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Tribunal da Concorrência recebeu mais de 16 milhões de euros só dos processos com multas mais elevadas

Quinta-feira, Abril 28th, 2022

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Tribunal da Concorrência recebeu mais de 16 milhões de euros só dos processos com multas mais elevadas

O Tribunal da Concorrência recebeu mais de 16 milhões de euros só dos processos com multas mais elevadas e juízas titulares do TCRS consideram que o trabalho desenvolvimento é “francamente positivo”.

O Tribunal da Concorrência recebeu, desde a sua criação, em 2012, mais de 16 milhões de euros de coimas, apenas dos recursos de contraordenações dos níveis 2 e 3 (superiores a 100.000 euros).

Segundo dados da Comarca de Santarém fornecidos à Lusa, desde a instalação do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em 30 de março de 2012, até ao final de 2020, dos recursos de contraordenação, níveis 2 e 3, julgados e arquivados após recurso para os Tribunais Superiores, “foram cobrados, provenientes de coimas, mais de 15.900.000 euros e de custas mais de 95.000 euros”, grande parte pagos voluntariamente pelos recorrentes.

Dados referentes a 2021, indicam que, até ao final do ano, foi pago um valor total de 1.502.758 euros, correspondendo 773.439 a coimas de nível 1 (até 100.000 euros), cerca de 150 mil a coimas de nível 2 (entre 100.000 e 500.000), 530 mil euros a coimas de nível 3 (acima dos 500.000 euros) e 49.218 euros a execuções.

Se até 2020 não eram pagas cauções, a partir dessa altura, o TCRS instituiu a obrigação de os arguidos terem de prestar cauções das coimas a que vêm condenados pelas autoridades administrativas.

“Estão a ser prestadas cauções de valores muito significativos ao Tribunal”, disse à Lusa Mariana Machado, juíza titular do Juízo 1 do TCRS, dando exemplo dos 100 milhões de euros de caução no processo que ficou conhecido como “cartel da banca” e que terá sentença no final deste mês.

Fonte judicial adiantou que, nos processos que envolvem bancos, as cauções, em regra no valor de 50% da coima aplicada pela entidade administrativa, têm sido prestadas por garantia bancária.

No caso da EDP que se encontra em fase de julgamento, a empresa depositou como caução o valor integral de 48 milhões de euros, correspondente à coima a que foi condenada pela Autoridade da Concorrência por abuso de posição dominante entre janeiro de 2009 e dezembro de 2013, da qual recorreu para o TCRS.

“A partir do momento em que passou a haver prestação de caução, os problemas de pagamento das coimas mitigaram-se”, disse Mariana Machado, salientando que, após alguma resistência inicial, esta prática “começa a ser interiorizada”.

Nos processos do BES entrados antes da exigência de prestação de caução tem havido “intercomunicabilidade com outros processos em que há apreensões” e “comunicações para, uma vez transitadas as coimas, serem salvaguardados” os interesses do Tribunal, disse.

Como exemplos, Mariana Machado referiu o arresto preventivo interposto pelo Ministério Público no processo BESA/Eurofin, no qual o ex-presidente do BES Ricardo Salgado foi multado em 4 milhões de euros, e a ação cível de impugnação pauliana (para contestar uma decisão lesiva dos legítimos interesses dos credores) da decisão do juiz de instrução Ivo Rosa de levantamento do arresto de 700 mil euros depositados numa conta do Deutsche Bank em nome da mulher de Ricardo Salgado.

Da primeira decisão do universo BES, de abril de 2018, transitada em julgado em novembro de 2020, continuam a ser feitas diligências para obter o pagamento dos 3,7 milhões de euros a que Ricardo Salgado foi condenado, uma vez que não houve pagamento voluntário, estando o outro arguido, o ex-responsável financeiro do BES Amílcar Morais Pires a pagar em prestações os 350.000 euros a que foi condenado.

Sobre o dinheiro das coimas pagas junto do TCRS, Mariana Machado explicita que “entra na conta geral do Estado”, salientando não existir qualquer interesse do Tribunal no desfecho dos processos.

Tribunal da Concorrência alargou competências numa especialização avaliada positivamente

O Tribunal da Concorrência, criado há 10 anos, viu as suas competências serem alargadas em 2018, passando a abranger um leque “muito amplo” de entidades reguladoras, com a sua especialização a ser avaliada positivamente.

Quando foi criado, em 2012, o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), instância de âmbito nacional com sede em Santarém, passou a receber os pedidos de impugnação de decisões de autoridades administrativas como a da Concorrência (AdC), de Comunicações (ANACOM), Banco de Portugal (BdP), Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), Instituto de Seguros de Portugal (ISP), entre outras.

A partir de 2018, as competências do TCRS foram alargadas, passando a abranger também as autoridades da Mobilidade e dos Transportes (AMT) e da Aviação Civil (ANAC), as entidades reguladoras da Saúde (ERS), de Águas e Resíduos (ERSAR) e dos Serviços Energéticos (ERSE), bem como ações de indemnizações por infrações ao direito da concorrência, entre outras.

A pertinência da criação deste Tribunal é reconhecida pelas três juízas titulares do TCRS, que destacam “a capacidade de uma resposta especializada para temas que são complexos e, muitos deles, inovadores”, referiu à Lusa Mariana Gomes Machado, titular do Juízo 1 (J1) desde julho de 2017, mas no lugar desde fevereiro de 2020 (após três anos em comissão de serviço no Tribunal Constitucional).

“Havia fundadas críticas de que antigamente os processos eram julgados na pequena instância criminal e isso era ingerível”, disse, sublinhando a pertinência desta “capacidade de resposta especializada”.

Vanda Miguel, titular do J3 do TCRS desde setembro de 2019, acrescentou o facto de os processos de contraordenação chegarem ao Tribunal muitas vezes “a poucos meses da prescrição”, o que “não seria compatível com a tramitação de outro tipo de ações”, sob o risco de prescreverem processos com coimas “de valores muito substanciais”.

Para Marta Campos, titular do J2, perante a “sofisticação e complexidade do direito e da realidade atual”, só a especialização permite uma melhor e mais célere decisão.

Sendo a juíza há mais tempo a exercer no TCRS, desde setembro de 2013, Marta Campos saudou a “evolução positiva” das competências atribuídas a este tribunal, ao serem definidas “de forma taxativa as entidades cujas decisões são suscetíveis de recursos de contraordenação” e ao serem admitidas “ações que se sustentam em práticas restritivas da concorrência, como ações de indemnização”.

O alargamento às ações cíveis levou a que, em 2020, fosse colocada extraordinariamente no TCRS uma juíza (que acumula com outras jurisdições da Comarca de Santarém), face à entrada de cerca de 70 ações cíveis interpostas por empresas que compraram camiões aos seis fabricantes condenados, em 2016 e 2017, pelo Tribunal de Justiça da União Europeia por concertação de preços de vendas durante 14 anos.

A estas ações, que atualmente ascendem a cerca de 90 e que aguardam ainda agendamento de julgamentos, têm-se vindo a somar as ações populares, interpostas sempre que há contraordenações em matérias lesivas dos consumidores.

Para Mariana Machado, estas ações, que são “complexas, extensas“, constituem mais um desafio, sendo necessário aferir se o elevado número de entradas no cível “é um pico, uma conjuntura, ou se é uma situação estrutural”, sendo necessário mais tempo para perceber se se impõe um juízo especializado no cível.

Vanda Miguel considera que se impunha “uma solução efetiva de continuidade” para os processos cíveis, “que exigem grande estudo e rigor”, pois, a partilha com outras instâncias da Comarca de Santarém, “à medida das necessidades desta”, implicou que, desde 2019, “não tenha sido proferida uma única decisão de mérito quanto a esses processos”.

Perante a evolução das competências atribuídas ao TCRS, Vanda Miguel defendeu uma “séria reflexão sobre a possibilidade de uma uniformização da lei, que englobasse um regime autónomo e completo, aplicável a todos os reguladores, o que criaria maior segurança jurídica para todos os operadores judiciários”.

Marta Campos sublinhou o trabalho desenvolvido pelo TCRS numa década de funcionamento, declarando que foi “francamente positivo”.

“Conseguiu decidir em tempo razoável processos de enorme complexidade com um potencial de impacto na sociedade, em geral, muito relevante”, afirmou.

Segundo dados facultados pelo Ministério da Justiça à Lusa, entre 2012 e 2021, entraram no TCRS 2.637 processos (recursos de contraordenação, execuções, providências cautelares, ações administrativas especiais e outros processos, incluindo os apensos), 2.436 dos quais foram concluídos, sendo a duração média dos processos penais de oito meses.

Vanda Miguel lembrou que, se na comparação com as entradas de processos noutros tribunais, estes não são elevados — embora com tendência para aumentarem –, o TCRS “tem peculiaridades que implicam que o nível de trabalho não possa ser medido pelo número de processos pendentes, mas sim pela complexidade dos mesmos”.

Por isso, considera que o número de magistrados, judiciais e do Ministério Público, bem como de funcionários, é insuficiente, “tendo em conta a pendência de processos de elevada complexidade e número de entradas que a curto prazo se prevê” (mais 22 processos de nível 3 — com coimas superiores a 500.000 euros — até ao final do ano).

A juíza salientou que a complexidade dos processos exige que seja possibilitado ao juiz “tempo para poder estudar e maturar a decisão” e aos funcionários condições para um trabalho de “elevada complexidade, que exige grande rigor e que não se compadece com uma enorme carga de trabalho”.

“Se assim não for, é a qualidade da Justiça que é afetada“, declarou.

Mariana Machado destacou igualmente a importância de um quadro de funcionários adequado e estável, considerando que a rotatividade e o reduzido número aumenta a potencialidade de haver erro.

O Ministério da Justiça reconheceu, em resposta à Lusa, que “o número de oficiais de justiça em exercício de funções no TCRS tem sofrido algumas oscilações”, o que explica, nomeadamente, pelas alterações da própria secretaria do tribunal, a qual, até agosto de 2014, era autónoma e dotada de um mapa de pessoal próprio, tendo, neste período, variado entre sete (em 2012) e onze (em 2014).

A partir de 2014, com o novo mapa judiciário, os funcionários judiciais do TCRS passaram a integrar o mapa de pessoal do núcleo de Santarém, num modelo em que os oficiais de justiça são colocados pela Direção Geral da Administração da Justiça (DGAJ) em cada núcleo, “competindo ao Administrador Judiciário da respetiva Comarca a distribuição dos recursos humanos”, em função das respetivas necessidades.

Atualmente, o quadro é de sete oficiais de justiça, mas apenas seis estão na secção, já que não foi substituída uma funcionária que saiu recentemente, salientando Vanda Miguel “o elevado profissionalismo, empenho e dedicação” de todos, apesar da “enorme sobrecarga de trabalho”.

Cerca de 40 crimes do megaprocesso BES/GES em risco de prescrever. Ricardo Salgado pode ver cair 15 dos 65 crimes de que está acusado

Quinta-feira, Abril 28th, 2022

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Observador

Cerca de 40 crimes do megaprocesso BES/GES em risco de prescrever. Ricardo Salgado pode ver cair 15 dos 65 crimes de que está acusado

Ministério Público e BES em Liquidação alertam para perigo de prescrição. Crimes de falsificação de documento e infidelidade podem cair antes do julgamento.

A maior parte dos crimes por falsificação de documento e infidelidade no megaprocesso BES/GES — mais de 40 — corre o risco de prescrever antes de o caso chegar a julgamento, segundo contas de uma fonte ligada ao processo. O cenário já tinha sido aventado pelo próprio Ministério Público em relação a 18 dos 25 arguidos, entre eles o antigo líder do BES, Ricardo Salgado — aquele que está acusado de mais crimes e que, por isso, poderá ver mais crimes a cair. São-lhe imputados 65 e poderão cair 15.

Segundo a lei, um crime de falsificação de documento prescreve ao fim de cinco ano após a sua prática. No entanto, com interrupções e suspensões na contagem de prazos, pode prescrever num máximo de dez anos e meio. Basta pensar que os crimes aconteceram entre 2009 e  2014 para concluir que em 2024, ou mesmo antes, poderão começar a prescrever. O mesmo acontece com os crimes de infidelidade. Contas feitas, do total de 340 crimes que constam da acusação contra 25 arguidos (sete deles empresas), 46 poderão prescrever antes de o caso ser julgado.

Além de Ricardo Salgado, por exemplo, também o antigo banqueiro Francisco Machado Cruz poderá ver prescritos quatro crimes de falsificação de documento e um de infidelidade. Manterá um de associação criminosa, outro de corrupção passiva e ainda manipulação de mercado, burla qualificada e cinco crimes de branqueamento. Há outros arguidos com crimes semelhantes que poderão beneficiar do tempo que o processo está a demorar a avançar (neste momento, aguarda-se pelo retomar da fase de instrução) para verem os crimes que lhes são imputados prescritos.

A instrução do processo — a parte processual que vai definir se o caso chega a julgamento e em que termos — foi atribuída ao juiz Ivo Rosa em outubro, mas a instrução só seria declarada aberta em janeiro de 2022. No despacho de abertura de instrução, o magistrado explicava que, dada a complexidade do processo e, depois, a mudança de instalações do Tribunal Central de Instrução Criminal para o Campus de Justiça, assim como a mudança das condições da sala de audiências e da sua disponibilidade, o plano para a instrução traçado com os advogados teria que ser alterado.

A instrução do processo, — a parte processual que vai definir se o caso chega a julgamento e em que termos, — foi atribuída ao juiz Ivo Rosa em outubro, mas a instrução só seria declarada aberta em janeiro de 2022creva a newsletter Startups

Logo nesse despacho, o juiz avisou também que não ia cumprir o prazo legal desta fase processual. “Não se pode esperar que um processo com esta dimensão e complexidade (sem qualquer dúvida, o maior e mais complexo alguma vez colocado perante os tribunais portugueses), que durou seis anos de inquérito, com uma acusação deduzida por sete procuradores, em que à defesa foi conferido o prazo de 14 meses para requerer a abertura de instrução, que a instrução decorra com celeridade ou que seja realizada dentro do prazo legal”, informava, ao mesmo tempo que agendava as primeiras inquirições para a última semana de fevereiro a repetirem-se na última semana de cada mês, em três sessões. Ou seja, havia audiências marcadas até 24 de maio.

Nesta altura, também já se estimava que esta fase processual se prolongasse por mais de um ano. Mas, ainda antes de a instrução arrancar — e sem que o juiz chegasse decidir se deixava Ricardo Salgado chamar as 82 testemunhas e o arguido Amílcar Morais Pires outras 75, nesta fase —, o magistrado foi obrigado a suspender as primeiras sessões do caso por motivos de doença. Foi operado ao coração e, um mês depois, ainda não estava recuperado.

BES em liquidação alerta para o risco de prescrição

Esta semana, na sequência da segunda suspensão das sessões — agendadas para esta terça-feira, dia 29 de março, 30 de março e 1 de abril —, o Banco Espírito Santo SA-Em Liquidação decidiu fazer um alerta ao processo. No requerimento a que o Observador teve acesso, os advogados lembram o que o Ministério Público já tinha sublinhado: que não é de excluir a existência de um sério risco “de prescrição do presente procedimento criminal, pelo menos no que respeita a parte dos crimes em causa”, que terão sido praticados entre os anos de 2009 e 2014. O que aporta um “grave prejuízo não só para a administração da justiça, como para os direitos dos lesados e ofendidos”, lembrando que Ivo Rosa reconheceu o estatuto de vítimas a 94 queixosos, que têm direito a uma decisão “dentro de um prazo razoável”.

Os advogados pedem, assim, que seja atribuída natureza urgente aos autos pelo risco de prescrição, para não estar dependente de prazos e poder correr durante as férias judiciais. Isto porque há datas marcadas até 24 de maio, mas por agora é impossível antecipar quando se realizará o debate instrutório, ou seja, o final da instrução — que culmina numa decisão sobre o futuro do processo. “Admitindo-se, pois, como muito provável que o escalonamento das sessões seguintes prossiga para o segundo semestre do ano, com um ainda maior prejuízo para a adequada imperiosa celeridade da tramitação dos presentes autos”, lê-se.

O BES em Liquidação lembra também que ainda não há decisão sobre as 75 testemunhas arroladas por Amílcar Morais Poiares, bem como às 82 arroladas pelo arguido, o que também fará diferença na duração desta fase.

O Banco Espírito Santo SA – Em liquidação pediu que o processo seja considerado urgente para não ser interrompido durante as férias judiciais.

Arguidos invocam outros crimes com risco de prescrição

Pelo menos três arguidos do processo já tinham invocado nos seus requerimentos de abertura de instrução que alguns dos crimes de que são acusados estavam prescritos. Um deles foi Paulo Roberto Nacif Jorge, acusado de um crime de falsificação que, a ser considerado prescrito, faz com que saia do processo. Paulo Nacif Jorge trabalhou no BES Brasil entre 2000 e 2007, como diretor adjunto do Departamento da Banca Transacional de Negócio Internacional e acompanhava clientes internacionais. Saiu do Novo Banco em Setembro de 2014.

Também o antigo administrador financeiro do Banco Espírito Santo (BES), e braço direito de Salgado, Amílcar Morais Pires, que está acusado de um total de 27 crimes, alegou que o procedimento criminal pelo crime de corrupção no setor privado que lhe é imputado também já está prescrito.

Isabel Almeida usou no seu requerimento de abertura de instrução argumentos semelhantes para o crime de infidelidade e de falsificação de documento, precisamente. No caso desta arguida, a defesa considera que os crimes estão já extintos, razão pela qual consideram que o juiz Ivo Rosa deveria fazê-los cair.

No caso da falsificação, está em causa um crime em co-autoria que envolve Isabel Almeida, Morais Pires e Ricardo Salgado, entre outros, que terá sido cometido entre 2001 e 14 de abril de 2014, e  que envolve um valor de 258 milhões de euros para a Espírito Santo Enterprises e 1.330 milhões para a Ongoing, de acordo com os cálculos do Ministério Público.

Juiz Ivo Rosa deixou cair vários crimes na Operação Marquês por causa de estarem prescritos.

Juiz Ivo Rosa também encontrou crimes prescritos na Operação Marquês

Recorde-se que na instrução da Operação Marquês, que ainda não foi julgada (apesar de daqui terem nascido dois processos autónomos contra Ricardo Salgado e Armando Vara que já foram julgados com condenações), o juiz Ivo Rosa reduziu uma lista de 188 crimes para apenas 17, tendo também reduzido o número de arguidos que considerava que deveriam ir a julgamento. Entre os vários argumentos apresentados houve também o da prescrição de alguns crimes, como o de corrupção passiva de titular de cargo político imputado ao ex-primeiro ministro, José Sócrates, e ao seu antigo braço direito, Carlos Silva.

“Apesar de a instrução ser uma fase processual essencialmente factual, não pode ela alhear-se da apreciação normativa das consequências que inapelavelmente se devem retirar da apreciação jurídica”, justificou Ivo Rosa no despacho de pronúncia. Ou seja, uma decisão de não levar a julgamento tanto pode justificar-se na falta de indícios como na verificação de alguma qualquer circunstância extintiva do procedimento criminal, como é o caso da prescrição. Que foi, aliás, o que aconteceu a alguns crimes.

Neste momento, Ivo Rosa está quase há dois meses ausente do tribunal, com as audiências de julgamento a serem suspensas enquanto não estiver em condições de retomar a atividade.

BES/GES. Relação de Lisboa rejeita recurso de Salgado a pedir revogação de caução de 1,5 milhões de euros

Sexta-feira, Março 25th, 2022

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BES/GES. Relação de Lisboa rejeita recurso de Salgado a pedir revogação de caução de 1,5 milhões de euros

O recurso agora recusado tinha por objeto o despacho proferido pelo Tribunal Central de Instrução Criminal que indeferiu os pedidos formulados por Ricardo Salgado.

O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) rejeitou um recurso do ex-banqueiro Ricardo Salgado a pedir a revogação de uma caução de 1,5 milhões de euros e o levantamento do arresto de bens que lhe foi decretado no processo BES/GES.

No acórdão do TRL de quinta-feira passada, a que a Lusa teve acesso, as juízas desembargadoras Lídia Whytton da Terra (relatora) e Paula Pires (adjunta) julgaram “totalmente improcedente” o recurso apresentado pelo antigo presidente do BES Ricardo Salgado.

O recurso agora recusado pelo TRL tinha por objeto o despacho proferido pelo Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) em 16 de setembro de 2021, que indeferiu os pedidos formulados por Ricardo Salgado para revogação de medida de coação de prestação de caução no processo BES/GES no valor de 1,5 milhões de euros e levantamento parcial do arresto sobre os bens do arguido até perfazer o montante de 10.717.611 euros.

No recurso, a defesa do ex-banqueiro alegou que o despacho do juiz do TCIC (Carlos Alexandre) “padece de vícios que o inquinam de nulidade e, subsidiariamente, de irregularidade” e que o mesmo “é nulo, por falta de fundamentação”.

Entre outros pontos do recurso, os advogados de Ricardo Salgado alegaram que a decisão do TCIC “não contém fundamentação própria“, reportando apenas aos argumentos invocados pelo Ministério Público (MP).

A defesa de Salgado alegou que a obrigação da fundamentação das decisões judiciais que procedam à reavaliação de medidas de caução (prestação de caução) e medidas de garantia patrimonial (arresto) está expressamente consagrada em vários artigos do Código de Processo Penal (CPP) e no artigo 205 da Constituição, pelo que requereu ao TRL a declaração de nulidade do despacho sobre a caução e arresto.

Argumentou ainda a defesa que, ao decidir manter a caução prestada por Ricardo Salgado, o juiz do TCIC violou “os princípios da proporcionalidade, adequação e necessidade“, previstos no CPP.

“É patente que, volvidos quase seis anos desde que foi prestada a aludida caução no presente processo e um ano desde que foi proferido despacho de encerramento do inquérito, a caução prestada é, atualmente, uma medida altamente excessiva face aos fins visados pela mesma”, alega a defesa no recurso, acrescentando que a manutenção da prestação de caução por parte de Salgado “acarreta uma grosseira restrição do seu direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva, por se afigurar completamente desproporcional” aos fins que visa a medida de coação.

Na decisão agora tomada, o TRL salienta que “o arguido (Ricardo Salgado) apenas alega que necessita impreterivelmente do montante da caução (1,5 milhões de euros), não alegando, nem demonstrando, como tinha que fazer, que não tem qualquer outro meio para satisfazer a reparação”, considerando que “improcede a alegada violação dos princípios da proporcionalidade, adequação e necessidade” da medida de coação.

O acórdão diz também não ver como é que “a manutenção da caução de 1,5 milhões de euros viola o direito consagrado” na Constituição.

“No que respeita ao artigo 30.º da Constituição que estabelece que não pode haver penas nem medidas de segurança privativas ou restritivas da liberdade com caráter perpétuo ou de duração ilimitada ou indefinida, não tem aqui aplicação manifestamente. Não se trata de uma pena ou medida de segurança, a restringir a liberdade”, lê-se no acórdão.

As juízas desembargadoras do TRL referem ainda que quanto ao artigo 32.º da Constituição, relativo às garantias de defesa em processo criminal, “não vislumbram, nem o arguido esclarece, em que é que a manutenção da caução viola os seus direitos de defesa”.

“Não se verifica, pois, a alegada inconstitucionalidade ou ilegalidade, improcedendo, assim, tal alegação”, adianta o acórdão.

Quanto à manutenção alegadamente indevida dos arrestos preventivos, que supostamente violaria artigos da Constituição, o TRL contrapôs no acórdão que foram cumpridos os requisitos daquela medida preventiva e assinala que “quer os direitos legítimos dos credores, quer os interesses (legítimos) do Estado continuam por satisfazer”.

“O arresto preventivo destinou-se e destina-se a acautelar o risco de dissipação patrimonial das vantagens obtidas com a prática dos crimes e garantir o pagamento de créditos e sanções pecuniárias aos lesados e ao Estado”, diz o acórdão, reportando-se aos artigos 110 e 111 do Código Penal.

Caso BES/GES. Juiz Ivo Rosa só quer um advogado na sala para representar 118 assistentes. Advogados contestam

Quarta-feira, Fevereiro 2nd, 2022

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Caso BES/GES. Juiz Ivo Rosa só quer um advogado na sala para representar 118 assistentes. Advogados contestam

Juiz de instrução queixa-se da dimensão do processo e da falta de condições no tribunal, por isso quer que assistentes tenham só um advogado na sala. Advogados dizem que há interesses diferentes.

O juiz Ivo Rosa decidiu que durante a fase de instrução do mega-processo BES/GES permaneça na sala de audiências apenas um advogado a representar 118 assistentes no processo. Argumentos: a sala não tem condições para sentar tantas pessoas e seria impossível ouvir todos os advogados a cada ato processual. A lei permite que o faça, mas a Ordem dos Advogados diz que a legislação colide com o seu estatuto e há já advogados que vão reclamar e propor outras soluções.

No despacho de abertura de instrução, concluído a 24 de janeiro — e em que Ivo Rosa eleva para 30 o total de arguidos no caso: soma cinco aos 25 que já eram conhecidos —, o magistrado explica que estão admitidos no processo 123 assistentes, entre eles o próprio banco, assim como lesados. Estes casos, lembra, foram acautelados pela lei, que prevê a representação apenas por um advogado, para garantir “o normal andamento do processo”.

Seria impossível tramitar o processo com a intervenção simultânea de todos os assistentes. Na verdade, não existiria uma sala com condições para acolher todos os advogados. E imagine-se o que seria o tribunal ter de ouvir todos os assistentes quanto à prática de qualquer ato processual”, afirma o juiz no despacho de 92 páginas.

O juiz determina então que, no prazo de dez dias, os 118 assistentes escolham quem os vai representar. E, caso não cheguem a nenhum acordo, ele próprio irá escolher um advogado, optando por aquele que foi o primeiro a constituir-se assistente — neste caso, o BES.

De fora desta regra, e representados cada um pelo seu advogado, ficam os assistentes cujo requerimento de abertura de instrução foi aceite pelo magistrado, que são cinco: Totalvalue, Segouviber Unipessoal, João Carlos Malveiro, Manuel Oliveira e Irene Oliveira. A instrução é uma fase do processo em que o juiz de instrução vai olhar para a acusação do Ministério Público e ouvir todas as partes para decidir se o caso deve seguir para julgamento.

Decisão de Ivo Rosa “colide com poder de escolha”, defende Bastonário

Para o bastonário da Ordem dos Advogados, Menezes Leitão, esta norma prevista no Código do Processo Penal “colide” com as que constam no Estatuto da Ordem dos Advogados. Sem se pronunciar sobre o caso concreto do BES, o advogado lembra que o estatuto prevê que “o mandato judicial, a representação e assistência por advogado são sempre admissíveis e não podem ser impedidos perante qualquer jurisdição, autoridade ou entidade pública ou privada”. Mais: ao Observador, Menezes Leitão defende que “o mandato forense não pode ser objeto, por qualquer forma, de medida ou acordo que impeça ou limite a escolha pessoal e livre do mandatário pelo mandante.”

A norma do Código do Processo Penal é de 1929 e muito anterior ao Estatuto. “Não me parece muito coerente no atual sistema democrático e essa norma colide com o poder de escolha”, diz ao Observador. Apesar de admitir já ter havido um acórdão do Tribunal Constitucional que não considerou esta norma ilegal, na posição da Ordem dos Advogados não deve ser “imposto a alguém ser representado por alguém”

E, mesmo do ponto de vista do advogado, a tarefa parece difícil, uma vez que terá de coordenar várias posições e interesses distintos. Para o juiz Ivo Rosa, porém, os interesses destes 118 assistentes são compatíveis entre si. Mas esta não é a perspetiva partilhada por alguns dos advogados, que se preparam para fazer um requerimento ao processo para que se encontre uma fórmula que considerem mais justa.

Contactado pelo Observador, o advogado Miguel Matias, que representa uma sociedade venezuelana, admite que está a pensar fazer um requerimento para, eventualmente, sugerir que se agrupem os assistentes por grupos, consoantes os seus interesses — até porque o interesse do seu constituinte é diferente do interesse dos clientes lesados do papel comercial. “O BES também não faz sentido estar junto”, considera o advogado.

Já Ricardo Sá Fernandes ficou de fora da regressa por ter visto os seus requerimentos de abertura de instrução, em nome da Totalvalue e de João Carlos Malveiro, serem aceites por Ivo Rosa. Ainda assim, considera que deve “haver uma questão de bom senso”, até porque não é viável ter “100 advogados com 100 assistentes”.

A questão de os assistentes serem representados por um só advogado foi também colocada no caso dos Comandos, com o coletivo a decidir que só podia estar um advogado a representá-los. Uma decisão do Tribunal da Relação de Lisboa acabaria a reverter a decisão. Os juízes desembargadores concluíram que havia interesses diferentes entre os assistentes (neste caso, vítimas e familiares das vítimas já mortas), fazendo com que os advogados estivesses presentes ao longo do julgamento.

Ricardo Salgado e 29 outros arguidos no caso

O juiz Ivo Rosa juntou mais cinco arguidos ao megaprocesso do BES/GES, que contava já com 25 arguidos (18 pessoas singulares e sete empresas), acusados do crime de associação criminosa, corrupção, falsificação de documentos, infidelidade, manipulação de mercado, branqueamento e burla qualificada.

No megaprocesso BES/GES, o antigo líder do BES, Ricardo Salgado, foi acusado de um crime de associação criminosa (em coautoria com outros 11 arguidos, entre eles os antigos administradores do BES Amílcar Pires e Isabel Almeida), 12 crimes de corrupção ativa no setor privado, 29 crimes de burla qualificada, infidelidade, manipulação de mercado, sete crimes de branqueamento de capitais e oito de falsificação.

O arguido José Manuel Espírito Santo Silva, antigo administrador do BES e primo de Ricardo Salgado, é acusado de vários crimes de burla qualificada e infidelidade.

O ex-administrador e diretor financeiro do BES Amílcar Pires responde por associação criminosa, corrupção passiva no setor privado, burla qualificada, branqueamento de capitais, manipulação de mercado, falsificação de documento e infidelidade.

A antiga administradora do BES, Isabel Almeida, foi também acusada por um crime de associação criminosa, em coautoria, corrupção passiva no setor privado, burla qualificada, branqueamento de capitais, manipulação de mercado, falsificação de documento e infidelidade.

São ainda arguidos neste processo Manuel Espírito Santo Silva, Francisco Machado da Cruz, António Soares, Alexandre Cadosch, Michel Creton, Cláudia Boal Faria, Pedro Cohen Serra, Paulo Carrageta Ferreira, Pedro de Almeida e Costa, Nuno Escudeiro, Paulo Nacif Jorge, Pedro Pinto, João Martins Pereira e João Alexandre Silva.

As sete empresas acusadas são a Espírito Santo International, Rioforte Investments, Eurofin Private Investment, Espírito Santo irmãos – Sociedade Gestora de Participações Sociais, ES Tourism Europe, Espírito Santo Resources Limited e ES Resources (Portugal) por crimes como burla qualificada a corrupção passiva, falsificação de documentos e branqueamento de capitais.

No despacho de abertura de instrução, o juiz Ivo Rosa apresenta algumas queixas: a falta de espaço no tribunal para um processo tão grande é uma delas; outra é a falta de meios :tem apenas dois funcionários. A primeira sessão está já marcada para 21 de fevereiro, mas dependente da sala maior do Campus de Justiça, no edifício A.

Caso BES/GES: defesa de Salgado acusa CMVM de processo político

Segunda-feira, Janeiro 10th, 2022

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CNN

Adriano Squilacce, um dos advogados do ex-banqueiro, alegou esta sexta-feira que a CMVM teria “o processo na gaveta” desde 2014 e que só avançou em 2017, depois “da nomeação de uma nova presidente”

defesa de Ricardo Salgado acusou esta sexta-feira a CMVM de mover um processo político interno contra o ex-presidente e cinco ex-administradores do BES condenados a multas de 4,75 milhões de euros por práticas lesivas dos clientes do banco.

processo que corre no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, instalado na antiga Escola Prática de Cavalaria de Santarém, “é notoriamente um processo político do foro interno da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM”, afirmou o representante legal de Ricardo Salgado durante as alegações finais no âmbito da ação que julga os recursos às contraordenações de 4,75 milhões aplicadas ao ex-presidente e a cinco ex-administradores do BES.

A CMVM considerou ter havido práticas lesivas dos clientes do BES, relativas à colocação de papel comercial da Espírito Santo Internacional (ESI) e da Rioforte aos balcões do banco, pelas quais condenou Ricardo Salgado a uma multa de dois milhões de euros.

Foram, ainda, multados os antigos administradores Manuel Espírito Santo Silva (900.000 euros), José Manuel Espírito Santo (750.000 euros), Amílcar Morais Pires (400.000 euros), Joaquim Goes (300.000 euros) e Rui Silveira (100.000 euros), tendo o processo sido arquivado em relação a José Maria Ricciardi, ex-presidente do BESI.

O advogado de Salgado, Adriano Squilacce, alegou esta sexta-feira que a CMVM teria “o processo na gaveta” desde 2014 e que só avançou em 2017, depois “da nomeação de uma nova presidente”.

A defesa do ex-presidente do BES acusou ainda a CMVM de ”manobras dilatórias” e de ter posto o Tribunal “entre a espada e a parede” devido ao perigo de prescrição dos alegados crimes que deram origem às multas.

Depois de, durante a manhã, o Ministério Público (MP) ter atribuído a Ricardo Salgado a “principal” responsabilidade sobre as ações do grupo (acusado de veicular informação falsa aos investidores na emissão de papel comercial da ESI e da Rioforte), à tarde foi a vez de o advogado rebater as provas valorizadas pelo procurador e tentar provar que o ex-presidente do grupo não tinha conhecimento de todas as decisões que eram tomadas, e que, quando “confrontado com o volume real da dívida à ESI, o que fez foi disponibilizar essa informação ao BCMVManco de Portugal”.

Adriano Squilacce aludiu ainda ao estado de saúde de Ricardo Salgado para defender que o mesmo não está em condições de “compreender” a contraordenação aplicada.

O Tribunal ouviu também as alegações do defensor do Haitong Bank (a chinesa Haitong adquiriu o Banco Espírito Santo de Investimento, BESI, em 2015, ao Novo Banco), que foi condenado ao pagamento de uma coima de 300.000 euros, suspensa em 100.000 euros pelo período de dois anos.

O advogado negou a responsabilidade do banco em relação à informação disponibilizada aquando da comercialização de papel comercial da Espírito Santo Internacional (ESI) e da Rioforte aos balcões BES, e pediu a absolvição do seu cliente.

Na sessão desta sexta-feira foram ainda ouvidas as alegações dos advogados de Manuel Espírito Santo (por videoconferência), Joaquim Goes e Rui Silveira, este último o único dos recorrentes que viu esta sexta-feira o MP defender a sua absolvição.

O julgamento prossegue na próxima segunda-feira, às 14:00, com as alegações finais dos representantes legais de José Manuel Espírito Santo e Amilcar Morais Pires.

Ricardo Salgado e mais sete arguidos acusados em novo processo BES/GES

Domingo, Janeiro 2nd, 2022

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Renascença

Em causa estarão crimes de corrupção ativa com prejuízo do comércio internacional, branqueamento, corrupção passiva no setor privado e falsificação de documento.

O Ministério Público (MP) deduziu acusação contra oito arguidos num novo processo associado ao universo BES/GES, entre os quais se encontram gestores do Grupo Espírito Santo e dois advogados.

O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) refere, em comunicado, que deduziu acusação contra uma sociedade de advogados e sete pessoas singulares, nomeadamente elementos de entidades financeiras do Grupo Espírito Santo (GES), um elemento da área da gestão de fortunas (GESTAR/ICG) e dois advogados.

Segundo o DCIAP, em causa estarão crimes de corrupção ativa com prejuízo do comércio internacional, branqueamento, corrupção passiva no setor privado e falsificação de documento que começaram há uma década (2011/2012) e se prolongaram até junho de 2014.

Estes crimes representaram vantagens num valor superior a 12,2 milhões euros, segundo o DCIAP.

“O inquérito teve por objeto a investigação de linhas de crédito no Mercado Monetário Interbancário (MMI) e de linhas de crédito no contexto do crédito documentário (cartas de crédito). A factualidade em causa envolveu ainda o ex-vice-presidente do Banco do Brasil e fornecedores da petrolífera venezuelana PDVSA”, refere o Ministério Público.

Fonte próxima do processo confirmou à Lusa que o antigo presidente do BES, Ricardo Salgado, é uma das sete pessoas singulares acusada neste processo autónomo do universo BES/GES. O ex-banqueiro, de 77 anos, está acusado dos crimes de corrupção ativa com prejuízo do comércio internacional e branqueamento.

Esta investigação ficou concluída no âmbito de um inquérito autónomo do processo principal sobre o universo BES/GES, no qual o Ministério Público (MP) deduziu acusação em julho de 2020, apurando em 11.800 milhões de euros o “valor que integra o produto de crimes e prejuízos com eles relacionados”.

Foram acusados 25 arguidos (18 pessoas e sete empresas, nacionais e estrangeiras), destacando-se Ricardo Salgado, com 65 crimes: um de associação criminosa, 29 de burla qualificada, 12 de corrupção ativa, nove de falsificação de documento, sete de branqueamento de capitais, seis de infidelidade e um de manipulação de mercado. A fase de instrução deste processo deve arrancar no início de 2022, tutelada pelo juiz Ivo Rosa.

Paralelamente, Ricardo Salgado está já a ser julgado num processo conexo da Operação Marquês por três crimes de abuso de confiança, devido a transferências de mais de 10 milhões de euros no âmbito da Operação Marquês. .

defesa do antigo presidente do BES apresentou em outubro um requerimento para a suspensão do julgamento, fundamentado por um atestado médico que certificava o diagnóstico de Doença de Alzheimer, mas essa pretensão foi rejeitada pelo coletivo de juízes, pelo que o julgamento prossegue, tendo sessão marcada para 6 de janeiro.

BES: Ivo Rosa diz que prazo de instrução é “humanamente impossível”. Juiz quer exclusividade

Quarta-feira, Novembro 10th, 2021

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Eco

A instrução do caso BES foi entregue a Ivo Rosa, mas o juiz diz ser “humanamente impossível” cumprir o prazo de quatro meses. Pede exclusividade já que este processo é seis vezes maior que o Marquês.

O juiz Ivo Rosa admite que o prazo previsto para o encerramento da fase de instrução do processo do Universo Espírito Santo, de quatro meses, é “humanamente impossível de alcançar”. Segundo o requerimento de Ivo Rosa, as razões prendem-se com as complexidades dos autos bem como da natureza dos crimes e das questões jurídicas suscitadas. O juiz vai ainda pedir ao Conselho Superior da Magistratura a exclusividade no processo, segundo avançou a revista Sábado. Questionado pelo ECO, por três vezes na última semana, fonte oficial do Ticão apenas disse que “será tomada posição no processo”.

A Relação de Lisboa julgou parcialmente procedentes os recursos de Ricardo Salgado e Morais Pires na condenação por violação de normas de prevenção de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo, mantendo, contudo, o valor das coimas únicas.

Num acórdão datado do passado dia 28 de setembro, a que a Lusa teve acesso esta terça-feira, a Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão (PICRS) do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) deu razão ao ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES) e ao seu antigo administrador financeiro na contestação ao facto de o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, ter agravado as coimas parcelares pelas quais haviam sido condenados pelo Banco de Portugal (BdP), apesar de ter reduzido o valor da coima única.

Na sentença de junho último, o TCRS baixou o valor das coimas únicas de que ambos vinham condenados pelo Banco de Portugal, de 350 mil para 290.000 euros, no caso de Ricardo Salgado, e de 150 mil para 100 mil euros, no de Amílcar Morais Pires, tendo, contudo, elevado os valores das coimas parcelares.

Na decisão de 28 de setembro, a conferência de juízes desembargadores do TRL, alterou a sentença do TCRS, repondo as coimas parcelares da decisão administrativa, mantendo, contudo, o valor das coimas únicas de 290 mil para Ricardo Salgado e de 100 mil euros para Morais Pires, decididas pela primeira instância.

Os dois ex-responsáveis do BES recorreram desse acórdão, reiterando a invocação de nulidades e inconstitucionalidades, mas, em decisão do passado dia 04, igualmente consultada pela Lusa, a conferência do PICRS do TRL apenas reformou o anterior acórdão quanto ao pagamento de custas, reconhecendo não terem lugar, dado que o recurso foi considerado parcialmente procedente no acórdão de 28 de setembro.

Em tudo o resto, o coletivo de juízes do PICRS manteve o acórdão de 28 de setembro, o qual apreciou, nomeadamente, a questão da prescrição invocada por Ricardo Salgado, não dando razão ao entendimento do ex-presidente do BES de que não se aplicaria a este processo as regras excecionais de suspensão decretadas devido à crise pandémica da Covid-19.

O TRL entende que aos oito anos de prazo máximo para prescrição, que foram atingidos no passado dia 27 de junho, acrescem um total de 160 dias das suspensões excecionais decretadas em 2020 (86 dias) e em 2021 (74 dias).

Sendo que os arguidos podem ainda recorrer para o Tribunal Constitucional, se o processo não transitar em julgado antes do próximo dia 04 de dezembro, as infrações pelas quais foram condenados neste processo acabarão por prescrever.

As contraordenações referem-se à falta de implementação de medidas para prevenção de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo em cinco unidades do Grupo BES, em Angola, Macau, Miami e Cabo Verde – BESA, BESOR, ESBank, BESCV e na sucursal BES SFE CV.

O processo, que teve início em 2014 em sede administrativa, culminando com a aplicação das coimas pelo BdP em abril de 2017, passou por uma primeira decisão no TCRS em dezembro de 2017, com o juiz Sérgio Sousa a acolher os recursos dos arguidos, reconhecendo não ter sido respeitado o direito de defesa, e determinando a devolução da acusação ao supervisor para, querendo, proferir nova decisão “isenta dos vícios” que considerou afetarem a sua validade.

A Relação veio a anular esta decisão em abril de 2019, dando razão aos recursos interpostos pelo Ministério Público e pelo BdP, determinando o prosseguimento dos autos e a realização de julgamento.

Este veio a acontecer entre outubro de 2019 e setembro de 2020, altura em que Sérgio Sousa proferiu a sentença que o TRL devolveu, em fevereiro último, de novo à primeira instância para serem apreciadas as questões suscitadas por Ricardo Salgado quanto ao direito de defesa na fase administrativa, a inconstitucionalidades, ao indeferimento da prorrogação do prazo do recurso e à não comunicação da alteração não substancial dos factos constante na decisão.

Na nova sentença, datada de 16 de junho último, Sérgio Sousa considerou improcedentes os pedidos de inconstitucionalidade, nulidades e irregularidades invocados pelos arguidos.

No recurso para a Relação, Morais Pires contestou, nomeadamente, o facto de ter sido absolvido da infração mais gravosa (com uma coima de 100.000 euros) e de ter visto as práticas pelas quais foi condenado passarem de dolo necessário para dolo eventual, sem que isso se tivesse refletido no valor da coima única, mas o TRL não acolheu os seus argumentos, repondo apenas as coimas parcelares aplicadas pelo BdP e isentando os arguidos do pagamento de custas.

Processos do BdP contra o BES já valeram multas de 27 milhões

Terça-feira, Outubro 12th, 2021

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Negócios

Seis processos de contraordenação instaurados pelo BdP contra entidades do universo Espírito Santo já têm decisões judiciais, que resultaram na condenação de 16 entidades. Destas, 13 são pessoas individuais, com Salgado à cabeça.

Os processos de contraordenação instaurados pelo Banco de Portugal (BdP) a várias entidades ligadas ao Banco Espírito Santo (BES) e ao Grupo Espírito Santo (GES) já resultaram na aplicação de coimas no valor superior a 27 milhões de euros, com os tribunais a confirmarem as condenações aplicadas pelo supervisor. Mais de metade deste valor, contudo, está suspenso.

Ao todo, foram já confirmados, por decisão judicial, seis processos contraordenacionais levados a cabo pelo BdP. “As investigações contraordenacionais relacionadas com o universo GES/BES, nas quais o BdP identificou e sancionou diversas condutas praticadas naquele universo, algumas delas na origem direta da resolução do BES, foram já, quanto aos aspetos fundamentais, objeto de confirmação por decisão judicial”, começa por referir o BdP, em comunicado divulgado esta segunda-feira.

Das decisões condenatórias proferidas pelo supervisor, detalha ainda o BdP, duas já transitaram em julgado, uma foi confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa e outras três foram confirmadas por parte do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS). Dentro destes processos, registam-se 16 condenações – das quais 13 são relativas a pessoas singulares (incluindo Ricardo Salgado, ex-presidente do BES, e Amílcar Morais Pires, antigo diretor financeiro do banco) e as outras três dizem respeito a instituições (incluindo o BES).

Destas condenações resultaram várias coimas, ainda que a sua execução não se verifique em todos os casos. De um lado, estas decisões judiciais levaram à aplicação de coimas no montante aproximado de 12 milhões de euros (cúmulo jurídico) a “diversos arguidos”. Por outro lado, soma-se um montante de cerca de 15 milhões de euros, “decorrente das decisões condenatórias que se tornaram definitivas logo na fase administrativa dos processos, por não terem sido judicialmente impugnadas pelos arguidos”.

Essas coimas no valor global de 15 milhões de euros estão suspensas, isto é, os visados só pagarão se cometerem uma nova infração nos próximos anos. Vários fatores justificam as suspensões. No caso do BES e do ESFG, por exemplo, as coimas não são executadas porque estas entidades estão insolventes e o supervisor procura proteger os credores da massa falida.

Quanto às coimas que estão a ser executadas, Ricardo Salgado é o maior visado, com multas superiores a 8 milhões. O montante global já pago fica aquém daquele que é exigido pelo supervisor, uma vez que alguns dos processos em causa ainda não transitaram em julgado, ainda que as decisões judiciais já tenham sido favoráveis ao BdP em várias instâncias

 

Tribunais já decidiram 16 condenações, a maioria relativa a indivíduos.

Caso GES. São 777 páginas em que Salgado refuta a acusação de 4 mil feita pelo Ministério Público

Quinta-feira, Setembro 9th, 2021

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Eco

Caso GES. São 777 páginas em que Salgado refuta a acusação de 4 mil feita pelo Ministério Público

A defesa de Salgado pediu a abertura da instrução de um dos maiores casos da Justiça: o ‘monstro’ GES passa agora para as mãos de Carlos Alexandre ou Ivo Rosa, que decidem se Salgado vai a julgamento.

Adefesa de Ricardo Salgado — que chama os ‘lesados do BES de lesados do Banco de Portugal — considera que a responsabilidade do colapso do BES, em agosto de 2014, foi do poder político (Governo da coligação) e dos reguladores, não poupando críticas a Carlos Costa (governador do BdP à data do colapso do BES), cita o Relatório final da mais recente Comissão de Inquérito da Assembleia da República ao Novo Banco ao chamar esta resolução de ‘fraude política’. E dedica ainda especial atenção ao crime de associação criminosa de que Ricardo Salgado é acusado, referindo-se aos outros investidores que aproveitaram o legado do Grupo Espírito Santo nos últimos anos (Espírito Santo Saúde, Tranquilidade, Hotéis Tivoli e Herdade da Comporta) para explicar que a história do BES-GES não pode ser reduzida a uma associação criminosa liderada pelo arguido como, “de uma forma escandalosamente infundada”, o Ministério Público nos faz crer.

O requerimento de abertura de instrução, a que o ECO teve acesso — entregue na segunda-feira pelos advogados de defesa Francisco Proença de Carvalho e Adriano Squillace — conta com 777 páginas que rejeitam as quase quatro mil páginas de acusação (3.852) do caso BES/GES – um dos maiores da história da Justiça portuguesa e que conta já com sete anos ‘em cima’. E refuta todos os crimes de que Ricardo Salgado é acusado com os argumentos jurídicos e técnicos que preenchem uma das maiores aberturas de instrução que será agora avaliada por Ivo Rosa ou Carlos Alexandre.

A defesa considera ainda que o arguido, e ex-líder do banco com 140 anos de história, sabia que o seu destino seria passar os anos que lhe restavam da sua vida “numa luta incessante – e muitas vezes solitária – contra os poderes do Estado que não hesitariam em centrar na sua pessoa todas as responsabilidades pelo colapso do GES“, pode ler-se no pedido de abertura de instrução. E confirmam o quadro clínico de Alzheimer do seu cliente — alegando esse quadro clínico para dizer que a sua capacidade de defesa está afetada.

O ex-presidente do BES está acusado de 65 crimes, incluindo associação criminosa, corrupção ativa no setor privado, burla qualificada, branqueamento de capitais e fraude fiscal, no processo BES/GES. Salgado foi acusado de um crime de associação criminosa, em coautoria com outros 11 arguidos, incluindo Amílcar Pires e Isabel Almeida. E também de 12 crimes de corrupção ativa no setor privado e de 29 crimes de burla qualificada, em coautoria com outros arguidos, entre os quais José Manuel Espírito Santo e Francisco Machado da Cruz. O processo conta ao todo com 25 arguidos, acusados num total de 348 crimes.

O documento acusa ainda o Ministério Público de desprezar a história do BES-GES e do seu papel na economia portuguesa ao longo de décadas, apresentando “uma versão deturpada de um Grupo que fez parte da vida de milhares de colaboradores e de milhões de clientes. Um grupo que, mesmo depois da tragédia de 2014, conseguiu deixar um valioso legado entregue, ‘por tuta e meia’, a investidores estrangeiros”.

Os advogados deixam adivinhar ainda a dificuldade deste processo “monstruoso” pela extensão das provas, com centenas de volumes e anexos, escutas telefónicas, documentos contabilísticos, financeiros, regulatórios, bancários, societários (entre outros), dispersos por milhões de ficheiros informáticos e apensos, relativos a vários países que não só Portugal.

E sublinham que seriam necessários muitos meses (ou mesmo anos) de dedicação exclusiva a este caso para que pudessem dominar –” com a plenitude necessária – a integralidade do conteúdo do processo”. E lembram que os autos do processo demonstram que ao Ministério Público nunca faltaram meios, já que a acusação foi assinada por sete Magistrados do Ministério Público, sem prejuízo de outros que ainda ajudaram.

Leia aqui alguns dos pontos transcritos do RAI:

  • Ainda no inquérito, o arguido deparou-se com um Juiz de Instrução muito mais “acusador” do que o próprio Ministério Público;
  • De facto, o Meritíssimo Juiz de Instrução (Carlos Alexandre) discordou do Ministério Público quando no interrogatório judicial realizado em 24 de Julho de 2015, o titular da acção penal requereu a aplicação de medidas de coacção não privativas da liberdade (que, como demonstra a história do processo, foram sempre suficientes).
  • Nesse caso, quando foi para agravar a situação processual do Arguido, o Juiz de Instrução discordou do Ministério Público e decidiu aplicar a um Arguido (que nunca teve um mínimo acto que fosse no sentido de “fugir” à Justiça e que até se deslocou para esse interrogatório voluntariamente e pelos seus próprios meios) uma medida de coacção privativa da liberdade;
  • Portanto, salvo o devido respeito, mas com toda a assertividade que o exercício do direito de defesa impõe, cabe recordar que o Juiz de Instrução Criminal conhecido no Estado de Direito Democrático é o “Juiz das liberdades” (como garante das liberdades e garantias) e não o Juiz da “Privação das Liberdades”.
  • O arguido chega a esta fase processual com o peso de quase uma década de permanentes
    violações dos seus direitos: fugas cirúrgicas ao segredo de justiça para alimentar as capas de alguns jornais com teses acusatórias “bombásticas”, difamações permanentes da sua pessoa e da sua família, condenações “sumárias” na praça pública, arrestos indiscriminados (dos seus bens e de bens de terceiros), incluindo do relógio que usava no pulso;
  • Nas condições de saúde em que se encontra, confrontado com uma Acusação “monstruosa” e um processo “monstruoso”, a opção provavelmente mais fácil seria a de prescindir desta fase processual facultativa. No entanto, ainda que em condições pessoais e de contexto extremamente difíceis, o arguido entende que tem o dever de se defender em todas as fases processuais previstas na Lei.
  • Com total desprezo pela história do BES-GES e do seu papel na economia portuguesa
    ao longo de décadas, a Acusação apresenta uma versão deturpada de um Grupo que fez
    parte da vida de milhares de colaboradores e de milhões de clientes;
  • Um Grupo que, mesmo depois da tragédia de 2014, conseguiu deixar um valioso legado
    entregue, “por tuta e meia”, a investidores estrangeiros. Hoje sabemos que a Espírito Santo Saúde – uma das mais inovadores e principais empresas de prestação de cuidados de saúde do país – se transformou em Luz Saúde do Grupo chinês Fosun.
  • Hoje sabemos que a Companhia de Seguros Tranquilidade – uma das grandes seguradoras
    do mercado – tornou-se parte de um dos mais reconhecidos grupos seguradores internacionais (Grupo Generali), depois de ter permitido ao Fundo Apollo uma avultadíssima mais-valia (estima-se que na ordem dos EUR 600 milhões).
  • Hoje sabemos que os Hotéis Tivoli – uma das maiores cadeias hoteleiras do mercado – vendido em 2016 ao Minor Group por EUR 294 milhões – já permitiu a este grupo tailandês um encaixe de 461 milhões com a venda de apenas 5 das suas unidades hoteleiras em Lisboa e Algarve.
  • Hoje sabemos que para a “única” Herdade da Comporta existem projectos ambiciosos de
    desenvolvimento;
  • Pretende tão-só ilustrar – com pequenos exemplos – que a história do BES-GES não pode ser reduzida a uma “associação criminosa” liderada pelo arguido como, de uma forma
    escandalosamente infundada, faz a acusação;

 

José Maria Ricciardi: Conselho do GES “funcionava como uma espécie de espectadores para ver o que o Dr. Salgado lá ia dizer”

Sábado, Julho 17th, 2021

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Observador

José Maria Ricciardi: Conselho do GES “funcionava como uma espécie de espectadores para ver o que o Dr. Salgado lá ia dizer”

José Maria Ricciardi desconhecia a existência da ES Enterprises, só soube pelos jornais em 2014. “Era uma empresa que não se falava”. Conselho Superior do GES tinha 9 pessoas, mas só Salgado falava.

O primo de Ricardo Salgado, José Maria Ricciardi, disse esta terça-feira em tribunal que, apesar de estar ligado ao Grupo Espírito Santo desde os finais dos anos 90, nunca ouviu falar da Espírito Santo (ES) Enterprises — tida pelo Ministério Público como o “Saco Azul do BES”. “Era uma empresa que não se falava, vim a tomar conhecimento pelos jornais já depois de 2014″, disse a testemunha da acusação.

Antes de Ricciardi entrar na sala de audiências, no Campus de Justiça, em Lisboa, o tribunal ainda tentou ouvir o empresário Hélder Bataglia, mas como este foi arguido na Operação Marquês foi-lhe dada a oportunidade de não falar. E ele aceitou.

Ricciardi, que tentou afastar o primo da gestão do grupo, explicou então ao procurador que a partir de 2011 integrou o Conselho Superior do GES. “Fiquei espantado!”, disse, explicando que este órgão começou por ser composto por cinco pessoas e passou para nove. E que os primeiros elementos se limitavam a “ouvir o que o Dr. Salgado tinha para fazer”. Não era “uma entidade em que se punha os assuntos à discussão e à votação”, constatou.

“Tirando a votação do voto de confiança que ele pediu, não me lembro de mais nenhuma. O Conselho funcionava como uma espécie de espectadores para ver o que o Dr. Salgado lá ia dizer”, afirmou.

A defesa de Ricardo Salgado começou por tentar perceber qual era a sua relação com o primo direito. “Não estou de relações cortadas”, garantiu, mesmo depois de o ter tentado afastar do Grupo Espírito Santo e apesar de não estar com ele desde 2015. Depois perguntou-lhe se conhecia a Espírito Santo International. Ricciardi disse que sabia que existia no Grupo e atalhou logo para a resposta seguinte, ainda antes de qualquer pergunta.

“Recebi dinheiro dessa conta porque foi o meu pai que tinha direito a um prémio de mais de 200 mil euros anuais e disse-me que me queria dar metade desse prémio, por ter ingressado no conselho superior do grupo. Pensei que vinha na conta do meu pai. Fiz a minha obrigação: declarar às finanças. Não foi RERT’s. Declarei!”, ironizou, lembrando que mal reparou na origem do dinheiro, por ser de uma conta do pai.

O primo de Salgado disse também que quando começou a detetar irregularidades nas contas e movimentos do BESA para a Savoices, de Salgado e da mulher, foi imediatamente ao Ministério Público informar o procurador Rosário Teixeira, responsável pelo caso Marquês. “Ele já tinha conhecimento disso”, resumiu.

Depois disto, lembrou que ainda fez um documento que foi assinado por seis dos nove elementos do Conselho na tentativa de afastar o primo e de alterar a “governance do grupo”. “Fui traído por esses elementos. Entregaram-lhe uma cópia. E na reunião seguinte ele pediu que fosse votada a tal moção de confiança”.

Ricciardi ainda se exaltou para dizer: “É absolutamente falso que eu alguma vez me candidatei ao lugar de Ricardo Salgado”. Mas nem a defesa nem o tribunal lhe tinham perguntado isso.

Mais à frente acabaria por lembrar que o grupo tinha um acionista muito importante, que era “o Credit Agricole” e o “seu grande objetivo de vida” era continuar no Banco de Investimento, onde começou com 100 pessoas e quando saiu estavam mil.

Granadeiro, o “pai do Pêra-Manca”, recebeu 8 milhões do GES e só fez contrato meses depois

Da parte da manhã tida sido ouvido um outro arguido do processo que não foi pronunciado, o ex-chairman da PT. Henrique Granadeiro considerou perfeitamente normal ter recebido mais de metade de um pagamento de 14 milhões de euros por parte da ES Enterprises, e só depois ter feito um contrato escrito com o Grupo Espírito Santo. Granadeiro recebeu 8 milhões de euros em outubro de 2011 e só em janeiro do ano seguinte, quando recebia a segunda tranche de 4 milhões, registou estas entregas num contrato. A última tranche, de dois milhões, foi paga em novembro.

— A base dos contratos de qualquer natureza é a confiança entre as partes, justificou, por videoconferência ao procurador do Ministério Público

— Então se havia confiança, não era preciso contrato, respondeu-lhe Vítor Pinto.

— A maior parte dos contratos que o senhor faz são verbais, respondeu Granadeiro

 De milhões?, interrogou o magistrado, que acabou por ser interrompido pelo juiz que quis por fim ao diálogo.

Henrique Granadeiro, ex-presidente da PT, livrou-se da acusação na Operação Marquês, mas não escapou de ser testemunha, esta terça-feira, no julgamento do seu amigo de longa data, Ricardo Salgado. É que um dos três crimes de abuso de confiança, de que o ex-líder do BES está acusado, prende-se precisamente com os 14 milhões de euros que Granadeiro recebeu da ES Enterprises, conhecido como Saco Azul do BES — pouco depois do Grupo GES entrar na PT. O Ministério Público tinha acusado Granadeiro e Zeinal Bava de terem sido favorecidos pelo GES, mas o juiz de instrução Ivo Rosa considerou não haver prova disso e não os pronunciou.

As explicações de Granadeiro para esses valores, no entanto, são outras: esses valores, pagos em tranches de “8, 4 e 2”, como o próprio Granadeiro especificou, serviram para investir numa herdade sua no Alentejo, o Vale do Rico Homem, onde queria inclusive construir uma campo de golfe e recuperar uma casa apalaçada. O valor foi pago em tranches, entre 2011 e 2012, em francos suíços e numa conta de Granadeiro naquele país, para ele poder investir no terreno.

— Os oito milhões de euro foi o sinal e o primeiro pagamento com a obrigação de instalar até final de dezembro um sistema de rega, que foi o que fiz. Tinha uma vinha de 45 a 50 hectares, que ainda hoje lá está, e regava uma área de 360 ha… era um projeto assente na produção de culturas, disse.

—  O senhor está mais interessado na parte agrícola, eu estou mais interessado no negócio, interrompeu o procurador.

Ainda em 2011 houve, porém, uma transferência de quatro milhões de Granadeiro para a esfera de Salgado através de uma outra conta, a Begolino. O ex-líder da PT, diz que foi o pagamento de um investimento que fez no Brasil, ao comprar uma moradia de luxo ao ex-líder do BES. O seu gestor de conta, Francisco Roseta Fino, que tem também uma casa na mesma zona, acabaria por dizer horas depois em tribunal que uma casa naquela zona valeria perto de um milhão de euros, mas a de Salgado poderia valer “uma vez e meia” e mais.

Já no final da ronda de perguntas a Granadeiro, o juiz Francisco Henriques que preside o coletivo, quis que o empresário esclarecesse porque abdicou de parte do dinheiro que dispunha e que podia ter investido no sector agrícola, que agora se dedica, para investir num negócio imobiliário. Granadeiro respondeu que devido ao dinheiro que tinha à data, considerou o melhor investimento.

“Eu não tinha estatuto para ter uma casa daquelas, aquilo foi para especulação”, respondeu.

Durante o seu depoimento, foram referidas uma escuta telefónica e uma mensagem com Salgado, que o Ministério Público acredita ter linguagem “cifrada”. Granadeiro porém, apesar de não se recordar, recusou que estivessem a falar por código. “Tenho boa memória, mas não faço ideia do que esta a falar. Eu sou viticultor com algum prestígio… Fui o pai do Pêra-Manca!”, sublinhou, para justificar que as “encomendas” referidas ao telefone com Salgado deviam ser “de vinho”.

“Nunca tive uma responsabilidade acima do BES”, afirma Morais Pires

Antes de Granadeiro, mas presencialmente, foi a vez de o economista Amílcar Morais Pires falar. Morais Pires trabalhou como responsável financeiro do BES durante a liderança de Ricardo Salgado e afirmou desconhecer a ES Enterprises, referindo que Espírito Santo era um marca “muito valiosa” e tinha muitas empresas. “Não participei na gestão dessa empresa nem sei quem eram os administradores”, respondeu.

Também arguido no processo BES, Morais Pires — que começou a trabalhar como funcionário em 1986, e em 2004 foi escolhido para a administração — falou nas reuniões do Conselho de Administração e da Comissão Executiva, lembrando que todas as decisões eram normalmente tomadas por unanimidade. “Nunca tive uma responsabilidade acima do BES”, reiterou.

Mas quando o Ministério Público lhe perguntou se tinha recebido algum dinheiro da ES Enterprises, a sua advogada travou-o. “Ele está acusado de ter recebido dinheiro, por isso não responder a perguntas sobre pagamentos”, advertiu.

Henrique Granadeiro, o ex-presidente da PT, seria a primeira testemunha a falar por videoconferência, mas como a defesa de Salgado o quis confrontar com alguns documentos, o coletivo decidiu ouvir primeiro Amílcar Morais Pires, responsável financeiro do BES. Já de tarde seria Hélder Bataglia a testemunhar, o empresário foi sócio do Grupo Espírito Santo, mas depois de o tribunal lhe dar a possibilidade de não testemunhar por ter sido arguido na Operação Marquês, Bataglia decidiu não falar. Tudo por videoconferência.

Esta sessão aconteceu imediatamente a seguir à leitura da sentença de Armando Vara, cujo processo também foi extraído do da Operação Marquês. O ex-líder da Caixa Geral de Depósitos foi condenado a uma pena efetiva de dois anos de prisão por um crime de branqueamento de capitais pelo mesmo coletivo de juízes que está a julgar Salgado (embora mude o juiz que o preside).