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Procuradores acreditam que provas da Suíça ainda podem ser usadas no julgamento do caso BES

Domingo, Maio 31st, 2020

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Público

Portugal espera há quatro anos que autoridades suíças remetam importantes provas no âmbito do colapso do universo Espírito Santo. Mesmo assim, Ministério Público português deve acabar acusação nos próximos dois meses. Serão emitidas certidões para continuar a investigar casos laterais.

O ex-banqueiro Ricardo Salgado, que dirigiu durante mais de duas décadas o Banco Espírito Santo (BES) e o grupo com o mesmo nome, está a ser investigado pelas autoridades suíças desde Agosto de 2014 por suspeitas de branqueamento de capitais agravado, mas até agora o inquérito permanece sem acusação. E as autoridades portuguesas permanecem sem resposta às cartas rogatórias que enviaram às autoridades helvéticas.

O gabinete do procurador-geral suíço recusa explicar porque não enviou nos últimos quatro anos ao Ministério Público (MP)português parte relevante dos elementos, entre eles documentos apreendidos e depoimentos de testemunhas, que Portugal solicitou, por carta rogatória, e cuja chegada se aguarda desde Maio de 2016. Numa primeira resposta enviada ao PÚBLICO em Fevereiro, o gabinete do procurador-geral suíço garantia apenas que “executou e continua executando essas solicitações de acordo com as prioridades definidas como parte da estreita colaboração entre os dois países”. Nessa altura, o MP português já decidira avançar com a acusação ao colapso do BES/GES sem essas provas, apesar de garantir que iria fazer uma última tentativa junto das autoridades suíças. Esta semana, passados mais de três meses e sabendo que os elementos não chegaram a Portugal, o PÚBLICO voltou a questionar as autoridades suíças, que se recusaram a fazer mais comentários sobre o assunto.

No MP português há alguma frustração por se ter que avançar para a acusação ao colapso do BES/GES sem os elementos que os procuradores já sabem que existem, já que alguns magistrados estiveram na Suíça, em Maio de 2016, a acompanhar grande parte das buscas e das audições que solicitaram às autoridades daquele país. Mesmo assim, acreditam que há prova para sustentar a acusação. Além disso a prova que está na Suíça ainda pode ser junta até ao julgamento, sustenta um responsável ligado ao caso. Este sublinha que tal vai demorar bastante mais do que um ano, já que, entretanto, deverá decorrer a instrução.

Já a pensar no futuro desenrolar do caso o MP está a preparar uma equipa de procuradores que deverá acompanhar a instrução e o julgamento deste megaprocesso que tem, pelo menos, 41 arguidos. O procurador José Ranito e a colega Olga Barata, os coordenadores da equipa de sete magistrados, deverão apoiar as próximas fase do caso, mas também deverão ficar encarregues de continuar a investigação de situações laterais que vão levar à extracção de certidões.

A acusação deverá estar pronta até às férias judiciais, que arrancam a 16 de Julho. Cada um dos sete procuradores que integram a equipa do caso ficou encarregue de escrever uma parte da acusação e, neste momento, estas estão a ser interligadas de forma a dar coerência a um documento que terá milhares de páginas. Os arguidos estão a começar a ser notificados, por escrito, de um resumo de novos factos que lhes são imputados, deixando os procuradores do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), onde o processo está em investigação desde 2014, ao critério destes uma eventual reacção que tanto pode ser presencial (através de um novo interrogatório) como escrita. Alguns, que nunca foram ouvidos, terão que ser interrogados.

Os advogados de defesa têm tentado consultar o processo que há mais de um ano deixou de estar abrangido pelo segredo de justiça, mas não tem sido facultado o acesso a diversos elementos vitais, como escutas telefónicas ou outros elementos recolhidos na Suíça.

O fim da equipa conjunta

Em Fevereiro, o gabinete do procurador-geral suíço explicava ao PÚBLICO que com base em várias comunicações do departamento helvético de prevenção de branqueamento de capitais e de várias queixas-crime, abriu diversas investigações criminais desde meados de 2014, altura em se verificou a resolução do BES. “Um desses processos é conduzido contra o ex-CEO do Banco Espírito Santo desde Agosto de 2014, em particular por suspeita de lavagem de dinheiro agravada. O processo foi estendido a vários outros indivíduos.”

As autoridades suíças assumiam que a “cooperação estreita” com Portugal era essencial “tendo em conta a dimensão e complexidade dos procedimentos, a extensão das perdas envolvidas, a natureza multi-jurisdicional dos processos e a necessidade de evitar qualquer duplicação de acusações”. E assim justificavam a criação, em Maio de 2015, da primeira equipa de investigação conjunta na área do colarinho branco, acordada em sede de Eurojust. “Esta equipa, que permite a ambos os lados acesso a toda a documentação e informação relevante para as investigações nos dois países, foi estendida em várias ocasiões, mas agora expirou”, afirmavam os suíços.

O PÚBLICO tentou saber o que tinha motivado o fim dessa equipa conjunta, tendo-lhe sido garantido, por fonte nacional, que tal aconteceu já no ano passado e que estas estruturas, financiadas pela União Europeia, têm sempre um prazo de funcionamento, que, neste caso, até foi prorrogado várias vezes. Os suíços garantem que a colaboração entre as autoridades dos dois países se mantém no âmbito dos acordos existentes e realçam que “os numerosos e extensos” pedidos de colaboração de Portugal à Suíça levaram ao congelamento de “centenas de contas bancárias” e à apreensão de mais de oito terabytes de dados.

Tentou-se ainda especificamente saber se, ao abrigo do que permite a legislação suíça, Ricardo Salgado ou algum dos visados na prova apreendida naquela confederação se opôs ao envio dos elementos recolhidos para Portugal, mas o gabinete do procurador-geral suíço não respondeu. Se tal tiver acontecido, o que é previsível, pode arrastar a situação durante anos nos tribunais helvéticos, já que há instâncias de recurso. Os advogados portugueses de Salgado não quiseram responder a esta questão, nem informar o nome do defensor de Salgado na Suíça.

A importância da Suíça no colapso do BES

Há duas entidades suíças que tiveram um papel relevante no colapso do Banco Espírito Santo e cujo escrutínio é essencial para desenredar o complexo novelo deste caso. São elas as sociedades financeiras Eurofin, que prestaram serviços ao banco português e ao respectivo grupo e a Espírito Santo Enterprises, um veículo que não fazia parte do organigrama do grupo e terá funcionado como um saco azul do BES. Uma auditora feita pela KPMG conclui que semanas antes do banco português ser intervencionado, o Eurofin intermediou um conjunto de transacções que terão permitido desviar 780 milhões de euros do BES para pagar dívidas do GES.

O grupo Eurofin, que é presidido por um suíço que foi quadro do BES durante uma década, está envolvido em operações polémicas de compra e recompra de títulos de dívida de holdings da família Espírito Santo, entre elas a Espírito Santo International, movimentos estes que determinaram perdas para o próprio banco de mais de 1,2 milhões de euros. Por outro lado, as sociedades Eurofin receberam ao longo de anos verbas do GES e do BES que canalizava a ES Enterprises que, se suspeita, ter servido para distribuir verbas não documentadas, de centenas de milhões de euros, por várias pessoas e entidades. No âmbito da acusação da Operação Marquês, que utilizou provas recolhidas nos inquéritos relativos ao universo Espírito Santo, O Ministério Público sustenta que a Enterprises serviu para pagar luvas milionárias a antigos gestores da PT e ao ex-primeiro-ministro José Sócrates, além de alegadamente ter servido para desviar para contas controladas por Salgado 10,7 milhões de euros.

Fim do BES: Suíça sem data para responder a Portugal

Quarta-feira, Julho 17th, 2019

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TSF

O fim da investigação depende das autoridades suíças, que se justificam com a complexidade do caso e recordam a presunção de inocência dos suspeitos.

O procurador-geral da Suíça diz que não está apenas nas suas mãos responder aos pedidos de cooperação judiciária do Ministério Público português na investigação ao que se passou no colapso do Universo Espírito Santo.

Fonte oficial do gabinete do procurador-geral sediado na cidade de Berna adianta à TSF que “não há, por isso, qualquer prognóstico quanto à duração dos procedimentos que estão em curso”. É esta a resposta das autoridades suíças depois de na segunda-feira a Procuradoria-Geral da República (PGR) portuguesa ter emitido uma nota em que pela segunda vez, em poucos meses, remetia para a necessidade de receber respostas do país helvético, que aguardava há muito tempo, para fechar o inquérito.

O gabinete do procurador-geral da Suíça confirma que tem em curso “vários procedimentos no âmbito do colapso do Universo Espírito Santo”, à semelhança de “outras autoridades estrangeiras.

“Inúmeros e volumosos pedidos”

Devido “à escala, complexidade, extensão dos prejuízos, natureza multi-jurisdicional do caso [ou seja, o cruzamento de leis de vários países] e para evitar o problema da dupla acusação, o procurador-geral da Suíça estabeleceu desde 2015 uma equipa conjunta com as autoridades portuguesas cuja colaboração tem sido excelente”, diz a resposta enviada à TSF.

O procurador acrescenta que, depois da conclusão do trabalho da equipa, “Portugal enviou para a Suíça inúmeros e volumosos pedidos de assistência”, que continuam a ser executados de acordo com as prioridades estabelecidas com as autoridades portuguesas e de acordo com a lei Suíça.

A terminar, o procurador-geral da Suíça sublinha que, “como sempre, a presunção de inocência aplica-se a todos os suspeitos neste caso”.

Tudo dependente da Suíça

Recorde-se que, na segunda-feira, a PGR adiou o prazo marcado para fechar a investigação, que dura há cinco anos, o que levou à queda do Grupo Espírito Santo, incluindo ao fim do BES.

O diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) argumenta que para chegar à verdade faltam dados fundamentais que estão dependentes da ajuda das autoridades suíças, apesar das “persistentes iniciativas desenvolvidas pelos magistrados titulares do inquérito”.

Com o despacho do diretor do DCIAP o prazo para finalizar o inquérito passou a estar totalmente dependente da resposta Suíça: “três meses contados a partir da devolução dos elementos probatórios em poder das autoridades suíças e apreendidos à ordem dos autos”. Só depois de corrido esse prazo é que será fechado o inquérito.