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BES: José Maria Ricciardi garante que foi feita provisão para ressarcir lesados

Quinta-feira, Abril 28th, 2022

Citamos

Dinheiro Vivo

Antigo presidente do Banco Espírito Santo Investimento (BESI), José Maria Ricciardi, afirma que é “testemunha de que foi constituída a provisão” e que vai testemunhar ao lado lesados do BES, caso seja necessário.

O antigo presidente do Banco Espírito Santo Investimento (BESI), José Maria Ricciardi, garantiu esta terça-feira que foi feita uma provisão para ressarcir os lesados do BES e mostrou-se disponível para testemunhar isso mesmo em tribunal.

“Fui testemunha viva de que se fez uma provisão absolutamente integral para vos pagar aquilo que vos era devido e que resultou da vossa confiança num nome que, infelizmente, apesar de ter sido credível durante muitos anos, foi destruído”, afirmou ao grupo de lesados que se esta terça-feira manifestou no Campus da Justiça, em Lisboa.

“Sou testemunha de que foi constituída a provisão e testemunharei a vosso lado se alguma vez necessitarem”, reforçou antes da entrada no tribunal.

José Maria Ricciardi falou brevemente com o grupo de lesados que se tem manifestado ao longo da tarde e lamentou a situação vivida por estas pessoas, considerando-a “muito triste” e que “devia ser prioritária” para a justiça.

Num dia em que estava agendada a sua inquirição como testemunha no arranque da fase de instrução do processo BES/GES, o primo do antigo líder do Grupo Espírito Santo, Ricardo Salgado, acabou por sair poucos minutos depois de chegar, tendo sido adiado o seu depoimento, uma vez que as diligências conduzidas pelo juiz de instrução Ivo Rosa estavam atrasadas.

Sublinhando ser também testemunha do Ministério Público (MP) neste caso – que não chama a depor na instrução, fase apenas reservada a arguidos e assistentes -, o ex-presidente do BESI admitiu ter ficado bastante surpreendido quando foi conhecida a acusação do processo, face à sua “dimensão”.

“Agora já não estou surpreendido. Aquilo que se passou e que está devidamente comprovado é que havia um conjunto de factos importantíssimos que foram ocultados. Quando se souberam, souberam-se. E havia pessoas que sabiam e pessoas que não sabiam, pessoas que reportaram às autoridades e outras que não reportaram. Foi o meu caso, quando tive conhecimento. Era a minha obrigação”, vincou.

José Maria Ricciardi, que confirmou não ter hoje qualquer relação com Ricardo Salgado, reiterou ainda aos jornalistas a sua vontade de criar uma instituição bancária.

“É muito difícil, mas vou tentar fazê-lo: primeiro, para tentar limpar o nome que foi destruído e que tinha 150 anos e fez estes senhores investirem; segundo, se tiver algum sucesso e se ainda puder ajudar a ressarcir uma parte do que estes senhores sofreram, também o farei”, concluiu o antigo membro da comissão executiva do BES, de 67 anos.

As diligências da primeira sessão da instrução contemplavam a audição de quatro testemunhas arroladas pelo arguido João Martins Pereira (diretor de compliance do BES e acusado de três crimes de burla qualificada), nomeadamente Carlos Calvário, Ana Saraiva, Nelson Pita e José Maria Ricciardi.

Porém, a inquirição de Carlos Calvário prolongou-se por mais tempo do que o esperado e o juiz Ivo Rosa acabou por adiar as audições das duas últimas testemunhas, fechando a sessão desta terça-feira com o testemunho de Ana Saraiva.

O processo BES/GES conta com 30 arguidos (23 pessoas e sete empresas), num total de 361 crimes.

Considerado um dos maiores processos da história da justiça portuguesa, este caso agrega no processo principal 242 inquéritos, que foram sendo apensados, e queixas de mais de 300 pessoas, singulares e coletivas, residentes em Portugal e no estrangeiro. Segundo o Ministério Público (MP), cuja acusação contabilizou cerca de quatro mil páginas, a derrocada do Grupo Espírito Santo (GES), em 2014, terá causado prejuízos superiores a 11,8 mil milhões de euros.

Ricciardi: “Vou tentar criar um banco para regenerar o nome da família Espírito Santo”

Segunda-feira, Outubro 25th, 2021

Citamos

Público

José Maria Ricciardi, ex-administrador do BES, defende que o Novo Banco devia ter ficado na esfera do Estado até ser saneado. E confessa: “Se conseguir começar a fazer a regeneração da família Espirito Santo partirei desta vida com a consciência tranquila”.

José Maria Ricciardi volta a explicar o seu papel em toda a crise que resultou na queda do BES, numa altura em que o processo de Ricardo Salgado vive horas decisivas. Sobre a actualidade, diz-se preocupado com a crise de energia “que pode levar à falta de produtos, à alta da inflação, a uma subida das taxas de juro”, um quadro que se agrava em países com altos níveis de endividamento como Portugal. Repesca a velha tese do choque fiscal como solução para se crescer de forma sustentável e poder pagar salários mais altos, diz que Portugal tem que aproveitar a reindustrialização europeia para desenvolver o seu sector industrial e declara: a “minha geração falhou”.

Tem acompanhado os julgamentos de Ricardo Salgado e do BES?
Tenho. Mas devido à pendência dos processos em curso e devido ao facto de ter sido chamado como testemunha do Ministério Público (MP), isso leva-me a não fazer qualquer comentário.

A defesa de Ricardo Salgado mantém a tese de que todas as decisões envolvendo o BES e o GES eram tomadas pela família e os órgãos sociais, o que também o atinge.
A verdade dos factos será com certeza confirmada e nem vou pôr-me a discutir.

Há uma dúvida legítima: como é que um ex-membro do conselho de administração do BES, como foi o seu caso, pode alegar que não sabia de nada do que ali se passava?
Compreendo a dúvida e sei que nunca irei convencer toda a gente e a única coisa que posso dizer é que após seis anos de toda a minha vida ter sido passada a pente fino, escrutinadas as minhas contas, o que fiz e o que não fiz, o que sabia e o que não sabia, por uma equipa de quase 30 elementos, que incluíam sete procuradores do MP, gente do Banco de Portugal (BdP), da CMVM e da Autoridade Tributária, fui totalmente ilibado. Estas entidades têm acesso a informações que mais ninguém tem e concluíram que existia um grupo a funcionar em circuito fechado, como uma célula, com comunicações encriptadas, que recebia dinheiro de um saco azul. E que era muito difícil aos outros administradores, auditores e reguladores terem conhecimento. Uma coisa é desconfiar, outra é ter provas.

No BES chegou a ter o pelouro do risco…
Esse tema está um bocado estafado. Mas pronto, vamos ver se desta vez consigo explicar: uma pessoa pode ter desconfianças, ter dúvidas ou achar que algo não bate certo, mas não são provas. E isto não é nenhuma desculpa. Se o MP com capacidade legal, com cartas rogatórias e meios, demorou seis anos a apanhar os movimentos que passavam todos lá por fora, por offshores, com esquemas de engenharias financeiras sofisticadas… Agora ponha-se nos meus sapatos e diga-me como é que eu podia saber? Que poderes investigatórios eu tinha? Tinha menos do que um auditor. Diz que eu tinha que saber, mas eu só podia saber se o Salgado desabafasse comigo. E mesmo aos que jogavam com ele, nunca dizia tudo: a um dizia 10%, a outro mais 10%, e a outro, outros 10%. Só ele sabia de tudo. Eu era um tipo completamente marginalizado e a ES Enterprise não consolidava com o grupo. E quando comecei a ter provas transmiti-as imediatamente ao BdP.

Mas podia ter feito melhor?
Com toda a humildade digo: provavelmente sim. Mas fiz tudo o que podia, e de toda a família sou o único a continuar a trabalhar no sector financeiro, cuja idoneidade nunca me foi retirada. E estive como presidente executivo do antigo BESI até 2017 quando saí, não por razões regulatórias, mas por divergências estratégicas.

A exposição descontrolada do BES ao BESA, expressa nas contas, que passou de 3,7 mil milhões, em 2011, para 6,1 mil milhões em 2013, não lhe acendeu a luz vermelha?
Não havia exposição descontrolada. Todos os bancos em Angola tinham um rácio de transformação elevado: muito mais empréstimos do que depósitos. O problema nunca esteve nas linhas bancárias que o BES teve nas suas subsidiárias. O problema estava na carteira de crédito que existia no BESA, auditada, sujeita a testes de stress, avaliada pelo BdP, e todos nos davam os parabéns pela situação fantástica em que o banco se encontrava, diziam que estava tudo fantástico. De Angola só vinham boas notícias.

Tendo em conta os interesses de milhares de pequenos aforradores do banco, como é que nunca se interpelou sobre o que se passava no BESA [a exposição do BES ao BESA equivalia em 2014 a 47% dos fundos próprios do BES]?
Estou cansado de explicar que não podia ter tido conhecimento, não tinha qualquer responsabilidade no BESA.

O ex-governador do BdP e vice governador do BCE no Parlamento mencionou o tema BESA…
Peço-lhe que não insista.

Tenho que insistir. Vítor Constâncio disse que a exposição do BES a Angola “devia ter sido travada” pelo BdP e pelos gestores logo em 2011.
Os processos do BESA foram analisados tanto judicialmente, como pelo BdP, e as pessoas com responsabilidades foram responsabilizadas.

O MP não o acusou de ilegalidades…
Não é uma questão de ilegalidades. É que se um gestor tem uma informação e não a comunica, incorre num acto censurável, já nem falo em ilegalidade. E as conclusões de todos aqueles que avaliaram o BESA é que houve alguns administradores, como era o meu caso, que não tinham acesso ao que ali se passava.

No julgamento de José Sócrates, o MP contestou o facto do juiz Ivo Rosa ter ignorado a credibilidade do seu testemunho. A ideia é que não foi responsabilizado pelo MP e pelo BdP por ter testemunhado a favor das duas entidades.
Apenas contei o que sabia ao MP. No BdP é diferente, dei informações logo em 2012 e em 2013, assim que tive conhecimento de factos importantes graves, exercendo a minha obrigação de dever de diligência.

Tem defendido o BdP dizendo que não podia ter actuado antes de 2014, mas agora diz que lhe facultou informações em 2012 e 2013.
Com a informação que tinha, o BdP foi actuando. Há outros aspectos criticáveis tanto ao BdP, como ao Governo do dr. Pedro Passos Coelho, que foi a resolução do BES. Quem quis a solução foram as autoridades europeias, que usaram um banco centenário para fazer experiências. O resultado está à vista: um prejuízo brutal para os contribuintes portugueses, para os stakeholders do BES, accionistas, obrigacionistas, detentores de papel comercial.

Gosta de elogiar a acção de Pedro Passos Coelho enquanto primeiro-ministro, mas foi ele que decidiu resolver o BES.
Sou seu amigo e admiro-o. Mas se o tema BES tivesse sido tratado por este Governo o desfecho teria sido provavelmente outro, pois o actual primeiro-ministro sabe negociar com Bruxelas. E isto não tem nada de ideológico, o BES devia ter ficado no Estado, e ter-se negociado uma capitalização pública, tal como se fez no britânico Lloyds, o maior banco do Reino Unido, que estava numa situação extremamente difícil. O Estado ficou dono do Lloyds, contratou uma equipa muito profissional, e acabou a revender parte das suas acções com lucro para os contribuintes ingleses.

Que avaliação faz da gestão do Novo Banco?
Só posso avaliar a gestão do Novo Banco (NB) quando souber o nome dos últimos beneficiários dos fundos compradores das carteiras de activos e quando souber quanto ganharam os compradores, se 15% ou se 70%. Estamos num quadro de taxas de juro muito baixas, entre zero e meio por cento, e se a rentabilidade dos compradores [dos activos] tiver sido de 6%, de 7%, vá lá, até 15%, é aceitável. Agora se os compradores tiverem tido 60%, 70% ou 80% de lucro, já não é. E grande parte da margem de lucro foi suportada pelo Fundo de Resolução (FdR) e pelos contribuintes. Na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), os deputados não conseguiram apurar duas coisas essenciais: o nome dos compradores finais dos activos do NB e quanto é que ganharam. E sem estas informações não posso responder à sua pergunta.

Se em vez de ser detido em 75% pelo Lone Star (LS), o NB fosse detido pelo Estado, as vendas dos activos teriam tido outro impacto nos contribuintes? 
Claro. Vou fazer contas: se tenho um activo no NB [detido pelo Lone Star] que está nos meus livros por 100 e se o vendo a um intermediário por 20, e o intermediário depois o vende por 80, então os 80 que vou perder – a diferença entre os 100 registados nas contas e os 20 a que compra o intermediário – é prejuízo do banco, neste caso, suportado pelo FdR e pelos contribuintes portugueses. E o lucro que o intermediário tem, entre os 20 e os 80 é todo dele. Se o banco estivesse no Estado, então não haveria intermediários e a margem de lucro desaparecia. E seriam os departamentos de recuperação de crédito internos a vender com tempo e sem correria ao comprador final, e o banco só perderia 20 e não perderia 80. É um quarto do valor. E depois do banco saneado, era vendido e o lucro ainda iria cobrir parte ou a totalidade do que o Estado lá meteu.

Uma tia sua antes de morrer pediu à família que confiasse em si para reconstruir o grupo? 
Fui desafiado a regenerar o grupo por um elemento da minha família. Mas já não sou novo e espero ter energia e tempo pela frente para cumprir esse desejo. Ver gente da minha família impecável e séria a sofrer com a hecatombe, a vergonha e o desastre do que se passou no grupo, cria-me angústia e ansiedade. E depois de profundas investigações das autoridades judiciais e fiscais, vemos que os problemas foram causados por um número restrito da família e o resto não tem culpa. O tempo dos Távora já passou.

Propõe-se criar um banco?
Vou tentar criar um banco novo, num conceito diferente dos chamados bancos clássicos. Terá de ser pequeno, pelo menos no início, virado para o mundo digital, mas que dê às próximas gerações e aos colaboradores a possibilidade de crescer no futuro.

Está confiante que vai conseguir?
Não posso dizer que esteja, pois é muito difícil. Mas estou a fazer os possíveis para o conseguir. A família Espírito Santo era conhecida em todo lado, o melhor nome da banca portuguesa foi destruído. Se conseguir começar a fazer a sua regeneração, para que as gerações seguintes o desenvolvam, partirei desta vida com a consciência tranquila de que fiz tudo o que podia.

E o banco vai chamar-se Ricciardi ou Espírito Santo?
Isso não sei, tem que ver com o branding e com a estratégia comercial e não sei se terá algum nome de família.

O ministro das Finanças João Leão anunciou que a estimativa de crescimento para 2022 vai ser de 5,5%. Partilha do optimismo?
Nem por isso, pois o crescimento não é mais do que a recuperação da situação pandémica. Não tenho uma visão partidária das razões dos problemas estruturais do país, pois quer o PS, quer o PSD têm altas responsabilidades no nosso fraco desempenho. Portugal é um país que em termos gerais vive mal, com um dos salários mínimos mais baixos da Europa [665 euros], um salário médio de mil e tal euros, que em termos líquidos não chegará a mil euros. Mais de 80 por cento da população activa não ganha mais do que 1500 euros por mês. E, apesar dos aspectos positivos, na saúde, na educação, todos falhámos em não ter conseguido que o nível de vida da população portuguesa fosse francamente superior ao que é. A geração a que pertenço não tem muito de que se orgulhar. Portugal tem um dos níveis de produtividade mais baixos da Europa, o que quer dizer que não trabalhamos o suficiente, ou que a organização do trabalho não é das melhores, tanto no privado como no público.

Há uma ideia generalizada de que os interesses pessoais e de carreira de muitos decisores públicos e privados se sobrepõem ao interesse público e ao das empresas que gerem.
Não digo que não. É certo que há grupos que se internacionalizaram e conseguiram enfrentar as dificuldades, mas são insuficientes para o nosso crescimento. Na sociedade civil portuguesa há um problema geral, com alguns empresários da minha geração a não terem feito o trabalho de casa. Não soubemos fazer com que o país evoluísse de forma diferente. Se nos compararmos com outros países europeus estamos na cauda da Europa. Se você tiver um bolo, neste caso um PIB, se ele for pequeno, e crescer pouco e se estiver sempre a divergir [da média europeia], e se o for repartir, a maioria das pessoas viverá sempre de uma forma fraca, não há nada a fazer. Isto não é um azar, nem é uma fatalidade. Simplesmente não temos conseguido.

O Governo diz que o Orçamento para 2022 será o do investimento e da recuperação. Tem essa expectativa?
Temos um problema de falta capacidade de crescer em todos os sectores. Estamos numa espiral negativa. Para termos maior eficiência e maior capacidade de resposta temos que pagar melhor, para pagar melhor temos que crescer mais. E para crescer temos que captar muito mais investimento produtivo, e não temos tido capacidade de o trazer para Portugal, ou de dar condições para que haja investimento português. Vou dar um exemplo: A Holanda não tem qualquer riqueza natural e tem mais ou menos metade do nosso território e quase 17 milhões de habitantes. E um PIB de cerca de 750 mil milhões. Ajustando o PIB da Holanda a 10 milhões [população portuguesa], seria de 438 mil milhões, mais do dobro do nosso PIB, 125% superior. Imagine o que seria o nível de vida dos portugueses? O ordenado mínimo em Portugal seria mais de mil euros [na Holanda é de 1684,80 euros].

Nos últimos dias, o Governo anunciou que vai avançar com medidas de desagravamento fiscal dirigidas à classe média e aos mais jovens.
Acho positivo, mas altamente insuficiente. O desagravamento fiscal deveria desagravar todos os escalões e não apenas alguns. Devia haver um choque fiscal, estendido às empresas, e em grande parte compensado pelo crescimento do IVA.

A pandemia pôs em evidência as fragilidades da Europa em termos das cadeias de valor e de fornecimento?
É verdade. A Europa tem o maior PIB mundial, maior do que o dos EUA, e um nível de vida que nada tem a ver com o de outras regiões, mas atravessa um mau momento. É altura de re-industrializar a Europa, para que não dependa tanto de matérias-primas e de indústrias a larga distância. E há a consciência de que se permitiu que as cadeias de valor, as cadeias de fornecedores, se alongassem excessivamente para a Ásia, com a China agora a perder as vantagens competitivas dos baixíssimos salários. A Europa deve aproveitar esta ocasião para criar condições para diminuir o gap entre os vários países.

Em que termos pode Portugal beneficiar da estratégia de reindustrialização europeia?
A Europa quer apostar na indústria das energias renováveis, em toda a parte do equipamento relacionado com o vento, e na indústria de fabrico de telemóveis. E a França acaba de apresentar um plano com vista à sua reindustrialização. Em Portugal temos de fazer reformas estruturais para atrair investimento produtivo que aumente o PIB e permita pagar salários mais elevados e para isso temos de melhorar os níveis de produtividade. Se os portugueses ganharem mais, consomem mais, e se consomem mais, pode-se descer os impostos, porque o IVA sobe muito mais. E isto vai proporcionar que os filhos das próximas gerações, as que vão herdar uma situação péssima, com baixos salários, possam viver melhor do que os pais. Crescer é decisivo para o nosso futuro.

Todos os governos, PS ou PSD, declararam o turismo uma prioridade estratégica. Mas a pandemia pôs em evidência as suas fragilidades.
Certo. De serviços até estamos relativamente bem, pois desenvolvemos o turismo, uma actividade que como se verificou, nesta crise pandémica, ao contrário da agro-indústria, é muito mais volátil, mais sujeita a vírus, a terrorismo. A nossa aposta na indústria e na agro-indústria, que existiu, devia ter tido dois vectores: o aumento das exportações de produtos e bens transaccionáveis e a substituição de importações. De 2019 para trás, o nosso PIB per capita cresceu 8% em 20 anos, o que significa que não cresceu mais de meio por cento por ano. Já a Irlanda cresceu 100% em 20 anos, enquanto dos países ditos do centro da Europa, o que cresceu menos, cresceu 50%. O que é decisivo em termos de futuro é conseguirmos crescimentos fortes e permanentes da economia, para não divergirmos. Ouvi o dr. Sérgio Sousa Pinto dizer que somos um país de pobres e de remediados e que cabe às novas gerações alterar a situação tanto do ponto de vista político, laboral e salarial, o que exige crescimento económico.

Está preocupado como as consequências da crise dos combustíveis, já evidente no Reino Unido?
No Reino Unido a situação é agravada pela factura do “Brexit”, pois a maioria dos camionistas não eram britânicos, e daí, em parte, a falta de bens nos supermercados e produtos agrícolas. Sem querer desvalorizar os temas das alterações climáticas e das energias limpas e renováveis, acho que o tema energético tem sido tratado de forma infantil, tanto nos EUA como na UE. Quando se entra num período de transição rápida de uma economia mais que centenária e que vivia à custa da chamada energia fóssil, carvão, petróleo e gás, para a dita energia limpa, cometeu-se um erro que se vai pagar caro e cujas consequências iremos ver na inflação, nas taxas de juro e no crescimento.

Que erro “infantil” foi esse?
Quando disseram que iam acabar com a energia fóssil, que é poluente e uma das principais responsáveis pelo aquecimento global, disseram que iam apostar em alternativas que não são muito competitivas em termos de custos. Só que estas fases de transição demoram mais do que uma década e avançaram para novas soluções sem ter os meios para substituir a prática do passado. E ao mesmo tempo pararam com o investimento na energia tradicional. No caso do petróleo, um poço esgota-se em dez anos e tem-se que investir em novos. O [presidente dos EUA, Joe] Biden proibiu o investimento em novos poços nas terras federais dos EUA, o que fez com que o ciclo se interrompesse. Angola não está, neste momento, a conseguir preencher a quota que a OPEP lhe atribuiu, porque não tem investido em novos poços. A crise começou no Reino Unido e já está a alastrar.

A OPEP decidiu controlar a produção de petróleo e o preço do combustível disparou para cima dos 80 dólares pela primeira vez desde 2018.
Se a oferta não está a conseguir acompanhar o crescimento da procura, e não digo só no petróleo, mas no gás e no carvão, e se, por outro lado, as energias ditas verdes ainda não têm qualquer capacidade de substituição, vamos e estamos a assistir a uma disrupção e a uma subida de preços incrível, porque a oferta está a falhar, porque não se investiu. Sei que temos de baixar a temperatura do planeta, mas estas questões deviam ter sido estudadas de forma mais rigorosa. Os preços não param de subir e as acções das grandes companhias de energia também não param de subir.

O governo inglês já fala em controlar a subida dos preços da energia e outros em baixar os preços.
Não, isso não é possível. Baixar artificialmente os preços não será uma solução bem-sucedida porque acarreta novos custos orçamentais que se repercutem sobre os cidadãos. Deve-se procurar restabelecer as cadeias de abastecimento, encurtando-as, e permitir que se continue a investir na energia fóssil, mas, ao mesmo tempo, fazer um esforço para que seja substituída pela verde. Mas não a interromper. Esta crise resulta da conjugação de dois factores, a questão energética e a quebra das cadeias de fornecimento, porque uns países confinaram e fecharam as suas economias e a reabertura veio aos solavancos com grande instabilidade nos transportes, mesmo nos marítimos. E tudo junto pode levar a um quadro difícil de falta de produtos, de inflação muito alta, ainda que temporária, o que pode acarretar subida das taxas de juro e problemas agravados para países com altos níveis de endividamento, como é o nosso caso.

A Comissão Europeia defende o combate à crise energética com o alívio nos impostos e a reforma no mercado do gás?
A reforma já vem tarde e o crescimento da oferta do gás não é recuperável em pouco tempo. Em relação ao alívio dos impostos, para compensar a subida dos preços da energia, só funciona para países com baixos níveis de endividamento. Em Portugal, essa solução não se aplica.

José Maria Ricciardi: Conselho do GES “funcionava como uma espécie de espectadores para ver o que o Dr. Salgado lá ia dizer”

Sábado, Julho 17th, 2021

Citamos

Observador

José Maria Ricciardi: Conselho do GES “funcionava como uma espécie de espectadores para ver o que o Dr. Salgado lá ia dizer”

José Maria Ricciardi desconhecia a existência da ES Enterprises, só soube pelos jornais em 2014. “Era uma empresa que não se falava”. Conselho Superior do GES tinha 9 pessoas, mas só Salgado falava.

O primo de Ricardo Salgado, José Maria Ricciardi, disse esta terça-feira em tribunal que, apesar de estar ligado ao Grupo Espírito Santo desde os finais dos anos 90, nunca ouviu falar da Espírito Santo (ES) Enterprises — tida pelo Ministério Público como o “Saco Azul do BES”. “Era uma empresa que não se falava, vim a tomar conhecimento pelos jornais já depois de 2014″, disse a testemunha da acusação.

Antes de Ricciardi entrar na sala de audiências, no Campus de Justiça, em Lisboa, o tribunal ainda tentou ouvir o empresário Hélder Bataglia, mas como este foi arguido na Operação Marquês foi-lhe dada a oportunidade de não falar. E ele aceitou.

Ricciardi, que tentou afastar o primo da gestão do grupo, explicou então ao procurador que a partir de 2011 integrou o Conselho Superior do GES. “Fiquei espantado!”, disse, explicando que este órgão começou por ser composto por cinco pessoas e passou para nove. E que os primeiros elementos se limitavam a “ouvir o que o Dr. Salgado tinha para fazer”. Não era “uma entidade em que se punha os assuntos à discussão e à votação”, constatou.

“Tirando a votação do voto de confiança que ele pediu, não me lembro de mais nenhuma. O Conselho funcionava como uma espécie de espectadores para ver o que o Dr. Salgado lá ia dizer”, afirmou.

A defesa de Ricardo Salgado começou por tentar perceber qual era a sua relação com o primo direito. “Não estou de relações cortadas”, garantiu, mesmo depois de o ter tentado afastar do Grupo Espírito Santo e apesar de não estar com ele desde 2015. Depois perguntou-lhe se conhecia a Espírito Santo International. Ricciardi disse que sabia que existia no Grupo e atalhou logo para a resposta seguinte, ainda antes de qualquer pergunta.

“Recebi dinheiro dessa conta porque foi o meu pai que tinha direito a um prémio de mais de 200 mil euros anuais e disse-me que me queria dar metade desse prémio, por ter ingressado no conselho superior do grupo. Pensei que vinha na conta do meu pai. Fiz a minha obrigação: declarar às finanças. Não foi RERT’s. Declarei!”, ironizou, lembrando que mal reparou na origem do dinheiro, por ser de uma conta do pai.

O primo de Salgado disse também que quando começou a detetar irregularidades nas contas e movimentos do BESA para a Savoices, de Salgado e da mulher, foi imediatamente ao Ministério Público informar o procurador Rosário Teixeira, responsável pelo caso Marquês. “Ele já tinha conhecimento disso”, resumiu.

Depois disto, lembrou que ainda fez um documento que foi assinado por seis dos nove elementos do Conselho na tentativa de afastar o primo e de alterar a “governance do grupo”. “Fui traído por esses elementos. Entregaram-lhe uma cópia. E na reunião seguinte ele pediu que fosse votada a tal moção de confiança”.

Ricciardi ainda se exaltou para dizer: “É absolutamente falso que eu alguma vez me candidatei ao lugar de Ricardo Salgado”. Mas nem a defesa nem o tribunal lhe tinham perguntado isso.

Mais à frente acabaria por lembrar que o grupo tinha um acionista muito importante, que era “o Credit Agricole” e o “seu grande objetivo de vida” era continuar no Banco de Investimento, onde começou com 100 pessoas e quando saiu estavam mil.

Granadeiro, o “pai do Pêra-Manca”, recebeu 8 milhões do GES e só fez contrato meses depois

Da parte da manhã tida sido ouvido um outro arguido do processo que não foi pronunciado, o ex-chairman da PT. Henrique Granadeiro considerou perfeitamente normal ter recebido mais de metade de um pagamento de 14 milhões de euros por parte da ES Enterprises, e só depois ter feito um contrato escrito com o Grupo Espírito Santo. Granadeiro recebeu 8 milhões de euros em outubro de 2011 e só em janeiro do ano seguinte, quando recebia a segunda tranche de 4 milhões, registou estas entregas num contrato. A última tranche, de dois milhões, foi paga em novembro.

— A base dos contratos de qualquer natureza é a confiança entre as partes, justificou, por videoconferência ao procurador do Ministério Público

— Então se havia confiança, não era preciso contrato, respondeu-lhe Vítor Pinto.

— A maior parte dos contratos que o senhor faz são verbais, respondeu Granadeiro

 De milhões?, interrogou o magistrado, que acabou por ser interrompido pelo juiz que quis por fim ao diálogo.

Henrique Granadeiro, ex-presidente da PT, livrou-se da acusação na Operação Marquês, mas não escapou de ser testemunha, esta terça-feira, no julgamento do seu amigo de longa data, Ricardo Salgado. É que um dos três crimes de abuso de confiança, de que o ex-líder do BES está acusado, prende-se precisamente com os 14 milhões de euros que Granadeiro recebeu da ES Enterprises, conhecido como Saco Azul do BES — pouco depois do Grupo GES entrar na PT. O Ministério Público tinha acusado Granadeiro e Zeinal Bava de terem sido favorecidos pelo GES, mas o juiz de instrução Ivo Rosa considerou não haver prova disso e não os pronunciou.

As explicações de Granadeiro para esses valores, no entanto, são outras: esses valores, pagos em tranches de “8, 4 e 2”, como o próprio Granadeiro especificou, serviram para investir numa herdade sua no Alentejo, o Vale do Rico Homem, onde queria inclusive construir uma campo de golfe e recuperar uma casa apalaçada. O valor foi pago em tranches, entre 2011 e 2012, em francos suíços e numa conta de Granadeiro naquele país, para ele poder investir no terreno.

— Os oito milhões de euro foi o sinal e o primeiro pagamento com a obrigação de instalar até final de dezembro um sistema de rega, que foi o que fiz. Tinha uma vinha de 45 a 50 hectares, que ainda hoje lá está, e regava uma área de 360 ha… era um projeto assente na produção de culturas, disse.

—  O senhor está mais interessado na parte agrícola, eu estou mais interessado no negócio, interrompeu o procurador.

Ainda em 2011 houve, porém, uma transferência de quatro milhões de Granadeiro para a esfera de Salgado através de uma outra conta, a Begolino. O ex-líder da PT, diz que foi o pagamento de um investimento que fez no Brasil, ao comprar uma moradia de luxo ao ex-líder do BES. O seu gestor de conta, Francisco Roseta Fino, que tem também uma casa na mesma zona, acabaria por dizer horas depois em tribunal que uma casa naquela zona valeria perto de um milhão de euros, mas a de Salgado poderia valer “uma vez e meia” e mais.

Já no final da ronda de perguntas a Granadeiro, o juiz Francisco Henriques que preside o coletivo, quis que o empresário esclarecesse porque abdicou de parte do dinheiro que dispunha e que podia ter investido no sector agrícola, que agora se dedica, para investir num negócio imobiliário. Granadeiro respondeu que devido ao dinheiro que tinha à data, considerou o melhor investimento.

“Eu não tinha estatuto para ter uma casa daquelas, aquilo foi para especulação”, respondeu.

Durante o seu depoimento, foram referidas uma escuta telefónica e uma mensagem com Salgado, que o Ministério Público acredita ter linguagem “cifrada”. Granadeiro porém, apesar de não se recordar, recusou que estivessem a falar por código. “Tenho boa memória, mas não faço ideia do que esta a falar. Eu sou viticultor com algum prestígio… Fui o pai do Pêra-Manca!”, sublinhou, para justificar que as “encomendas” referidas ao telefone com Salgado deviam ser “de vinho”.

“Nunca tive uma responsabilidade acima do BES”, afirma Morais Pires

Antes de Granadeiro, mas presencialmente, foi a vez de o economista Amílcar Morais Pires falar. Morais Pires trabalhou como responsável financeiro do BES durante a liderança de Ricardo Salgado e afirmou desconhecer a ES Enterprises, referindo que Espírito Santo era um marca “muito valiosa” e tinha muitas empresas. “Não participei na gestão dessa empresa nem sei quem eram os administradores”, respondeu.

Também arguido no processo BES, Morais Pires — que começou a trabalhar como funcionário em 1986, e em 2004 foi escolhido para a administração — falou nas reuniões do Conselho de Administração e da Comissão Executiva, lembrando que todas as decisões eram normalmente tomadas por unanimidade. “Nunca tive uma responsabilidade acima do BES”, reiterou.

Mas quando o Ministério Público lhe perguntou se tinha recebido algum dinheiro da ES Enterprises, a sua advogada travou-o. “Ele está acusado de ter recebido dinheiro, por isso não responder a perguntas sobre pagamentos”, advertiu.

Henrique Granadeiro, o ex-presidente da PT, seria a primeira testemunha a falar por videoconferência, mas como a defesa de Salgado o quis confrontar com alguns documentos, o coletivo decidiu ouvir primeiro Amílcar Morais Pires, responsável financeiro do BES. Já de tarde seria Hélder Bataglia a testemunhar, o empresário foi sócio do Grupo Espírito Santo, mas depois de o tribunal lhe dar a possibilidade de não testemunhar por ter sido arguido na Operação Marquês, Bataglia decidiu não falar. Tudo por videoconferência.

Esta sessão aconteceu imediatamente a seguir à leitura da sentença de Armando Vara, cujo processo também foi extraído do da Operação Marquês. O ex-líder da Caixa Geral de Depósitos foi condenado a uma pena efetiva de dois anos de prisão por um crime de branqueamento de capitais pelo mesmo coletivo de juízes que está a julgar Salgado (embora mude o juiz que o preside).

Salgado descreve capítulos da guerra com o primo para rejeitar título de Dono Disto Tudo

Segunda-feira, Junho 21st, 2021

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Salgado descreve capítulos da guerra com o primo para rejeitar título de Dono Disto Tudo

 

Na contestação que entregou ao tribunal, o ex-banqueiro do BES Ricardo Salgado descreve alguns capítulos da guerra que travou com o primo José Maria Ricciardi, testemunha fundamental do MP no Marquês.

Ricardo Salgado quer descolar-se do selo de “Dono Disto Tudo” (DDT) e promete mostrar em tribunal que não era ele quem liderava o Universo Grupo Espírito Santo (GES), como tem sido dado por adquirido. Na contestação que entregou em tribunal — no âmbito do processo autónomo que nasceu da operação Marquês por decisão de Ivo Rosa –, o ex-banqueiro descreve todos os nomes que faziam parte dos conselhos de administração das empresas do grupo, assim como algumas das suas decisões. Mas há um membro contra quem Salgado mais dispara: o primo José Maria Ricciardi, com quem travou uma guerra em 2013, depois de este o tentar afastar do BES — Ricciardi é uma das principais testemunhas de acusação do Ministério Público (MP).

“Não temos dúvidas de que, durante o julgamento deste processo, José Maria Ricciardi irá proferir um chorrilho de generalidades infundadas quanto à ‘gestão centralizada’ do GES  que se pretende imputar ao ora arguido”, escreve a defesa de Salgado.

José Maria Ricciardi irá proferir um chorrilho de generalidades infundadas quanto à ‘gestão centralizadas’ do GES  que se pretende imputar ao ora arguido.
Contestação de Ricardo Salgado

O ex-banqueiro acusa mesmo o Ministério Público de ter olhado “cegamente” para os problemas do seio do GES e de ter alimentado uma “fantasia”, uma “mentira pejada” e uma “narrativa oportunista” para o levar a julgamento como sendo o homem que controlava todo o Universo GES, quando ele era apenas um administrador não executivo. “Foi e é uma narrativa oportunista aproveitada por muitos para lograrem uma automática ‘ilibação’ dos problemas do GES e, infelizmente, seguida cegamente pelo Ministério Público, em manifesta violação dos seus deveres de objetividade e legalidade, pois é sempre mais fácil escolher o culpado do que apurar a verdade dos factos e dos documentos”, lê-se na contestação a que o Observador teve acesso.

Para isso Salgado recua ao ano de 2013. Na altura o Conselho Superior do GES, que Salgado integrava, era presidido pelo clã Ricciardi — o presidente era o comandante António Ricciardi, pai de José Maria Ricciardi –, fazendo também parte do conselho José Manuel Espírito Santo e Ricardo Abecassis, Maria do Carmo Moniz Galvão Espírito Santo, Manuel Fernando Espírito Santo, Mário Mosqueira do Amaral e Pedro Mosqueira do Amaral.

E foi numa das reuniões desse conselho, em novembro, que o primo, José Maria Ricciardi, tentou afastar Salgado do cargo de Presidente do BES e da ESFG (Espírito Santo Financial Group). Salgado diz mesmo que José Maria Ricciardi estava interessado em substitui-lo no cargo de CEO do BES e promoveu, então, a votação de uma moção de censura contra ele. No entanto, o Conselho Superior do GES não aprovou a moção (com Ricciardi pai a votar contra, mas não durante muito tempo).

Ainda em novembro de 2013, lembra Salgado ao tribunal que o vai julgar, José Maria Ricciardi fez um comunicado a dar conta de não ter dado um voto de confiança a Salgado. “E começaram a circular notícias de que José Maria Ricciardi iria ocupar ou ‘candidatar-se’ ao cargo de CEO do BES”. Desconfiado de que teria sido ele passar essa informação, Salgado ripostou e convocou uma reunião com o Conselho de Administração do BES para o afastar das funções de CEO do BESI.

No entanto, nesse dia, e antes do início da reunião do Conselho de Administração do BES, o comandante António Ricciardi e José Manuel Espírito Santo anteciparam-se e opuseram-se. E Salgado, segundo conta, baixou as armas e desistiu da ideia de afastar o primo. Não só desistiu como, de seguida, transmitiu ao Conselho de Administração do BES “a falsa aparência de que as divergências com José Maria Ricciardi haviam sido sanadas”, como lembra que demonstra a ata dessa reunião.

Com este episódio, a defesa pretende mostrar que não era Salgado quem mandava no grupo. Aliás, já em 2014, conta ainda a defesa, os ramos familiares de Manuel Fernando Espírito Santo, do comandante António Ricciardi (e José Maria Ricciardi) e de Mosqueira do Amaral acabaram por fazer “um protocolo” para o afastar do cargo de CEO do BES, salientando para o efeito que os seus ramos familiares representavam a maioria do Conselho Superior. “Isto demonstra que não havia qualquer gestão centralizada pelo ora arguido do GES, nem este decidia os ‘destinos do GES’, atenta a preponderância dos demais membros do Conselho Superior do GES”, alegam os seus advogados.

Foi e é uma narrativa oportunista aproveitada por muitos para lograrem uma automática ‘ilibação’ dos problemas do GES
Contestação de Ricardo Salgado

Ao longo da contestação, que inclui também um perfil físico e psicológico de Salgado — que justifica as suas faltas de memória e o seu mal-estar pelo “escrutínio público –, a defesa faz uma exposição do que era o Grupo Espírito Santo, composto por centenas de sociedades (350) do ramo financeiro e não financeiro, dispersas por todo o mundo. Ricardo Salgado era CEO do BES e administrador não executivo da ESFG (a holding do setor financeiro) e era “impossível uma pessoa ‘centralizar’ a gestão do GES”, justifica.

“Além do ora arguido (que não era administrador da Enterprises), havia outros membros da família Espírito Santo e outras pessoas que davam instruções para a movimentação de fundos da Enterprises”, lê-se.

Aliás, a defesa explica mesmo a génese do tal Conselho Superior do grupo, criado pelos ramos da família Espírito Santo (e Mosqueira do Amaral), enquanto sócios da holding de topo do GES, a ES Control (que detinha mais de 50% da Espírito Santo International, — que, através da ESI BVI, detinha a Enterprises). E frisam que neste órgão familiar e parassocial todos tinham paridade de voto.

Os advogados explicam ainda que o ramo não financeiro “pelo qual o arguido não era responsável” tinha uma “estrutura complexa”, cujos conselhos de administração só tomavam decisões com pelo menos a aprovação de metade dos seus membros. Em 2011, altura das transferências suspeitas que o colocam no banco dos réus, no âmbito da acusação da operação Marquês, faziam parte do Conselho de Administração da ES Control o Comandante António Ricciardi (Presidente ou Chairman), Mário Mosqueira do Amaral, Ricardo Salgado, José Manuel Espírito Santo, Patrício Monteiro de Barros, Manuel Fernando Espírito Santo Silva, Pedro Queiroz Pereira, Jorge Leite Espírito Santo Silva, João Espírito Silva Salgado, Ricardo Abecassis Espírito Santo Silva, Miguel Abecassis Espírito Santo Silva, Roland Cottier e Domingos Pereira Coutinho.

Já à frente da ES International (que detinha a Enterprises) estavam: o comandante António Ricciardi (Presidente ou Chairman), Mário Mosqueira do Amaral (Vice-Presidente); Ricardo Salgado, José Manuel Pinheiro Espírito Santo Silva; Manuel Fernando Espírito Santo Silva; José Maria Espírito Santo Ricciardi, Ricardo Abecassis Espírito Santo Silva, Pedro Mosqueira do Amaral, Patrick Monteiro de Barros; Fernando Moniz Galvão Espírito Santo Silva; Martim Espírito Santo Quintela Saldanha; Bernardo Ernesto Simões Moniz da Maia; Aníbal da Costa Reis de Oliveira; João Espírito Santo Silva Salgado; Jorge Leite Faria Espírito Santo Silva; Domingos Espírito Santo Pereira Coutinho e Rui Manuel de Medeiros D’Espiney Patrício.

Salgado garante que era administrador não executivo da ESI, ao contrário do que é referido na pronúncia assinada pelo juiz Ivo Rosa, até porque a ESI não tinha comissão executiva. E as suas contas eram assinadas pelos respetivos administradores: o comandante António Ricciardi (enquanto Presidente ou Chairman) e Manuel Fernando Espírito Santo Silva (por ser administrador responsável pela área não financeira).

Salgado transmitiu ao Conselho de Administração do BES “a falsa aparência de que as divergências com José Maria Ricciardi haviam sido sanadas”
Contestação de Ricardo Salgado

A defesa dá mesmo exemplos para tentar provar que esta cúpula era de facto quem liderava o grupo. Pegando em documentos que constam em processos de contra-ordenação do Banco de Portugal, lê-se na contestação que  “a ESI BVI pagou honorários inter alia ao comandante António Ricciardi, José Maria Ricciardi e Manuel Fernando Espírito Santo pelo exercício de funções no GES e no Conselho Superior do GES”. Foi o que aconteceu em 2013, por exemplo, em que a ESI BVI pagou ao comandante António Ricciardi honorários no valor de mais de um milhão de euros, enquanto José Maria Ricciardi recebeu mais de 112 mil euros (a somar à sua remuneração como CEO do BESI, em 2013, no valor de 606 mil euros). Já Manuel Fernando Espírito Santo recebeu mais de 355 mil euros.

Ricciardi tenta isentar-se de culpas na insolvência do BES apontando para ilibação noutro processo

Terça-feira, Abril 6th, 2021

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Ricciardi tenta isentar-se de culpas na insolvência do BES apontando para ilibação noutro processo

Antigo gestor do BESI lembra que foi ilibado no processo-crime relativo ao universo GES para argumentar que não teve culpas na insolvência. MP e comissão liquidatária não estão convencidos.

José Maria Ricciardi, um dos antigos administradores do BES que a comissão liquidatária considerou culpados pelo colapso do banco, quer usar um processo paralelo para ser ilibado. Segundo o Jornal de Negócios, que escreve esta segunda-feira sobre o caso, Ricciardi veio defender-se lembrando que foi ilibado no processo principal sobre o universo BES, mas sem sucesso: o argumento não terá convencido nem o Ministério Público nem a comissão liquidatária do BES.

Para perceber os desenvolvimentos do caso, é preciso ter em conta que correm dois processos, de forma paralela, sobre o colapso do BES. Por um lado, existe no Tribunal de Comércio de Lisboa o processo relativo à insolvência do banco, em que a comissão liquidatária do BES classificou como culposo o percurso que levou à falência da instituição e atribuiu essa responsabilidade a vários antigos administradores, incluindo José Maria Ricciardi, que liderava o Banco Espírito Santo Investimento (BESI).

A comissão liquidatária apontava mesmo, em 2017, as áreas principais em que teriam sido praticadas por “dolo ou culpa grave”, concluindo que essa gestão do banco — determinada, “sozinho ou em co-autoria”, principalmente por Ricardo Salgado — terá gerado um prejuízo para o BES de 5,9 mil milhões de euros. E, neste caso, o Ministério Público concorda com a versão apresentada pela comissão liquidatária, acreditando que foi essa conduta “culposa” que levou à falência do banco.

Ora, por outro lado, existe o processo crime relativo a todo o universo BES e GES, com acusação deduzida no verão do ano passado. Neste, são menos (quatro) os antigos administradores a quem se apontam alegadas culpas e que foram constituídos arguidos, sendo que Ricciardi — que em 2013 tinha criticado publicamente Ricardo Salgado, defendendo que abandonasse a liderança do banco, e que acabaria por deixar as suas funções em fevereiro de 2014 — foi ilibado e chamado apenas como testemunha da acusação.

É essa ilibação que Ricciardi quer agora usar para argumentar que não tem culpas no primeiro processo, relativo à insolvência culposa, que não constituindo um crime pode inibi-lo de exercer algumas funções no futuro e obrigá-lo a pagar uma indemnização aos credores.

Até ver, sem frutos, adianta o mesmo jornal: tanto o MP como a comissão liquidatária se “opuseram a esta pretensão”, lê-se num relatório trimestral da comissão liquidatária do BES, citado pelo Jornal de Negócios. A decisão sobre a culpa pelo colapso do BES não tem prazo previsto, uma vez que os antigos gestores contestaram a atribuição de culpa e ainda não se sabe o que será levado a julgamento.

Tribunal da Relação anula despacho de Ivo Rosa e obriga-o a analisar declarações de Hélder Bataglia

Sexta-feira, Setembro 11th, 2020

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Tribunal da Relação anula despacho de Ivo Rosa e obriga-o a analisar declarações de Hélder Bataglia

Juiz de instrução da Operação Marquês obrigado a analisar prova testemunhal de ex-líder da Escom sobre transferências relacionadas com José Sócrates, o seu primo e Ricardo Salgado.

O Tribunal da Relação de Lisboa deu razão ao Ministério Público e anulou uma vez mais um despacho de Ivo Rosa, censurando-o por “extravasar as suas competências”, por esquecer o que determina a jurisprudência e por confundir “conceitos jurídicos” básicos. Desta vez foi na Operação Marquês e no centro do acórdão assinado pelos desembargadores Ricardo Cardoso e Artur Vargues estão declarações relevantes de Hélder Bataglia, ex-líder da Escom, que o juiz que lidera a fase de instrução criminal da Operação Marquês terá agora de ter em conta na sua decisão instrutória, que deverá ser conhecida até ao final deste ano. É a 14.ª derrota para Ivo Rosa na Relação de Lisboa em menos de três anos.

As declarações de Bataglia foram proferidas no processo Monte Branco e dizem respeito ao esquema de branqueamento de capitais de Francisco Canas (o principal suspeito daquele processo, que morreu em janeiro de 2017) que alegadamente permitiu a transferência de cerca de dois milhões de euros para contas bancárias na Suíça controladas por Carlos Santos Silva (alegado testa-de-ferro do ex-primeiro-ministro José Sócrates) e por Armando Vara (ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos). Tais transferências são, segundo a acusação do Ministério Público, uma alegada contrapartida paga a José Sócrates e Armando Vara pela aprovação um crédito de mais de 197 milhões de euros na Caixa Geral de Depósitos para um grupo de investidores liderados por Bataglia comprarem o resort algarvio Vale do Lobo. Bataglia fez igualmente declarações sobre transferências para o primo de José Sócrates e para Ricardo Salgado através das suas sociedades offshore Green Emerald e Overview Investments.

Decisão “revela confusão de conceitos jurídicos” e “extravassa competências”

Ivo Rosa tinha decidido a 21 de junho de 2019 anular a prova testemunhal de Hélder Bataglia, argumentando que a lei apenas permite que as declarações prestadas num determinado processo sejam utilizadas como prova nos mesmos autos em que foram proferidas. Como as declarações de Bataglia tinham sido feitas no âmbito do caso Monte Branco, então não podiam ser transferidas para a Operação Marquês para “formar qualquer juízo de indiciação” na fase de instrução.

O procurador Rosário Teixeira recorreu para a Relação de Lisboa argumentando que o juiz Ivo Rosa estava a extrapolar e a invocar para a fase de instrução criminal uma norma que apenas é usada durante a fase de julgamento. “A valoração de determinado meio de prova em fase de julgamento é questão diversa da possibilidade de utilização desses mesmos meios de prova em fase de inquérito ou de instrução”, escreveu o procurador no seu recurso.

Os desembargadores Ricardo Cardoso e Artur Vargues deram total razão ao procurador Rosário Teixeira. Num acórdão sintético (apenas 25 páginas) mas assertivo, o relator Ricardo Cardoso censura o raciocínio jurídico do juiz Ivo Rosa.

Em primeiro lugar, os desembargadores dizem que a decisão de Ivo Rosa “revela a confusão de conceitos jurídicos, de competência e funções do juiz de instrução”. E porquê?

Porque Ivo Rosa invoca normas do Código de Processo Penal que “se reportam às regras da audiência de julgamento, pelo que a decisão recorrida subverte e antecipa para a fase de instrução uma norma dirigida e integrada no regime da fase de julgamento”.

Ou seja, e como o Ministério Público tinha argumentado, o juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal confunde conceitos jurídicos e “possibilidades de prova”, “sem querer perceber que o que está em causa é um mesmo objecto de prova e não um mesmo processo.”

Mais: de acordo com o relator do acórdão da Relação, Ivo Rosa “olvida o enunciado princípio de que o juízo de probabilidade razoável de condenação” aplicável “à pronúncia ou não pronúncia, não equivale ao juízo de certeza exigido ao juiz de julgamento na condenação”, escreve o desembargador Ricardo Cardoso.

Por isso, mesmo a Relação de Lisboa considera que, “ao pronunciar-se sobre a possibilidade de utilização em julgamento da prova por declarações como arguido de Hélder Bataglia constante da aludida certidão”, o juiz Ivo Rosa “extravasou a sua competência”, que está limitada pela lei, “violando a exclusiva competência do tribunal de julgamento pretendendo subtrair tal competência ao tribunal próprio dessa fase final ao efectuar a apreciação desses elementos de prova que só o juiz do julgamento tem competência para valorar”.

Por isso mesmo, os desembargadores Ricardo Cardoso e Artur Vargues declararam a nulidade insanável do despacho de Ivo Rosa que anulou a prova testemunhal de Hélder Bataglia e reafirmaram “a possibilidade de utilização como prova, em sede de instrução,” das declarações do ex-líder da Escom proferidas no caso Monte Branco.

Uma decisão idêntica já tinha sido tomada pela Relação de Lisboa em dezembro de 2019 em relação a um outro despacho de Ivo Rosa na Operação Marquês em que o juiz de instrução tinha determinado a anulação a transmissão da prova testemunhal de Ricardo Salgado no caso Universo Espírito Santo e Monte Branco.

 

 

“Perplexo” com crimes do primo Salgado, Ricciardi critica “idiotas” que o acusam e estranha Novo Banco

Sábado, Julho 18th, 2020

 

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“Perplexo” com crimes do primo Salgado, Ricciardi critica “idiotas” que o acusam e estranha Novo Banco

José Maria Ricciardi, antigo presidente do Banco Espírito Santo de Investimento (BESI) e primo de Ricardo Salgado, diz que “esperava este resultado” no processo judicial em torno do BES, com a acusação de 25 pessoas, mas assume que não imaginava que “a situação fosse tão má”.

“Esperava este resultado”, considera José Maria Ricciardi em entrevista ao Dinheiro Vivo, notando, contudo, que ficou “absolutamente impressionado com a dimensão” dos crimes imputados a Ricardo Salgado e a outros 24 arguidos do processo BES.

Ricciardi é testemunha de acusação do Ministério Público (MP) e refere que continua “perplexo com a dimensão e profundidade das fraudes e crimes que estão alegadamente em causa”.

O antigo dirigente do BESI nota que tinha “razão” quando em 2013 propôs a “substituição de Ricardo Salgado” à frente do Banco e “a alteração do governo do grupo”. Mas “não imaginei que a situação fosse tão má“, afiança.

O grupo não tinha escrutínio nem tinha “checks and balances” (separação de poderes). Havia movimentos de capitais e não eram controlados. Ricardo Salgado tentou colocar na opinião pública a ideia de que se tratava de uma luta de poderes e que eu só queria ocupar o seu lugar, o que é absolutamente falso”, diz ainda Ricciardi.

Quanto aos que “dizem que [ele] devia saber o que se passava no grupo por estar dentro dele”, Ricciardi aponta que “são uns verdadeiros idiotas”. “Se o MP, com os meios de investigação que tem e a colaboração da CMVM [Comissão de Mercado de Valores Mobiliários] e do Banco de Portugal, leva 6 anos a investigar, era eu que ia descobrir isto?”, questiona em jeito de crítica.

Mas Ricciardi está certo de que “se se tivesse feito algo em 2013, muita gente que foi prejudicada” não o teria sido e “muito provavelmente podia ter-se minorado os danos“, salienta na entrevista.

Sobre a situação do Novo Banco que continua a apresentar prejuízos sucessivos e a necessitar de injecções de capital de dinheiros públicos, Ricciardi considera que “o que se passou com o BES não explica estas incongruências”.

“Quando o Novo Banco foi criado e nos anos seguintes as contas foram aprovadas sem reservas acerca das imparidades. Com a venda à Lone Star tudo se modificou. Ainda para mais, a economia cresceu e o sector imobiliário recuperou, pelo que os activos que estavam no Novo Banco valorizaram”, realça, concluindo que, “no mínimo, o que se passa é um bocadinho difícil de explicar“.

 

“Se me tivessem dado ouvidos se calhar o BES ainda existia”: as reações à acusação do MP

Quinta-feira, Julho 16th, 2020

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“Se me tivessem dado ouvidos se calhar o BES ainda existia”: as reações à acusação do MP

José Maria Ricciardi foi uma das pessoas que já reagiram às acusações a 25 arguidos no caso BES. Também antigos participantes da Comissão Parlamentar de Inquérito comentaram a notícia.

O antigo administrador do Banco Espírito Santo, José Maria Ricciardi, considera que foi premonitório na análise à situação do BES e diz que se tivesse sido ouvido o banco poderia ainda existir. “As iniciativas que empreendi, nomeadamente naquela altura de 2013 e 2014, para alterar a governance do BES, aconteceram porque não havia nessa governance qualquer escrutínio, havia um poder absoluto”, afirmou, em declarações à Rádio Observador, que pode ouvir aqui.

Propus o afastamento do dr. Ricardo Salgado e tinha toda a razão de ser, ao contrário dos comentários que ouvi na altura. Diziam que era incompreensível, etc. Tinha toda a razão. Se me tivessem dado ouvidos em 2013 se calhar o BES ainda existia“.

O antigo administrador do banco apontou ainda: “Ele obviamente não se demitia porque tinha que esconder aquilo que estamos a ver. Na altura fui muito criticado e tentou-se vender a ideia que queria o lugar dele, não era nada disso. Na altura, nem nos piores cenários alguma vez imaginei a extensão e gravidade das fraudes e crimes praticados e dos prejuízos causados a terceiros, nomeadamente aos lesados do Banco Espírito Santo. Se soubesse, ainda teria tentado ser mais incisivo e atuante naquilo que tentei fazer para evitar o colapso”.

José Maria Ricciardi diz que não foi bem sucedido nas tentativas de afastar Ricardo Salgado da liderança do banco “porque os acionistas na altura não quiseram dar ouvidos”. Mas “houve muita gente, não foram só os acionistas que não quiseram dar ouvidos”.

Para o antigo banqueiro, “podia ter-se evitado grande parte desta hecatombe que se deu num dos principais grupos económicos, com 150 anos de vida e com uma reputação extraordinária até à chegada do dr. Ricardo Salgado — e no país, que sofreu muito com isto”.

Ricciardi aproveitou ainda “para responder” a alguns críticos, que lhe perguntam como “não se apercebia disto estando lá dentro”. O antigo banqueiro apontou: “Para apurar isto foram precisos seis anos e uma equipa completa do Ministério do Público com o Banco de Portugal, a CMVM e Autoridade Tributária, com capacidades investigatórias que nunca poderia ter, nomeadamente no exterior, fora de Portugal. Eu é que conseguia apurar como simples administrador do banco? Por amor de Deus, tenham vergonha.”

Sobre o processo e as fases percorridas até esta acusação, José Maria Ricciardi apontou: “Acho que o trabalho foi feito é extraordinário. As pessoas têm de ter consciência que estes crimes económicos são extremamente complexos, feitos com grande engenharia financeira e às vezes com advogados e outro tipo de experts eficazes e sofisticados. São feitos muitas vezes em jurisdições como o Panamá, Ilhas Virgens Britânicas, Suíça, Luxemburgo, Dubai, onde for…”

Quando a complexidade é desta natureza, é extremamente difícil, por isso acho notável o trabalho que se fez. Portugal, infelizmente, pelas suas limitações orçamentais, não tem os meios humanos e materiais se calhar necessários para conseguir ser mais rápido em processos desta dimensão e complexidade”, referiu ainda.

Lembrando que foi “testemunha deste processo” e também “da Operação Marquês”, o economista acrescentou: “Se vai demorar muito tempo? Temos o Código de Processo Penal que temos, as leis que temos. Os acusados têm todo o direito à sua defesa, se isto vai demorar muito tempo… espero que o país possa gradualmente conceder mais meios humanos e materiais não só aos magistrados e Ministério Público mas também aos juízes, para que estes processos possam não demorar tanto tempo. E, já agora, aproveito para desejar que essas pessoas sejam devidamente recompensadas e pagas pelo trabalho gigantesco que fazem”.

Lesados exigem recuperação total do dinheiro e indemnização por dados morais

Quem também já reagiu foi o advogado Nuno da Silva Vieira, que representa grande parte dos lesados do BES. A acusação é “uma boa notícia”, chega sem surpresas e, ao mesmo tempo, é mais um passo para atingir o objetivo de recuperacão total do dinheiro. A defesa dos ex-clientes do Banco Espírito Santo exige ainda compensações para fazer face aos danos morais causados aos envolvidos.

Nuno da Silva Vieira antecipa ainda, em declarações à Rádio Observador, que serão conhecidos outros arguidos no processo, sem nomear.

Sistema “não está preparado” para lidar com um processo destes

Já o presidente da Associação Sindical dos juízes, Manuel Soares, diz que os tribunais não estão preparados para lidar com um caso com tantos arguidos, como acontece neste processo. Também à Rádio Observador, Manuel Soares diz mesmo que “nenhum país está preparado”.

Manuel Soares não vê, por isso, que seja possível haver um desfecho deste processo em poucos anos.

Negrão (PSD) considera que tribunais portugueses “não estão preparados” para estes processos

Nas reações políticas, para Fernando Negrão, deputado do PSD que presidiu à Comissão Parlamentar de Inquérito ao GES, o desfecho do processo e das acusações a 25 arguidos no âmbito do inquérito à deterioração do Universo Espírito Santo — reveladas esta terça-feira pelo Ministério Público —, deverá demorar: “Tenho a convicção que levará muitos anos”. A dimensão do processo é um dos motivos, mas não o único: “Acho que os tribunais portugueses ainda não estão preparados para processos desta dimensão”, referiu ainda em declarações à Rádio Observador, vincando que a supervisão “não funcionou nos moldes em que deveria ter funcionado”.

Pode ouvir aqui as declarações de Fernando Negrão à Rádio Observador:

O presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito, que se dedicou a investigar a a queda do Banco Espírito Santo, lembrou que falta ainda “a prova que será levada ao processo pelos arguidos e pelas suas defesas”. E recordou ainda que as conclusões da CPI “foram muito críticas para o governador do Banco de Portugal”, porque na supervisão à situação do banco “houve muitas hesitações, houve perda de tempo e perda de oportunidades para que muitos portugueses não tivessem sofrido como sofreram, com a perda das suas economias”.

Face às conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito, que, lembra Fernando Negrão, “é um instrumento que o Parlamento tem para dar uma primeira resposta a um caso de grande gravidade, e este caso afigurou-se e continua a afigurar-se como um caso de enorme gravidade”, a guerra judicial a que agora se começa a assistir “era inevitável”:

Essa guerra judicial era inevitável, diria, da minha experiência, face à revelação de muitos factos durante a Comissão de Inquérito. Agora, a Comissão de Inquérito não faz prova, não tem essa competência, a prova está a ser feita agora nos tribunais. O Ministério Público apresentou a sua, agora veremos a prova que vem a seguir da defesa dos arguidos”, notou.

O deputado do PSD destacou ainda um momento da CPI que, defende, deveria ter sido visto à época pelos supervisores — isto é, Banco de Portugal — como alarmante. “O BdP não obrigou, se é que podia obrigar, o BES, na altura, a deixar que entrasse dinheiro disponível para os bancos. O BES nunca o aceitou. Todos sabemos porque nunca aceitou, nunca aceitou porque já teria problemas e não queria que eles fossem revelados”.

Para Fernando Negrão, fica uma dúvida: “O mais grave é porque é que deixaram que o Banco Espírito Santo ficasse de fora do espectro financeiro dos bancos que receberam dinheiro, que estava disponível a todos os bancos? Foi o único que não quis esse dinheiro que estava disponível para a sua gestão. Isso foi o grande erro, do banco e do Banco de Portugal por não ter tomado as medidas necessárias para que isso tivesse acontecido”.

Quanto a eventuais implicações políticas do processo e desta acusação, Fernando Negrão respondeu: “Acho que em termos políticos vamos ter aqui implicações grandes daquilo que é o funcionaneto da supervisão do Banco de Portugal — e isto é política. Quem nomeia o governador do BdP são os políticos, quem define as regras de funcionamento do Banco de Portugal são os políticos, portanto o primeiro embate diria que tem a ver com o funcionamento do Banco de Portugal, principalmente na área da supervisão. Embora a supervisão hoje esteja dividida entre o BdP e instâncias europeias. Depois, no decorrer do processo podem surgir factos que impliquem figuras ligadas à política ou não. Veremos”.

O que o antigo presidente da CPI ao BES pretende é que este “seja um julgamento justo para todos: para a defesa dos interesses daqueles que querem que seja feita justiça para eles próprios mas também que seja justo no sentido de que as práticas ilegais sejam devidamente punidas”.

Mariana Mortágua: “É importante até para credibilizar o sistema”

Quem também já comentou as acusações foi Mariana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda que esteve na Comissão Parlamentar de Inquérito à queda do BES e do grupo GES. “Acho muito importante que se tenha conseguido chegar a uma acusação, não quer dizer que depois o julgamento não demore muito tempo mas é importante até para credibilizar o sistema”, apontou.

Pode ouvir aqui as declarações de Mariana Mortágua à Rádio Observador.

Aquilo que se encontrou e os factos que a Comissão Parlamentar de Inquérito permitiu revelar, e que a comunicação social também foi dando conta, são muito graves. Obviamente mereciam e devem estar refletidos no processo judicial, portanto fico satisfeita que finalmente tenha saído esta acusação”, referiu ainda.

Recordando aquilo que foi a Comissão Parlamentar de Inquérito à queda do banco e do grupo, Mariana Mortágua assumiu que foram encontrados indícios de vários crimes durante as audições. “Ao abrir o grupo BES e ao perceber o que estava por dentro do grupo BES e do grupo GES, encontrámos exemplos daquelas que na verdade são as práticas reiteradas em muitos dos negócios que hoje encontramos”, defendeu.

De seguida, a deputada do BE detalhou os índicios que a Comissão Parlamentar de Inquérito encontrou. “Encontrámos a [ligação à] construção — e toda a corrupção durante muitos anos em Portugal esteve associada ao negócio da construção; encontrámos Angola e a forma como Angola serviu para enriquecer personalidades ligadas ao regime para dar lucros aos bancos portugueses mas também para lavar dinheiro; encontrámos os offshores e como foram usados para esquemas de financiamento ilícito, circulação de fundos ou manipulação de contabilidade”.

Encontrámos também as guerras de acionistas que acabaram por envolver as maiores empresas portuguesas, muitas delas privatizadas, guerras acionistas essas que foram motivadas pelos lucros que essas empresas davam, como é o caso da PT e que depois deu origem àquela relação entre Zeinal Beival e Ricardo Salgado”, apontou Mortágua.

A comissão parlamentar foi útil, desde logo, porque “serviu não só para levantar o véu sobre aquilo que, penso eu, serão algumas das acusações refletidas neste processo judicial, mas também para levantar o véu sobre muitas práticas que acredito que ainda hoje continuam a persistir no sistema económico e que acabam por ser pouco faladas ou ter grande complacência, porque são práticas consideradas normais ou que exploram a linha entre o legítimo e ilegítimo — e nem sempre são muito fáceis de descortinar depois”.

Defende que Ricardo Salgado é “o expoente máximo” destes crimes e práticas “porque era a figura máxima do regime e do sistema económica, uma figura incontestada durante décadas — porque representava poder económico”, a deputada bloquista lembra outros casos dos últimos anos: “Olhamos para o Banif e o que encontramos? Olhamos para o BCP e o que encontramos? Olhamos para o BPP, para o BPN, para a Caixa Geral de Depósitos, para a Portugal Telecom, para a EDP e o que encontramos nas grandes empresas e nas formas como foram geridas? E o que encontramos nestes gestores de topo, que nos foi dito que representavam o melhor do capitalismo português pós-privatizações, porque era altura de trazer pessoas profissionais para gerir empresas que eram públicas e entretanto se tornaram privadas?”.

Temos uma geração de gestores que vai de [Zeinal] Bava a [António] Mexia com imensas ligações entre o poder político e o poder privado, que alimentam as portas giratórias, com negócios muito obscuros que favorecem às vezes os acionistas privados e às vezes os próprios bolsos… Insisto que há um problema de sistema, que não é só português”, defendeu.

Mariana Mortágua rebateu ainda a ideia “de que não houve lesados” neste caso: “As provas que temos são imensas e todos os lesados são lesados do Ricardo Salgado e são legados do BES. O grupo GES só não ruiu antes porque estava assente em fraude, porque há muito que havia contabilidade criativa, que fraudes e negócios obscuros alimentavam aquele polvo de dimensões gigantescas. O país é lesado de Ricardo Salgado. Não só os lesados do BES perderam as suas poupanças como ainda estamos todos a pagar os desvarios desses tempos, alguns por crime, outros simplesmente por uma economia completamente insustentável”.

Miguel Tiago (PCP): “É estranho que o BdP tenha deixado chegar ao ponto que chegou”

O antigo deputado do PCP Miguel Tiago, que participou na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), afirmou em declarações à Rádio Observador que “durante as audições da Comissão Parlamentar de Inquérito, algumas delas até à porta fechada, ficou claro que Ricardo Salgado deu orientações para falsificar as contas da holding. Sei que não ficou patente porque a transmissão dessa audição não foi realizada mas isso foi dito e o PCP até requereu documento em que supostamente a assinatura de Ricardo Salgado constaria”.

É perfeitamente plausível que tenha existido uma pressão da parte da administração, nomeadamente do Ricardo Salgado para falsificar as contas da ESI — Espírito Santo Internacional Holding —, enfim, para esconder um passivo e poder continuar a colocar dívida”, referiu.

Para Miguel Tiago, porém, “o que é mais chocante é que mesmo depois de vários avisos da CMVM, o Banco de Portugal tenha continuado a permitir que Ricardo Salgado, apesar de todas as desconfianças que já vinham surgindo, tenha continuado a permitir que não só a ESI continuasse a colocar dívida através da parte não financeira do grupo junto dos balcões do BES como que tenha autorizado o empréstimo de 3,8 mil milhões de euros, se não estou em erro, em Angola, no BESA”.

É claro que há uma atuação de Ricardo Salgado com vista a manter um desequilíbrio que vinha de há muitos anos, dentro do BES. O que é estranho é que o Banco de Portugal tenha deixado chegar ao ponto a que chegou sabendo tudo o que se passava dentro do BES”, vincou.

O antigo deputado comunista, que entretanto saiu do Parlamento, disse ainda: “Não temos acesso a todos os documentos do Ministério Público mas uma boa parte daquilo que até hoje vem a público é perfeitamente plausível daquilo que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) pôde apurar. A CPI fez depois um relatório aprovado por praticamente todas as forças políticas, com uma abstenção julgo eu do BE e um voto contra do PCP, em que culpava o Ricardo Salgado por todos os problemas do banco como se não houvesse mais ninguém envolvido e como se o Banco de Portugal não soubesse absolutamente nada do que se passava”.

Para o antigo deputado comunista, Miguel Tiago, “o Banco de Portugal foi complacente” com a situação que culminou na queda do Grupo Espírito Santo (GES) (@ ANTÓNIO COTRIM/LUSA)

Para Miguel Tiago, já nas audições da Comissão Parlamentar de Inquérito à queda do banco e do grupo Espírito Santo foi possível concluir que ” foram cometidos crimes dentro do BES, junto dos clientes do BES e das suas sucursais. Os clientes foram lesados e  o Banco de Portugal atuou da pior maneira, mentindo aos portugueses sobre o valor da resolução, não querendo nacionalizar o banco ou o grupo Espírito Santo”. Miguel Tiago considera ainda que “o ministério das Finanças daquela altura optou por encobrir todos esses problemas, para gastar o mínimo possível, varrendo para debaixo do tapete os problemas do BES”.

Pode ouvir aqui as declarações de Miguel Tiago à Rádio Observador.

O antigo deputado comunista defende que “o Banco de Portugal não atuou nem antes do problema, nem atuou corretamente perante o problema”. Miguel Tiago recorda que “o GES era um universo de empresas que girava em torno do BES, que se endividava no BES, que já só consumia crédito no seu próprio banco — todos os outros bancos negavam-se já a dar créditos ao GES”.

Tudo apontava, diz Miguel Tiago, “para estarmos perante um monopólio alimentado por um banco e que isso a qualquer momento poderia fazer rebentar o próprio banco. O Banco de Portugal nunca atuou, em nenhum momento. Atuou precisamente no momento crítico depois, relembro, de ter autorizado uma transferência de mais de metade do capital do BES para Angola. Não tem nenhum cabimento nas regras da regulação e supervisão bancária, dado que os bancos não podem comprometer, julgo, mais de metade do seu capital bancário com um empréstimo específico. Foi exatamente o que se passou. O Banco de Portugal foi complacente”.

Artigo atualizado com reações de advogado de lesados do BES e do presidente da Associação Sindical dos Juízes

Ricciardi sobre caso BES: “Não imaginei que a situação fosse tão má”

Quinta-feira, Julho 16th, 2020

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DN

José Maria Ricciardi diz-se “perplexo com a dimensão e a profundidade das fraudes” no caso do BES.

Antigo presidente do Banco Espírito Santo de Investimento (BESI) e primo de Ricardo Salgado, José Maria Ricciardi surge como testemunha arrolada pelo Ministério Público na acusação. Considera que está a ser feita justiça no caso BES, mas lamenta que não tenham sido levadas mais a sério as suas ações em 2013 para retirar Salgado da liderança do grupo.

Está satisfeito com o desfecho da investigação ao que aconteceu no Grupo GES, tanto no que lhe diz respeito como em geral?
Da minha parte esperava este resultado. Sei muito bem como sempre me conduzi. Em relação ao que sabemos, não paro de ficar perplexo com a dimensão e a profundidade das fraudes e dos crimes que estão alegadamente em causa. Fico absolutamente impressionado com a dimensão. Por um lado, eu sei que tinha razão quando em 2013 propus a substituição de Ricardo Salgado e a alteração do governo do grupo. O grupo não tinha escrutínio nem tinha checks and balances (separação de poderes). Havia movimentos de capitais e não eram controlados. Ricardo Salgado tentou colocar na opinião pública a ideia de que se tratava de uma luta de poderes e que eu só queria ocupar o seu lugar, o que é absolutamente falso. Não imaginei que a situação fosse tão má.

Suspeitou do que estava a acontecer?
Àqueles que dizem que eu devia saber o que se passava no grupo por estar dentro dele apenas tenho a dizer que – e peço desculpa pelos termos – são uns verdadeiros idiotas. Se o Ministério Público, com os meios de investigação que tem – cartas rogatórias etc. – e a colaboração da CMVM e do Banco de Portugal, leva seis anos a investigar, era eu que ia descobrir isto?

Sente que está a ser feita justiça para todos os que foram lesados com a queda do grupo, dos trabalhadores aos clientes e investidores?
Sinto, mas com algumas considerações. Se se tivesse feito algo em 2013, muita gente que foi prejudicada… muito provavelmente podia ter-se menorizado os danos. No meu caso, sim. Foi feita justiça. Eu fiquei a liderar um banco, aliás.

Sobre o que se passa com o Novo Banco, como vê a situação?
O que se passou com o BES não explica estas incongruências. Quando o Novo Banco foi criado e nos anos seguintes as contas foram aprovadas sem reservas acerca das imparidades. Com a venda à Lone Star tudo se modificou. Ainda para mais, a economia cresceu e o setor imobiliário recuperou, pelo que os ativos que estavam no Novo Banco valorizaram. Acho que, no mínimo, o que se passa é um bocadinho difícil de explicar.

Jornalista do Dinheiro Vivo

Ricciardi conta que BES só adquiriu posição na EDP a pedido de Sócrates

Terça-feira, Dezembro 24th, 2019

Citamos

Negócios

O ex-membro da comissão executiva relatou como o investimento de 200 milhões “não resultou de um estudo económico-financeiro prévio” e que Salgado influenciou e aprovou a escolha de Mexia para a elétrica.

No final de 2005, Ricardo Salgado informou a Comissão Executiva do Banco Espírito Santo (BES) que “o então primeiro-ministro, José Sócrates, lhe tinha pedido [para o banco] adquirir uma participação qualificada na EDP, necessariamente superior a 2%”. A confidência é feita por José Maria Ricciardi, que foi ouvido como testemunha no caso relacionado com a empresa de energia.

Segundo o auto de interrogatório, noticiado pelo Observador esta segunda-feira, 23 de dezembro, o então membro deste órgão executivo, que viria a representar o banco no Conselho Geral e de Supervisão, contou que o investimento de 200 milhões de euros para ficar com essa posição de 2,17%, concretizado em janeiro de 2006, “não resultou de um estudo económico-financeiro prévio por parte do BES”.

Aos procuradores Carlos Casimiro e Hugo Neto, o ex-presidente executivo do BES Investimento disse ainda que “Ricardo Salgado influenciou/teve conhecimento prévio” e “aprovou a escolha de [António] Mexia” para presidente da EDP, lembrando que era um “antigo quadro do BES que tinha saído amigavelmente do banco”.

O jornal digital apresenta este testemunho recolhido a 14 de novembro – e em que Ricciardi insiste ainda que o banqueiro “terá indicado” a Sócrates o nome de Manuel Pinho para ministro da Economia – como relevante para ajudar o Ministério Público a reforçar a prova indiciária que já reuniu contra Pinho, Mexia e Salgado no caso EDP. O ex-ministro é o ator principal, suspeito de receber indevidamente milhões de euros da EDP e do Grupo Espírito Santo (GES) enquanto tutelava a pasta da Economia.