Arquivo para a categoria ‘Governador do BdP’

Lesados do BES em protesto ruidoso junto a casa do governador do Banco de Portugal

Domingo, Março 17th, 2019

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Correio da Manhã

Exigem a devolução das poupanças e garantem mais protestos até reaverem o dinheiro.

Cerca de 25 lesados do papel comercial BES/Novo Banco fizeram este sábado uma manifestação ruidosa junto à casa do governador do Banco de Portugal, em Lisboa, exigindo a devolução das poupanças e garantindo mais protestos até reaverem o dinheiro.

Junto à marina do Parque das Nações, em Lisboa, 25 membros do grupo de lesados do Novo Banco, lesados do papel comercial e lesados emigrantes, provenientes da região do Porto, espalharam faixas onde se lia “Roubados Novo Banco”, “Banco de Portugal Irresponsável”, “Exigimos a Provisão” e “Demissão Carlos Costa”, ao mesmo tempo que batiam em bidons de metal para se fazerem ouvir e em tambores.

Havia mesmo um com a cara do governador. O objetivo era serem escutados na casa do governador do Banco de Portugal, guardada por polícias, uma vez que responsabilizam Carlos Costa de os ter enganado. Fernando Silva, um dos lesados, gritava ao megafone que os lesados tinham sido roubados e instava o governador: “Se és homem, se és ser humano, anda cá fora e enfrenta-me. O que fizeste ao nosso dinheiro? Andaste a distribuir pelos teus amigos?”.

Em declarações à agência Lusa, António Silva, porta-voz deste grupo de lesados, disse que as aplicações destes clientes estavam protegidas por uma provisão de 1.837 milhões de euros que o Banco de Portugal obrigou o BES a constituir e que passou para o Novo Banco aquando da resolução, em agosto de 2014. Contudo, afirmou, essa provisão que dava aos clientes do papel comercial a garantia de que receberiam o capital investido não foi honrada, acrescentando que “a [consultora [Deloitte] disse que [essa provisão] foi utilizada para pagar [dívidas] a institucionais”, incluindo outros bancos.

BE quer ouvir antigo governador do BdP Vítor Constâncio na comissão de inquérito da CGD

Domingo, Fevereiro 24th, 2019

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Negócios

Vítor Constâncio, segundo a deputada do BE, “tem a particularidade de ter sido o governador não apenas neste período da Caixa, mas também quando operações semelhantes ocorreram no BES ou no Banif”.

O BE quer ouvir o antigo governador do Banco de Portugal Vítor Constâncio na comissão parlamentar de inquérito à gestão da Caixa Geral de Depósitos, uma “figura central” com responsabilidades de supervisão, que não esteve presencialmente nas anteriores comissões.

A II comissão parlamentar de inquérito à recapitalização da Caixa Geral de Depósitos (CGD) e à gestão do banco tomou hoje posse, na Assembleia da República, em Lisboa, sendo presidida pelo deputado do PSD Luís Leite Ramos.

À agência Lusa, a deputada do BE Mariana Mortágua – que integra esta comissão – adiantou que a lista das pessoas a ouvir “não está ainda fechada”, até porque “há um entendimento entre os grupos parlamentares que subscreveram a comissão para que os nomes sejam discutidos em conjunto de forma a tornar os trabalhos mais eficazes”.

Por isso, aquilo que o BE identificou foram apenas “três grupos de nomes a chamar”, sendo estes os administradores da CGD que tomaram decisões de crédito, os clientes mais importantes e, por último, os supervisores e auditores.

“Para além do atual Governador do Banco de Portugal [Carlos Costa], que também tem que dar explicações, é importante também ouvir o Governador do Banco de Portugal no tempo em que a maior parte das operações ocorreram, que é Vítor Constâncio”, defendeu.

Vítor Constâncio, segundo a deputada do BE, “tem a particularidade de ter sido o governador não apenas neste período da Caixa, mas também quando operações semelhantes ocorreram no BES ou no Banif”.

Na anterior comissão de inquérito, recordou, Vítor Constâncio não foi ouvido porque estava no Banco Central Europeu (BCE).

“Tem usado essa sua posição como forma de responder por escrito e não conseguimos ainda que viesse a uma comissão de inquérito”, explicou.

Como “neste momento já não está no BCE”, Mariana Mortágua disse esperar que agora Vítor Constâncio se desloque à Assembleia da República.

“Penso que seria uma figura central, da parte da supervisão, uma vez que era dele a responsabilidade de supervisão nos anos 2006, 2007, 2008, quando a maior parte destes créditos ocorreram”, justificou.

Mariana Mortágua adiantou ainda que “seria importante ouvir quem fez o relatório da auditoria, perceber as dificuldades que encontrou, algumas incongruências e algumas questões que o relatório possa suscitar”.

Para o BE, tendo em conta o tempo limitado da comissão de inquérito, “tem que ser um leque de audições muito bem pensado”, porque “essa parcimónia vai ser importante ao longo do processo”.

“O primeiro grupo é o dos administradores da Caixa que tomaram decisões de crédito, que pertenciam aos conselhos de crédito ou que ratificaram as decisões de crédito mais importantes e nos períodos mais importantes, alguns deles já vieram à Assembleia da República em comissões anteriores e vai ser importante confrontá-los com os novos dados”, detalhou.

O segundo grupo, para Mariana Mortágua, “diz respeito a clientes mais importantes”, ou seja, “perceber o outro lado destes créditos porque houve uma grande concentração num pequeno número de clientes e muitos deles que acabam por estar na órbita, das mesmas instituições e das mesmas empresas”.

 

Carlos Costa: Contribuintes vão perceber que não lhes foi cobrado dinheiro no Fundo de Resolução

Domingo, Fevereiro 24th, 2019

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Negócios

O governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, disse hoje que “no futuro” os contribuintes “vão perceber” que o seu dinheiro não foi cobrado no Fundo de Resolução.

“Tenho a certeza que no futuro, quando o tempo for o certo, as pessoas vão perceber que o dinheiro dos contribuintes não foi cobrado” no Fundo de Resolução, disse Carlos Costa, durante a conferência “Desafios enfrentados pelo Eurosistema”, em que é orador o governador do Banco de França.

Carlos Costa acrescentou que “a cobrança no setor bancário não foi tão grande como tínhamos antecipado, e portanto o ponto principal é que a confiança no setor bancário por parte dos depositantes foi preservada sem fugas e controlos de capitais”.

Recorrendo a uma metáfora, Carlos Costa comparou o uso de mecanismos de resolução a uma ida ao hospital para realizar uma cirurgia.

“Não é nada que alguém queira fazer, mas só se vai para uma cirurgia quando se tem um acidente. Estava-se a pedir um acidente? Não, mas acontece”, comparou.

O Fundo de Resolução é uma entidade da esfera pública gerida pelo Banco de Portugal, comparticipada pelos outros bancos, e que detém 25% do Novo Banco.

O desgoverno do governador

Domingo, Fevereiro 24th, 2019

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Esquerda Net opinião Pedro Filipe Soares

Carlos Costa é juiz em causa própria e, além disso, recusa ser avaliado. Se não pode ser avaliado, como pode ser considerado idóneo? Esta é a questão de fundo.

O governador do Banco de Portugal (BdP), Carlos Costa, veio a público defender-se das acusações de envolvimento nos créditos ruinosos da Caixa Geral de Depósitos (CGD). “Não, não e não”, naquela noite Carlos Costa negou por três vezes a participação nas reuniões de onde saíram as decisões que nos estão a ser muito caras. Tudo esclarecido? Longe disso.

Percebeu-se o desprendimento com que Carlos Costa cumpria as suas obrigações. Ele só “ocasionalmente” participava nas reuniões do conselho alargado de crédito (CAC), porque “não tinha competências de crédito, nem competências de acompanhamento de clientes”, e apenas para “assegurar o número de administradores necessários para que a decisão pudesse ter lugar”. Palavras do próprio para explicar que só lá ia fazer número.

De Armando Vara não foi amigo e não terá recordações aprazíveis. Já não bastava ser enganado uma vez por não perceber a gestão danosa do administrador Vara, foi intrujado uma segunda vez pelo proprietário Armando que lhe terá vendido um monte alentejano acima do preço. Segundo Carlos Costa, com a intermediação da própria CGD, que lhe terá sugerido o negócio que saiu “5 a 10 mil euros” mais caro do que teria sido através de uma imobiliária. É aqui que ficamos a conhecer o Carlos Costa, lesado de Armando Vara.

Com estas memórias da passagem pela Caixa, só faltou alegar trauma psicológico para explicar porque não quis saber do maior banco português quando chegou governador. Parece estranho, mas a auditoria que expôs todos os créditos ruinosos da Caixa não foi pedida pelo BdP. Resultou de uma proposta do Bloco de Esquerda que o governo executou. Quando as notícias há muito denunciavam gestão danosa na Caixa, porque razão Carlos Costa não agiu? Se dependesse do BdP ainda tudo estaria por investigar.

Aliás, quando instado a explicar a sua inação, Carlos Costa disse que em causa estava uma “auditoria a atos de gestão e não uma auditoria de natureza prudencial”, coisa que não lhe competiria. A explicação tem perna curta, porque o próprio BdP promoveu auditorias a atos de gestão do Montepio ou do antigo BES. Além disso, um dos exercícios a que toda a banca foi sujeita foi o SAP, que incidiu sobre os procedimentos de concessão de crédito, e deveria ter identificado alguns dos créditos ruinosos, mas não há notícia que isso tenha sido encontrado pelo BdP. Será que a verdadeira justificação para não investigar a fundo seria a vontade de não mostrar algum esqueleto no armário?

Esta e outras questões serão avaliadas pela comissão de inquérito que inicia agora os seus trabalhos. Mas, há uma confusão que não devemos criar e que se tentou instalar nas últimas semanas. A proposta do Bloco de Esquerda para a exoneração de Carlos Costa do cargo de governador do BdP não se mistura com os trabalhos da comissão de inquérito.

Uma comissão de inquérito não decide sobre a idoneidade de um administrador bancário. Pode apurar factos que provem maus atos de gestão, demonstrar gestão danosa, exigir responsabilidades judiciais, mas não pode avaliar a idoneidade de um administrador, competência única do BdP. Carlos Costa é juiz em causa própria e, além disso, recusa ser avaliado. Se não pode ser avaliado, como pode ser considerado idóneo? Esta é a questão de fundo.

A direita tentou misturar as coisas, para com a confusão esconder as suas responsabilidades. Carlos Costa foi reconduzido no cargo de governador por PSD e CDS, mesmo depois do seu primeiro mandato como governador estar bem longe de ser curriculum e mais perto de ser cadastro. É, por exemplo, o legado da inação perante gestão danosa do BES, que agora resulta num buraco que estamos a pagar.

A posição do PS está no domínio da absoluta inconsequência. Carlos César disse que “todos anseiam” pelo fim do mandato de Carlos Costa, para depois afirmar que “não podemos pôr o carro à frente dos bois” e temos de esperar pelo fim da comissão de inquérito. E conclui que há um “problema de ineficácia”, pois o mandato do governador termina em maio de 2020 e o processo de exoneração só terminaria por essa altura. Percebeu? Nem o próprio terá percebido.

Artigo publicado no jornal “Público” a 22 de fevereiro de 2019

Tristes figuras

Sexta-feira, Fevereiro 22nd, 2019

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Económico opinião João Marcelino 

A entrevista televisiva de Carlos Costa, sobretudo na parte em que tentou explicar a compra do monte alentejano a Armando Vara, foi lamentável.

A entrevista de Carlos Costa (à SIC) fez lembrar aquela vergonhosa atuação de Zeinal Bava no Parlamento, em 2015. Não sabia. Ou não se lembrava. Ou não tinha sido ele quem tratara, porque não tinha essa responsabilidade.

Então estava em causa o desmoronamento da antiga PT, agora falamos da passagem do governador do Banco de Portugal (BdP) pela Caixa Geral dos Depósitos (CGD) em pleno período de empréstimos concedidos sem garantias dignas desse nome.

Bava, um gestor premiado, nada sabia do que se passava na antiga empresa da qual era o todo-poderoso responsável executivo porque só se preocupava com ‘detalhes’. Carlos Costa, financeiro, banqueiro, sabemos agora que nem as casas compra. Deixou que fossem os ‘serviços da CGD’ a descobrirem-lhe uma oportunidade de um bom negócio pessoal: a compra de um monte no Alentejo. E veja-se a pontaria, que neste caso anda a par de desfaçatez: sem saber, acertou na compra de uma casa que era de Armando Vara, colega de administração na CGD, de quem sentiu a necessidade de salientar nunca ter sido amigo.

Em tempos, apertado pela polémica das fulgurantes mais-valias daquelas magníficas ações do BPN disponibilizadas por Oliveira e Costa, até Cavaco Silva chegou a dizer que nada percebia do mercado bolsista e dos seus nomes ‘esquisitos’: era a mulher, Maria, quem tratava lá em casa da compra e venda desses complicadíssimos produtos financeiros que sobem e descem ao livre arbítrio dos mercados.

Cito três casos mas podia relembrar mais, mesmo que não tão flagrantes, de falta de brio pessoal e predisposição para protagonizar tristes figuras em público, de que José Sócrates se tornou um ícone.

Neste caso, eu estava disposto a acreditar que nunca o atual governador do BdP, enquanto administrador da CGD, de 2004 a 2006, tivesse participado no processo de decisão para concessão de algum dos 25 créditos em causa. Era tecnicamente possível, mesmo que alguém com o estatuto político, a experiência de vida e o gabarito profissional de Carlos Costa não possa ousar dizer, pelo menos sem se rir, que alguma vez se tenha esquecido do papel que a CGD desempenha no regime. No entanto, a explicação da compra do monte alentejano a Armando Vara é a gota de água que acaba por fazer transbordar toda a minha capacidade de tentativa de compreensão.

A compra de uma casa é algo de pessoal, a não ser para os especuladores imobiliários – coisa que não é suposto que seja um administrador da CGD em rota para o Banco Central do país. Ainda para mais nem sequer era uma casa para viver a vida profissional. Era uma casa de fim de semana, segunda habitação, local de lazer para a família. A explicação é inverosímil e só demonstra vergonha pela ligação a Vara, mesmo que, neste caso, ao que se saiba, não haja nada de condenável a apontar numa transação legítima entre duas pessoas.

É com episódios destes, desculpas esfarrapadas, argumentos infantis, absoluta tentativa de desresponsabilização pessoal e política, episódios socialmente aberrantes, que cresce em Portugal o descrédito do regime e se envenena a Democracia. Se os políticos e demais decisores, da esquerda à direita, se comportam muitas vezes assim, sendo capazes de tudo dizer para evitarem assumir as consequências das suas atitudes, não podem aspirar ao respeito do país. E o pior é que o país não possa, com esta realidade, aspirar a um futuro melhor.

 

A lição do burocrata Carlos Costa

Sexta-feira, Fevereiro 22nd, 2019

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Negócios Opinião Bruno Faria Lopes

O governador do Banco de Portugal teve sorte no percurso na banca, mas azar na chegada a supervisor – a crise histórica exigiu demasiado do seu perfil burocrata e levou a um reexame das práticas de gestão bancária no passado, incluindo as suas.

O problema do governador do Banco de Portugal, nesta altura, não é o pedido de exoneração feito pelo Bloco de Esquerda. A exoneração é uma via-sacra processual, longa e não testada e nenhum governo, muito menos de um país periférico do euro, correria o risco de comprar essa guerra com o BCE. Se o problema principal de Carlos Costa fosse a exoneração, que se joga no estrito plano formal, as justificações formais que apresentou nos últimos dias para ter aprovado aqueles créditos na Caixa poderiam ser suficientes. Mas como o problema é outro – de credibilidade, a sua e a da instituição que lidera – as explicações pouco resolvem.

Carlos Costa diz que o empréstimo de 47 milhões à Metalgest acabou por não se fazer porque Berardo foi a outro banco – mas a Caixa aprovou-o e Costa estava na reunião. O governador diz que o empréstimo de 144 milhões para Manuel Fino comprar ações foi pago em 2009 – mas é complicado ser tão cirúrgico na interligação de créditos a um cliente que em 2015 devia 138 milhões à Caixa. Costa sustenta que a aprovação que deu aos 220 milhões para o projeto imobiliário de Vale do Lobo não foi a aprovação final que está na auditoria da EY – mas aquela aprovação inicial teria dado um resultado não muito distante do registado.

Quem quiser ir além dos formalismos percebe que neste, como noutros casos, Carlos Costa partilhou responsabilidades em erros gordos de gestão, responsabilidades que sempre negou com verdades formais. Em 2013 foi a tribunal testemunhar que os 600 milhões de euros em créditos que autorizou para clientes offshore do BCP estavam dentro do manual e do perfil de risco do banco, e que ele não tinha formalmente de saber para que serviria o dinheiro (serviu para manipular a cotação do banco). Em 2016, quando a SÁBADO realçou o seu papel na estratégia de expansão ruinosa da Caixa para Espanha, respondeu que quando saiu do banco Espanha dava lucro (começaria a dar prejuízo logo no ano seguinte). Sobre o financiamento recorde de PPP rodoviárias enquanto esteve no BEI, responderá que a análise do banco apontava retornos positivos (foram ruinosas).

É sempre possível nunca olhar à volta e gerir dentro das regras e procedimentos. Isso é típico de um burocrata e Carlos Costa, na verdade, fez a parte mais brilhante do seu percurso como burocrata europeu, função em que acumulou experiência e prestígio. Mas a banca comercial exige outro perfil. Costa – que chegou a diretor no BCP em 2000 sem tarimba na banca e daí foi para a Caixa – teve como outros a sorte de construir uma carreira a partir do topo de bancos relevantes, numa era mais tolerante à inexperiência e ao erro.

Mas, ao contrário de outros, teve o azar de chegar a governador do Banco de Portugal no meio da maior crise financeira em décadas. As crises não são ambientes favoráveis para formalistas suaves, sobretudo se estes forem supervisores – as falhas e hesitações perante a enorme exigência posta pelo caso BES (sublinho “enorme”, para não ser injusto com o governador) refletem, em parte, a falta de experiência bancária e o perfil desajustado a estes tempos conturbados. As crises sísmicas, como esta que ainda pagamos, têm ainda outro efeito: levam ao reexame das práticas do passado, incluindo as do governador.

Carlos Costa não fez tudo mal – parte da história dos últimos anos estará por escrever. Mas, neste momento, os erros passados e recentes que não está disposto a admitir são um fardo pesado para si e para a instituição que lidera. Tendo em conta a chuva de elogios que Costa recebeu à chegada ao Banco de Portugal – todos elogiavam a sua experiência na banca – a sua situação actual é, também, uma lição para aqueles que nomearem e escrutinarem o próximo governador.

O espelho da intensidade da crise 

O BCE fez história com um programa de estímulos que salvou a zona euro, mas que levou à explosão do seu balanço. A margem para acções futuras parece curta.

A comunicação e a interpretação da política monetária faz-se de palavras codificadas, antigas e novas. Uma das novidades é “paciência”, termo usado nos últimos dias pelos presidentes da Reserva Federal e do Banco Central Europeu. Por “paciência”, os tradutores nos mercados estão a entender duas coisas: os bancos centrais vão ajustar a velocidade de retirada dos estímulos históricos e, por outro lado, podem para já congelar as taxas de juro em níveis baixos. Toda esta reponderação dos banqueiros centrais surge entre os sinais evidentes de travagem do crescimento económico e da maior incerteza sobre a economia. Um dos fatores de receio – como ficou patente na cimeira de Davos, por exemplo – são precisamente os próprios bancos centrais. A resposta inédita que deram à crise pode ter limitado muito a capacidade de resposta à próxima crise – os balanços cresceram brutalmente com as compras de activos e as taxas têm pouco ou nenhum espaço para descerem. A “paciência” pode resultar perante um abrandamento – mas numa recessão a sério as asas parecem cortadas.

Carlos Costa – não, infelizmente não foi só a Caixa!

Sexta-feira, Fevereiro 22nd, 2019

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Ionline Opinião João Gabriel

Carlos Costa tem a credibilidade manchada e a sua autoridade diminuída, e a bem da instituição a que ainda preside devia ser ele a tomar a iniciativa de sair

Causa estranheza que só nove anos depois de ter sido nomeado governador do Banco de Portugal, a ética, a competência e a idoneidade de Carlos Costa comecem a ser questionadas. A auditoria à CGD apenas revelou um pouco mais do que já se sabia, e o que se sabia não era bom. As offshores do BCP e o plano ruinoso de expansão da Caixa em Espanha teriam sido, só por si, razões suficientes para impedir a sua ascensão à liderança do Banco de Portugal. Inexplicavelmente, tal não aconteceu!

Depois, foi o que sabemos: uma boa gestão da imagem e a cumplicidade de muitos jornalistas que simplesmente abdicaram de avaliar de forma séria e objetiva a justeza e os méritos da sua ação enquanto governador. Entre a produção de aparências e a quantidade de desinformação produzida passaram nove anos e, como vivemos tempos em que a perceção se torna realidade mesmo que a realidade nada tenha a ver com a perceção criada, Carlos Costa foi sempre retratado como o governador competente e idóneo que nunca foi.

Além da sua competência técnica e credibilidade, a força de qualquer governador reside na coerência das suas decisões, no valor da sua palavra, no seu carisma e percurso.

Como diria Ortega y Gasset, o homem é o homem e a sua circunstância. A circunstância, neste caso, mostrou as fraquezas do governador e a sua ética ficou comprometida muito antes de chegar ao Banco de Portugal.

O percurso já denotava falhas e, quanto ao carisma, foi muito mais o que recebeu do que aquele que emprestou à instituição a que preside.

Mas, passados nove anos, os prejuízos causados pelo governador ao erário público enquanto ainda era só Carlos Costa, nas suas passagens pela Caixa e pelo BCP, são pequenos quando comparados com os prejuízos que Carlos Costa, já governador, causou ao país com a resolução do BES.

Em pouco mais de um mês (julho de 2014), o Banco de Portugal de Carlos Costa, por ação ou omissão, distorceu o valor dos prejuízos do BES, inflacionou as suas provisões, impôs um presidente de comissão executiva, fez perder a garantia soberana de Angola, ignorou propostas de fundos privados para recapitalizar o banco, nunca tentou usar a linha de recapitalização pública que estava disponível e, apesar de tudo isto, conseguiu passar a ideia, com a ajuda dos mesmos jornalistas, de que aquela tinha sido a melhor solução. Não foi! A resolução foi uma má e injustificada decisão.

Hoje sabemos, por exemplo, através da carta do então vice-governador do Banco de Portugal, Pedro Duarte Neves, para Vítor Bento, datada de 29 de julho de 2014, que o Banco de Portugal sabia desde dia 27 desse mesmo mês quais eram as contas que a KPMG iria apresentar ao conselho de administração três dias depois. A verdade é que o regulador não pode substituir-se à administração de nenhum dos bancos que supervisiona, nem pode orientar as contas que estes vão apresentar, mas aconteceu.

No Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, em Santarém, Rui Silveira, ex-administrador jurídico do BES, afirmou que “Sikander Satar (presidente da KPMG) explicou que as provisões (que distorceram as contas do primeiro semestre de 2014) foram feitas de acordo com o Banco de Portugal”. Esta carta de Pedro Duarte Neves dá-lhe razão.

Desde o dia 27 de julho que o regulador sabia das contas que a KPMG iria apresentar. Mesmo assim, a 29 de julho reitera em comunicado “a solvência do banco”, garante haver propostas privadas para reforço do capital e, “no limite”, adianta haver uma “linha de recapitalização pública criada no âmbito do Programa de Assistência Económica e Financeira, que poderá ser utilizada para suportar qualquer necessidade de capital”.

Ou seja, quando este comunicado foi emitido, o Banco de Portugal sabia exatamente quais seriam as contas a aprovar no dia 30 de julho pelo conselho de administração do BES. Como é que, no dia 3 de agosto, Carlos Costa pôde invocar surpresa perante os resultados do BES no primeiro semestre e apresentar esse álibi para resolver o banco? Como é que, ao contrário do que o Banco de Portugal disse em comunicado, não recorreu à linha de recapitalização pública? Como é que, sete meses depois de o BES ser cadáver, mais de 1,3 mil milhões de euros de provisões foram revertidos para balanço do Novo Banco, demonstrando com isso a completa adulteração das contas que serviram de justificação para liquidar o banco? Houve ou não concertação entre Carlos Costa e a KPMG na preparação das contas do BES do primeiro semestre de 2014?

A teia de contradições cresce ao mesmo ritmo que os custos da resolução.

Afastar Salgado não tinha de significar destruir um banco que representava um alicerce fundamental da economia nacional e que devia ter continuado a existir apesar de Salgado. O BES não devia ter desaparecido.

A fatura engorda a cada dia que passa e, hoje, já poucos se lembram que o governador prometeu que a resolução do BES se tornaria um case study. Acertou, mas não pelas razões que ele imaginou. O “custo zero” de Carlos Costa vai ultrapassar os 10 mil milhões.

Ricardo Salgado terá de responder pelas práticas que levaram o BES até uma encruzilhada em que era preciso fazer prova de vida, mas Carlos Costa terá também de ser chamado pelo Ministério Público para explicar a autoria material de uma decisão arbitrária e injustificada.

Vamos levar décadas a pagar a fatura da ação negligente ou dolosa, só o tempo nos dirá, de Carlos Costa, antes e durante o seu tempo no Banco de Portugal, mas ele, até hoje, nunca assumiu como sua uma única responsabilidade. As culpas foram sempre de outros, antes e durante o seu tempo como governador. Nisso revela coerência!

Na entrevista à SIC, e em relação ao BES, Carlos Costa mentiu. Fê-lo quando afirmou que o Banco de Portugal nunca exigiu o aumento de capital de junho de 2014. Exigiu e há testemunhas! Mentiu, ainda, quando afirmou que a partir de 15 de julho houve factos novos que justificaram a “bomba atómica”!

As contas adulteradas do primeiro semestre do BES e o desaparecimento da garantia soberana de Angola de 5,7 mil milhões de dólares, de que o próprio Vítor Bento, escolha de Carlos Costa para presidir ao BES, o aponta como responsável, são duas “gavetas” que o governador, a todo o custo, quer manter fechadas.

Carlos Costa tem a credibilidade manchada e a sua autoridade diminuída, e a bem da instituição a que ainda preside devia ser ele a tomar a iniciativa de sair. Não o fará, terá um fim de mandato penoso, como penoso será para o Banco de Portugal continuar a ser liderado por alguém com este lastro.

A boa imprensa de Carlos Costa vai continuar a defender a bondade e a competência do governador. A História, porém, encarregar-se-á de mostrar o desastre que ele representou para o sistema financeiro português.

Não, infelizmente não foi só a Caixa, nem só o BCP. Também foi o BES e, já agora, o Banif!

Carlos Costa: a vida e as polémicas do governador do BdP

Quarta-feira, Fevereiro 20th, 2019

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Económico

Nasceu em Oliveira de Azeméis e brincava numa estrada de terra batida onde passavam carros de bois. Licenciou-se no Porto e chegou ao Banco de Portugal em 2010, num percurso com muitas polémicas.

Em Cesar, uma das povoações mais antigas do país e local de uma sangrenta batalha entre as hostes cristãs do rei Leão e os mouros, o governador do Banco de Portugal (BdP) vivia numa casa de dois andares com os pais e o irmão. Gostava de jogar à bola com os amigos, matraquilhos e seguia com muita atenção os resultados do Benfica. Sempre que a agenda de trabalho o permite, visita o Estádio da Luz para ver o clube do coração.

“Quando o Benfica venceu o Real Madrid nos anos 60, na final da Taça dos Campeões Europeus, fizemos uma festa enorme”, lembra um amigo de infância ao Jornal Económico. Filho de um antigo operário da Viarco e de uma costureira, Carlos Costa era considerado um bom aluno pelos professores. Além de calmo e tranquilo, tinha uma grande paixão pela leitura.

Costa e os amigos habitavam na zona mais rural de Cesar, localidade do concelho de Oliveira de Azeméis. As brincadeiras ao ar livre jogavam-se na estrada de terra batida, onde também passavam carros de bois e bicicletas. No verão, juntavam-se alguns amigos de Lisboa e Porto e filhos de emigrantes no Brasil. Os palacetes, a igreja, o aqueduto e uma parte industrial compunham a paisagem da aldeia, elevada a vila décadas depois.

Nessa altura, já o governador do Banco de Portugal tinha partido para outros voos: no Porto licenciou-se em economia pela Faculdade de Economia, a mesma que deu o diploma ao antigo ministro das Finanças, Teixeira dos Santos. Na Invicta, Carlos Costa começou por alugar um quarto, deu explicações e viria a conhecer a mulher com quem casou e mãe dos seus dois filhos.

Na área universitária, foi professor convidado na Universidade de Aveiro. Ocupou igualmente o cargo de presidente do Conselho Consultivo da Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica Portuguesa, no Porto, além de ter sido docente na Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEUP).

No início dos anos 80, realizou estudos de pós-graduação e investigação na Universidade de Paris I, da Sorbone, e frequentou o Programa de Gestão para Executivos do INSEAD (1998). No âmbito da integração europeia, coordenou o Departamento de Assuntos Económicos e Financeiros da Representação Permanente de Portugal junto da Comunidade Europeia (CE) de 1986 a 1992.

Carreira e polémicas

Desempenhou ainda o cargo de diretor-geral do Millennium BCP de 2000 a 2004, tendo participado no “Conselho Superior para a Reforma do Sistema Financeiro” (1988-1992), que serviu de base à reforma global do quadro legislativo do sistema financeiro português, e chegou também a integrar a administração do Unibanco.

Entre outras funções, foi também presidente do conselho de administração da Caixa Geral de Depósitos entre 2004 e 2006, e ocupou idêntico cargo no Banco Nacional Ultramarino (BNU) e no Banco Caixa Geral (Espanha). O governador recebeu ainda o grau de “Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique”.

O governador chegou ao Banco de Portugal em 2010 e as polémicas não têm faltado. Teve de lidar com as medidas de resolução aplicadas a dois bancos, o Banco Espírito Santo (BES) e o Banif; as consequências da nacionalização do Banco Português de Negócios (BPN); e o caso das ‘offshores’ do Banco Comercial Português (BCP).

Tal como o Jornal Económico noticiou em primeira mão, o supervisor está a avaliar a responsabilidade de ex-gestores da Caixa nas decisões de negócios ruinosos do banco público. No entanto, o exame exclui o governador do Banco de Portugal, também ele ex-administrador da CGD. A decisão está a gerar polémica.
Num comunicado divulgado na sexta-feira, dia 8 de fevereiro, o governador esclareceu que no período em que foi administrador da CGD, entre abril de 2004 e setembro de 2006, “não teve responsabilidades nas áreas de crédito, risco, acompanhamento de clientes ou de controlo e auditoria interna”. Certo é que este será um mandato que continuará sob fogo.

As dez dúvidas que o governador do Banco de Portugal ainda não esclareceu

Quarta-feira, Fevereiro 20th, 2019

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Eco

As dez dúvidas que o governador do Banco de Portugal ainda não esclareceu

O governador do Banco de Portugal tem sido um dos principais alvos políticos e mediáticos, pela sua atuação enquanto administrador da CGD. Esta terça-feira, terá oportunidade de se explicar.

Passado pouco mais de duas semanas desde que o relatório final da auditoria feita pela EY à gestão da Caixa Geral de Depósitos (CGD) entre os anos de 2000 e 2015 foi divulgado pelo próprio banco público, Carlos Costa volta a aparecer no espaço público. O governador do Banco de Portugal tem sido um dos principais alvos políticos e mediáticos das últimas semanas, pela sua atuação enquanto administrador não executivo da Caixa, altura em que terá participado em reuniões onde foi dado aval a várias das operações de crédito ruinosas visadas na auditoria da EY. A sua exoneração volta a estar em cima da mesa e o seu nome está na linha da frente para ser ouvido na terceira comissão parlamentar de inquéritodesta legislatura que tem a Caixa como objeto.

Esta terça-feira, o governador terá oportunidade de esclarecer várias questões, quando participar no Via Bolsa, evento promovido pela Euronext que contará com a presença da comunicação social, e quando for entrevistado pela SIC, esta noite. Estas são dez das principais questões a esclarecer.

  • Quem são os gestores da CGD que estarão sujeitos ao exame de idoneidade aplicado pelo Banco de Portugal?

O Banco de Portugal está a avaliar a idoneidade de antigos e atuais gestores da Caixa que tenham feito parte dos conselhos de administração durante o período analisado pelo EY e que, ainda hoje, mantenham funções de gestão em instituições bancárias. Mas o regulador não esclareceu, para já, quem são os responsáveis que estão a ser examinados. O Jornal Económico começou por avançar, no início deste mês, que o Banco de Portugal estaria a avaliar a idoneidade de nove dos 44 gestores que passaram pelo banco público entre 2000 e 2015. Já este sábado, o Expresso deu conta de que seriam, afinal, sete os antigos administradores que estão a ser analisados pelo Banco de Portugal, que irá depois decidir se abre um processo de reavaliação da sua idoneidade. Entre eles, está António de Sousa, antigo governador do Banco de Portugal e presidente da Caixa entre 2000 e 2004. Os restantes, ainda segundo o semanário, encontram-se atualmente no Novo Banco, BCP, Finantia, CGD, EuroBic e ECS.

  • Porque é que o governador não será sujeito a este exame?

O Banco de Portugal está a analisar a atuação de antigos gestores da Caixa que se mantenham em funções da banca, mas o próprio governador escapa a este exame. Isto porque a legislação não permite que o Banco de Portugal se supervisione a si a próprio, no que toca a questões de avaliação de idoneidade. Isto apesar de, durante o período em que Carlos Costa foi administrador não executivo da Caixa, entre abril de 2004 e setembro de 2006, o banco público ter aprovado vários dos créditos visados na auditoria da EY que vieram a revelar-se ruinosos.

  • Em que reuniões do Conselho Alargado de Crédito esteve presente enquanto administrador da CGD?

Carlos Costa participou, enquanto administrador da Caixa, entre abril de 2004 e setembro de 2006, em reuniões do Conselho Alargado de Crédito que trataram algumas das operações de financiamento que vieram a gerar perdas de milhões para o banco público. As atas a que a revista Sábado teve acesso dão conta disso mesmo e o governador do Banco de Portugal não o nega. Mas Carlos Costa ainda não esclareceu quais as reuniões exatas em que esteve presente. Segundo a revista, o então administrador do banco público esteve presente em, pelo menos, quatro reuniões do Conselho Alargado de Crédito nas quais foram aprovados empréstimos a grande devedores, incluindo aquelas onde se aprovaram os créditos à Metalgest, Investifino e Vale do Lobo. No primeiro esclarecimento que prestou a este respeito, o agora governador do Banco de Portugal disse apenas estar disponível para prestar todos os esclarecimentos sobre “os termos da sua participação nos órgãos colegiais que aprovaram as operações que são objeto da auditoria da EY à CGD”. No mais recente esclarecimento, já disse que “o financiamento da CGD a Vale do Lobo teve a aprovação final numa reunião do Conselho Alargado de Crédito que não contou com a presença do governador”. Não fez ainda qualquer referência às outras operações em que poderá ter estado envolvido.

  • Qual foi a sua intervenção nessas reuniões?

Carlos Costa não nega ter participado em reuniões do Conselho Alargado de Crédito da CGD, mas não esclarece qual foi a sua participação nas mesmas. O mais próximo que esteve de explicar a sua intervenção nestas reuniões foi quando negou responsabilidades na área do crédito: “Entre abril de 2004 e setembro de 2006, o governador exerceu funções de administrador da CGD, tendo sido responsável pelas áreas de marketing e internacional da instituição. Durante todo o período em que exerceu funções de administrador na CGD, o governador não teve responsabilidades nas áreas de crédito, risco, acompanhamento de clientes ou de controlo e auditoria interna”.

  • Em que operações visadas na auditoria da EY teve intervenção, enquanto administrador da CGD?

Fica por saber, então, quais as operações, de crédito ou de investimento, que são analisadas na auditoria da EY e em que Carlos Costa teve intervenção enquanto foi administrador da CGD, no Conselho Alargado de Crédito ou noutro âmbito.

  • O que vai expor ao Conselho de Ética do Banco de Portugal e ao BCE?

Neste cenário em que se colocam em causa as condições que Carlos Costa ainda terá, ou não, para manter o cargo no regulador da banca, o governador pediu para ser ouvido pelo Conselho de Ética do Banco de Portugal e pelo Comité de Ética do Banco Central Europeu (BCE), segundo avançou o Expresso este sábado. Carlos Costa já terá preparado a defesa sobre o seu alegado envolvimento, enquanto administrador da CGD, em algumas das operações que resultaram em perdas de milhões para o público, incluindo a Metalgest, Vale do Lobo e Investifino. Resta tornar estas explicações públicas. E, sobre este ponto, importa também notar que a Comissão de Ética a quem o governador vai prestar esclarecimentos foi escolhida por ele próprio, como determina o Regulamento da Comissão de Ética e dos Deveres Gerais de Conduta dos Trabalhadores do Banco de Portugal. Nesta comissão estão Vítor Pessoa, que foi administrador do Banco de Portugal no início do mandato de Carlos Costa, Vasco Pereira, que já foi diretor do departamento de supervisão ainda durante o mandato do atual governador, e José Pereira, que já esteve à frente do mesmo departamento, também durante o mandato de Carlos Costa.

  • Porque é que só pediu escusa de decisões relativas à CGD mais de quatro meses depois de o relatório da auditoria da EY ter sido concluído?

Primeiro, Carlos Costa anunciou que pediu para não participar nas decisões do Banco de Portugal decorrentes das conclusões da auditoria feita pela EY, um pedido que foi aceite pelo Conselho de Administração do regulador. Mais tarde, esclareceu que este pedido de escusa foi feito no dia 6 de novembro de 2018, tendo sido aceite nesse mesmo dia. Significa isto que o pedido de escusa só foi feito cerca de quatro meses e meio depois de o relatório final da auditoria da EY ter sido concluído, a 26 de junho de 2018.

  • Considera que continua a cumprir os requisitos necessários ao exercício das suas funções, ou que cometeu alguma falta grave que justifique a sua exoneração?

O governador do Banco de Portugal é inamovível e só há duas situações em que pode ser exonerado: se deixar de preencher os requisitos necessários ao exercício das mesmas ou se tiver cometido falta grave. Os requisitos que têm de preencher antes de poderem ser nomeados são: comprovada idoneidade, capacidade e experiência de gestão, bem como domínio de conhecimento nas áreas bancária e monetária. Já o conceito de “falta grave” não está definido com clareza nos estatutos do BCE. Em várias opiniões emitidas relativas ao quadro legal de países da Zona Euro, o regulador europeu classifica de “falta grave” as decisões ou omissões que violem a lei, um conceito relativamente aberto. Noutros casos, é mais específico. No que toca aos requisitos de reporte relativos às estatísticas de balanço, por exemplo, o BCE define como “falta grave” as situações de incumprimento sistemático dos padrões mínimos para as revisões; reporte incorreto com intenção fraudulenta; reporte sistemático de dados incorretos; flagrante falta de cooperação com o banco central competente e/ou com o BCE.

No ano passado, pouco depois de ter recebido a auditoria da EY, o Banco de Portugal acabou por não dar parecer de idoneidade a Norberto Rosa, antigo administrador da Caixa que era candidato a administrador não executivo do BCP, e a Pedro Cardoso, outro antigo administrador do banco público que era candidato a administrador do Bison Bank, em ambos os casos devido às participações destes antigos gestores nos conselhos de crédito da Caixa. É neste contexto, e considerando as situações em que o governador pode ser exonerado, que se levantam várias questões. Se Carlos Costa também participou em conselhos de crédito da Caixa no período analisado pela EY, por que razão não estão o seu nome e a sua idoneidade a serem avaliados? Do mesmo modo, o governador pode garantir que continua a cumprir os requisitos que lhe são exigidos ou que não cometeu qualquer falta grave?

  • Houve falhas por parte do Banco de Portugal, durante o seu mandato, na supervisão à CGD?

Não está apenas em causa a atuação de Carlos Costa como administrador da Caixa, mas, também, como governador do Banco de Portugal. Carlos Costa é governador desde 2010, período que já é abrangido análise feita pela EY (2000 a 2015). Ao longo desses anos, o supervisor não quis envolver-se no processo de realização de uma auditoria à Caixa, que acabou por ser pedida pelo Estado, ao contrário do que fez com o Banco Espírito Santo (BES), caso em que pediu uma auditoria à consultora Deloitte. Isto apesar de, neste período o banco público ter tido de ser recapitalizado por duas vezes: uma em 2012, com uma injeção de 1.650 milhões de euros, e outra em 2016, de cerca de cinco mil milhões de euros. Em qualquer um dos casos, não se conhecem análises de supervisão do Banco de Portugal que tenham determinado as razões que levaram a essas necessidades de capital.

  • Admite sair do Banco de Portugal pelo próprio pé?

Pela segunda vez no seu mandato, vai ser votado um projeto que pede a exoneração do governador do Banco de Portugal. O projeto volta a ser apresentado pelo Bloco de Esquerda, que argumenta que “sem a possibilidade de aferir a sua idoneidade face ao comprovado envolvimento na Caixa Geral de Depósitos, Carlos Costa não cumpre as condições de escrutínio e isenção para o desempenho das funções de governador do Banco de Portugal”.

Mais: não é a primeira vez que a possibilidade de Carlos Costa ter cometido alguma falta grave enquanto governador é levantada, ainda que esta nunca lhe tenha sido apontada oficialmente. “É uma falha grave que nós reputamos de falha grave de transmissão de informação”, disse, em abril de 2017, o ministro das Finanças, Mário Centeno, em entrevista à RTP, referindo-se ao facto de o Banco de Portugal ter omitido que tinha pedido ao BCE para limitar o financiamento ao Banif. O Governo nunca retirou, contudo, consequências destas falhas graves. “Esperarei que a comissão de inquérito identifique todas as situações envolvidas nesta matéria”, ressalvou o ministro das Finanças, afastando, então, a exoneração do governador.

A hipotética exoneração do governador poderia, por outro lado, não ter qualquer efeito prático, já que o processo de exoneração é demorado e o mandato do governador termina em julho de 2020.

Resta saber, então, se Carlos Costa admite, perante as falhas de supervisão que lhe são apontadas já desde o colapso do BES, em 2014, renunciar ao mandato.

“Não participei nos 25 créditos que geraram perdas para a Caixa”

Quarta-feira, Fevereiro 20th, 2019

Citamos

TSF

Governador do Banco de Portugal garante que não teve qualquer participação nos 25 grandes créditos identificados pela auditoria à Caixa.

“Não está associada a minha passagem pela CGD, a minha participação em nenhuma das 25 exposições gerou grandes perdas para a Caixa. Esta é que é a questão”, defendeu o governador. Questionado sobre se não existem, então, razões para a sua exoneração, Carlos Costa considerou que tal é “evidente.” “Se alguém consegue demonstrar o contrário, os procedimentos estão previstos no tratado e pode acioná-los. Terei todo o gosto em mostrar a falsidade que resulta dessa argumentação.”

“O que foi reembolsado foi o crédito onde eu estive”, assegurou Carlos Costa em entrevista na SIC Notícias. O governador, que esteve na Caixa entre 2004 e 2006, período durante o qual foram concedidos alguns empréstimos que mais tarde se revelariam ruinosos, garante que “os créditos mencionados na auditoria independente foram créditos em que não participei”.

Carlos Costa insiste, para “que fique claro: nos 25 grandes créditos que geraram perdas e imparidades para a Caixa, eu não participei na decisão do conselho alargado de crédito”.

“Só ocasionalmente participava no Conselho Alargado de Crédito, dado que não tinha nem competências de crédito, nem de acompanhamento de clientes, nem de risco, nem de controlo”, explicou Carlos Costa, adiantando que a sua participação servia apenas para assegurar “o número de administradores necessários para que a decisão pudesse ter lugar.”

“Nunca presenciei qualquer atitude ou qualquer movimento que lesasse os interesses da CGD do ponto de vista da concessão de créditos”, assegurou. Questionado sobre a sua participação na reunião de 27 de julho de 2006, na qual foi aprovado o financiamento à Vale do Lobo, o ex-administrador da CGD garante que essa decisão foi tomada num conselho em que não estava presente. Ainda assim, confirma que esteve presente na reunião em que foram discutidas as “condições em que a CGD poderia participar numa operação de financiamento de uma eventual aquisição da Vale do Lobo”, na qual ainda não eram conhecidos candidatos a essa mesma aquisição.

Questionado sobre se esta reunião poderia ter sido a génese da atribuição do crédito de 200 milhões de euros, Carlos Costa garante que a operação aprovada “não tinha nem tem nada a ver com a operação e princípios estabelecidos para uma eventual participação da Caixa”, pelo que a reunião terá servido apenas para que o banco se preparasse para esse processo.

Mais tarde, Carlos Costa veio a passar férias no empreendimento, mas garante que não tem qualquer ligação ao mesmo e que não obteve qualquer vantagem financeira. “Não tinha nada a ver com a Vale do Lobo porque não estive na concessão de crédito àquele empreendedor. Tinham passado sete e oito anos, o que significa que não tinha nada a ver, nem ele tinha nada a ver comigo, e a compra desse serviço – aluguer de uma semana – foi feita em mercado, através dos serviços comerciais”, assegurou.

“Não, não sou amigo. Eu transitei de uma administração nomeada pela ministra Manuela Ferreira Leite para uma administração que foi nomeada pelo ministro Bagão Félix e depois para uma administração nomeada pelo professor Teixeira dos Santos. As pessoas que integraram as equipas, integraram-nas em função do convite para permanecer ou não”, explicou Carlos Costa acerca das suas nomeações para as administrações do banco público.

Carlos Costa ficou ligado à história financeira do país quando decidiu o fim do Banco Espírito Santo mas entende que, apesar do custo da operação – com as recapitalizações do Novo Banco -, ter sido muito mais alto do que previa, não põe em causa a sua competência para o cargo.

“Não põe, não põe. O volume de imparidades tem que ser visto em função do momento em que são calculadas. Todos os bancos estão, todos os anos, a constituir imparidades suplementares. Segundo, quando se entra num banco num fim de semana, não se descobre tudo o que lá está. Só ao fim de algum tempo é que se consegue descobrir o que lá está. Terceiro, a lei permite – e por isso é que está estabelecido – que o período para fechar o processo é largo, porque não se descobre tudo o que está no ativo e com problemas a não ser à medida que o tempo vai passando”, relembra.

Em suma, Carlos Costa garante que dorme descansado. “Não tenho nenhum problema de consciência porque desenvolvi a minha atividade com a diligência e a boa fé que é própria da minha atividade ao longo do tempo.”