O CASO BES E A DEFESA DOS DIREITOS DOS LESADOS
O instrumento de resolução adotado pelo Banco de Portugal, ao que parece com fundamento no disposto no Decreto-lei nº 298/92, de 321 de dezembro e na Diretiva nº 2014/59/UE, do Parlamento e do Conselho é chocante, de um ponto de vista técnico-jurídico, desde logo por falta de publicação do ato.
A simples leitura dos artºs 37º e seguintes da referida Diretiva suscita mais dúvidas do que esclarecimentos, na medida em que as responsabilidades relativas ao uso dos instrumentos de resolução previstos nesse normativo comunitário são, essencialmente, dos Estados-membros e não das autoridades de resolução.
Os Estados-membros asseguram que as autoridades de resolução disponham dos poderes necessários para aplicar os instrumentos de resolução às instituições ou às entidades financeiras, referidas no artº1º,1 da diretiva.
De qualquer modo, sem prejuízo de a autoridade de resolução poder recuperar as suas despesas, as contrapartidas pagas pelo adquirente do banco sujeito a instrumento de resolução devem beneficiar, em primeiro grau “os titulares das ações ou dos instrumentos de propriedade.”
Diga-se o que se disser acerca de operações com produtos financeiros estruturados, é claro e inequívoco que os ativos de qualidade que o Banco de Portugal pretende colocar no Novo Banco pertencem aos acionistas do BES.
Assistimos ontem ao anúncio de um assalto aos ativos limpos do BES e ao anúncio de entrega do lixo aos acionistas.
Estamos, antes de tudo, perante uma imoralidade, que não pode ser justificada por nada. Estamos perante um confisco de valores que têm dono, anunciando-se que os lesados não serão indemnizados.
Nem o gonçalvismo foi tão longe.
Sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado e do Banco de Portugal, emergente do facto de terem sonegado informação aos investidores e de, ao invés, terem difundido informação falsa e tendenciosa, parece inequívoco que, se o banco for vendido com mais valias, têm essas mais valias que ser distribuídas aos acionistas do BES, sem discriminação.
É óbvio que os instrumentos de resolução estão sujeitos a impugnação contenciosa.
Certo é que, para poder impugnar tais instrumentos, é indispensável que os mesmos sejam conhecidos. E isso não acontece, no caso BES.
Poucos juristas terão estudado, com um mínimo de cuidado e rigor a Diretiva 2014/59/UE, citada
Uma leitura, ainda que em diagonal, desse diploma permite concluir que quase tudo o que foi anunciado pode ser posto em causa pelos lesados.
A diretiva não é uma fórmula europeia de tomada de assaltos ativos bons de entidades financeiras a quem os reguladores permitiram desvarios.
Queiramos ou não, esta intervenção do Estado no BES é bem mais sinistra que a que foi realizada pelo governo de Vasco Gonçalves, a seguir ao 11 de março de 1975.
Por tudo isso me parece que os lesados têm condições para obter reparação dos seus prejuízos na Justiça.