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Obsevador (entrevista com som)
Entre risos, lágrimas e irritações, Nuno Vasconcellos falou sobre a dívida que a Ongoing deixou à banca. O ex-administrador confessou que quer “pagar cada tostão com juros”.
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Obsevador (entrevista com som)
Entre risos, lágrimas e irritações, Nuno Vasconcellos falou sobre a dívida que a Ongoing deixou à banca. O ex-administrador confessou que quer “pagar cada tostão com juros”.
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“Tecnicamente não sou devedor porque as empresas nas quais eu trabalhei e geri, efetivamente contraíram dívidas com o Novo Banco, é verdade. Quando eu saí, não estavam ainda em incumprimento”, respondeu o ex-sócio de Nuno Vasconcellos na Ongoing.
Oex-sócio de Nuno Vasconcellos na Ongoing, Rafael Mora, considerou hoje que “tecnicamente” não é devedor do Novo Banco, dizendo que do ponto de vista financeiro seguia ordens das chefias.
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A Quinta Patiño continua a ser o refúgio de Nuno Vasconcellos quando está em Portugal. Mas isso é cada vez mais raro. Desde que assumiu a liderança de todos os negócios da Ongoing, em Março, o gestor de 50 anos passa a maior parte do tempo no Brasil – 20 dias por mês, pelo menos. Nos sete dias que restam, vem a Lisboa – desloca-se num Mercedes da empresa, fica no luxuoso condomínio do Estoril, agora na casa da mãe, Isabel Rocha dos Santos, e marca viagens pela Europa – Londres, sobretudo. Nas férias, continua a ir até à Comporta, e não escapa aos comentários – que o irritam – de quem o encontra na praia e pensa que já faliu. “Nuno, estás bem? Vi as notícias…”
Já teve outras duas moradas na Quinta Patiño: a casa da ex-mulher, Alexandra Mascarenhas (que a tem à venda numa imobiliária, por 5 milhões de euros), e, depois de se ter separado, uma outra, arrendada. “Deixou de arrendar quando passou a viver a maior parte do tempo no Brasil”, diz um amigo. O Brasil não é só a nova casa do empresário. É também a “nova casa” da Ongoing. Os principais investimentos têm-se concentrado neste país. É lá que funciona, por exemplo, a RealTime, a principal exportadora de tecnologia do grupo, que em 2012 o The Huffington Post colocou no topo da lista das startups mais valiosas (avaliou-a em 100 mil milhões de dólares, 91 mil milhões de euros), acima do Twitter, Airbnb e Spotify.
Do outro lado do Atlântico, Vasconcellos tem três escritórios: o de São Paulo, onde trabalha três dias por semana e onde têm sede o portal de media iG (que encolheu de 450 para 150 pessoas), a Ejesa (dona do Brasil Econômico, que deixou de ser impresso o mês passado por problemas financeiros e passou a existir apenas online) e as tecnológicas; o do Rio de Janeiro, na Barra, a partir do qual acompanha sobretudo a imprensa e a Oi; e uma estrutura mais pequena, em Brasília – quatro salas.
Em Portugal, a operação não tem parado de emagrecer. Desde 2012 que a Ongoing está a ser reestruturada. Entre 2013 e 2014, os custos com as holdings caíram 38%. Este ano, desceram 47%. “Essa estrutura está praticamente destruída”, diz fonte próxima da empresa. A meta seguinte é renegociar a dívida à banca, um trabalho que começou há cerca de dois anos. Fonte conhecedora do processo garante que estará concluído até ao fim de Agosto. Gonçalo Silva Carvalho, actual número dois de Vasconcellos e um dos melhores amigos do gestor, é o responsável pelas negociações com o BCP (onde a dívida da Ongoing ultrapassa os 230 milhões de euros) e com o Novo Banco, os principais credores. “A empresa não consegue cumprir os compromissos nas condições actuais. Precisa de mais tempo ou de uma redução da dívida”, acrescenta a mesma fonte. Uma das opções em estudo é recorrer ao Processo Especial de Revitalização (PER).
7 milhões pela sede no Chiado
Nos últimos dois anos, a sede do grupo em Lisboa, no número 19 da Rua Vítor Córdon, no Chiado, onde chegaram a trabalhar 60 pessoas, tem perdido gente. Pelo menos desde 2013 que a Ongoing espera por uma boa proposta para vender o imóvel – terá tido interessados, mas nenhum convenceu. O edifício valerá mais de 7 milhões de euros. “Até há quatro ou cinco meses estava quase vazio. Tinha umas 15 pessoas”, diz um ex -funcionário. Agora, acolheu cerca de 20 trabalhadores da tecnológica Mobbit – que deixou de arrendar o 1º piso do edifício Suécia, em Carnaxide. A sede acolhe também os funcionários da Heidrick & Struggles e da especialista em marcas My Brand.
No quinto piso do prédio de 800 m2, os gabinetes de Nuno Vasconcellos e de Rafael Mora, com vista para o Tejo, continuam lado a lado, separados por uma sala de estar, embora Mora também pare pouco por lá. “Quando abandonou todos os cargos, mudou-se de São Paulo para o Rio, onde a telefónica brasileira tem sede”, revela um amigo. Gonçalo Silva Carvalho, responsável financeiro, não quis ocupar aquele espaço – tem escritório no 6º andar, no sótão. Mora terá voltado algumas vezes ao edifício do Chiado mas não em contexto de trabalho. Quando deixou a Ongoing, garantiu que não havia “zangas nem sangue”. A exigência do trabalho na Oi e na ex-PT SGPS justificavam a opção – a RS Holding, que controla a Ongoing, tem 10,05% da agora Pharol, ex-PT
Há outros sinais de que o grupo que nasceu com ambições de gigante (em 2006, Vasconcellos dizia que queria a Ongoing entre as 500 maiores do mundo) está a encolher. Só no último ano e meio, perdeu 70% das pessoas, sobretudo no topo da estrutura. Em Dezembro de 2014, o administrador Fernando Maia Cerqueira renunciou; em 2012, José Eduardo Moniz deixou a vice-presidência da área de media. Também saíram Agostinho Branquinho, hoje secretário de Estado da Segurança Social (e que, enquanto deputado, perguntou numa comissão parlamentar o que era a Ongoing – 13 meses depois foi contratado), o ex -espião Jorge Silva Carvalho (antigo director do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa, acusado de usar os conhecimentos nas Secretas para obter informações e beneficiar a empresa). No fim de Julho, dois administradores da consultora Heidrick & Struggles, Mariana Branquinho da Fonseca e Pedro Rocha Matos, pediram a demissão. Voltou Filipa Xara Brasil – funcionária número três, a mais antiga depois de Mora e Vasconcellos.
As mudanças têm sido muitas e rápidas – talvez por isso, quando se tenta aceder à composição da equipa da Ongoing, surge o erro 404. “A página não pode ser encontrada” – a estrutura funcional que aparece no site é de 2010.
Além disso, o BESI tem, desde Julho, um mandato para vender o Diário Económico e a Económico TV. Fontes próximas da empresa disseram à SÁBADO que o processo deve estar concluído até ao fim do ano. No início de 2014, a Ongoing vendeu os 23% que detinha na Impresa, por 50 milhões de euros. Os negócios em África (Angola, Moçambique, África do Sul) e na Ásia (Pequim), sobretudo na área do imobiliário, nunca descolaram. Encerraram há quatro anos. “Para ficar nesses países era preciso investir durante mais dois ou três anos e não havia dinheiro”, diz um próximo.
As últimas contas apresentadas pela Ongoing são as de 2012. Na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, estão em falta as de 2013 e 2014 (e as de 2011 e 2012 foram entregues com muito atraso). As últimas disponíveis, segundo um relatório consultado pela SÁBADO, não são animadoras: em 2012 os prejuízos são de quase 140 milhões de euros.
Ninguém na empresa quis justificar o atraso ou comentar os números. Fonte próxima adiantou apenas que é muito provável que os negócios passem integralmente para o Brasil. “O Nuno acha que a Ongoing é alvo de demasiado escrutínio e gostava de tirá-la de Portugal. Não apresenta contas porque não quer que ninguém as veja. E porque o grupo não é cotado e a maior parte das empresas não tem contas cá.” Várias fontes disseram à SÁBADO que há pagamentos a fornecedores e a ex-colaboradores em atraso. Fonte próxima da Ongoing reconheceu que podem “existir falhas por dificuldades de tesouraria”, mas lembrou que “o Estado paga a seis meses”.
A “grana” que vinha de Portugal
Só com o BES, em 2014, a Ongoing perdeu mais de 150 milhões de euros. E a PT perdeu 2,29 mil milhões do seu valor de mercado desde que foi conhecido o investimento de 897 milhões em dívida da Rioforte, empresa do falido Grupo Espírito Santo. Daqui deixou de vir “a grana” de que se falava nas redacções dos jornais do grupo no Brasil sempre que o prazo dos pagamentos derrapava.
Antes de comunicar à redacção do Brasil Econômico, o primeiro da Ongoing no país, que o jornal deixaria de existir em papel (os jornalistas receberam a notícia a 14 de Julho, três dias antes de a mudança se concretizar, e 30 ficaram sem emprego), Vasconcellos fez uma visita ao Palácio do Planalto. Encontrou-se com o ministro da Comunicação, Edinho Silva. Evanise Santos, responsável pelas relações institucionais da Ejesa (da qual a Ongoing detém 29,9% e Xandinha, ex-mulher de Vasconcellos, 70,1%), foi com ele. A ex-companheira de José Dirceu (ex-ministro condenado no caso Mensalão e detido na operação Lava Jato) disse à SÁBADO que o encontro durou 20 minutos e foi “um gesto de cortesia”.
Afinal, o Brasil Econômico fora bem recebido pelo poder – na capa da primeira edição, o então Presidente, Lula da Silva, aparece ao lado de Vasconcellos a ler o jornal. O jornalista brasileiro Fernando Rodrigues escreveu no seu blogue que as verbas publicitárias estatais federais do título aumentaram 60% entre 2013 e 2014, de 2,2 milhões de reais (573 milhões de euros) para 3,6 milhões (938 milhões de euros), e que 94% vieram de empresas estatais.
Quando souberam do fecho, os colaboradores do jornal ainda não tinham recebido esse mês – a empresa prometeu pagar em três tranches. Os quadros, diz um dos jornalistas, vão receber em 10 prestações. “Muitas vezes, quando havia um atraso, nos acalmavam dizendo que ia chegar uma grana de Portugal.”
De Lisboa chegou a sair o papel em que se imprimia o jornal. A Ongoing fez tanto estrondo na chegada ao Brasil (até anunciou que ia comprar um canal de televisão) que os grupos concorrentes reagiram com um boicote: nenhuma gráfica lhe vendia papel. Fontes próximas da empresa atribuem o falhanço às características do mercado – “Num país com mais de 200 milhões de habitantes, o económico líder vende 45 mil exemplares por dia, o da Ejesa vendia menos de metade” – e à crise económica. “A publicidade caiu 30% e os custos do papel subiram 35%.” Outras culpam a estratégia de gastar muito e de fazer do projecto uma manobra de marketing e de poder.
Este não foi o único negócio no Brasil a correr mal. Em 2011, a Ongoing ficou com 66% do grupo editorial Babel, então presidido por Paulo Teixeira Pinto (ex-presidente do BCP). Em 2013, os accionistas separaram-se – o Globo noticiou que os 10 autores ficaram sem receber e os livros não chegaram às lojas.
As relações com os bancos brasileiros também arrefeceram. Fonte próxima da empresa diz que não existe dívida em reais. “A taxa de juro é muito alta, chega aos 14%, nunca se financiaram lá, a não ser para resolver questões de tesouraria.”
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São as ondas de choque do colapso do império Espírito Santo e do seu efeito colateral mais grave, a Portugal Telecom. A Ongoing vivia do valor das ações e dos dividendos da PT. E quando acabaram…
Ricardo Salgado chamou-lhe o único efeito colateral que não previu, em consequência da queda do BES. A queda da PT, pelo menos da PT poderosa que conhecíamos, é uma consequência direta da implosão do banco e do grupo Espírito Santo, e está a produzir outros efeitos colaterais de menor dimensão. A Ongoing é um deles. E não é o único.
Se o Banco Espírito Santo alimentou o grupo que era o seu principal dono, a Portugal Telecom foi também uma fonte generosa de receitas e ganhos para os acionistas. Ganhavam em dividendos e em fornecimentos. Entre 2010 e 2014, a PT pagou 3,4 mil milhões de euros brutos em dividendos, cerca de dois terços desta remuneração resultou da venda da brasileira Vivo no final de 2010. No mesmo período, o grupo contratou aos seus maiores acionistas serviços e fornecimentos no valor de 851 milhões de euros.
Os principais beneficiários foram o BES/GES, a Ongoing, a Visabeira e a Controlinveste, parceira da PT na Sport TV. Para além destas relações financeiras, a PT também investiu os seus recursos em operações dos acionistas que passaram sobretudo pelo GES/BES, mas também por fundos geridos pela Ongoing. Hoje esses tempos são uma miragem. O que resta da PT, a Pharol, não paga dividendos — tem prejuízos — nem contrata — deixou de ter atividade operacional ao transferir a PT Portugal para a Oi que entretanto a vendeu à Altice.
As ações da antiga PT valem hoje um décimo do que valiam antes da crise do Grupo Espírito Santo. Joaquim Oliveira já não é acionista, saiu no quadro de um acordo com a banca, e mais de metade das ações da Ongoing passou para mãos dos bancos que emprestaram ao grupo liderado por Nuno Vasconcelos. As ações na Portugal Telecom eram o principal património que permitiram financiar o investimento e as operações do grupo dono do Diário Económico.
Na década passada, a Ongoing colocou a família Rocha dos Santos no top dos mais ricos de Portugal, um feito conseguido sobretudo à boleia das valorizações acionista da Portugal Telecom. A Ongoing entrou em 2006 na PT, pela mão do Banco Espírito Santo, reforçando o lado dos que se opunham à OPA da Sonae. Depois de uma breve passagem pela guerra de poder no BCP, a Ongoing comprou o Diário Económico em 2008, vencendo uma disputa com o Grupo Lena, e preparou-se para fazer do título a plataforma de uma estratégia de expansão dos media que ambicionava chegar à televisão.
Tentou uma aproximação à Impresa, onde chegou a ter 23% do capital, mas a abordagem falhou quando Francisco Pinto Balsemão viu na proposta de aumento de capital uma tentativa de lhe roubar o controlo. Em ano de eleições legislativas, a Ongoing avançou com uma proposta de compra de 35% da Media Capital, a dona da TVI. A operação ganhou fôlego em 2009, depois da polémica tentativa de aquisição da estação televisiva, muito incómoda para o governo de José Sócrates, pela Portugal Telecom, onde a Ongoing era já uma das principais acionistas.
O processo acabou por ser travado pelo regulador dos media cujo parecer é vinculativo. A ERC (Entidade Reguladora da Comunicação) chumbou o negócio ao impor como condição a venda da participação da Ongoing na Impresa que era dona da maior concorrente da TVI, a SIC. O grupo de Vasconcellos não insistiu na compra da TVI e lançou a Económico TV, de olhos postos numa futura privatização ou concessão da RTP.
Pelo meio, ainda houve uma guerra muito pública com o presidente da Impresa que expulsou Nuno Vasconcellos e Rafael Mora dos órgãos sociais do grupo. Entre exigências de lançamento de OPA e impugnação de decisões da assembleia geral da Impresa, o grupo de Balsemão foi ganhando em tribunal e em 2013 a Ongoing deixou cair as ações. As outras, as ações da Impresa, foram vendidas no início de 2014.
pesar do forte sismo que abala os media, e em particular a imprensa, onde o investimento publicitário quase desaparece, a Ongoing mantém o rumo. O grupo vive à sombra dos generosos dividendos distribuídos pela Portugal Telecom, logo à seguir à venda da Vivo, realizada em 2010. Foi este negócio que levou a PT a investir na Oi. Em 2012 a empresa de Vasconcellos compra um dos principais portais brasileiros, o iG, precisamente à Oi
Também vai fazendo contratações de peso, dentro e fora do Estado. Uma das mais badaladas foi a de José Eduardo Moniz, o todo-poderoso patrão da TVI, que foi para a Ongoing quando estava em cima da mesa a compra da Media Capital.
O ex-espião Silva Carvalho acabou por se revelar o maior embaraço quando no meio da guerra com a Impresa o Expressopublica a história de que o antigo diretor do SIED teria usado os meios dos serviços de informação do Estado em benefício da empresa para o qual viria a trabalhar.
Depois da queda de Sócrates, em 2011, a empresa contrata Guilherme Drey, ex-chefe de gabinete do antigo primeiro-ministro e que nessa qualidade acompanhou ao lado de Sócrates a venda da Vivo, um negócio que este começou por rejeitar, mas que acabou por abraçar.
Também o ex-secretário de Estado do Tesouro, Carlos Costa Pina, passou por lá, embora por pouco tempo, antes de rumar à administração da Galp. Outra das contratações famosas foi Agostinho Branquinho, o deputado social-democrata que pouco tempo antes tinha feito a pergunta numa comissão de inquérito:O que é a Ongoing?
Entre 2010 e 2011, a PT distribuiu dividendos extraordinários à conta dos ganhos que fez na alienação da Vivo à Telefónica, uma operação que acabou por ser apoiada pelos grandes acionistas da empresa, depois dos espanhóis terem aumentado várias vezes o cheque até chegar aos 7.500 milhões de euros.
Só em 2010, ano em que tinha 6,8% da PT, a Ongoing terá recebido mais de 100 milhões de euros líquidos nos três dividendos pagos pela empresa, uma parte dos quais distribuído no ano seguinte. A remuneração referente a 2011, e considerando que a Ongoing já tinha 10% do capital, terá chegado aos 44 milhões de euros com duas distribuições de dividendos, um dele ainda por conta da Vivo. No ano seguinte, a PT é menos pródiga e a Ongoing teria direito 21 milhões de euros, distribuídos já em 2013. No entanto, por esta altura, já uma parte importante dos dividendos estaria também hipotecada.
Para além de pagar dividendos, a PT também investiu uma parte dos recursos do Fundo de Pensões em fundos geridos pela acionista Ongoing. A aplicação polémica não foi ao comité de investimentos do fundo e levou à demissão de um administrador (Jorge Tomé então na Caixa). O investimento de 75 milhões chegou a valer mais de 100 milhões e foi uma antecâmara para o desastre que se seguiria quatro anos depois.
A PT até mudou as regras e criou o comité de partes relacionadas para escrutinar as relações económicas perigosas entre acionistas e a empresa. Em vão. As aplicações de tesouraria (os investimentos feitos a três meses, mas renovados) em papel comercial de empresas do GES, não passaram neste crivo.
O ano passado foi o último em que ocorreu distribuição de lucros por parte da PT, referentes aos resultados positivos de 2013. Mas o dividendo líquido foi inferior a 10 cêntimos por ação. A Ongoing teria direito a cerca de 6,5 milhões de euros líquidos. Este é o primeiro ano sem dividendos. A PT SGPS (hoje designada Pharol) passou a prejuízos depois do polémico investimento de 900 milhões de euros na Rioforte, holding não financeira do GES. Pelo caminho, a PT perdeu a PT Portugal que a Oi vendeu, os gestores premiados e a dignidade de grande empresa.
Tão ou mais grave que a perda dos dividendos, foi o descalabro da cotação da PT, que vale hoje um décimo do que valia antes de serem conhecidas as aplicações na Rioforte e a insolvência em cadeia do Grupo Espírito Santo (GES). As ações da PT serviam de garantia aos empréstimos contraídos pela Ongoing, nomeadamente junto do BCP, e o resvalar da cotação tornou inevitável o cenário da execução. A alternativa seria reforçar as garantias e eventualmente entrar com garantias pessoais.
A notícia do “colapso iminente” da Ongoing foi avançada peloExpresso no final de julho. Uma semana depois, confirma-se a execução das ações da Pharol que estavam dadas como garantia ao BCP. O grupo que chegou a ter 10% da PT, tem agora apenas 3,5% da Pharol que tem como ativo ser o maior acionista da Oi. A Ongoing apoiou a venda da PT Portugal e a estratégia de consolidação da Oi Brasil que, no entanto, tarda em dar frutos.
Segundo o semanário, as dificuldades financeiras implicam ainda a venda do Diário Económico, o principal negócio operacional em Portugal, e poderão culminar no recurso ao PER (processo especial de revitalização), informação que o Observador não conseguiu confirmar. A Ongoing ainda tem operações mais relevantes no Brasil, nos media e tecnologias de informação, do qual pouco se sabe. Haverá igualmente o património dos acionistas, a família.
As últimas contas entregues, já este ano, no Instituto de Registos e Notariados da holding Ongoing Strategy são de 2012. Apesar da cópia quase ilegível consultada pelo Observador foi possível perceber os sinais de degradação financeira da empresa que era um dos dez maiores devedores da banca portuguesa. Os prejuízos ascenderam a cerca de 163 milhões de euros (não é possível perceber o valor exato) e só não foram maiores porque a Ongoing não contabilizou todas as perdas resultantes da desvalorização em bolsa das ações da PT, o que suscitou uma reserva (num total de três) do auditor que aprovou as contas.
Mais de metade das ações detidas na Portugal Telecom estavam já em 2012 dadas como penhor pelo empréstimo do BCP e comprometidas com um financiamento swap contraído junto do Crédit Suisse. Nos dois casos, os dividendos destas ações tinham como destino o pagamento de juros às instituições financeiras. O crédito ao BCP ascendia à data (final de 2012) a cerca de 398 milhões de euros e na sequência da desvalorização em bolsa da PT o banco exigiu um reforço de colaterais que resultou na entrega de ações da Ongoing TMT e do BES. O Banco Espírito Santo era outro financiador importante ao nível da tesouraria.
os últimos meses, foram saindo do grupo os quadros mais importantes. Em março, sai Rafael Mora que era mais do que um braço direito de Nuno Vasconcellos. Era apontado como o grande estratega da empresa. Mora continua a ser administrador da Pharol e da Oi.
Em abril, demite-se o diretor do Diário Económico. António Costa era administrador da Ongoing Media e foi o quadro que o grupo foi buscar para liderar o projeto Económico, logo a seguir à compra do título. Guilherme Drey terá entretanto também saído. Moniz trocou o grupo pela administração da SAD do Benfica já em 2012.
Mas se a Ongoing era um dano coleteral mais ou menos envidente, há outros casos menos óbvios. As dívidas e empresas da família Espírito Santo não foram as únicas a ficar presas no banco mau. O relatório do BES pós resolução mostra que deste lado ficaram ainda os créditos sobre duas empresas do grupo Imastogil e sobre a holding de Margarida Queiroz Pereira (MPQ), a irmã mais nova de Pedro Queiroz Pereira. Oempréstimo de 87,2 milhões de euros tem uma imparidade (perda) associada elevada.
O financiamento à MPQ ficou no BES porque a resolução impõe que que “os direitos de crédito sobre a Espírito Santo International e seus acionistas, os acionistas da Espírito Santo Control” não passariam para o Novo Banco, esclareceu ao Observador o gabinete de relações com os investidores do Banco Espírito Santo. Os ativos e passivos das partes relacionadas (acionistas qualificados do banco e do grupo) ficaram no BES por ordem do Banco de Portugal.
Isto significa que a irmã de Queiroz Pereira, o empresário que entrou em guerra com Ricardo Salgado por causa da Semapa, é acionista do GES e nessa qualidade, uma perdedora com o colapso do grupo. Margarida Queiroz Pereira também chegou a constar da lista dos mais ricos em Portugal. A história da sua falência fez manchete no jornal Expresso.
Segundo o jornal, a exposição da MPQ a investimentos acionistas no GES contribuiu para o descontrolo financeiro dos negócios de Margarida Queiroz Pereira que entrou no Grupo Espírito Santo na sequência de um conflito com o seu irmão, que lidera os destinos da Semapa desde os anos 90.
No início da década passada, MPG entregou a sua participação na holding ao GES, em troca de uma participação nas holdings de controlo do grupo, a Espírito Santo Internacional e a Espírito Santo Control. Foi este negócio feito nos bastidores que esteve na origem da guerra entre Queiroz Pereira e o então líder do BES, já que Ricardo Salgado recusou identificar os acionistas das sociedades offshore que ficaram com a participação da irmã mais nova na Semapa.
A propósito deste episódio, fica famosa uma frase de Queiroz Pereira na comissão de inquérito ao BES: “Dr. Ricardo Salgado tem um problema: não lida maravilhosamente com a verdade. As offshores eram ele”. A confirmação desta ligação levou o dono da Semapa a acusar o ex-líder do BES de lhe querer roubar o controlo do grupo. O empresário temia que o seu grupo passasse a ser a nova PT.
A guerra sobe de tom quando Ricardo Salgado aparece ao lado de Maude Queiroz Pereira, a outra irmã “seduzida” pelo ex-líder do BES que contestou em tribunal algumas operações realizadas por PQP para assegurar o controlo da Semapa-
Pedro Queiroz Pereira, ele próprio acionista do GES, começou a exigir informação e relatórios sobre a situação financeira do grupo. Os dados que recolheu revelaram fragilidades financeiras do GES e chegaram ao Banco de Portugal na mesma altura que o supervisor já estava a investigar as contas da Espírito Santo Internacional. O resto é a história que já conhecemos.
Os efeitos mais devastadores da queda do banco e da família são ao nível das empresas do Grupo Espírito Santo, a maioria dos quais enfrentava já problemas económicos e vivia na dependência do financiamento dado pelo banco ou obtido através dos clientes do GES.
Opway, Espírito Santo Hotéis, Tivoli Hotéis, Espírito Santo Property, Espírito Santo Irmãos, Espírito Santo Financial Portugal, fazem parte da lista de empresas do GES que avançou para o PER (Processo Especial de Revitalização) de empresas. As duas últimas foram declaradas insolventes. A lista de créditos reclamados somava 1.300 milhões de euros em maio, com a Caixa a liderar. Este número não inclui as dívidas das holdings do grupo — A Espírito Santo Internacional, a Rioforte e a Espírito Santo Financial Group — que foram declaradas insolventes pela justiça do Luxemburgo.
Os processos da Tivoli Hotéis e da Espírito Santo Property, dona de parte da Herdade da Comporta, receberam luz verde dos credores, mas o seu desenvolvimento está ainda pendente dos tribunais por causa do arresto de bens do GES decretado pelo tribunal. Os hotéis foram vendidos ao grupo tailandês Minor.
O arresto sobre o património imobiliário e turístico da herdade tem sido também um obstáculo à liquidação dos ativos da Rioforte que foi declarada insolvente no Luxemburgo.
O plano da construtora Opway, que foi comprada ao GES pelo seu presidente, Almerindo Marques, ainda está em apreciação. A Tranquilidade, a Espírito Santo Saúde e a ES Viagens foram vendidas logo após a queda do BES/GES no verão passado.
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A Ongoing quer vender o Diário Económico (DE) e a Económico TV (ETV), tendo para isso mandatado formalmente o BESI, segundo o jornal Expresso. Os potenciais interessados referem ainda ao mesmo jornal que é difícil encontrar um racional para a compra. O DE tem um passivo de 30 milhões de euros, perdas mensais de exploração de 200 mil euros e enfrenta problemas de tesouraria.
“O processo já foi desencadeado em Julho e já deu origem ao envio de um primeiro dossier a potenciais investidores, com alguns dados sobre a operação da empresa que detém estes activos – a S.T. & S.F. – e os moldes gerais em que poderia avançar a operação”, sublinha o mesmo jornal.
No passado dia 27 de Julho, o Correio da Manhã já avançava também que têm existido contactos para alienar o jornal Diário Económico, assim como o canal de televisão ETV. Isto no mesmo dia em que noticiou que a Ongoing prosseguia o processo de corte de custos, desta vez colocando à venda o edifício-sede, em Lisboa, e esperando angariar entre 7 a 8 milhões de euros com a operação.
No início de 2014, recorde-se, a Ongoing vendeu a participação de 23% que detinha na Impresa, dona da SIC e do Expresso, por 50 milhões. “De referir ainda que no Brasil, e depois de em 2012 ter deixado de publicar o desportivo Marca, encerrou este ano a edição em papel do Brasil Económico. Já no portal IG, o grupo fez duas reestruturações, que originaram o despedimento de 300 pessoas”, sublinhava então o CM, recordando que a Ongoing é das empresas que mais sofreram com a crise da Portugal Telecom, já que tinha uma posição accionista de 10,05%.
Na edição deste sábado, o Expresso refere que fonte do conselho de redacção do Diário Económico confirmou que o director do jornal, Raul Vaz, revelou esta semana aos jornalistas que o processo de venda está em curso, no âmbito da reestruturação do grupo Ongoing.
O semanário sublinha ainda que entre os vários grupos de media e investidores contactados pelo BESI, “os que terão manifestado maior interesse foram três de origem angolana: o dono do Sol e do i, Álvaro Sobrinho; um dos novos donos do DN, JN e TSF, António Mosquito; e Isabel dos Santos, que, depois de investir na banca, energia e telecomunicações, está a estudar um possível reforço da sua presença na área dos media em Portugal”.
No entanto, apenas um dos três interessados mostrou intenção de avançar para a fase seguinte do processo, que é o levantamento do caderno de encargos, diz o Expresso, salientando a difícil situação financeira do Diário Económico, que tem um passivo próximo dos 30 milhões de euros.
Ongoing em PER?
O semanário destaca ainda, numa outra notícia, que a Ongoing está em colapso iminente e que o BCP poderá executar garantias sobre a empresa (cuja dívida para com o banco liderado por Nuno Amado ascende a mais de 230 milhões de euros). “A execução da dívida [da Ongoing] por parte do BCP está por um fio”, escreve o Expresso.
Ao que o jornal apurou, a Ongoing está a avançar com um Processo Especial de Revitalização (PER), um projecto de recuperação de devedores em situação económica difícil, em que é apoiado pelo Novo Banco, onde a empresa da família de Nuno Vasconcellos tem ainda empréstimos para pagar.
“A decisão é consensual e tudo aponta para que o BCP esteja receptivo ao PER. (…) O BCP está, porém, decidido a exercer as garantias que tem, com PER ou sem PER”, avança o Expresso. Ainda de acordo com o jornal, existem garantias pessoais de Nuno Vasconcellos.