado dos títulos de dívida que foram protegidos na decisão polémica do Banco de Portugal mostra que os investidores continuam muito receosos em relação ao futuro do Novo Banco. Apesar de o Banco de Portugal garantir que a resolução está “completada” e que não haverá mais perdas, as obrigações do Novo Banco estão a negociar a pouco mais de 70% do seu valor e o risco está ao nível da Grécia, pese embora o facto de o banco ter agora uma solvabilidade mais confortável. Este é um sinal claro de que osinvestidores duvidam das garantias dadas pela instituição liderada por Carlos Costa e admitem que as perdas podem não ter ficado por aqui.

Os títulos de dívida do Novo Banco – que apresenta resultados anuais esta quarta-feira – passaram a estar sob pressão no mercado logo no verão, altura em que falhou o (primeiro) processo de venda e que os resultados dos testes de stress do BCE revelaram uma carência de 1.400 milhões de euros em capital. O banco precisaria de fazer alguma coisa para suprir essas necessidades e cumprir os rácios mínimos à entrada no novo ano. E os preços no mercado mostraram, desde esse momento, que os detentores de títulos de dívida – incluindo a dívida com maiores garantias, a senior – poderiam ser chamados a participar nesse esforço de recapitalização. E participar significaria, claro, perdas nos investimentos.

“Tubarões” escaldados

Ao contrário do que alguns terão admitido, contudo, a forma de resolver o problema não foi impor perdas espalhadas por todos os detentores de dívida, na proporção necessária. A decisão do Banco de Portugal foi escolher cinco linhas de obrigações (senior) e fazê-las regressar ao BES, onde os investidores terão uma probabilidade muito baixa de receber um valor que chegue perto do capital investido. A decisão significou que na dívida do BES/Novo Banco poderá ter havido filhos e enteados – o que em termos mais técnicos significa que se violou o princípio de igual tratamento de investidores em circunstâncias iguais (pari passu).

Este é um dos riscos judiciais mais importantes da decisão conhecida em dezembro, e que contribuiu para que se tenham virado os holofotes para Portugal – sobretudo pelo facto de os principais investidores nessas cinco obrigações, que valem dois mil milhões de euros, serem alguns dos maiores investidores do mundo, como a BlackRock e a Pimco, com sede europeia em Londres. Para estes grandes (e influentes) investidores em Londres, once bitten, twice shy.

Por seu lado, as outras linhas de obrigações, cerca de 35, ficaram protegidas a 100%. Mas o seu preço no mercado está longe desses 100%, o que indica que os investidores receiam que os títulos não serão pagos na íntegra.

O paradoxo: rácios melhores mas risco maior?

Naquilo que os especialistas chamam de situação fundamental do banco – rácios de capital, situação operacional, entre outros – o panorama ficou melhor com a decisão do Banco de Portugal. Mas apenas na teoria porque, apesar de o banco ter um passivo menor e a venda parecer, agora, mais facilitada, continua a existir muito nervosismo nos mercados em relação aos outros títulos de dívida do Novo Banco – isto é, aqueles que foram protegidos pela decisão do Banco de Portugal.

Os títulos de dívida senior com vencimentos de 2019 para a frente estão a ser negociados (entre os investidores) com valores na ordem dos 70% do seu valor nominal – aquele que será reembolsado caso o banco pague os títulos na íntegra no vencimento. Para compreender este movimento, o Observador falou com Puja Poojara, analista da consultora CreditSights em Londres. A analista é especializada em mercado de dívida de empresas financeiras e cobre os bancos portugueses para a CreditSights.

O desempenho das obrigações que permaneceram no Novo Banco deveria ser determinada pela visão fundamental do banco, bem como pelos progressos na venda da instituição. Mas ainda existe um nervosismo e uma ansiedade em torno do risco de que possa existir uma nova retransferênciaentre as duas entidades [Novo Banco e BES], apesar de o Banco de Portugal garantir que ‘o conjunto de decisões constitui a alteração final e definitiva do perímetro de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos para o Novo Banco, que assim se considera definitivamente fixado‘”.

E porquê este risco? A opinião de Pedro Ricardo Santos, gestor da corretoraXTB, em Lisboa, ajuda a compreender o que está em causa.

O desempenho das obrigações que permaneceram no Novo Banco deveria ser determinada pela visão fundamental do banco, bem como pelos progressos na venda da instituição. Mas ainda existe um nervosismo e uma ansiedade em torno do risco de que possa existir uma nova retransferênciaentre as duas entidades [Novo Banco e BES], apesar de o Banco de Portugal garantir que ‘o conjunto de decisões constitui a alteração final e definitiva do perímetro de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos para o Novo Banco, que assim se considera definitivamente fixado‘”.

E porquê este risco? A opinião de Pedro Ricardo Santos, gestor da corretoraXTB, em Lisboa, ajuda a compreender o que está em causa.

A principal razão para este movimento relaciona-se com a perceção de risco por parte dos investidores. Apesar das obrigações com maturidade de 2019 não fazerem parte do pacote de ativos transferidos para o banco mau no final de 2015, o risco sistémico acabou por contagiar os restantes títulos do mesmo emitente. Ainda que Carlos Costa tenha referido que o perímetro de atuação do mecanismo de Resolução está fechado, a verdade é que a credibilidade da instituição ficou claramente manchada devido à solução adotada. Assim, o risco de que haja mais necessidades de capital que obriguem a novas medidas do regulador aumenta o risco dos títulos de dívida do antigo BES.

Um terceiro especialista em mercados de dívida bancária, que prefere não ser identificado, salienta que o facto de estes títulos terem pouca liquidez – ou seja, poucos títulos disponíveis para comprar e vender – contribui para amplificar os prémios de risco. E assinala, também, a importância da incerteza política que se seguiu às eleições de 4 de outubro e do recente impasse orçamental com Bruxelas, que tem contribuído para aumentar a pressão sobre a dívida portuguesa.

Um plano para “corrigir o erro” do Banco de Portugal

Estes fatores estão a demonstrar a vulnerabilidade que os ativos portugueses têm num início de ano que está a ser amargo para a maioria dos mercados financeiros europeus e, em especial, para os títulos da banca europeia de um modo geral. As obrigações de outros bancos, como a Caixa Geral de Depósitos e oMillennium BCP, também estão a ser penalizadas neste cenário, mas nada que se compare com os títulos do Novo Banco.

Para o Novo Banco, contudo, a medida deixou a instituição com rácios reforçados, portanto com uma almofada maior para debelar eventuais prejuízos nos próximos tempos. Mas a incerteza em torno do processo de venda e, no fundo, em torno do futuro da instituição – que em grande medida não está nas mãos de Eduardo Stock da Cunha – está a ser suficiente para afastar os investidores.

O risco de litigância é um risco de peso, ainda que tenha ficado claro na decisão do Banco de Portugal que qualquer impacto dessa ordem terá de ser suportado pelo Fundo de Resolução, ou seja, por todos os bancos nacionais. Outro risco é que o Banco de Portugal acabe, por alguma razão, por voltar atrás e impor perdas a outros obrigacionistas que não apenas os que estavam expostos àqueles cinco títulos. E, nesse campo, um especialista publicou recentemente uma sugestão para a forma como o Banco de Portugal poderia “corrigir o erro que cometeu“.

Eis a sugestão de Adam Lerrick, especialista ligado ao American Enterprise Institute, para assegurar um tratamento igual para os obrigacionistas e, ao mesmo tempo, proteger os investidores não-institucionais – como o Banco de Portugal quis fazer. (O plano foi noticiado no blogue Alphaville, do Financial Times)

  • Olha-se para a exposição agregada de cada investidor a obrigações do Novo Banco (tanto os títulos emitidos sob lei portuguesa como os emitidos sob lei internacional). A partir daí, criam-se dois cestos, ou montes.
  • No primeiro monte coloca-se até 200 mil euros em títulos de dívida, de cada investidor, e esses títulos continuam a constar do balanço do Novo Banco – continuando, portanto, protegidos.
  • No segundo cesto, colocam-se os restantes títulos. E desse monte poderia escolher-se os necessários dois mil milhões de euros, em base transversal e equalitária. Esses dois mil milhões em responsabilidades passariam, então, para o BES, ao mesmo tempo que se resolvia o problema de capital que existia no Novo Banco.

Este plano permitiria, segundo o especialista, proteger os investidores com menor exposição e, nos restantes, haveria um tratamento igual na imposição de perdas. Por outras palavras, mais investidores perderiam, mas cada investidor perderia menos. E os não institucionais ficariam protegidos da mesma forma que a decisão anunciada pelo Banco de Portugal os protegeu.

 

 

Os bancos (e os custos) que explodiram nas mãos dos governadores

Sábado, Fevereiro 20th, 2016

Citamos

Dinheiro Vivo

CGD, Novo Banco, BPN, BPP ou Banif custaram ao Estado mais de 14 mil milhões desde 2008. Fatura foi para a dívida pública, cujo custo disparou 52%

Entre 2008 e 2014, os diferentes governos avançaram com 17,6 mil milhões de euros dos contribuintes para o setor bancário, segundo os cálculos do Tribunal de Contas (TC), feitas aquando da apreciação sobre a Conta Geral do Estado de 2014.

O dinheiro entregue ao setor financeiro representava então 10,2% do produto interno bruto mas trouxe igualmente algumas receitas, como por exemplo através do pagamento de juros por parte de alguns bancos sobre os empréstimos públicos a que recorreram.

Segundo o TC, o encaixe para os contribuintes no mesmo período foi de 5,8 mil milhões de euros, pelo que o prejuízo líquido para as contas públicas entre 2008 e 2014, segundo a mesma fonte, ficou nos 11,8 mil milhões de euros, ou seja um buraco equivalente a 7% do produto interno bruto de 2014.

Não por acaso entre 2008 e 2014 a dívida pública portuguesa explodiu de 71% para 130% do PIB, uma subida que elevou de forma bastante agressiva os juros pagos pelos contribuintes no período: se em 2008 rondavam os 5 mil milhões de euros anuais, em 2014 foram 7,6 mil milhões, um crescimento de 52% – sendo que em 2016 a dívida já vai queimar mais de 8 mil milhões em juros.

O cenário até 2014

CGD – Segundo as contas do TC, os vários aumentos de capital feitos no banco público na era Vítor Constâncio e tanto por necessidades da própria instituição como pela absorção do BPN, levaram 3,6 mil milhões de euros dos contribuintes, resultando apenas em 441,6 milhões de euros de receita. Resultado: -3,16 mil milhões de euros. De notar que este banco ainda vai precisar de mais aumentos de capital financiados pelos contribuintes.

BPN – A fatura é interminável e também caiu na era do ex-governador Vítor Constâncio, hoje vice-presidente do BCE – a troco de 359 mil euros anuais. Até 2014, o BPN já tinha queimado 2,7 mil milhões dos contribuintes e existiam ainda outros 3,5 mil milhões de euros empatados na instituição. Em 2016, o OE contempla mais umas centenas de milhões de euros para o antigo banco de Oliveira e Costa e do qual Cavaco Silva foi acionista.

BPP – O Banco Privado teve um impacto de 653 milhões nas contas públicas, segundo o Tribunal de Contas. O banco explodiu nas mãos do ex-governador Vítor Constâncio quando deixou de ter capacidade de cumprir obrigações com os clientes. Segundo a CMVM, o BPP ia usando offshores para financiar-se de forma ilícita.

BES/Novo Banco – Já ninguém acredita que se venda o Novo Banco por um valor próximo dos 4,9 mil milhões aplicados na instituição. Carlos Costa já era o supervisor quando o “império” de Salgado ruiu à conta de uma pirâmide de dívidas que foram sendo contraídos entre empresas do mesmo grupo sem o supervisor tomar medidas. Até ao final de 2014 o impacto ascendia a -4,7 mil milhões.

As contas até 2014 só não foram ainda mais agressivas para os contribuintes por causa do BCP e do BPI, que recorreram igualmente a empréstimos públicos e cumpriram os seus pagamentos de modo célere: Segundo o TC, estes dois bancos acabaram por resultar em ganhos para as contas públicas de 22,1 milhões (BCP) e 167,5 milhões (BPI) até 2014.

Depois de 2014

Este é o número que ainda está longe de ficar fechado. Conforme atrás referido, o BPN continua a apresentar anualmente faturas atrás de faturas e a CGD ainda vai precisar de aumentos de capital. Depois, também o impacto global do Novo Banco ainda é uma incógnita, como o próprio Banif ainda poderá trazer algumas surpresas negativas, apesar dos esforços do governo para fechar o dossier incorrendo logo em todas as perdas.

O Banif foi precisamente o mais recente banco a cair, também na era Carlos Costa, arrastando consigo um custo de 2,4 mil milhões de euros para os contribuintes – 700 milhões num empréstimo e mais 1,7 mil milhões para salvaguardar os depositantes. Este foi mais um banco que foi acumulando vários ativos tóxicos no seu balanço até chegar ao ponto de implosão.

Se juntarmos o impacto da instituição madeirense aos 11,8 mil milhões de euros de perdas líquidas para os contribuintes com o setor bancário entre 2008 e 2014, a fatura atualizada estará hoje na casa dos 14,2 mil milhões de euros: 8,21% do PIB previsto para 2015 – sensivelmente 176 mil milhões.