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O governador do Banco de Portugal, em entrevista ao PÚBLICO, continua a defender a solução encontrada para a venda do Novo Banco. Mas lamenta “a duração e carácter tardio com que foi tratado” o problema provocada pela queda do BES.
A sequência de episódios a que se tem vindo a assistir no Novo Banco é classificada por Mário Centeno como um processo “penoso”, mas que ocorre, não por falhas na solução encontrada para o banco, mas pelo atraso com que o problema começou a ser resolvido, defende o governador do Banco de Portugal.
Sem querer referir-se a casos concretos, Mário Centeno, numa entrevista ao PÚBLICO sobre a revisão estratégica do BCE a publicar esta segunda-feira, defende que aquilo que é necessário é “celeridade, clareza e efectividade na forma como todos lidamos com estes casos”.
“No sector financeiro não há azar, há procrastinação. Estes casos revelam tudo isso. Situações bancárias que se prolongam sem viabilidade ao longo de muito tempo, geram comportamentos negativos, quer do lado do sistema bancário, que fica de mãos atadas a alimentar no seu balanço créditos que não têm destino previsivelmente bem-sucedido, quer do lado dos mutuários que insistem em encontrar soluções”, afirma.
Questionado se a sequência de episódios a que se tem vindo a assistir no Novo Banco não revelam também as fragilidades da solução encontrada para a instituição financeira no momento da sua venda, o ex-ministro das Finanças responde que “não, porque isto acontece em todos os bancos e em todo o lado”.
“Temos de ter noção que estes fenómenos decorrem da inacção que os sistemas têm e da complacência que demonstram com determinado tipo de comportamentos. Temos noutros países – na Alemanha, que é sempre um exemplo que gostamos de dar – fenómenos de corrupção e malversação da gestão bancária semelhantes a estes que estamos a observar em Portugal, e esses fenómenos são devidamente identificados e corrigidos, com as consequências para quem os pratica. Nós provavelmente atrasamo-nos a tratar deles no sistema bancário e a tratar deles no sistema judicial. Começámos a fazê-lo há alguns anos no sistema bancário”, diz.
Mário Centeno repete a sua defesa da solução adoptada no Novo Banco. Permitiu que o Novo Banco melhorasse todos os indicadores financeiros num banco que é o terceiro maior do país e que precisa dessa estabilidade para que haja estabilidade financeira em Portugal. Isso tem de ser avaliado como um sucesso, argumenta. “Outra coisa é que este processo pela sua duração e pelo carácter tardio com que foi tratado se tenha tornado um processo penoso. Isso é que não existe nos outros países: este atraso e esta duração no tratamento destas situações”, insiste.
O Novo Banco foi criado em Agosto de 2014, na sequência da resolução do BES, que colapsou perante o peso dos desequilíbrios financeiros gerados durante a gestão de Ricardo Salgado. Em 2015, o Banco de Portugal fez uma primeira tentativa de venda da instituição, que demorou seis meses e culminou com a suspensão do processo em Setembro, quando estavam apenas duas entidades na corrida: Apollo e Fosun. Em 2016, reacende-se o processo de venda, que é concluído apenas em Outubro de 2017, com a entrega do banco aos norte-americanos da Lone Star. Já este ano, de 2021, chegou ao fim o processo de reestruturação do banco negociado com o BCE no âmbito da venda do Novo Banco.
Este é um excerto da entrevista do governador do Banco de Portugal sobre a revisão da estratégia do BCE, a primeira desde 2003, que será publicada esta segunda-feira na íntegra