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Testemunha admite que transferências antes de contratos assinados não eram “surpresa” com Salgado

Sexta-feira, Janeiro 7th, 2022

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Testemunha admite que transferências antes de contratos assinados não eram “surpresa” com Salgado

“Se Ricardo Salgado dizia que as negociações estavam em curso, fazíamos. Não era de estranhar. Efetivamente, a prática normal dos negócios não é essa”, garante o suíço Jean-Luc Schneider.

O suíço Jean-Luc Schneider, que desempenhou diversos cargos em sociedades do Grupo Espírito Santo (GES), admitiu esta quinta-feira em tribunal que a existência de transferências sem um contrato assinado “não era surpresa” com o ex-presidente do GES, Ricardo Salgado.

“Não era surpresa para nós, trabalhávamos num ambiente de confiança. Se Ricardo Salgado dizia que as negociações estavam em curso, fazíamos. Não era de estranhar. Efetivamente, a prática normal dos negócios não é essa e, sim, ter o contrato assinado primeiro, mas com Ricardo Salgado, e o clima de confiança em que o grupo funcionava, isso não era uma coisa extraordinária”, afirmou esta quinta-feira o antigo funcionário do GES, onde trabalhou entre 1989 e 2015.

Em causa estava uma transferência em outubro de 2011 da sociedade ES Enterprises (mais tarde designada Enterprises Management Services) de quase 10 milhões de francos suíços (cerca de oito milhões de euros) para Henrique Granadeiro sem um contrato associado (apenas elaborado em janeiro de 2012), numa operação ligada – segundo o antigo líder da PT numa anterior sessão – à venda de 30% da sociedade agrícola Margar por 14 milhões de euros.

No depoimento por videoconferência como testemunha no julgamento de Ricardo Salgado, em processo conexo e separado da Operação Marquês, Jean-Luc Schneider confirmou que a “Enterprises funcionava como uma sociedade ‘offshore’ do Grupo”, que “fazia pagamentos de bónus” e que era “uma responsabilidade no domínio de Ricardo Salgado”, sendo detida por outra sociedade, a ESBVI, que, por sua vez, pertencia à ES International, do Luxemburgo.

Antigo vice-presidente sénior e ‘chief accounting officer’ da ESFG, presidente do conselho de administração da ESFIL e ‘manager’ da Enterprises Management Services, o alto quadro suíço assumiu que se ocupava das transferências bancárias e dos registos de contabilidade desta última sociedade. Sobre esse negócio relativo à Margar, afirmou não saber “os detalhes específicos sobre o objetivo” deste contrato.

“Foi uma operação decidida por Ricardo Salgado, não tive nenhuma intervenção na preparação do mesmo”, explicou, em resposta às questões da defesa do arguido, salientando que o antigo banqueiro apenas lhe disse que era para a “aquisição de uma vinha. “Ricardo Salgado contactou-me e disse-me que havia uma operação que estava em curso, com um contrato que estava a ser elaborado, mas que fizesse um pagamento prévio”, declarou.

Questionado sobre a movimentação da conta da Enterprises e se era comum fazer pagamentos desta ordem de valores – nos quais se incluíam ainda, por exemplo, 15 milhões de euros pagos a Helder Bataglia ou o empréstimo de quatro milhões de euros ao antigo presidente do GES, Jean-Luc Schneider notou que esses “valores não estavam fora do habitual” funcionamento daquela sociedade.

Em relação a essa transferência em outubro de 2011 de quatro milhões de euros da Enterprises para a sociedade ‘offshore’ Savoices, controlada por Ricardo Salgado, numa operação sobre a qual recai um dos três crimes de abuso de confiança imputados ao antigo banqueiro neste julgamento, Jean-Luc Schneider referiu que se tratou de “um empréstimo” e que assinou essa transferência “com base nas instruções que Ricardo Salgado deu”.

Contudo, explicou que o ex-presidente do GES apenas devolveu em 2012 dois milhões de euros dos quatro que havia recebido, portanto, sem reembolsar por completo, contrariamente ao que tinha acontecido em anteriores empréstimos da Enterprises a Ricardo Salgado.

Já na reta final da audição, o juiz presidente tentou perceber melhor a atividade da Enterprises, nomeadamente de onde vinham os seus fundos e o objeto das suas operações financeiras. Jean-Luc Schneider limitou-se a falar em “contratos de opções” e que eventuais lucros e perdas faziam “parte da operação” da sociedade, com Francisco Henriques a desabafar ao fim de alguns minutos: “É uma pescadinha de rabo na boca”.

De seguida, o procurador do Ministério Público (MP), Vítor Pinto, apresentou um primeiro requerimento com vista à leitura das declarações da testemunha José Castella ao MP em julho de 2016, uma vez que o antigo ‘controller’ financeiro do GES e secretário do Conselho Superior faleceu em 2020 e foi referido por mais do que uma vez na sessão desta quinta-feira. Apesar da oposição da defesa, o coletivo de juízes deliberou e acabou por ler um resumo dessas declarações.

Por fim, o MP comunicou algumas alterações não substanciais da pronúncia, como a correção de determinadas datas e certos valores em alguns artigos, com o tribunal a conceder agora 10 dias aos advogados de defesa de Ricardo Salgado para se pronunciarem sobre essa matéria.

Com o fim da produção de prova na oitava sessão do julgamento no Juízo Criminal de Lisboa, os advogados Francisco Proença de Carvalho e Adriano Squilacce disseram à saída do tribunal não existir “nenhuma preocupação”, asseverando aos jornalistas que “a defesa está totalmente confortável com a prova que foi produzida em audiência”.

As alegações finais do julgamento do antigo banqueiro no processo conexo e separado da Operação Marquês estão agora marcadas para 8 de fevereiro, às 09h30, no Campus da Justiça. Ricardo Salgado responde neste julgamento por três crimes de abuso de confiança, devido a transferências de mais de 10 milhões de euros no âmbito da Operação Marquês, do qual este processo foi separado.

BES: Relação confirma sentença que condenou ex-administradores da PT

Quarta-feira, Março 24th, 2021

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Expresso

Em causa estava a redução das coimas aplicadas pelo regulador dos mercados aos ex-administradores da Portugal Telecom Zeinal Bava, Henrique Granadeiro, Pacheco de Melo e Morais Pires.

O acórdão da Relação, datado de 12 de fevereiro e a que a Lusa teve hoje acesso, julgou, com voto de vencido do presidente da Secção de Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão, Eurico Reis, improcedentes os recursos interpostos pelos ex-administradores da PT, no âmbito do processo que envolveu o investimento da operadora na Rioforte, empresa do Grupo Espírito Santo (GES).

Na sua decisão, o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, manteve a coima de um milhão de euros aplicada pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) à PT (atual Pharol), suspendendo-a na totalidade durante três anos, e reduziu as que o regulador havia aplicado aos ex-administradores Zeinal Bava, Henrique Granadeiro, Pacheco de Melo e Morais Pires.

Os ex-administradores recorreram da decisão para o Tribunal da Relação de Lisboa, que confirmou na íntegra a sentença da primeira instância, a qual reduziu as coimas aplicadas pela CMVM a Henrique Granadeiro de 750.000 para 420.000 euros, a Zeinal Bava de 600.000 para 310.000 euros, a Luís Pacheco de Melo de 400.000 para 300.000 euros e a Amílcar Morais Pires de 300.000 para 180.000 euros.

O acórdão da Relação é passível de recurso até ao Tribunal Constitucional.

Na declaração de voto de vencido, Eurico Reis afirma que teria julgado “parcialmente procedentes” os recursos e reduzido os valores das coimas, tendo em conta o estabelecido no artigo 18º do Regime Geral das Contraordenações (RGCO), que determina a medida da coima.

O juiz invoca o facto de a sentença do TCRS justificar a redução das coimas por não ter ficado provado que as condutas dos ex-administradores “tenham gerado danos ou prejuízos, nem que da sua atuação tenham resultado benefícios patrimoniais” e por terem sido “cooperantes”, determinando que agiram com “dolo eventual” e não direto como vinham condenados.

Eurico Reis questiona se o julgamento dos recursos às decisões das entidades reguladoras deve continuar a ser “balizado pelas regras estabelecidas” no RGCO, aprovado em 1982, “ou se não deveria ser criada uma regulamentação autónoma” assente na “nova perspetiva de abordagem de resolução desses conflitos”.

Sublinhando que “tal discussão não foi ainda sequer iniciada”, o juiz desembargador entende que só resta aos juízes seguir aquelas normas “tomando em consideração os mecanismos internos de funcionamento da concreta área económico-social em que atua a entidade […] acusada da prática da infração”.

A decisão do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), aprovada pelos juízes desembargadores Carlos Melo Marinho e Ana Mascarenhas Pessoa, confirma como prazo de prescrição do processo o dia 17 de março de 2021, tendo em conta o prazo máximo de oito anos a partir da data da prática dos factos, não dando razão a Zeinal Bava, que alegava a prescrição do procedimento contraordenacional pelo qual foi condenado.

Para Eurico Reis, o facto de os processos chegarem aos tribunais muito próximos do prazo de prescrição “constitui uma inaceitável pressão sobre quem tem de proferir uma decisão fundamentada”.

Dá ainda razão ao ex-administrador e responsável financeiro da PT Luís Pacheco de Melo, que contestou os prazos de recurso dada a “especial complexidade” do processo.

“Se assim não fosse, por que motivo a instrução do procedimento por parte da CMVM demorou tanto tempo e encurtou de forma tão intensa o tempo disponível, nomeadamente aos Juízes que exercem funções nesta Relação de Lisboa, para ponderar de forma cuidada a materialidade submetida ao julgamento do Tribunal?”, questiona Eurico Reis.

Em causa no processo estão as contraordenações imputadas pela CMVM relativas à divulgação de informação não verdadeira, não completa e não lícita nos relatórios e contas da antiga PT de 2012, 2013 e primeiro trimestre de 2014 e nos relatórios de governo societário de 2012 e 2013, relativa às aplicações de tesouraria realizadas pela PT na Espírito Santo International e na Rioforte nos anos de 2012 a 2014.

BES: Ministério Público e CMVM pedem manutenção de coimas à Pharol e a ex-administradores

Quinta-feira, Novembro 19th, 2020

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Notícias ao Minuto

O Ministério Público e a CMVM pediram hoje ao Tribunal da Concorrência que mantenha as coimas aplicadas em março último à Pharol e a ex-administradores, entre os quais Zeinal Bava, Henrique Granadeiro e Amílcar Morais Pires.

No julgamento dos pedidos de impugnação às coimas aplicadas pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), num valor global de 2,5 milhões de euros, à Pharol (antiga Portugal Telecom) e a sete antigos administradores, tanto o procurador do Ministério Público, Eduardo Sá Couto, como a mandatária da CMVM, Joana Miranda, pediram a manutenção da decisão administrativa.

Em causa no processo está a prestação de informação falsa ou incompleta nos relatórios e contas de 2012, 2013 e primeiro trimestre de 2014 e nos relatórios de governo societário de 2012 e 2013, relativa às aplicações de tesouraria realizadas pela PT na Espírito Santo International (ESI) e na Rioforte.

Joana Miranda frisou, nas suas alegações, que a prova produzida durante o julgamento, incluindo os depoimentos dos arguidos recorrentes, veio confirmar os termos da decisão administrativa, nomeadamente quanto a atuação dolosa, pelo que pediu a manutenção das coimas únicas de um milhão de euros aplicada à Pharol, de 600.000 euros a Zeinal Bava, de 750.000 euros a Henrique Granadeiro, de 400.000 euros a Luís Pacheco de Melo e de 300.000 euros a Amílcar Morais Pires.

Na decisão administrativa foram ainda condenados João Mello Franco, José Xavier de Basto e Mário Matos Gomes, a coimas únicas de 150.000 euros cada um, todas elas suspensas por dois anos.

Quanto à coima aplicada à Pharol, suspensa por dois anos em dois terços do seu valor, o Ministério Público pediu ao Tribunal da Concorrência Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, a suspensão na totalidade por igual período.

Segundo a CMVM, a PT, sob a gestão de Zeinal Bava primeiro e depois com Henrique Granadeiro, fez aplicações de tesouraria (num processo que começou com a liquidez obtida com a venda da Vivo, em 2010) na ESI, não cumprindo com as normas que determinam a diversificação das aplicações, em instituições financeiras com notação de ‘rating’.

Frisando que a ESI e, depois, a partir de janeiro de 2014, a Rioforte (para a qual foram transferidas as aplicações financeiras de curto prazo da PT), não eram instituições financeiras e não estavam sujeitas a ‘rating’ por agências de notação de risco, Joana Miranda sublinhou a relevância da qualidade da informação para os acionistas e potenciais investidores numa empresa que estava cotada tanto na bolsa de Lisboa como na de Nova Iorque.

Apesar de a Pharol ter alegado no processo não lhe poder ser imputada a responsabilidade dos atos praticados pelos seus administradores, a mandatária afirmou que estes foram praticados em seu nome e sublinhou o facto de a empresa ter entretanto alterado a sua estrutura interna e tornada obrigatória a aprovação das aplicações financeiras pelo conselho de administração, bem como a sua diversificação e a introdução de limites às aplicações que o administrador financeiro pode aprovar.

O julgamento, que decorre por videoconferência a partir de uma sala no Instituto Politécnico de Santarém prossegue à tarde com as alegações dos recorrentes.

“Pressão? Não.” Ex-presidente da mesa da Assembleia Geral da PT nega pressão de Salgado

Segunda-feira, Abril 1st, 2019

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TSF

António Menezes Cordeiro, antigo presidente da mesa da Assembleia Geral da Portugal Telecom foi ao Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa garantir que nunca sentiu na empresa qualquer pressão de Ricardo Salgado. Foi a primeira testemunha arrolada pela defesa de Henrique Granadeiro a ser ouvida na fase de instrução.

Henrique Granadeiro foi o arguido da Operação Marquês que mais mais testemunhas arrolou para a fase de instrução. No total, o ex-presidente da Portugal Telecom (PT) indicou 15 testemunhas abonatórias, e as três primeiras foram ouvidas esta tarde pelo juiz Ivo Rosa no Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa (TCIC).

António Menezes Cordeiro, antigo presidente da mesa da Assembleia Geral da PT entre 2006 e 2012, foi a primeira testemunha a ser inquirida e a única que prestou declarações aos jornalistas. À saída do TCIC, Menezes Cordeiro garantiu que nunca sentiu na PT qualquer pressão de Ricardo Salgado: “Pressão? Não, nenhuma. Não tenho elementos nenhuns que vão nesse sentido. Aquilo que que vi foram assembleias onde as pessoas votaram e não vi nada de suspeito.”

O antigo presidente da mesa da Assembleia Geral da PT garantiu ainda que as atas das reuniões provam que o chumbo à OPA da SONAE sobre a PT foi transparente e sem interferências do Grupo Espírito Santo (GES).

Amanhã serão ouvidas mais 3 testemunhas, incluindo Jorge Tomé, ex-administrador não executivo da PT em representação da acionista Caixa Geral de Depósitos e antigo presidente do BANIF.

Entre as testemunhas arroladas pela defesa de Granadeiro estão ainda Carlos Slim (magnata mexicano que foi acionista da PT e que é considerado o 5º homem mais rico do mundo), Gerald McGown (ex-embaixador dos Estados Unidos em Portugal e antigo administrador da PT) e Ricardo Knoepfelmacher (ex-administrador da Brasil Telecom) que serão ouvidos por videoconferência em data a definir, até junho.

Segundo o Ministério Público, Henrique Granadeiro terá recebido 24 milhões de euros alegadamente pagos pelo ex-presidente do Banco Espírito Santo, Ricardo Salgado, para beneficiar os interesses do GES em vários negócios da PT. O antigo CEO e presidente do conselho de administração da PT está acusado de 1 crime de corrupção passiva, 3 de fraude fiscal qualificada, 2 de branqueamento de capitais, 1 de peculato e outro de abuso de confiança.

Para evitar ir a julgamento, a defesa alega que as principais provas da acusação foram obtidas de forma ilegal e devem ser anuladas.

 

Caso Rio Forte leva Granadeiro à CMVM, outra vez

Quarta-feira, Maio 9th, 2018

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Observador

Caso Rio Forte leva Granadeiro à CMVM, outra vez

O antigo presidente da PT está a ser ouvido por causa do empréstimo feito pela antiga operadora à Rio Forte, do Grupo Espírito Santo. Que foi determinante para a queda da PT.

Henrique Granadeiro, antigo presidente da PT, está a ser novamente ouvido na Comissão de Mercado de Valores Imobiliários, divulga a SIC Notícias. Em caso está o empréstimo feito à Rio Forte, empresa do Grupo Espírito Santo (GES), no valor de 897 milhões de euros, quando a empresa já estava em dificuldades.

O gestor já tinha sido ouvido pela CMVM, a 18 de abril, no âmbito de investimentos da PT ao GES, numa altura em que a operadora apresentou resultados ruinosos. Neste momento o Ministério Público está a investigar criminalmente este empréstimo, como as informações prestadas por Granadeiro sobre a relação da PT com o GES.

Granadeiro é também arguido na Operação Marquês, por alegados pagamentos recebidos por gestores da PT que levaram o Ministérios Público a pedir a apensação dos processos Monte Branco, Universo BES (onde está o caso PT) e PPP.

A CMVM acusou, em 2016, vários antigos gestores da PT, como Granadeiro, Zeinal Bava e Pacheco de Melo de vários ilícitos contra-ordenacionais muito graves.

Granadeiro ouvido por causa do papel comercial do GES. CMVM vai chamar mais responsáveis

Quinta-feira, Abril 19th, 2018

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Eco

O ex-presidente da PT está na CMVM a ser ouvido no âmbito de um processo de compra de papel comercial do Grupo Espírito Santo. CMVM vai chamar mais envolvidos.

Henrique Granadeiro, ex-presidente da Portugal Telecom (PT), está a ser ouvido na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) no âmbito de um processo de compra de papel comercial do Grupo Espírito Santo (GES) por parte da antiga operadora de telecomunicações, de acordo com a informação avançada pela SIC Notícias.

Contactada, fonte oficial da CMVM não quis fazer qualquer comentário relativamente à audição do antigo chairman da PT. O ECO confirmou a informação da SIC Notícias, sabendo ainda que nos próximos dias o regulador do mercado de capitais vai ouvir outros envolvidos no investimento de 900 milhões de euros por parte da PT na dívida da Rio Forte.

Este investimento remonta a 2014, altura em que a PT tinha papel comercial da ESI que foi depois trocado por papel comercial da Rioforte, meses antes da resolução do Banco Espírito Santo (BES). Foi este papel que acabou por gerar uma crise na antiga operadora que culminou no pedido de demissão de Henrique Granadeiro.

compra de papel comercial já foi alvo de uma auditoria por parte da PwC. O objetivo foi apurar todas as circunstâncias em torno dos investimentos realizados em empresas detidas pelo GES, que através do BES era o maior acionista da PT. Foram entrevistados vários ex-gestores da operadora e do BES, nomeadamente Henrique Granadeiro e Luiz Pacheco de Melo, os dois responsáveis da PT que se demitiram na sequência do investimento de 900 milhões de euros na Rioforte, mas também Zeinal Bava.

João Mello Franco (atual presidente da PT SGPS e antigo membro da comissão de auditoria), Rafael Mora, administrador da PT e da Ongoing, Amílcar Morais Pires e Joaquim Goes, dois ex-administradores do BES que estavam representados no conselho de administração da operadora de telecomunicações, também constaram da lista de 15 pessoas ouvidas.

Granadeiro foi um dos acusados pela Pharol (antiga PT) em 2016. No comunicado enviado à CMVM, a empresa afirmou que o ex-presidente da PT, em conjunto com Zeinal Bava e Pacheco Melo, terá violado “os respetivos deveres legais e contratuais, nomeadamente o dever de submeter a aprovação prévia, pelo Conselho de Administração, a realização de aplicações em instrumentos de dívida emitidos por sociedades integrantes do GES, bem como o dever de implementar um sistema de controlo interno adequado à existência de aplicações com tal natureza”.

A resolução do BES aconteceu numa altura em que a PT e a operadora brasileira Oi estavam em processo de fusão, que resultou na criação de um veículo de investimento — a Pharol. Esta empresa ficou então a dever os 847 milhões em papel comercial à PT, o que fez com que a sua participação nesta fusão diminuísse para 25,6% face aos 38% que estavam previstos.

O interrogatório a Salgado: o ex-DDT que pediu um “copinho de água” para lidar com o “choque” das acusações

Segunda-feira, Dezembro 18th, 2017

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O interrogatório a Salgado: o ex-DDT que pediu um “copinho de água” para lidar com o “choque” das acusações

 

 

O dia 18 de janeiro de 2017 ficará registado na história de Ricardo Salgado como o dia em que foi formalmente constituído arguido por alegadamente ter corrompido um primeiro-ministro e dois ex-líderes da Portugal Telecom (PT) — indiciação que foi mais tarde confirmada pelo Ministério Público no despacho de acusação da Operação Marquês.

Como diria o historiador José Hermano Saraiva, “foi aqui” — ou melhor, foi ali –, naquela pequena sala do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), em Lisboa, que Ricardo Salgado tomou consciência de que já não era o DDT — Dono Disto Tudo. Ao ouvir a longa indiciação que o procurador Rosário Teixeira demorou 30 minutos a ler, a sua habitual postura glaciar pouco se alterou mas a forma contida, ritmada e fria das primeiras declarações do líder informal da família Espírito Santo contrastam claramente com o seu estado de espírito.

“Não se surpreendam de eu ter ficado praticamente em estado de choque porque se não tivesse alguma preparação física provavelmente tinha caído para o lado com estas acusações (…) O que eu ia pedir era um copinho de água porque, de facto, este… este choque que sofri o merece”, começou por dizer perante os procuradores Rosário Teixeira e Inês Bonina e os inspetores tributários Paulo Silva e Ana Barroso.

O céu tinha acabado de cair em cima da cabeça de um dos homens mais poderosos do Portugal dos últimos 30 anos.

[Ouça no vídeo a reconstituição de 8 momentos-chave do interrogatório a Ricardo Salgado, em mais um episódio da mini-série Sim, Sr. Procurador]

A defesa da honra

Entre suspeitas de corrupção de titular de cargo político (José Sócrates), corrupção ativa de dois gestores da PT (Henrique Granadeiro e Zeinal Bava), branqueamento de capitais, fraude fiscal qualificada e abuso de confiança — alegados ilícitos estes a que foi acrescentado o alegado crime de falsificação de documento no despacho de acusação da Operação Marquês –, Salgado diz ter ficado “profundamente chocado, profundissimamente chocado com tudo isto”. Mas não ficou calado: “Nunca vi tanta mentira junta e peço desculpa por o estar a afirmar”.

Seguindo um padrão de discurso público e privado que segue desde a derrocada do grupo que liderou informalmente durante mais de 20 anos, Salgado começou por negar qualquer irregularidade e refutou as acusações — particularmente no que diz respeito às suspeitas de corrupção e aos alegados benefícios nos negócios relacionados com a PT.

Ricardo Salgado: Posso ter cometido erros de julgamento mas não erros de princípios (…). Não são verdadeiras as afirmações de qualquer tipo de relação, de influência, no primeiro-ministro da altura, o eng. José Sócrates, em relação a qualquer operação que fosse. Nunca falei com o José Sócrates sobre a história da PT sequer. E muito menos procurar entregar valores a um primeiro-ministro [José Sócrates], portanto subornos, direta ou indiretamente, por qualquer outra forma. Também gostava de referir que ilícitos praticados em relação a administradores da PT, por mim ou pelo grupo, não foram cometidos. (…)

O primeiro negócio da PT que está sob escrutínio na Operação Marquês é a Oferta Pública de Aquisição (OPA) da Sonae que Belmiro e Paulo Azevedo anunciaram ao mercado em fevereiro de 2006 — que foi derrotada em Assembleia Geral da PT cerca de um ano depois. Salgado é suspeito de alegadamente ter corrompido José Sócrates para o então primeiro-ministro influenciar a Caixa Geral de Depósitos (onde estava Armando Vara como administrador) a alinhar contra a OPA da família Azevedo (mantendo a influência do BES na PT) e de ter igualmente e alegadamente corrompido Henrique Granadeiro (então líder da PT) e Zeinal Bava (então vice-presidente da PT) para convencer a gestão da operadora a delinear e a aplicar uma estratégia anti-OPA.

Ricardo Salgado ao lado de Henrique Granadeiro e Zeinal Bava em 2012 (Jorge Amaral / Global Imagens )

Ricardo Salgado: Sr. procurador posso-lhe dizer que este aspeto da OPA da PT é o aspeto mais fácil para mim de explicar. Que não era necessária nenhuma intervenção política. (…) Se quisermos fazer um esforço de memória é muito fácil relembrar as informações que saíram na época logo que foi anunciada a OPA, salvo erro no início de fevereiro de 2006, em que imediatamente saíram duas afirmações que explicam muita coisa. A primeira é que a OPA não passa. Isso era opinião dos media especialistas na área económica (…). E a segunda vem exatamente do Paulo Azevedo, que vem referir com toda a transparência que a participação da PT no Brasil não é estratégica e, portanto, diz de caras que a operação do Brasil é para ser vendida porque — isto agora já é um julgamento meu — isso permitiria ajudar a financiar a aquisição da PT, uma vez que tinham um comprador garantido que era a Telefónica (…).

Homem no poder há muito tempo, Ricardo Salgado lidou com todos os primeiros-ministros eleitos desde que tomou posse no início dos anos 90 como líder executivo do BES. Tem, por isso mesmo, muitas histórias para contar – como faz questão de recordar ao longo das mais de duas horas de interrogatório. António Guterres, primeiro-ministro entre 1995 e 2001, é protagonista de um episódio marcante para a história da PT.

Homem no poder há muito tempo, Ricardo Salgado lidou com todos os primeiros-ministros eleitos desde que tomou posse no início dos anos 90 como líder executivo do BES. Tem, por isso mesmo, muitas histórias para contar — como faz questão de recordar ao longo das mais de duas horas de interrogatório. António Guterres, primeiro-ministro entre 1995 e 2001, é protagonista de um episódio marcante para a história da PT: a ida para o Brasil e a vitória na privatização da Telesp Celular. Mais tarde, a PT uniu-se à Telefónica (que tinha ganho a privatização da rede fixa de São Paulo) e criam uma joint venture que veio dar origem à operadora Vivo.

Mas o procurador Rosário Teixeira não perde o foco desta parte do interrogatório: a OPA da Sonae.

Ricardo Salgado: Gostava também de recordar que foi o BES que financiou a PT para a aquisição da licença da Vivo [no final dos anos 90]. A Telefónica tinha comprado a rede fixa de São Paulo, a rede celular da Vivo [Telesp Celular] foi vendida no Rio de Janeiro. E é muito fácil de verificarem esse aspeto porque (…) julgo que era o eng. Guterres que era primeiro-ministro. Telefona e diz-me [Guterres]: “Ricardo, o valor da licença está a subir exponencialmente e não sabemos se podemos ir a certos valores”. E eu apoiei-o naquilo que fosse a decisão que ele tomasse, que a administração da PT que estava no Rio de Janeiro tomasse. “O BES fará tudo para poder estar ao vosso lado na aquisição da Vivo [Telesp Celular]”. (…)

Procurador Rosário Teixeira: A administração da PT contra a OPA [da Sonae] não foi uma coisa que o sr. dr. [Ricardo Salgado] tivesse, digamos assim, também apoiado de alguma forma?

Ricardo Salgado: (…) hoje em dia não sei se consigo convencer as pessoas da bondade do meu comportamento… (…) Eu tinha tido a oportunidade de vender o controlo do BES quando o Santander comprou o grupo do António Champalimaud (…) e eu disse que não. Não podíamos vender o controlo de uma instituição a outro banco espanhol, principalmente. O nosso princípio era de defesa dos centros de decisão em Portugal e não era com objetivos maquiavélicos de retirar daí benefícios significativos. E, portanto, com certeza que estava contra a OPA [da Sonae à PT] e estava contra a OPA porquê? Por uma razão muito simples. É que nós sabíamos que a Telefónica ia comprar a Vivo. (…) Nunca falei com o José Sócrates a pedir o que quer que fosse. Aliás, eu julgo que houve no início, até nas notícias de 2006, José Sócrates fez uma dissertação pública de satisfação que a OPA [da Sonae] mostrava confiança na economia do país.

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A relação com Hélder Bataglia

De acordo com a tese da acusação, o processo da alegada corrupção de Sócrates por parte de Salgado tem um homem-chave: chama-se Hélder Bataglia e, de acordo com o testemunho do próprio nos autos da Operação Marquês, terá sido este alto quadro do GES e ex-presidente da Escom a receber dinheiro do Banco Espírito Santo Angola e da Espírito Santo Enterprises, o famoso ‘saco azul’ do GES, e a transmiti-lo a Carlos Santos Silva.

O Ministério Público entende que Bataglia terá recebido do GES cerca de 22 milhões de euros com esse objetivo, mas Bataglia apenas reconheceu no seu interrogatório no DCIAP, realizado poucos dias antes de Salgado ser chamado a prestar declarações, que transferiu cerca de 12 milhões de euros para Santos Silva alegadamente a pedido expresso de Salgado.

A alegada necessidade de Ricardo Salgado corromper José Sócrates é explicada pelo MP através de dois temas — ambos relacionados com a PT:

  • Convencer Sócrates a apoiar a oposição do BES à OPA lançada pela Sonae em fevereiro de 2006, de forma a manter a influência do BES na operadora;
  • Promover a utilização das 500 golden-shares da PT que o Estado detinha, de forma a condicionar a venda da participação que a PT tinha na Vivo ao reinvestimento de boa parte dos 7,5 mil milhões de euros pagos pelos espanhóis da Telefónica na aquisição de uma nova participação numa operadora brasileira: a Oi/Telemar.

Procurador Rosário Teixeira: Vamos então, e já que era seu desejo, reconstruir esse relacionamento com o sr. Hélder Bataglia. Tinha prometido ou não ao sr. Hélder Bataglia qualquer tipo de pagamento, qualquer tipo de compensação pelo trabalho, pelo sucesso da Escom?

Ricardo Salgado: (…) o Hélder Bataglia foi contratado pelo meu primo António Espírito Santo. (…) E para fazer a longa história curta eu vou-lhe dizer que houve dois grandes culpados da catástrofe do Grupo Espírito Santo em Angola: um foi o sr. Álvaro Sobrinho e outro foi o sr. Hélder Bataglia. Mas, no início, o Hélder Bataglia era um homem genial. O desenvolvimento da atividade da Escom vem em velocidade acelerada e ele começa, muito cedo, a desenvolver relações internacionais com a bandeira Espírito Santo (…). Vai para a China, vai para a Rússia, vai para aqui, vai para acolá. E é de tal maneira bem-sucedido que, no final dos anos 90, eu não lhe sei precisar a data exata, os chineses já estavam a fazer acordos com Angola no sentido de comprar petróleo e financiar o Estado angolano. O prestígio do Hélder Bataglia em Angola subiu vertiginosamente. Ele era praticamente one man show. Trouxe os chineses para Angola. Há relatórios, até relatórios secretos, sobre isso se depois tiverem interesse. Que afirmam isso. Poderemos facultar-lhe.

Ricardo Salgado: “Devo dizer-lhe que encontrei o Manuel Vicente [ex-vice-presidente de Angola e ex-presidente da Sonangol] em Portugal uma ou duas vezes a quem eu me queixei (…). E ele por duas vezes garantiu-me: ‘Vocês vão ter concessões de petróleo em Angola. Não tenha dúvida alguma’.”

Salgado manteve ao longo de todo o interrogatório a sua justificação para as transferências realizadas pelo BESA e pela ES Enterprises para as contas bancárias suíças de duas sociedades offshore de Hélder Bataglia: tratava-se de uma remuneração por um acordo (apelidado de acordo-chapéu pelo próprio Salgado) que o GES tinha assinado com Bataglia para remunerá-lo pela obtenção da licença bancária que permitiu ao GES abrir o BESA em Angola e por alegadas licenças de exploração de petróleo em Angola que seriam emitidas em nome do GES.

Procurador Rosário Teixeira: O acordo-chapéu com Hélder Bataglia foi mesmo feito nesta data de 2005?

Ricardo Salgado: Foi, foi. (…) Com as boas relações que estava com o governo de Angola, o Hélder Bataglia diz-nos que vai obter licenças para blocos de petróleo. E então aparecem seis blocos, salvo erro, dois onshore em Angola e quatro offshore. Não sei agora os nomes nem as características. Aquilo que eu vim a reconhecer depois é que nós só tivemos uma participação num bloco de petróleo com um grupo angolano. Foi a única coisa que eu depois acabei por detetar. Mas nós tivemos que pagar ao Hélder Bataglia montantes consideráveis para efeitos dessas concessões.

Contudo, o próprio Salgado admite que Bataglia não conseguiu as licenças de petróleo que tinha prometido e para as quais teria alegadamente recebido cerca de 6 milhões de euros do BESA.

Ricardo Salgado: Devo dizer-lhe que encontrei o Manuel Vicente [ex-vice-presidente de Angola e ex-presidente da Sonangol] em Portugal uma ou duas vezes a quem eu me queixei (…) e disse-lhe: “Tudo aquilo que nós já fizemos por Angola e eu tenho agora esta informação, esta possibilidade dos blocos de petróleo dita pelo Hélder Bataglia…”. E ele por duas vezes garantiu-me: “Vocês vão ter concessões de petróleo em Angola. Não tenha dúvida alguma”. O Manuel Vicente verbalmente. Julgo até que uma vez foi num jantar oficial oferecido não sei se foi ao [José] Eduardo dos Santos, mas ele estava lá nesse jantar oficial. Não sei qual era o primeiro-ministro, o Presidente [Cavaco Silva] que estava a receber as entidades.

Procurador Rosário Teixeira: Tinha então duas pessoas bem posicionadas, o dr. Hélder Bataglia e o Manuel Vicente, que estava na Sonagol na altura, a garantir que o grupo iria ser beneficiário de licenças de exploração?

Ricardo Salgado: Em função disso são montadas algumas dessas operações. (…) Os pagamentos ao Hélder Bataglia eram feitos com esta finalidade. A obtenção de direitos de concessão, poços de petróleo, etc. Agora, de repente, e eu devo-lhe dizer que descobri isso fundamentalmente depois do colapso, por trás das nossas costas estava a passar um filme de terror em que os recursos eram desviados para outras finalidades. Que eu nunca na minha vida pensei que isso pudesse acontecer. (…)

Procurador Rosário Teixeira: Então porque é que pagaram sem verificar se isso tinha ido avante ou não?

Ricardo Salgado: Porque é que pagámos? A sua questão é perfeitamente correta. É porque nós estávamos convencidos de que as coisas estavam a acontecer. (…)

Procurador Rosário Teixeira: O acordo é feito pela tal Espírito Santo Enterprises, que o sr. dr., não sei se admitirá ou não, mas que em princípio só libertaria fundos com a sua intervenção…

Ricardo Salgado: Não era só com a minha. Também havia outros membros do Conselho Superior [do GES] que davam ordens para a Enterprises. Mas pronto. (…) O senhor que controlava os pagamentos [Jean Luc Schneider], certamente deve ter perguntado se podia pagar (…).

Inspetor Paulo Silva: E foi perguntar a quem?

Ricardo Salgado: Deve ter perguntado a mim! Pode ter perguntado perfeitamente a mim! (…) Eu não tinha tempo para tratar administrativamente desse assunto. Há falhas, há. Não tenho dúvida. Agora, pode ter a certeza que esses recursos para nós deviam ter sido investidos em Angola (…) e não sub-repticiamente passar-nos por trás das costas e estarem a ser passados não sabemos a quem.

Hélder Bataglia, ex-presidente da Escom, denunciou Ricardo Salgado no interrogatório a que foi sujeito no DCIAP. MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

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Os alegados pagamentos a José Sócrates

A primeira tranche que Hélder Bataglia recebeu do GES corresponde a 7 milhões de euros que tiveram origem no BESA e acabaram numa conta da Suíça aberta em nome da Markell, sociedade offshore de Bataglia. Com esses fundos na mão, o então líder da Escom terá transferido cerca de 6 milhões de euros para a conta da Gunter Finance de José Paulo Pinto de Sousa — primo de José Sócrates e o seu alegado primeiro testa-de-ferro. Bataglia diz que este montante corresponde ao preço de compra dos terrenos das salinas de Benguela que pertenciam à família Pinto de Sousa. Mas esta justificação foi claramente desmentida por Pedro Ferreira Neto, alto quadro do GES e então chief financial officer da Escom, nos autos da Operação Marquês.

Ricardo Salgado: (…) Quando me falam agora de acusações ou de suposições que eu mandei pagar através do Hélder Bataglia ó… ó… A quem é que é? Ao José [Paulo] Pinto de Sousa [primo de José Sócrates]! O Hélder Bataglia falou-me uma vez neste José Pinto de Sousa que tinha… que tinha se… porque havia lá terrenos do… da… destes familiares do Sócrates e que tinham umas salinas… foi a única coisa que eu soube.

Procurador Rosário Teixeira: É capaz de nos dizer em que circunstâncias é que ocorreu essa… essa conversa?

(…)

Ricardo Salgado: Comigo? Não! Eu vim a saber mais tarde que as salinas acabaram no BESA. Mas só soube mais tarde. Só soube depois da nossa intervenção lá no BESA. Em 2013. Exatamente.(…) Foi uma conversa de ocasião, uma coisa qualquer que me disse: “Ah! Eu tenho aqui o Pinto de Sousa…”, que era primo do Sócrates. Eu não sabia que o Hélder Bataglia tinha relações familiares tão estreitas com o José Sócrates, não fazia a mais pequena ideia. Acho que tinha uma filha que era de uma prima dele [Filomena Pinto de Sousa]. (…) Em outubro de 2013 quando eu fui lá [a Angola], depois de ter detetado o buracão que havia no banco [Espírito Santo Angola] provocado pelo Álvaro Sobrinho, hoje não tenho dúvida de acrescentar o nome do Hélder Bataglia. Peço desculpa, aquilo que lhes vou dizer é uma frase inglesa, os ingleses são muito cínicos, mas que é esta:”birds of the same feather they fly together — pássaros com as mesmas penas voam juntos”. Não tenho dúvida nenhuma que fomos completamente enganados em relação às duas coisas. Ao banco [BESA] e à Escom. E que o Hélder Bataglia foi um elemento determinante nisso.

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As críticas a Carlos Costa

Hélder Bataglia e Álvaro Sobrinho são dois protagonistas do caso BES/GES que merecem acusações de Ricardo Salgado. Salgado aponta o dedo a muitas outras pessoas, desde o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, que recusou autorizar a Caixa Geral de Depósitos a conceder um empréstimo de emergência ao GES, até Carlos Costa, governador do Banco de Portugal que o afastou da liderança do BES e abriu cinco processos de contra-ordenação ao próprio Salgado e aos restantes administradores do BES. Aliás, Salgado fez mesmo questão de mostrar o que pensa de Carlos Costa num aparte do interrogatório que decorreu no DCIAP — tudo a propósito do pagamento da dívida de Angola a empresas portuguesas que decorreu no início da década sob patrocínio do Governo de Durão Barroso.

Procurador Rosário Teixeira: E neste processo de negociação [para o pagamento da dívida de Angola a Portugal e restantes credores internacionais], o Sr. Hélder Bataglia tem alguma intervenção?

Ricardo Salgado: Zero. Nada. Não tem nada. Isto foi tudo feito em Lisboa. Estavam vários responsáveis angolanos à volta da mesa, que agora não me lembro do nome mas posso facultar-lhe alguns nomes, e estavam entre outras pessoas como representantes dos bancos, a ironia da história, entre outros um tal dr. Carlos Costa da área internacional do BCP. Infelizmente para o nosso país. Peço desculpa pelo aparte.

Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, afastou Ricardo Salgado da liderança do BES e ordenou a abertura de cinco processos de contra-ordenação à sua administração

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“Conhece Carlos Santos Silva?”

O momento-chave do interrogatório de Ricardo Salgado surge quando o procurador Rosário Teixeira confronta o ex-líder informal do GES com as declarações de Hélder Bataglia — que, dias antes, tinha responsabilizado Ricardo Salgado naquela mesma sala por lhe ter pedido para usar as suas contas.

Procurador Rosário Teixeira: Diga-me uma coisa: conhece o sr. eng. Carlos Santos Silva?

Ricardo Salgado: Nunca o vi! Nunca o vi. Era uma… é uma situação para mim de uma enorme perplexidade. Por aquilo que eu percebi, os recursos foram parar a um tal Carlos Santos Silva. Eu vou-lhe dizer o que é que eu conheço do grupo Lena. (…)

Procurador Rosário Teixeira: (…) Mas já me está a associar o Carlos Santos Silva ao grupo Lena.

Ricardo Salgado: Ó sr. procurador, eu não me recordo de ter falado ao Carlos Santos Silva.

Procurador Rosário Teixeira: Em primeiro lugar, era seu cliente com alguns recursos, que até recebia os dinheiros numas contas do BESI que não são para toda a gente e que trouxe dinheiro lá de fora.

Ricardo Salgado: Para mim foi uma enorme surpresa que ele tivesse feito o RERT [ Regime Excepcional de Regularização Tributária] no BES. Eu não sabia! (…) Eu falo no Lena porquê. Porque eu vejo-o associado ao Lena e nas fotografias aparece sempre os senhores [irmãos] Barroca com o Carlos Santos Silva ao lado e o eng. José Sócrates. Uma das minhas funções é estar todos os 15 dias no terreno em Portugal a visitar as direções regionais dos centros de empresas e, portanto, nessas reuniões nós acabávamos por receber os clientes ao fim do dia. E eu parece-me que o Lena é ali da região de Leiria, não é?

Procurador Rosário Teixeira: Certo.

Ricardo Salgado: Pronto. E portanto eu posso ter recebido — e nós normalmente quando recebíamos pessoas não eram 100 ou 200, chegavam a ser 400 e 500 pessoas para cocktail e jantar, jantar em pé. Posso ter cumprimentado o Sr. Carlos Santos Silva, mas não sei! Não… Nunca eu, em plena consciência… nunca o vi. (…) Agora, nunca me passou pela cabeça que isto pudesse acontecer. Esta conjugação de relações entre o eng. Sócrates, o Lena e o Carlos Santos Silva. Não fazia ideia.

Procurador Rosário Teixeira: E muito menos tem conhecimento que tenha pedido a alguém para fazer transferências para este sr. Carlos Santos Silva?

Ricardo Salgado: Claro que não! Isso é tudo iniciativas do sr. Bataglia, que quando tinha um programa para desenvolver em Angola, para o qual estava a ser pago (…) fazia circular os recursos por trás das nossas costas desta forma. Foi uma total surpresa. (…)

Procurador Rosário Teixeira: Mas algumas dessas mesmas interpretações destes factos não saem da nossa lavra, saem de pessoas que o afirmaram e que dizem que foi o senhor que pediu precisamente para haver contas que serviam de passagem para dinheiros que vieram da [Espírito Santo] Enterprises.

Ricardo Salgado: Nunca fiz isso na minha vida.

Procurador Rosário Teixeira: Nunca pediu a ninguém: “Olhe, deixe lá passar esse dinheiro e depois transfere para a conta tal”?

Ricardo Salgado: Não, não.

Procurador Rosário Teixeira: Portanto, aquilo que aqui está em causa são duas versões sobre a existência destes pagamentos porque o sr. está-nos a dizer que deu estes dinheiros todos ao sr. Hélder Bataglia — que só nestes anos 2008, 2009 somam aqui assim os tais 22 milhões de euros — e que são pura e simplesmente para ele desenvolver negócios e para remunerações dele pelo sucesso que pudesse ter, incluindo a tal licença bancária do BESA que terá sido paga algum tempo depois. Isso é verdade da sua parte que a licença já foi paga nos anos depois. Outra coisa é dizer que parte deste dinheiro foi entregue por si ao sr. Hélder Bataglia mas para depois o reencaminhar para umas contas que o sr. Carlos Santos Silva deveria indicar.

Ricardo Salgado: Nunca ouvi falar no Carlos Santos Silva antes. Nunca ouvi falar. O Hélder Bataglia nunca me falou no Carlos Santos Silva. Nunca me falou de nada. Ele fazia o que queria (…)

Procurador Rosário Teixeira: “Pediu a alguém para fazer transferências para este sr. Carlos Santos Silva?”
Ricardo Salgado: “Claro que não! Isso é tudo iniciativas do sr. Bataglia, que, quando tinha um programa para desenvolver em Angola, (…) fazia circular os recursos por trás das nossas costas desta forma. Foi uma total surpresa.”

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As relações com José Dirceu

João Abrantes Serra, sócio de Fernando Lima (grão-mestre do Grande Oriente Lusitano) no escritório de advogados Lima, Serra e Fernandes & Associados, foi constituído arguido na Operação Marquês mas acabou por não ser acusado de nenhum ilícito criminal. Em causa estava o alegado pagamento de cerca de 944 mil euros a José Dirceu, o ex-braço direito do Presidente brasileiro Lula da Silva. A equipa do procurador Rosário Teixeira suspeitava que o escritório Lima, Serra e Fernandes & Associados, que foi contratado por Henrique Granadeiro para assessorar a PT no Brasil a propósito de uma possível fusão com a operadora Telemar, teria sido usado para fazer chegar aquele montante a José Dirceu, de forma a que este intercedesse junto das autoridades brasileiras para alegadamente favorecer a PT.

Ricardo Salgado foi confrontado com estas suspeitas, o que levou o ex-líder do BES a falar de um personagem que ficou famoso na década passada no Brasil e em Portugal: Marcos Valério, um antigo publicitário que está na origem do caso Mensalão — um processo judicial de alegada corrupção de um número muito significativo de congressistas do Partido dos Trabalhadores (PT) e que levou mesmo à primeira condenação a prisão efetiva de José Dirceu. Ricardo Salgado (BES), António Mexia (presidente da EDP) e Miguel Horta e Costa (ex-presidente da PT) chegaram a ser ouvidos como testemunhas em Portugal num inquérito criminal a propósito de acusações de Valério (conhecido como “o careca” por ser calvo) de alegado financiamento pratidário ilícito por parte daquelas empresas portuguesas ao PT. O inquérito foi arquivado.

Procurador Rosário Teixeira: Conheceu José Dirceu e em que circunstâncias?

Ricardo Salgado: O José Dirceu foi o braço direito do Lula na primeira fase do presidente brasileiro.

Procurador Rosário Teixeira: Chegou a conhecê-lo lá [no Brasil] ou cá [em Portugal]?

Ricardo Salgado: Conheci-o cá e vou-lhe já dizer: o sr. procurador deve-se recordar do período em que houve o célebre careca [Marcos Valério] que era o ‘homem da mala’ que veio a Lisboa e que foi à PT, foi ao BES e que depois foi à EDP. E então andava a procurar levantar dinheiro. E eu disse-lhe que nós não tínhamos hipótese nenhuma e que não fazia sentido estarmos a contribuir para o Partido dos Trabalhadores. Ele aparecia então como responsável por uma empresa de comunicação no estado de Minas Gerais. Veio-se a verificar que é do pior que há, lá dentro daquele grupo. E aconselhei-o a falar com o meu primo Ricardo Espírito Santo no Brasil, o que ele fez. Entretanto, acontece a queda do Dirceu, começam as investigações e há um mandado para fazer um inquérito em Portugal no qual eu fui responder. Eu, o António Mexia e o Miguel Horta e Costa, que estava na PT na altura. Para saber se tínhamos dado dinheiro para o tal sujeito, o careca. Daí que poderia ser para o Dirceu. E nós dissemos que não tínhamos feito absolutamente pagamento nenhum, que não havia absolutamente nada e que não havia relação nenhuma com o José Dirceu. E encontro o José Dirceu numa cerimónia, ali na Expo, e o José Dirceu veio-me agradecer o depoimento que eu tinha feito. Eu nem sequer o vi lá no julgamento. E foi assim que eu o conheci.

José Dirceu, ex-ministro e ex-braço-direito de Lula da Silva, foi condenado a pena de prisão efetiva no caso do Mensalão e na Operação Lava Jato (HEDESON ALVES/EPA)

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E as relações com José Sócrates

O interrogatório terminou, como não podia deixar de ser, com a relação entre Ricardo Salgado e José Sócrates. O ex-líder do BES negou qualquer proximidade ao ex-líder do PS.

Inspetor Paulo Silva: A sua relação com o sr. José Sócrates. Conhecia-o antes das funções dele como primeiro-ministro?

Ricardo Salgado: Não. Julgo que terei eventualmente tido um encontro quando ele foi do Ambiente uma vez, por causa de uma situação na Beira Baixa, onde nós tínhamos lá propriedades. Mas fora isso as minhas relações com o eng. José Sócrates foram sempre institucionais. (…) Nada de intimidades. Aliás, nunca tive relações íntimas com nenhum primeiro-ministro ou Presidente [da República]. No outro dia, dei o meu testemunho em relação ao dr. Mário Soares, foi uma coisa de facto muito especial. Foi o dr. Mário Soares que me chamou para nós [família Espírito Santo] voltarmos para Portugal, infelizmente. E nós aceitamos. (…) O dr. Mário Soares ficou chocadíssimo com tudo aquilo que aconteceu [a detenção de Salgado no âmbito da processo Universo Espírito Santo]. Mas foi um amigo fantástico e visitava-me quando estava detido em casa — ele e a senhora, a Maria Jesus Barroso — e jantavam connosco. Quando eu deixei de estar detido, passei a ir visitá-los a casa deles. Foi um homem notável no nosso país.

Inspetor Paulo Silva: E com o eng. José Sócrates então?

Ricardo Salgado: Com o eng. José Sócrates nunca tive relações de intimidade, quaisquer que fossem. Nunca falei com ele sobre esta história.

Inspetor Paulo Silva: Já agora, qual foi a última vez que esteve com ele [José Sócrates]? (…) nunca foi à sua residência em Cascais?

Ricardo Salgado: Não me recordo.

Advogado Adriano Squilacce: O sr. inspetor está a perguntar isto porque saíram umas notícias que o Sócrates esteve a jantar em sua casa.

Ricardo Salgado: Não me lembro. Pode ter ido quando ele escreveu um livro, quando regressou de Paris ou qualquer coisa assim. Escreveu um livro e foi lá a casa entregar-me o livro. Julgo que foi isso.

Advogado Adriano Squilacce: Tanto quanto é público, aliás foi o Correio da Manhã que referiu, que teria ocorrido um jantar em março, abril de 2014.

Ricardo Salgado: Não me recordo do jantar. Recordo-me do tal livro que eu nunca li. Nunca tive intimidade nenhuma com o eng. José Sócrates. (…)

A falta de intimidade não livrou Ricardo Salgado de, na perspetiva da equipa do procurador Rosário Teixeira, ser o principal protagonista da Operação Marquês. No centro do alegado esquema de corrupção que é denunciado no despacho de acusação do Ministério Público está o alegado favorecimento do Grupo Espírito Santo — o que significa Ricardo Salgado, o ex-Dono Disto Tudo.

Luís Rosa é autor do livro “A Conspiração dos Poderosos — Os Segredos do Saco Azul do Grupo Espírito Santo” (Esfera dos Livros) lançado em novembro de 2017.

Zeinal Bava e Granadeiro receberam €45 milhões de Salgado

Quinta-feira, Outubro 12th, 2017

Citamos

Sábado

Acusação diz que o CEO da Portugal Telecom recebeu 25 milhões e que o chairman da mesma empresa recebeu os restantes. Ambos através de contas na Suíça e em off-shores

A acusação não tem dúvidas que Zeinal Bava, CEO da Portugal Telecom na altura, ” recorreu a contas bancárias sediadas na UBS, na Suíça e em Singapura, quer em seu nome pessoal quer em nome da sociedade em off-shore ROWNYA OVERSEAS INC, para ocultar a origem ilícita e propriedade de quantias recebidas por determinação do arguido Ricardo Salgado e com origem em contas do Grupo BES, tendo em vista actuar de acordo com os interesses deste último no exercício das suas funções profissionais no Grupo PT, as quais atingiram um montante total de €25.200.000, entre Dezembro de 2007 e Setembro de 2011.”

Mais à frente, esmiúça os valores.
– €6.700.000, transferidos no dia 7 de dezembro da conta n.° 103’443 da ES ENTERPRISES SA a favor da conta n.° 199801, aberta junto da UBS AG SINGAPURA, em nome do arguido ZEINAL BAVA;
– €8.500.000, transferidos no dia 21 de dezembro de 2010 da conta n.° 103’443 da ENTERPRISES MANAGEMENT
SERVICES SA a favor de “M. ZENA BAVA”, para a conta com o IBAN CH670020620635031460B, aberta junto da UBS AG
Zurique;
– €10.000.000, transferidos no dia 20 de setembro de 2011 a partir da subconta 103443.01.101/EUR/PF do BANQUE PRIVÉE, titulada pela ES ENTERPRISES, a favor da conta n.° 199801 junto da UBS AG SINGAPURA, titulada pelo arguido ZEINAL BAVA.

Bava viria a “devolver” boa parte destes montantes. A acusação explica a razão:

“Com as detenções de arguidos realizadas no âmbito dos presentes autos, em novembro de 2014, o arguido Ricardo Salgado, sabendo que tinha realizado pagamentos ao arguido José Sócrates, que havia sido detido, e receando que pudessem ser identificados os pagamentos realizados ao arguido Zeinal Bava, iniciou diligências no sentido de ser montada uma justificação para o pagamento das referidas quantias.”

“Por outro lado, tendo então o arguido Zeinal Bava ainda disponibilidades financeiras para devolver um montante equivalente aos últimos pagamentos recebidos, em 2010 e 2011, num total de €18.500.000,00, resolveram os arguidos Zeinal Bava e Ricardo Salgado iniciar contactos no sentido de poder ser devolvido o referido montante.”

O problema colocava-se agora na justificação desta operação. Bava e Salgado acordaram forjar um contrato, segundo o despacho.

“Fizeram então produzir um documento, em língua inglesa, designado de acordo (“agreement”), sob forma contratual, destinado a enquadrar o recebimento daqueles pagamentos, no qual fizeram apor a data de 20 de dezembro de 2010, e em que fizeram figurar como partes o primeiro arguido e a ES ENTERPRISES”.

Uma das cláusulas revelva que “a ES ENTERPRISE acordava disponibilizar ao arguido ZEINAL BAVA um financiamento no valor máximo de €30.000.000,00 (trinta milhões de euros) para que este último adquirisse até 5.000.000 (cinco milhões) de ações da PORTUGAL TELECOM, em nome da primeira sociedade, assim que o processo de privatização da PT estivesse completo e essa companhia passasse a ser totalmente privada.”
Bava não comprou nenhum acção.

“Tendo conhecimento da existência de um pagamento anterior à data que haviam feito apor no referido pretenso acordo,
pagamento de €6.700.000,00 feito ao arguido Zeinal Bava em dezembro de 2007, os arguidos Zeinal Bava e Ricardo Salgado acordaram entre si que, caso o mesmo pagamento fosse identificado, utilizariam os termos do referido acordo para justificar o mesmo pagamento.”

Quanto a Henrique Granadeiro, usou o mesmo sistema suíço, mas “utilizou contas sediadas no Banque Pictet, tituladas quer em nome pessoal quer em nome da entidade em off-shore GRANAL LTD INC”.

Segundo o despacho, o chairman na PT à altura dos factos, recebeu “por determinação e na sequência de acordo com o arguido Ricardo Salgado, tendo em vista actuar de acordo com os interesses do mesmo, no período entre Maio de 2006 e Novembro de 2012, no âmbito do exercício das suas funções profissionais no PT, a quantia total de €23.967.907.”

Deste valor, €3.967.611,00 “foram transferidos das contas de Henrique Granadeiro para conta na Suíça controlada pelo arguido Ricardo Salgado e titulada pela entidade BEGOLINO, tendo permanecido na esfera patrimonial deste ultimo, conforme acordado entre os dois arguidos.”

A acusação diz que no total, Granadeiro beneficiou para si próprio, de pagamentos indevidos no montante total €20.000.296.”

Os pagamentos eram referentes à OPA da Sonae sobre a PT e ao comportamento dos gestores em favor das pretenções do Grupo Espírito Santo.

As revelações de Ricardo Salgado sobre Sócrates e muito mais

Quinta-feira, Outubro 12th, 2017

Citamos

Visão

Durante quatro horas de interrogatório, o banqueiro explicou a sua relação com José Sócrates e justificou a saída de fundos do GES para Zeinal Bava, Henrique Granadeiro e para uma offshore em seu nome. Leia aqui a versão do arguido da Operação Marquês, relatada na VISÃO de 2 de Março

O procurador Rosário Teixeira demorou mais de 30 minutos a ler as razões porque Ricardo Salgado estava a ser ouvido como arguido na Operação Marquês. No final, o ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES) só conseguia falar em “choque”. Pediu desculpa ao magistrado pela afronta e disse nunca ter visto “tanta mentira junta”.

Rosário Teixeira perguntou-lhe se não queria tempo para conferenciar com os seus advogados numa outra sala do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), e Salgado, abatido, pediu apenas “um copinho de água”, alegando que quem sofria um choque daqueles o merecia. Ainda bem que tinha “alguma preparação física”, desabafaria mais à frente. Caso contrário, teria “caído para o lado” com as acusações que lhe faziam.

Seguir-se-iam quase quatro horas de um interrogatório tenso, de que a VISÃO teve conhecimento e revela em exclusivo, e em que o ex-líder do BES foi “apertado” pelos investigadores para explicar transferências bancárias de mais de €90 milhões feitas pelo Grupo Espírito Santo (GES). Para responsáveis políticos, em Portugal e no Brasil, administradores da PT e até para o próprio Ricardo Salgado, entre 2006 e 2014.

Foi uma das revelações mais surpreendentes do interrogatório.

O Ministério Público (MP) descobrira que tinham sido “desviados” da Espírito Santo Enterprises (o alegado saco azul do GES) €7,75 milhões para uma conta da Savoices, offshore que era, nada mais, nada menos, de Ricardo Salgado. A equipa liderada por Rosário Teixeira acreditava que o então presidente do BES o teria feito deliberadamente, para também “tirar proveitos” dos negócios da PT e ocultar esses valores das suas declarações de rendimentos. As suspeitas eram gravíssimas: Salgado não só era apontado como o corruptor de José Sócrates e de administradores da PT, como era suspeito de ter prejudicado as contas do grupo que liderara durante mais de duas décadas, ao desviar o dinheiro para contas suas e para pagar subornos. O Grupo Espírito Santo ruiu, a PT também.

Chamado a explicar-se, o antigo banqueiro disse ter recorrido àquela empresa do grupo, em 2010 e em 2011, para ter financiamento e assim entrar em aumentos de capital do banco. Só não devolveu todo o dinheiro porque teria sido desse bolo que pagara a caução de €3 milhões que “o sr.

procurador tinha feito questão” de lhe estabelecer, no processo Monte Branco. E não tinha mais “recursos”, como Rosário Teixeira bem saberia: “Congelou-me as contas na Suíça!”, queixou-se.

Para explicar as razões que motivariam Salgado a corromper políticos e gestores em negócios da PT, o procurador começou por recuar até 2006, altura em que a Sonaecom, de Belmiro de Azevedo, lançou uma oferta pública de aquisição (OPA) sobre a PT.

À época, diz o MP, Ricardo Salgado teria um controlo real sobre a operadora telefónica: porque o BES tinha uma participação direta de 8,3% na PT e porque era próximo de membros da comissão executiva da empresa.

O estatuto permitia-lhe dar início a um plano para a OPA ser chumbada.

Perder a PT significaria perder dividendos e capacidade de influência, em Portugal e no Brasil. Por essa razão, diz a investigação, Salgado terá procurado apoio político para bloquear uma eventual decisão favorável à OPA, acordando com José Sócrates “o pagamento de uma quantia”, que deveria chegar à posse do então primeiro-ministro “de forma oculta”, com recurso a intermediários, contratos forjados e contas de passagem.

Nesta primeira fase, Ricardo Salgado terá “simulado” financiamentos à Escom empresa do Grupo Espírito Santo e do luso-angolano Hélder Bataglia para fazer o dinheiro chegar, de forma encapotada, a José Sócrates. Bataglia, acionista da Escom, e Pedro Neto, administrador da empresa, terão visto passar pelas suas contas €7,5 milhões, entre abril e maio de 2006. Desses, €6 milhões foram transferidos para uma conta na UBS de José Paulo Pinto de Sousa, primo de José Sócrates residente em Angola, e já referenciado no processo Freeport. Uma parte terá sido enviada em numerário para Portugal, através de um circuito paralelo; e outra parte terá, mais tarde, sido transferida para as contas suíças do empresário e então administrador do grupo Lena, Carlos Santos Silva, suspeito de ser o testa de ferro de Sócrates.

O suposto plano de Ricardo Salgado para não perder o controlo da PT não terminaria aí. Em 2007, o então líder do BES terá acordado com Sócrates e com administradores da operadora telefónica “novos pagamentos” para levar avante a estratégia de reestruturação da PT e de investimentos no Brasil. Fundos de €7 milhões foram transferidos da Espírito Santo Enterprises (E.S. Enterprises) para Bataglia em julho de 2007, justificados por um contrato que o MP diz ter sido forjado entre a Markwell, offshore do luso-angolano, e a Pinsong, uma subsidiária da E.S. Enterprises.

Dos €7 milhões, €3 milhões chegariam a Santos Silva.

No mesmo mês, aquela empresa do GES passou também a ser o veículo para distribuir dinheiro aos administradores da PT. O primeiro contemplado foi Henrique Granadeiro, então chairman da empresa, que terá recebido €6,5 milhões numa conta do banco Pictet, na Suíça. Em dezembro, também Bava receberia, numa conta em Singapura, os seus primeiros €6,7 milhões com origem no GES. Esse pagamento nunca foi tornado público: o antigo gestor da PT assumira ter recebido €18,5 milhões do GES em 2011, mas ocultara esta transferência de 2007. No total, terá recebido mais de €25 milhões.

€48 MILHÕES PARA ADMINISTRADORES DA PT

Durante o interrogatório, Salgado justificou as transferências de 2011 para Zeinal Bava com o que chamou de “garantia fiduciária”. Disse que deu adiantamentos ao então presidente–executivo da PT para garantir que a sua equipa de gestores brilhantes, com Bava “montado em cima do cavalo”, não abandonava a corrida antes de pôr em ordem a brasileira Oi. E a transferência feita em 2007 para Bava? Salgado não sabia explicar.

Entre 2010 e 2012, contas no banco Pictet voltaram a ser alimentadas, desta vez com €5,5 milhões e cerca de 15 milhões de francos suíços (à data o equivalente a cerca de €12 milhões).

Salgado associou essas transferências a Granadeiro, constituído arguido a 24 de fevereiro, dia em que Zeinal Bava também foi ouvido e constituído arguido. São suspeitos de corrupção passiva, fraude fiscal e branqueamento de capitais na Operação Marquês.

Sobre estes movimentos bancários para o ex-chairman da PT, Salgado já tinha explicações. Ou parte delas.

Primeiro, que o dinheiro serviria para pagar favores antigos do gestor, do tempo em que a família do banqueiro decidira investir em negócios ruinosos de cerâmicas. Depois, que seria para pagar a aquisição de parte de uma quinta de Granadeiro, reconhecido por Salgado como “um dos maiores sábios” da área agrícola e produtor de “uns vinhos fantásticos”. Qual quinta? Não sabia. Que participação? Não se lembrava. E o contrato? Não chegou a ser redigido, disse Salgado, garantindo porém que de certeza teria sido feita uma avaliação. No total, os administradores da PT terão recebido mais de €48 milhões, mais do dobro dos €22 milhões que terão chegado a Sócrates pelas suas alegadas interferências políticas nos negócios da operadora telefónica.

No ano de 2010, novas propostas alargaram os horizontes da PT.

A operadora portuguesa e a espanhola Telefónica tinham participações na brasileira Vivo. Em junho de 2010, a Telefónica formalizou uma proposta para adquirir a participação da PT.

À primeira vista, o negócio era bom para a empresa portuguesa, que encaixava o dinheiro da venda da Vivo e ganhava fundos para entrar no capital da Oi, outra operadora de telecomunicações brasileira.

Salgado não estava convencido.

Nesse momento, segundo o MP, o antigo banqueiro terá montado uma estratégia “para convencer o poder político a usar a goldenshare” detida pelo Estado na PT. A assembleia geral da PT concordou na venda da participação da Vivo à Telefónica. E no mesmo dia Sócrates usou as “ações douradas” para bloquear o processo.

A estratégia permitiu que a Vivo subisse a oferta de €7,15 mil milhões para €7,5 mil milhões, um valor que se considerava impensável. Na mesma data, a PT fez um acordo prévio para aquisição de capital da Oi.

Uns meses depois, em novembro, os administradores da PT foram compensados pela estratégia de expansão para o Brasil com novas transferências da E.S. Enterprises. Nas mesmas datas, Salgado recebeu dinheiro daquela empresa na sua Savoices e €4 milhões foram transferidos para Álvaro Sobrinho, então presidente do BES Angola.

O MP também descobriu movimentos em sentido inverso: entradas de verbas na E.S. Enterprises vindas da Socidesa, uma sociedade offshore com ligações à família de Sobrinho e que terá beneficiado dos créditos sem garantias dados pelo banco angolano. Salgado não soube explicar nenhuma das operações, mas lembrou não ser a única pessoa do grupo a poder movimentar as contas da empresa.

“NUNCA FUI ÍNTIMO DE SÓCRATES”

Ricardo Salgado acabaria por não se ficar só pelo “copinho de água”. Depois de uma paragem, regressou à sala do DCIAP e quis fazer uma declaração sobre o seu caráter: teria cometido erros de julgamento mas não “erros de princípio”. Nunca tinha falado “com o engenheiro José Sócrates” sobre a história da PT. E muito menos tinha entregado subornos a um ex-primeiro-ministro. E as coincidências das datas das transferências do Grupo Espírito Santo com as datas de decisões importantes para a PT? Salgado reconhecia a coincidência e respondia com humor: “Já ouvi falar várias vezes do diabo. Isto foi o diabo.” Com José Sócrates diz ter mantido apenas “relações institucionais”. “Nada de intimidades.” Aliás, nunca tivera relações íntimas com nenhum primeiro-ministro. Nunca usara contas de passagem. E tinha ficado “perplexo” por o dinheiro ter ido parar a Santos Silva, que jurou nunca ter visto. De resto, tinha estado duas vezes contra Sócrates publicamente: quando disse que a Vivo não devia ser vendida e quando, em 2011, foi à TVI defender a intervenção da troika. Desde então, acreditava que o ex-primeiro-ministro estaria “um bocado torcido” consigo. Depois disso, Sócrates não teria ido jantar à sua casa em Cascais?, perguntaram-lhe. Salgado tinha a vaga ideia de ter recebido uma visita de Sócrates no seu regresso de Paris, a pretexto da entrega do seu livro, que o banqueiro disse nunca ter lido. Nesse contexto, admitia lapsos de memória, mas não sobre passagens de dinheiro.

Isso, disse, só podia ter sido feito por uma pessoa: “Hélder Bataglia.”

DOIS PÁSSAROS, AS MESMAS PENAS

Desde o início da conversa que Ricardo Salgado pedia paciência e tentava interromper a ordem das perguntas para falar sobre as suas relações com Hélder Bataglia. Naquele dia, 18 de janeiro, Salgado já sabia que estava ali por causa do depoimento demolidor daquele que foi o homem do GES em África. Cerca de duas semanas antes, Bataglia tinha ido a Lisboa incriminar Salgado, dizendo que o então presidente do BES lhe pedira para ser intermediário do dinheiro para Santos Silva.

Salgado estava inquieto por ripostar.

E na onda acabou também por arrastar o ex-presidente do BES Angola (BESA), dizendo que, “ao buracão” de Sobrinho (havia 5 mil milhões de dólares de créditos irregulares no BESA), hoje já não tinha receio de juntar o nome de Bataglia. Salgado citou até o que dizia ser um provérbio inglês: “Pássaros com as mesmas penas voam juntos.” Contou que seria uma cunhada de Sobrinho a aprovar os créditos no BESA e que o angolano, escolhido para o cargo pelos seus dotes matemáticos, teria usado a matemática “só para benefício próprio”.

O ex-presidente do BES ia lançado e não poupou nas palavras. Quando ouviu que Bataglia tinha dito que vendera a sua posição no BESA a Sobrinho por 60 milhões de dólares, questionou de onde viria esse dinheiro, afirmando ter “quase a certeza” de que saíra dos cofres do banco em Angola. Nessa altura, insistiu, Sobri nho já se teria “servido muito bem” e já se falava que sairia de Angola com o dinheiro “em malas”. Salgado estranhava que tivesse comprado uma torre na Escom (o mais emblemático prédio de Luanda) por 400 milhões de dólares, financiado pelo BESA, e posteriormente vendido a torre por 800 milhões a outra entidade, também financiada por aquele banco. Para Salgado, era um escândalo como em Angola ainda ninguém lhe tinha tocado.

Para o ex-presidente do BES, isso só se explicava de uma maneira: com a existência de mais pessoas a lucrarem com o prejuízo do banco.

Embalado, Salgado chegou mesmo a levar para a história nomes de generais.

Disse ter ficado surpreendido ao saber que a equipa liderada por Rui Guerra que substituiu Álvaro Sobrinho no comando do BESA tinha chegado a Angola com “passaportes militares” e sido reencaminhada para o general Leopoldino Nascimento (“Dino”). “O Kopelipa era mais regrado”, terá então comentado Salgado.

O ex-líder do BES recordou como Bataglia tinha entrado no grupo nos anos 90; e como o BES tinha ajudado Angola ao liderar um sindicato bancário, que deu um empréstimo para o país conseguir pagar uma parte da sua dívida. Aqui, Salgado brincou. Disse que se as pessoas agora não gostavam de ouvir falar de offshores deviam saber que o Estado português tinha montado uma nesse negócio, para onde iriam os fundos para pagar a Portugal com “garantias de barris de petróleo”. Ironia maior ainda, lembrava Salgado, é que na mesa dessas reuniões estivesse sentado Carlos Costa, então na área internacional do BCP, e hoje governador do Banco de Portugal.

Depois da expansão dos negócios da Escom, o BES consegue a licença para abrir o primeiro banco de direito angolano e o BESA começa a crescer brutalmente. Cresce tudo de forma tão “inusitada” que Bataglia salta dali para o Congo Brazzaville. Para Salgado, esta terá sido mais uma forma de “passar dinheiros de Angola para fora”.

A primeira vez que se sentira traído por Bataglia aconteceu quando “um chinês esquisitíssimo” chamado Sam Pa, trazido na mão pelo luso-angolano, quis fazer negócios com o GES e lhes “passou a perna”. Certo é que, por mais desavenças que tivesse com Bataglia, e por mais que o chateasse que o fundador da Escom estivesse a toda a hora a pedir “success fees”, Salgado até assinou um contrato de prestação de serviços em 2005, prometendo remunerá-lo em negócios do petróleo aos diamantes, como diz ter feito.

O MP não acredita na veracidade deste contrato. Dos €29 milhões que o GES terá dado a Bataglia, o luso-angolano só terá ficado com €7 milhões.

A BONDADE NOS NEGÓCIOS DA PT

Salgado arrancou sorrisos na sala ao dizer que todas as decisões que tomou enquanto acionista da PT tinham sido em defesa da empresa e não com “objetivos maquiavélicos”. E lamentou o facto de hoje já não conseguir convencer as pessoas da sua “bondade”.

Contou que soube pelo bilionário mexicano Carlos Slim que a Telefónica iria comprar a Vivo. Slim estaria interessado porque era concorrente da Telefónica no Brasil. E Salgado não via razões para apoiar a OPA, nem para favorecer os espanhóis na venda da participação na Vivo, numa altura em que todos tinham interesse em estar no Brasil.

Também desmentiu ter forçado Nuno Vasconcellos, então presidente da Ongoing, a entrar no capital da PT.

Vasconcellos era “Rocha dos Santos” pelo lado materno e, por aí, tinha capitais.

O erro, diz, foi que Vasconcellos “exagerou” ao convencer-se de que a Ongoing iria ser “uma grande empresa de multimédia”.

Sobre os alegados lucros obtidos com a separação entre a PT e a PT Multimédia, em 2007, Salgado teimou em desmenti-los, puxando dos galões por ter sido durante 12 anos membro do Nyse Euronext, em Nova Iorque: “Ó sr. procurador, se alguém sabe alguma coisa de mercados sou eu!” O ex-presidente do BES foi então levado a explicar as alterações no conselho de administração da PT, com a saída de Miguel Horta e Costa e a entrada de Henrique Granadeiro.

É que César Alierta, presidente da Telefónica, teria convidado Horta e Costa para o conselho de administração da operadora espanhola. Além disso, recordou Salgado, a imagem do gestor estava denegrida na empresa.

Porque, além de Horta e Costa “se vestir muito bem” e ter “gravatas muito bonitas”, seria conhecido pelas viagens ao Brasil, “despesas sumptuárias” em festas e por ir a Paris apanhar um avião para São Paulo só para ir recostado “em cadeiras-cama”. Granadeiro, por seu turno, seria “extremamente controlado” nas despesas.

MILHÕES PARA HOMEM DE LULA

No interrogatório, que estava a ser gravado, o MP destacou Salgado como o grande impulsionador de outro plano para favorecer as parcerias da PT no Brasil. Salgado terá convencido a administração da PT a fazer pagamentos de 500 mil euros a José Dirceu, então braço-direito do presidente Lula da Silva, através de “pretensos contratos” de prestação de serviços com a sociedade de advogados de Abrantes Serra, já constituído arguido na Operação Marquês. Terá ainda desembolsado mais de €1,2 milhões (sem IVA) para Dirceu, através da Espírito Santo Financial, outra empresa do GES. Para o efeito, terão sido encenados outros contratos de prestação de serviços com aquele escritório, que justificavam uma avença de 30 mil euros por mês.

Esses pagamentos, que se estenderam durante três anos, terão acabado numa conta que seria usada exclusivamente para pagar despesas, designadamente viagens, do ex-ministro Dirceu, condenado em 2016, no Brasil, a uma pena de 23 anos de prisão no processo Lava-Jato.

Salgado insistiu que o dinheiro não era para Dirceu, mas para pagar ao escritório de advogados que tinha correspondentes no Brasil, para o ajudarem num processo judicial antigo relacionado com a invasão de uma propriedade da família. Mas Rosário Teixeira não descolava dos factos: Dirceu reunira-se em Portugal com Granadeiro e os pagamentos entregues a Abrantes Serra tinham acabado numa conta bancária onde, durante muitos anos, não tinha caído um cêntimo além dos do GES. Rosário Teixeira terá então desabafado em voz alta: “Outra vez essas coincidências…”

Para quem foi o dinheiro

O Grupo Espírito Santo terá distribuído mais de €90 milhões, de forma encapotada, por responsáveis políticos, administradores da PT e banqueiros, incluindo o próprio Ricardo Salgado

Os pagamentos para a PT

Em 2007 saíram cerca de €13,2 milhões da Espírito Santo Enterprises, do GES, para contas de Zeinal Bava e Henrique Granadeiro.

A 9 de julho saem €6 milhões para Granadeiro e a 7 de dezembro mais 468 mil euros. Nesse mesmo dia de dezembro, Bava recebe €6,7 milhões. De 2010 a 2012, decorre uma nova ronda de pagamentos.

São feitas cinco transferências para contas no banco Picté, na Suíça, que Salgado associa a Granadeiro no interrogatório. Em janeiro de 2011, uma conta em Singapura de uma offshore de Bava recebe €8,5 milhões. Outros €10 milhões chegam em setembro desse ano.

No total, os administradores da PT terão lucrado mais de 48 milhões de euros.

Os pagamentos para Sócrates

Segundo o Ministério Público, Salgado terá dado as primeiras ordens de transferências para o então primeiro-ministro em abril de 2006. Os fundos vêm do BES Angola e da Sucursal Financeira Exterior do BES, através de supostos financiamentos à Escom, a empresa do Grupo Espírito Santo em que Hélder Bataglia detinha 33%. Seguem para uma conta do BESA no Santander. Passam por Hélder Bataglia e Pedro Neto, administrador da Escom. Vão para uma conta de José Paulo Pinto de Sousa, primo de Sócrates.

Uma parte chega a Portugal em numerário, através de um circuito paralelo. Outra segue para as contas suíças de Santos Silva, mas só em 2008. Em julho de 2007, seguem mais €7 milhões para Bataglia, mas desta vez com origem no alegado saco azul do GES (a Espírito Santo Enterprises): só €3 milhões chegam a Santos Silva. Em 2008 e 2009, a ronda de pagamentos para Sócrates completa-se com a chegada à Suíça de €12 milhões, através de duas offshores de Bataglia, a Monkway e a Markwell. O primeiro circuito financeiro não incluiria Carlos Santos Silva. Na verdade, o empresário só foi chamado ao plano de ocultação de fundos em 2008. Até então, segundo Rosário Teixeira, o alegado testa de ferro seria José Paulo Pinto de Sousa, primo de José Sócrates residente em Angola, conhecido como “O Gordo”. O problema começou quando José Paulo passou a ser visado em investigações judiciais, como o processo Freeport, que rebentara nas vésperas das eleições legislativas e continuaria a perseguir Sócrates depois de ser eleito. Era preciso desviar os fundos para alguém mais discreto, que escapasse aos olhos da justiça.

Terão então escolhido Santos Silva.

Os pagamentos para Ricardo Salgado

Depois de concluída a venda da participação na Vivo por mais €350 milhões (devido ao uso das “ações douradas” pelo Estado), e da entrada da PT no capital da operadora Oi, o alegado saco azul do GES transferiu a 8 e a 18 de novembro de 2010 mais €7,5 milhões para a Green Emerald, offshore de Bataglia.

Só que desta vez o destinatário final não seria José Sócrates. A 9 de novembro são feitas duas transferências para a sociedade Savoices, de Ricardo Salgado, no total de €2,75 milhões. A 21 de outubro de 2011, outros €4 milhões seguem diretamente da Espírito Santo Enterprises para a Savoices, que acumula assim €6,75 milhões.

Em 2011, a Green Emerald volta a distribuir verbas que tinham ficado guardadas desde a transferência do GES, ainda em 2010: a 3 de janeiro saem €4 milhões com destino à Grunberg, de Álvaro Sobrinho, então presidente do BESA.

Granadeiro desmentido sobre dinheiro do GES

Terça-feira, Setembro 5th, 2017

Citamos

Observador

 

O Ministério Público não compra a tese de que o GES transferiu dinheiro para Granadeiro pela compra de 30% da sociedade que detém a Herdade do Vale de Rico Homem. A investigação não encontrou provas de que a venda tenha sido consumada.